Passaram-se mais de 20 anos desde que Hugo Chávez, eleito, em
1998, e assumiu a Presidência da Venezuela, abrindo caminho para
um período de importantes vitórias das forças progressistas e
anti-imperialistas no subcontinente sul-americano.
Desde o início, as oligarquias venezuelanas – vassalas dos
Estados Unidos – se insurgiram contra essa experiência
transformadora e tentaram liquidá-la no seu nascedouro,
utilizando todo o tipo de expedientes antidemocráticos, mas sem
obter êxito.
Hoje, os Estados Unidos, OTAN, Grupo de Lima e seus satélites –
coadjuvados pela oposição golpista – realizam uma ofensiva total
contra a Venezuela, inclusive ameaçando com uma agressão
militar.
Os monopólios midiáticos internacionais martelam diariamente que
os governos bolivarianos foram e são ditatoriais e apresentam
essa cruzada bandidesca contra o povo venezuelano como “defesa
da democracia” e “ajuda humanitária”.
Em amplas camadas do povo e mesmo em setores da esquerda
observamos uma aceitação acrítica desses ataques, ou posturas
omissas e politicamente covardes, que não compreendem a
importância de uma solidariedade ativa à luta do povo
venezuelano.
Nesse texto busco, de forma sucinta, historiar o chamado
“processo bolivariano”, mostrando principalmente o seu caráter
profundamente democrático, em contraste com a postura golpista e
antidemocrática da oposição e dos EUA, desde o início do
processo.
Sem pretender esgotar o tema, trago informações e dados que
repõem a verdade sobre a Venezuela, com o objetivo de armar a
militância progressista para uma efetiva, destemida e necessária
solidariedade à luta do povo venezuelano.
Antecedentes: o “CARACAZO” e a rebelião de Hugo Chavez
Em 2 de fevereiro de 1989, Carlos Andrés Perez, da Ação
Democrática (AD), assumiu pela segunda vez a presidência da
Venezuela. No dia 16 de fevereiro, ele dirigiu-se ao país e
anunciou – para surpresa geral – que havia assinado um memorando
com o FMI, para obter um empréstimo de 4,5 bilhões de dólares.
No dia 25 de fevereiro, sábado, ele anunciou as contrapartidas:
desvalorização da moeda; redução dos gastos públicos e do
crédito; aumento da gasolina em 100% e dos transportes em 30%;
aumento dos gêneros de primeira necessidade; congelamento dos
salários.
A
reação não se fez esperar. Na segunda feira, 27 de fevereiro
explodiu nas principais cidades do país uma revolta espontânea,
levando às ruas de Caracas e das principais cidades dezenas de
milhares de pessoas, que passaram a protestar e saquear os
estabelecimentos comerciais. A repressão, feita pelo exército,
foi impiedosa e estima-se em cerca de 3.000 mortos e milhares de
feridos.
O
“Caracazo” – como ficou conhecida essa explosão popular –
expressou uma sociedade gravemente enferma, onde 70% das pessoas
viviam abaixo da linha da pobreza e 30% na miséria absoluta.
Pode-se dizer que ele pôs fim ao Pacto de Punto Fijo, no
qual, em 1958, os três principais partidos oligárquicos de então
– AD, COPEI e URD – estabeleceram um entendimento para
compartilharem o poder na Venezuela, garantindo os seus
interesses de classe.
Impulsionados por esses acontecimentos, três anos depois, em 4
fevereiro de 1992, jovens oficiais de tendências progressistas e
nacionalistas – que em 1982 haviam criado o Movimento
Bolivariano Revolucionário 200 (MBR200) – iniciaram uma
rebelião militar sob a liderança do Coronel Hugo Rafael Chavez
Frías, com o objetivo de “refundar e moralizar a República”,
mas foram derrotados e presos. Chavez – que assumiu toda a
responsabilidade pela rebelião – permaneceu por dois anos no
cárcere.
Em maio de 1993, Carlos Andrés Perez foi afastado por corrupção
e, posteriormente, preso. As eleições de dezembro de 1993 deram
a vitória ao ex-presidente Rafael Caldeira, do COPEI. Outra
grave crise financeira paralisou o crescimento, aumentou o
desemprego e a pobreza e voltou a causar grandes manifestações
populares, em 1996 e 1997.
A
eleição de Chávez e o “processo bolivariano”
Nas eleições de dezembro de 1998, quebrando o bipartidarismo e a
alternância conservadora entre o COPEI “social-cristão” e a AD
“socialdemocrata”, Chavez candidatou-se e venceu com 56% dos
votos válidos. O segundo colocado obteve 33% dos votos.
Comprometido com uma melhor distribuição de renda, a moralização
da administração pública e a reforma do Estado, Chávez convocou
em abril de 1999 um plebiscito para decidir sobre a eleição de
uma Assembleia Nacional Constituinte, o que foi aprovado por 92%
dos votantes. A Constituinte tomou posse em agosto de 1999.
Chavez colocou, então, o seu cargo à disposição da Constituinte,
que o confirmou no cargo. Posteriormente, a Constituinte aprovou
seu decreto executivo reorganizando os poderes de Estado.
Em dezembro de 1999, 71% dos votantes referendaram a nova
Constituição que instituiu uma Assembleia Nacional unicameral –
em substituição ao Senado e à Câmara de Deputados –, reformulou
o Judiciário, aumentou o mandato presidencial de 5 para 6 anos,
permitiu uma reeleição consecutiva, alterou o nome do país para
“República Bolivariana da Venezuela” e ampliou os
direitos dos povos indígenas, entre outras decisões.
Chávez – abrindo mão do mandato para o qual havia sido eleito –
convocou novas eleições para julho de 2000, inclusive para
presidência do país, sendo reeleito com 57% dos votos (contra
36% do segundo colocado) para o sextiênio 2001-2007.
De imediato colocou em prática um processo de nacionalização dos
setores estratégicos da economia – como a siderúrgica Sidor
(85% do aço produzido) e a Petróleos de Venezuela
(PDVSA). A nacionalização dessa última só foi concluída em 2007
e enfrentou uma forte resistência de seus diretivos e parte de
seus trabalhadores mais privilegiados.
Através de 49 “Leis Habilitantes” autorizadas pela Constituição
– espécie de Medida Provisória brasileira –, Chavez incidiu
sobre diversas áreas da economia. Três delas – a Lei de
Terras, a Lei de Hidrocarbonetos e a Lei de Pesca
– atingiram importantes interesses econômicos e levantaram
forte oposição. Em 10 de dezembro de 2001, a Fedecâmaras
patronal chamou a um protesto e paralisação de um dia, com
relativo êxito.
O
Golpe de abril de 2002 e o “lock out” patronal contra
Chávez
No início de 2002, Chavez alterou a direção da PDVSA, tentando
romper com seu caráter praticamente privado, enfrentando forte
oposição dos setores conservadores, que articularam uma nova
paralisação para 11 de abril.
Nesse dia, Chavez foi seqüestrado por um grupo de militares e
destituído da Presidência – com o apoio aberto dos partidos de
oposição e dos monopólios midiáticos –, sendo colocado em seu
lugar o empresário Pedro Carmona, o mais alto executivo da
FEDECAMARAS. Este de imediato declarou revogadas as 49 leis
habilitantes de Chávez, dissolveu a Assembleia Nacional e
suspendeu as atividades do Tribunal Supremo de Justiça, com a
promessa de eleições dentro de um ano. Imediatamente os EUA –
que tiveram ingerência direta no golpe – reconheceram Carmona
como o “legítimo” presidente da Venezuela. Espanha e Perú
fizeram o mesmo.
Menos de 72h depois, porém, o golpe cívico-militar-midiático foi
derrotado pela mobilização popular e pela ação de militares
fiéis à Chavez. Vitorioso, Chávez fez um chamamento à concórdia
e ao diálogo.
Diante da iminente entrada em vigor, no início de 2003, da “Lei
de Terras”, que aprofundava a Reforma Agrária, e da “Lei do
petróleo”, que reformava a estrutura praticamente privada da
PDVSA, a oposição – que ainda detinha o comando dessa empresa –
e a direitista Central de Trabalhadores da Venezuela convocaram
uma “greve geral” – apoiada por um lock out patronal –
que paralisou por 63 dias boa parte da economia do país,
inclusive a produção petrolífera, sabotando equipamentos vitais
e impedindo por certo tempo o transporte do petróleo.
Mas, o “golpe petroleiro” também fracassou e o governo colocou
novamente a economia e a PDVSA em funcionamento. Tudo isso, com
sérios prejuízos para o país, causando a fuga de 7 bilhões de
dólares e fazendo o PIB recuar 27% no 1º semestre de 2003
Para fazer frente a essa ofensiva das forças reacionárias, o
povo venezuelano precisou avançar em seu nível de organização.
Multiplicaram-se os Círculos Bolivarianos e os Comitês
de Terra. A direitista e corrupta Central dos
Trabalhadores da Venezuela (CTV) – que apoiou o golpe de
abril de 2002 – passou a enfrentar-se com a União Nacional
dos Trabalhadores (UNT), criada em abril de 2003.
Derrotada nas urnas, a oposição opta pelo confronto
Em 2004, a oposição – acreditando que os problemas econômicos em
que mergulhou o país, em decorrência da “paralisação
petroleira”, causariam a derrota de Chávez – exigiu a realização
de um Referendo Revogatório (prerrogativa constitucional
colocada na Constituição por iniciativa do próprio Chávez) para
decidir sobre a permanência ou não de Chávez na presidência da
Venezuela. O Referendo ocorreu em agosto de 2014 e, para
surpresa dos golpistas, Chávez venceu com 59% dos votos.
Alguns meses depois, nas eleições regionais e municipais de
outubro de 2004, os chavistas conquistaram outra grande vitória,
elegendo 20 dos 23 governos estaduais e 270 das 337
administrações municipais, inclusive a estratégica prefeitura da
região metropolitana de Caracas.
Revelando o desespero da oposição, o ex-presidente
socialdemocrata Carlos Andrés Pérez afirmou: “só resta a
violência para derrubar Chávez. Ele deve morrer como um
cachorro”.
Pouco depois, o Promotor Danilo Anderson, responsável pelas
investigações sobre o golpe de abril de 2002, foi morto por um
atentado a bomba, no Centro de Caracas...
Nas eleições para a Assembleia Nacional, realizadas em 4 de
dezembro de 2005, a oposição – sem perspectiva de vitória e na
esperança de criar um fato político de repercussão internacional
– optou pelo boicote. O resultado foi uma vitória esmagadora de
Chávez, que ficou com as mãos livres para aprofundar as
mudanças.
Governando para os humildes
No âmbito social, o governo desenvolveu a alfabetização massiva,
a atenção médica gratuita, os mercados populares, a educação
secundária e a educação universitária, beneficiando 75% da
população venezuelana. A Lei de Terras, promulgada em
dezembro de 2001, mas bloqueada pela violência do latifúndio –
que assassinou mais de 100 lideranças camponesas – começou a ser
aplicada, sendo distribuídos 2,5 milhões de hectares.
O
governo criou as chamadas “Missões Sociais”, a começar pela
Bairro Adentro, que garantia em cada região popular da
capital e do interior um médico e um ambulatório. Diante das
dificuldades em conseguir médicos venezuelanos para participar
desse programa, Chávez estabeleceu um convênio com Cuba, que
forneceu cerca de 20 mil médicos para o Programa.
A
Missão Mercal proporcionou a venda de cestas básicas a
preços inferiores aos do mercado, que em alguns casos chegava a
50%. A Missão Robinson eliminou o analfabetismo no país
já em 2005. E as Missões Escolas Bolivarianas, Ribas,
Sucre e Universidade Bolivariana criaram programas
educacionais – inclusive universitários – para os mais pobres
No âmbito da mídia, foram incentivados meios alternativos de
comunicação, tendo surgido quase 200 rádios e TV comunitárias e
a rede estatal VTV tornou-se a segunda mais vista no país (antes
era a última). Da mesma forma, foi criada a TELESUR com
abrangência continental.
A
reeleição consagradora de Chávez
Nas eleições de dezembro de 2006, Hugo Chávez foi reeleito para
o sextiênio 2007-2013, com 63% dos votos válidos, contra 37% do
candidato direitista. A oposição – que, sem perspectivas de
vitória, havia boicotado as eleições de 2005 para a Assembleia
Nacional – passou a apostar no confronto e na desestabilização
do governo.
Vitorioso, Chávez anunciou, em 28 de dezembro de 2006, que a
Rádio Caracas de Televisão (RCTV) – que tivera um papel
fundamental no golpe de Estado de abril de 2002 –, cuja
concessão findava em março de 2007, não a teria renovada. As
outras três redes privadas de televisão – Venevision,
Globovision e Televen –, igualmente oposicionistas, continuaram
funcionando normalmente.
Derrotado em 2007, Chávez dá a volta por cima em 2008, 2009 e
2012
Em dezembro de 2007, Chávez chamou um referendo para a reforma
da Constituição, mas foi derrotado por erros sectários cometidos
por ele, que se refletiram em uma grande abstenção, faltando-lhe
1,4% dos votos para aprovar as mudanças. Democraticamente,
Chávez respeitou a vontade popular.
Mas, nas eleições regionais e municipais de 2008, os chavistas
venceram, conquistando 18 dos 23 Estados, com uma votação que
superou em 1,2 milhões de votos o resultado no referendo de
2007.
E, em 2009, em um novo referendo autorizando a reeleição
ilimitada para a Presidência da República, venceu com 54% dos
votos.
Em junho de 2011, em pronunciamento pela TV, Chávez anunciou que
sofria de câncer.
Ainda em 2012, nacionalizou 11 plataformas petrolíferas
norte-americanas e estatizou diversas fábricas do México, França
e Suíça.
Nas eleições de outubro de 2012, Chávez foi reeleito para o
sextiênio 2013--2019, com 54% dos votos, contra 44% de seu
opositor Henrique Capriles. Tendo em vista a grave enfermidade
de Chávez, assumiu interinamente o seu Vice-Presidente
executivo, Nicolás Maduro Moros, em dezembro de 2012.
Com a morte de Chávez, Maduro torna-se o Presidente
Com a morte de Chávez em 5 de março de 2013, Maduro tornou-se o
Presidente da Venezuela. Cumprindo o disposto na Constituição,
convocou imediatamente novas eleições presidenciais. Nessas,
realizadas em 14 de abril de 2013, Nicolas Maduro concorreu
contra cinco candidatos de oposição e venceu o pleito com 50,62%
dos votos válidos.
Essas eleições foram acompanhadas por 170 organizações
internacionais – dentre as quais o Carter Center – que
atestaram a regularidade do pleito. Maduro assumiu, então, a
Presidência do país para o sextiênio 2013-2019, fazendo um
chamamento à oposição para o diálogo.
A
resposta da oposição e dos Estados Unidos – percebendo que
Maduro não tinha o mesmo carisma e liderança de Chávez – foi não
reconhecer as eleições, negar-se a qualquer diálogo e optar pelo
confronto. Passaram, então, a exigir, sem qualquer base legal, o
afastamento de Nicolás Maduro. Conclamaram ações de sabotagem,
ataques a prédios públicos e atos de vandalismo de “marimberos”,
causando mais de 120 mortos e 1000 feridos, sempre debitados
pela mídia nacional e internacional ao “ditador Maduro”.
Apesar disso, uma pesquisa realizada um anos após o início do
governo Maduro revelou que 61% dos venezuelanos aprovavam a sua
gestão e 70% aprovavam as suas medidas econômicas. Nicolás
Maduro continuou buscando insistentemente uma negociação com a
oposição, tendo feito 338 chamados ao diálogo e à paz, desde
2013, propondo um acordo mínimo de convivência democrática. Mas
tudo foi em vão.
Nas eleições para a Assembleia Nacional, em dezembro de 2015 –
por conta da ação desestabilizadora da oposição e das
dificuldades econômicas decorrentes da forte queda dos preços do
petróleo –, a oposição venceu, com 56% dos votos. O que foi
acatado pelo governo bolivariano.
A
Assembleia Nacional parte para o golpismo aberto
A
partir de então, o centro da conspiração golpista transladou-se
para a Assembleia Nacional, que passou a trabalhar pela
destituição imediata de Maduro, sem esperar as eleições de 2019.
A primeira tentativa foi convocar em 2016 um “referendo
revogatório” – como o que haviam feito contra Chávez em 2004. A
demora em obter o número necessário de assinaturas e sua
posterior conferição, as denúncias de fraudes, inviabilizaram a
sua realização em 2016, com o que a oposição abandonou esse
caminho, pois mesmo que fossem vitoriosos, quem assumiria seria
o vice-presidente.
Em janeiro de 2017, a Assembleia Nacional – alegando as
disposições do artigo 233 da Constituição – declarou o “abandono
do cargo” por parte de Maduro e exigiu novas eleições, ao mesmo
tempo que a oposição retomava as ações violentas e os atos de
vandalismo nas ruas.
O
problema é que o artigo 233 da Constituição Venezuelana
qualifica como “ausência absoluta” do Chefe de Estado unicamente
os casos de morte, renúncia, destituição pelo Tribunal Supremo
de Justiça e abandono do cargo. Como nada disso havia ocorrido,
o TSJ declarou nula essa decisão da Assembleia Nacional.
E, como a Assembleia Nacional dera posse, em janeiro de 2016, a
três deputados do Estado do Amazonas – impugnados pela Justiça
Eleitoral por fraude eleitoral, envolvendo a compra de votos –,
desobedecendo assim a decisão judicial de aguardar a conclusão
das investigações, além ter desrespeitado diversas outras
decisões judiciais, o TSJ declarou a Assembleia Nacional em
“desacato” e suspendeu as suas funções, em 29 de março de 2017.
Maduro apelou, então, para que o TSJ revisse essa decisão, com o
objetivo de assegurar a estabilidade constitucional, o que
acabou sendo acatado pelo TSJ já na primeira semana de abril.
A
vitória chavista na Constituinte e nas eleições regionais e
municipais
Diante da postura golpista da oposição, entrincheirada na
Assembleia Nacional, Maduro convocou – conforme lhe facultava a
Constituição – a eleição de uma Assembleia Nacional
Constituinte, obviamente hierarquicamente superior à Assembleia
Nacional. Essas eleições ocorreram em 30 de julho de 2017. A
oposição, dividida entre boicotar ou participar da Constituinte,
foi fragorosamente derrotada. Com isso, o golpismo parlamentar
foi bloqueado e a Constituinte eleita – com maioria chavista –
passou a ser o verdadeiro parlamento venezuelano.
Em outubro de 2017, nas eleições regionais, a maré vasante do
golpismo oposicionista ficou clara e as forças chavistas
venceram 18 dos 23 governos estaduais, contra apenas 5 Estados
vencidos pela oposição. Já nas eleições municipais de 10 de
dezembro de 2017, as forças bolivarianas venceram em 300
municípios e a oposição em apenas 35, sendo que em pelo menos
metade deles o chavismo fez mais de 70% dos votos.
Nas capitais, o chavismo venceu em 22, contra apenas 1 vitória
da oposição. Ao todo, a oposição perdeu 2,1 milhões de votos
nessa eleição. Com isso, as forças bolivarianas reverteram a
derrota que haviam sofrido em 2015, nas eleições para a
Assembleia Nacional.
Como o governador eleito pela oposição no Estado de Zulia se
negou a prestar juramento diante da Assembleia Nacional
Constituinte (os outros 4 o fizeram), foi destituído pelo
Conselho Legislativo local. Convocadas novas eleições para o
Estado de Zulia, saíram vitoriosas às forças bolivarianas, que
passaram a deter 19 dos 23 governos estaduais.
Os EUA impediram que os diálogos de Santo Domingo tivessem êxito
No início de 2018, Maduro fez um novo chamamento ao diálogo.
Estabeleceu-se, então, a Conferência Nacional pela Paz –
os chamados “Diálogos de Santo Domingo” – com a mediação do
ex-presidente Espanhol José Luis Rodriguez Zapatero. Maduro
aceitou o pedido das oposições para que as eleições
presidenciais– previstas para dezembro de 2018 – fossem
antecipadas para maio de 2018 e que a fiscalização do pleito
fosse organizada pela Secretaria Geral da ONU.
Quando estava tudo pronto para a assinatura do acordo, os
Estados Unidos interferiram para que tal não ocorresse e o
acordo não foi firmado, gerando forte denúncia de Zapatero.
Ficou claro que os EUA e a oposição abandonavam o caminho
democrático e optavam pelo caminho do golpe e da ameaça de
intervenção militar.
As eleições presidenciais de 2018 e a vitória de Maduro
Apesar disso, o Governo Bolivariano manteve a antecipação das
eleições e as realizou no dia 20 de maio de 2018. Acompanharam o
pleito mais de 150 observadores internacionais – entre eles 14
comissões eleitorais de oito países, duas missões técnicas
eleitorais, o próprio Zapatero, o ex-presidente dos EUA Jimmy
Carter e jornalistas de todo o mundo. Todos atestaram a correção
do pleito.
Participaram dessas eleições 16 dos 19 partidos venezuelanos e
inscreveram-se seis candidatos, sendo que no decorrer do
processo dois desistiram. Nicolás Maduro obteve 68% dos votos
válidos e os opositores tiveram 21%, 11% e 0,4% do total dos
votos.
É
importante dizer que as eleições presidenciais de 2018 ocorreram
no mesmo sistema eleitoral de 2015, quando a oposição venceu e
não contestou o processo eleitoral. Nele, o eleitor se
identifica através de suas impressões digitais e após votar em
uma urna digital recebe o seu voto impresso e o depositado em
uma urna física, para posterior verificação.
Após o pleito foram feitas 18 auditorias, com a participação dos
representantes de todos os candidatos, sendo que nenhum deles
contestou o resultado das eleições. Portanto, não tem qualquer
fundamento a contestação da legitimidade da eleição de Nicolás
Maduro. O mais irônico é que o presidente dos EUA – que contesta
a legitimidade da eleição de Maduro – obteve menos votos que sua
opositora Hillary Clinton e foi eleito por apenas 27% dos
eleitores estadunidenses!
Quanto aos que contestam o caráter democrático do processo
bolivariano, basta dizer que desde 1998 (primeiro governo
Chávez) foram realizados 25 processos eleitorais, referendos ou
plebiscitos, todos eles escrupulosamente respeitados pelo
governo, mesmo quando derrotado. Pergunto: em que outro país do
mundo o povo foi chamado a votar tantas vezes ao longo desses 20
anos? A resposta é: em nenhum.
Da mesma forma – ao contrário do que propalam os detratores do
processo bolivariano – prevalece total liberdade midiática,
existindo jornais, revistas, rádios e diversas TVs de oposição,
que bombardeiam diariamente o governo com ataques, calúnias e “fake
news” (notícias distorcidas ou falsas). Ressalte-se que 80%
da mídia é privada e que os três jornais de caráter nacional
existentes são da oposição e têm mais de 90% dos leitores. E dos
quatro canais nacionais de TV, três – Globovision, Venevision e
Televen – são de oposição, ocupando 90% da audiência.
Para se ter uma idéia da parcialidade dessa mídia oposicionista,
basta citar o relatório do insuspeito Carter Center que,
avaliando a mídia venezuelana durante a campanha presidencial de
2013, diz que a Globovision cobriu nove vezes mais o candidato
da oposição Henrique Capriles do que à cobertura dada a Nicolás
Maduro.
A
escalada dos EUA, OTAN e seus satélites contra a Venezuela
Desde então, os EUA e os seus aliado da OTAN, OEA e Pacto de
Lima (articulação dos governos direitistas da América do Sul) –
desrespeitando a ONU e as mais elementares normas do Direito
Internacional – desencadearam uma escalada diplomática,
econômica, midiática e militar contra o povo venezuelano,
interferindo nos seus assuntos internos, instigando a guerra
civil e ameaçando com a intervenção militar, em um retorno
descarado à “diplomacia das canhoneiras”, quando as potências
coloniais do passado atacavam e invadiam as nações mais fracas
para saqueá-las.
Deflagraram uma cruel “guerra econômica”, derrubaram o preço
internacional do petróleo, expropriaram ilegalmente bilhões de
dólares de suas reservas internacionais, retiveram os pagamentos
de suas vendas de petróleo, bloquearam as suas operações
financeiras e o fornecimento de produtos essenciais que a
população necessita – inclusive medicamentos e alimentos –,
impondo à Venezuela uma séria crise.
O
advogado norte-americano Alfred Zayas “Relator Especial da
ONU para a Promoção de uma Ordem Internacional Democrática”,
depois de uma viagem de 10 dias à Venezuela, escreveu, em agosto
de 2018, um relatório afirmando que não há crise humanitária na
Venezuela e sim uma “guerra econômica asfixiante,”
conduzida pela oposição: “alimentos e medicamentos não são
distribuídos para supermercados e farmácias, mas armazenados e
depois liberados no mercado negro”. Segundo ele, esse quadro
é agravado pelas sanções econômicas dos EUA, Canadá e União
Europeia, que visam “causar o caos na Venezuela, à espera de
que o governo caia”. Para ele, “o nível de maquiavelismo
é de tirar o fôlego” e conclui equiparando as sanções à
Venezuela a crimes contra a humanidade.
Segundo as autoridades venezuelanas, essa guerra econômica já
causou prejuízos de mais de 30 bilhões de dólares ao país. A
situação só não é mais grave porque o
governo distribui mensalmente – através dos Comitês Locais de
Abastecimento e Produção (CLAP) – milhões de toneladas de
alimentos, a mais de 6 milhões de famílias.
Em uma ingerência descarada na Venezuela, os EUA – com o apoio
da oposição – têm conclamado abertamente os militares
venezuelanos a um golpe de estado e apóiam atos terroristas,
como o recente atentado contra a vida do Presidente Maduro
através de drones carregados com explosivos, em uma
solenidade militar. Felizmente esse magnicídio foi frustrado.
A
farsa da “ajuda humanitária” foi derrotada
Não tendo conseguido derrubar Maduro através dessa bárbara
guerra econômica, os EUA buscaram criar um pretexto para uma
intervenção militar “humanitária” na Venezuela. Para isso,
convenceram o presidente da Assembleia Nacional – o desconhecido
Juan Guaidó – a autoproclamar-se “presidente interino” da
Venezuela. Ato contínuo os EUA, a OTAN, o Pacto de Lima
(articulação de governos de direita) e países satélites o
reconheceram como o “legítimo presidente da Venezuela”.
Em seguida – sob o pretexto da existência de uma “crise
humanitária” na Venezuela – o impostor (em combinação com os
EUA) apelou por uma “ajuda humanitária”, que deveria ingressar
através das fronteiras com a Colômbia e o Brasil (e por mar),
com a “proteção” de tropas estadunidenses e de seus satélites
sul-americanos. Isso, sem autorização do governo venezuelano e
sem a participação de entidades internacionais, como a ONU e a
Cruz Vermelha.
Inicialmente – através do capitão que desgoverna o país –, o
Brasil somou-se a essa provocação contra a Venezuela, mas,
depois, devido uma posição mais prudente da cúpula militar, não
cedeu o seu território para a entrada de tropas estadunidenses,
que escoltariam a dita “ajuda”. Limitou-se a estocar em duas
cidades de Roraima – Paracaima e Boa Vista – alguns mantimentos,
a serem retirados por caminhões venezuelanos, a mando de Juan
Guaidó. Estes, lá se encontram até hoje, sem que ninguém tenha
vindo buscá-los.
Para atrair o deslocamento de parcelas da população venezuelana
até a fronteira para receber essa “ajuda”, foi organizado um
show milionário – bancado com recursos estadunidenses – na
cidade de Cúcuta, na fronteira da Colômbia com a Venezuela.
Sem atemorizar-se, o governo Maduro denunciou a tentativa de
invasão sob o disfarce de “ajuda humanitária”, fechou as
fronteiras da Venezuela com a Colômbia e com o Brasil, assim
como por mar, mobilizou as suas FFAA e convocou o povo
venezuelano às ruas.
Na data aprazada, 23 de fevereiro, assistiu-se a um espetáculo
vergonhoso: os presidentes da Colômbia, Chile, OEA e outros
próceres do desmoralizado “Grupo de Lima”, na Ponte Simón
Bolivar, acompanhando o auto-proclamado “presidente interino da
Venezuela”, esperando a hora de sua “entrada triunfal” em
território venezuelano. O que evidentemente não aconteceu. Tudo
resumiu-se a atos de vandalismo de conhecidos “marimberos”, que
inclusive atearam fogo aos dois caminhões da pretensa “ajuda
humanitária”. Os protagonistas maiores dessa “ópera bufa” se
viram obrigados, então, a retirar-se desmoralizados, “com o rabo
entre as pernas”.
Enquanto o ato-show do lado colombiano foi um fracasso, do lado
venezuelano uma multidão incalculável manifestou o seu apoio a
Maduro e somou-se aos militares no bloqueio da fronteira. Em
Caracas e em outras cidades, multidões saíram às ruas em
protesto contra essa agressão.
Maduro desmascarou ainda mais essa pretensa “ajuda humanitária”
ao desafiar os EUA e seus satélites a venderem à Venezuela os
alimentos e remédios que estavam se negando a fornecer. Já a
Rússia, China e Cuba enviaram grande quantidade de medicamentos
e alimentos, em uma verdadeira ação solidária contra o
desabastecimento provocado pelos EUA e pela oposição.
Dois dias depois, na reunião de Bogotá do famigerado Grupo de
Lima, apesar de Mike Pence reiterar que “todas as opções
estão na mesa” – em uma clara ameaça de agressão militar à
Venezuela–, a porta-voz da União Européia, o Gal. Mourão
(vice-Presidente brasileiro) e a maioria dos participantes
descartaram qualquer ação militar contra a Venezuela. Em um
final melancólico para os EUA, a declaração do Grupo de Lima
afirmou: “a transição à democracia deve ser conduzida
pelos próprios venezuelanos pacificamente e no marco da
Constituição (...) sem uso de força.” A montanha parira um
rato!
Derrotados na sua farsa, os EUA e a oposição ainda tentaram
criar um fato político com o retorno do “presidente títere” à
Venezuela, certos de que ele seria preso, o que geraria uma
“comoção mundial” contra Maduro. Com inteligência, o governo
ignorou solenemente a volta do “pau-mandado” de Trump, e o seu
retorno passou despercebido em todo o planeta.
A
guerra cibernética contra a Venezuela e os “apagões”
Os EUA decidiram, então, iniciar uma criminosa guerra
cibernética contra a Venezuela, sabotando todo o seu sistema
elétrico, causando enormes prejuízos ao país, afetando o
abastecimento de água, o atendimento em hospitais, escolas,
fábricas, transportes, etc.
Com isso, pretendem criar o caos na Venezuela e fortalecer a
oposição – que hipocritamente culpa o governo por essa situação
–, justificando a derrubada de Maduro.
A
situação é complexa e técnicos da Rússia e China já se encontram
na Venezuela, ajudando a restabelecer o funcionamento das
centrais elétricas venezuelanas e aprendendo as tecnologias
estadunidenses de guerra cibernética. O que certamente lhes será
muito útil no futuro.
Essa pérfida agressão, ao mesmo tempo em que causa graves
problemas ao povo venezuelano, a total falta de escrúpulos dos
EUA e da oposição e pode transformar-se em um importante
elemento de esclarecimento da população.
Só os ingênuos acreditam que há alguma preocupação humanitária
ou com a democracia nessas agressões dos EUA e de seus aliados à
Venezuela. O seu interesse central é controlar as maiores
reservas petrolíferas do planeta, que se encontram na Venezuela.
Aliás, o próprio John Bolton – assessor de Segurança Nacional da
Casa Branca – confessou isso, ao declarar em janeiro
deste ano que “fará uma grande diferença para os Estados
Unidos, economicamente, se pudéssemos ter companhias
petrolíferas americanas realmente investindo e produzindo as
capacidades petrolíferas na Venezuela.”
A
esse interesse econômico soma-se a preocupação em retomar o
controle geopolítico da Venezuela, país chave para o controle
das Antilhas e do Canal do Panamá, assim como do futuro Canal da
Nicarágua, que está sendo construído pelos chineses. Essa
preocupação geopolítica em relação à Venezuela se acentuou
principalmente depois que Chávez e Maduro estreitaram os laços
econômicos e militares com a China e com a Rússia. Não por
acaso, essas duas potências mundiais declararam o seu apoio à
Venezuela e advertiram os EUA de que não aceitarão qualquer
intervenção militar nesse país.
Deixando claro que a agressão à Venezuela faz parte de um plano
maior, o mesmo Bolton – em discurso, neste ano, em Miami –
deixou claro que a queda de Nicolás Maduro na Venezuela é apenas
o primeiro objetivo dos EUA, ao qual se seguirão Cuba e
Nicarágua, que ele denomina “a Troika da tirania”.
Tudo isso nos mostra a gravidade da situação, que inclusive pode
evoluir para um conflito mundial de grandes proporções, nas
fronteiras do Brasil.
Por essa razão, a luta PELA PAZ, CONTRA A GUERRA E PELA
AUTODETERMINAÇÃO DO POVO VENEZUELANO é tão importante e
interessa a todos os povos de mundo.
A
solidariedade internacional é uma via de duas mãos e joga um
papel decisivo!
A
Venezuela resistirá!
Abril de 2019
RAUL CARRION