1
- INTRODUÇÃO
Há quatro décadas, o “projeto econômico reformador” do Partido
Comunista vem garantindo à China as mais elevadas taxas de
desenvolvimento do mundo, retirando – só nos últimos 20 anos,
segundo dados da própria ONU – mais de 890 milhões de chineses
da pobreza.
Por isso, o estudo da exitosa experiência de construção
econômica de uma nação como a China – de dimensões continentais,
com uma população de mais de um bilhão de habitantes, que a cada
ano está conseguindo libertar da pobreza dezenas de milhões de
pessoas – é algo que interessa não só os que almejam o fim da
sociedade de classes e a eliminação da exploração do homem pelo
homem, mas também aqueles que buscam caminhos para romper com a
subordinação neoliberal dos nossos países.
Com este estudo, quero contribuir nesse debate, examinando desde
uma perspectiva militante e marxista-leninista a experiência
chinesa, confrontando-a com as demais experiências de construção
do socialismo e com as concepções dos clássicos do marxismo (e
do próprio Mao Zedong) sobre a transição do capitalismo ao
socialismo.
No mesmo diapasão, buscaremos entender como a China se insere na
globalização neoliberal de forma soberana, sem subordinar-se aos
interesses do capital financeiro internacional, algo vital para
países como o Brasil, que precisa construir um projeto
nacional-desenvolvimentista, fora da lógica neoliberal.
O centro deste trabalho são as mudanças ocorridas na China
Pós-Revolução Cultural – em especial nos 25 anos que se
seguiram à 3ª Sessão Plenária do 11º Comitê Central, em dezembro
de 1978, quando tiveram início as Reformas e a
Abertura propugnadas por Deng Xiaoping – configurando o que
os dirigentes do Partido Comunista da China denominam de “socialismo
com peculiaridades chinesas”.
Entretanto, para tornar inteligível o tema, examinaremos, ainda
que de maneira rápida, o processo revolucionário que levou o
Partido Comunista da China ao Poder, as primeiras transformações
econômicas na China revolucionária, o Grande Salto à Frente
e os dez anos da Revolução Cultural, única forma de
podermos compreender o que foi “reformado”.
A
seguir, examinaremos os dois anos da transição, sob o comando de
Hua Guofeng – que se inicia com o afastamento do “bando dos
quatro” (em 1976) e conclui com a 3ª Sessão Plenária do Comitê
Central (em 1978) – que marca a passagem do período da
Revolução Cultural para o período das Reformas.
Nessa análise de décadas de Reforma e Abertura,
centraremos o nosso estudo principalmente nos aspectos
econômicos, ainda que atentos às questões políticas, culturais,
diplomáticas e outras que tenham relevância.
Examinaremos as profundas mudanças na agricultura, na indústria,
no comércio e demais serviços; a inovadora Abertura para
o exterior; a reforma das estatais; a modernização cultural,
científica e tecnológica; a colocação do desenvolvimento das
forças produtivas como o elo principal das transformações
socialistas; a concepção do “socialismo com peculiaridades
chinesas”, que em sua etapa primária assume a característica de
uma “economia de mercado planificada”; a luta contra as
tendências liberais burguesas, cujo ápice foram os incidentes da
praça Tian’anmen; e o retorno de Taiwan e Macao para a China,
através da “política de um país, dois sistemas”. Ao
final, faremos um pequeno balanço sobre os resultados desses
anos de Reforma e Abertura, cujo saldo é
extremamente positivo.
Nas conclusões, examinamos três aspectos: primeiro, tentaremos
uma sistematização da teoria chinesa de transição ao socialismo,
procurando compará-la com a visão dos clássicos e tentando
responder se há ou não uma ruptura com ela; em segundo lugar,
examinaremos se a experiência chinesa tem um caráter universal
ou meramente particular; isto é, se é aplicável em outros países
que buscam levar adiante as transformações socialistas e
antineoliberais ou não; por fim, para onde vai a China: rumo à
restauração do capitalismo – como afirmam teóricos do
neoliberalismo e, mesmo, de esquerda – ou rumo à construção de
uma experiência inovadora de socialismo?
A
bibliografia examinada foi bastante ampla e plural Foram
privilegiadas algumas obras, em especial aquelas que têm caráter
de fonte primária – como os escritos de Mao Zedong, Deng
Xiaoping e Jiang Zemin –, além da Breve história do Partido
Comunista da China (1991) que dá a versão oficial da
liderança chinesa sobre os 70 anos do PCCh e mais de 40 anos da
Revolução Chinesa).
Na medida do possível, todos os nomes chineses foram adaptados
para a nova grafia chinesa e os números romanos transformados em
arábicos. As citações, sempre que necessário, foram traduzidas
por mim.
Originalmente, este estudo foi elaborado em 2004, constituindo o
meu trabalho de conclusão do curso de Especialização em
História Afro-Asiática das Faculdades Porto-Alegrenses
(FAPA), tendo como orientadora a Professora Analúcia Danilevicz.
Por entender que as questões chaves das Reformas na China
ocorreram no período abordado pelo trabalho original
(1978-2003), mantive no essencial o texto, mas por questões de
espaço eliminei o capítulo sobre a Legislação Trabalhista da
China – desatualizado por conta dos inúmeros avanços ocorridos
desde então – e a bibliografia geral, restringindo-me à
bibliografia citada. Também fiz pequenas correções no texto e
nas citações, incorporando algumas ao corpo do trabalho. Ao
final, agreguei um capítulo atualizando de forma breve os
avanços ocorridos nos últimos anos.
2
- SISTEMA DE REFERÊNCIAS TEÓRICAS
A
base teórica do nosso estudo é o marxismo-leninismo,
consubstanciado em uma concepção materialista e dialética da
história e da sociedade. Em particular, utilizaremos os
conceitos teóricos referentes à transição entre a sociedade
capitalista e a sociedade comunista, da qual o socialismo é a
primeira fase.
Em sua Crítica ao programa de Gotha, escrito em 1875 e
publicado pela primeira vez em 1891, por iniciativa de Engels, –
um dos poucos trabalhos em que Karl Marx teoriza sobre a futura
sociedade comunista – ele nos alerta contra as visões simplistas
que imaginam a nova sociedade surgindo como algo integralmente
novo, de forma imediata, das cinzas do capitalismo: “Entre a
sociedade capitalista e a sociedade comunista medeia o período
da transformação revolucionária da primeira na segunda.”[1]
Já em 1847, em seus Princípios do comunismo, Engels
afirmara:
Assim como não se
pode aumentar de repente as forças produtivas, assim também não
se pode estabelecer o comunismo de um dia para outro. A
revolução proletária só poderá, por conseguinte, transformar
pouco a pouco a sociedade atual e só poderá suprimir
completamente a propriedade privada quando tiver criado a
quantidade necessária de meios de produção.[2]
A
teoria marxista, ao mesmo tempo em que indica a necessidade de
todo um período de transição entre o capitalismo e o comunismo,
critica as concepções idealistas que imaginavam ser possível a
eliminação, desde o início, da “lei do valor” e da produção de
mercadorias:
Do que se trata
aqui não é de uma sociedade comunista que se desenvolveu sobre
sua própria base, mas de uma que acaba de sair precisamente da
sociedade capitalista e que, portanto, apresenta ainda, em todos
os seus aspectos, no econômico, no moral e no intelectual, o
selo da velha sociedade de cujas entranhas procede.[3]
Comentando essa passagem, Lenin nos diz: “Esta sociedade
comunista, que acaba de sair das entranhas do capitalismo e que
leva em todos os seus aspectos a marca da sociedade antiga, é o
que Marx chama de ‘primeira’ fase ou fase inferior da sociedade
comunista.”[4]
Após criticar o igualitarismo do direito burguês, que propõe
tratar de forma igual os desiguais, Marx afirma:
Para evitar todos
estes inconvenientes, o direito não teria que ser igual, mas
desigual. Estes defeitos, porém, são inevitáveis na primeira
fase da sociedade comunista, tal como brota da sociedade
capitalista, depois de um longo e doloroso parto. (...) Na fase
superior da sociedade comunista, quando houver desaparecido a
subordinação escravizadora dos indivíduos à divisão do trabalho
e, com ela, o contraste entre o trabalho intelectual e o
trabalho manual; quando o trabalho não for somente um meio de
vida, mas a primeira necessidade vital; quando com o
desenvolvimento dos indivíduos em todos os seus aspectos
crescerem também as forças produtivas e jorrarem em caudais os
mananciais da riqueza coletiva, só então será possível
ultrapassar-se totalmente o estreito horizonte do direito
burguês e a sociedade poderá inscrever em suas bandeiras: De
cada qual, segundo sua capacidade; a cada qual, segundo suas
necessidades.[5]
A
essa altura, é importante destacar alguns conceitos, entre os
quais o de “primeira fase da sociedade comunista” (o socialismo)
e de “fase superior da sociedade comunista” (o comunismo
propriamente dito). Da mesma forma, a importância que a teoria
marxista concede ao desenvolvimento das forças produtivas como
condição para a passagem à etapa superior do comunismo, quando
cada um aportará à produção e à riqueza social na medida da sua
capacidade e receberá segundo a sua necessidade. Questão que
Marx reforça, em uma conhecida passagem do Manifesto do
Partido Comunista de 1848:
a primeira fase da revolução operária é o advento do
proletariado como classe dominante, a conquista da democracia. O
proletariado utilizará sua supremacia política para arrancar
pouco a pouco todo capital à burguesia, para centralizar todos
os instrumentos de produção nas mãos do Estado, isto é, do
proletariado organizado em classe dominante, e para aumentar o
mais rapidamente possível o total das forças produtivas.[6]
Caberá a Lenin, retomar e desenvolver essas resumidas indicações
de Karl Marx: “historicamente tem que haver, sem
dúvida alguma, uma fase especial ou uma etapa especial de
transição do capitalismo ao socialismo”[7],
ainda mais nos países atrasados, onde “a
revolução de todos os camponeses ainda é uma revolução burguesa
e que sem uma série de transições, de etapas transitórias, não
se pode fazer dela uma revolução socialista em um país atrasado.”[8]
E prossegue:
Assim, pois, na
primeira fase da sociedade comunista (à qual se costuma dar o
nome de socialismo), o “direito burguês” não é suprimido por
completo, mas só em parte, só na medida da transformação
econômica já alcançada, ou seja, só em relação aos meios de
produção. O “direito burguês” reconhece a propriedade privada
dos indivíduos sobre os meios de produção. O socialismo os
converte em propriedade comum. Nesse sentido – e só nesse
sentido – desaparece o “direito burguês”. Entretanto, esse
direito persiste em outro de seus aspectos: como regulador da
distribuição dos produtos e da distribuição do trabalho entre os
membros da sociedade.[9]
Fica clara a compreensão de Lenin, na esteira de Marx, de que só
quando a sociedade puder passar da distribuição da riqueza
social “segundo a capacidade de cada um” (socialismo)
para a distribuição “conforme a necessidade de cada um”
(comunismo) é que se poderá falar da extinção do “direito
burguês” e alcançar a verdadeira igualdade social (que não se
confunde com “igualitarismo”). Mas, para isso, é preciso um
grande desenvolvimento das forças produtivas, que supere as
diferenças entre o trabalho intelectual e o trabalho manual,
entre o campo e a cidade, e crie a abundância de bens:
a expropriação
dos capitalistas originará inevitavelmente um desenvolvimento
gigantesco das forças produtivas da sociedade humana. O que não
sabemos, nem podemos saber, é a rapidez com que avançará esse
desenvolvimento, a rapidez com que conseguirá romper com a
divisão do trabalho, suprimir o contraste entre o trabalho
intelectual e o manual, converter o trabalho “na primeira
necessidade vital”. (...) a diferença científica entre o
socialismo e o comunismo é clara. Ao que se costuma denominar
socialismo, Marx chamava de “primeira” fase ou fase inferior da
sociedade comunista. (...) Em sua primeira fase, em seu primeiro
grau, o comunismo não pode apresentar ainda uma maturidade
econômica completa, não pode aparecer ainda completamente livre
das tradições ou das marcas do capitalismo. (...) Na realidade,
a vida nos mostra a cada passo os vestígios do velho no novo,
tanto na natureza como na sociedade. (...) Através de que
etapas, por meio de que medidas práticas chegará a humanidade a
este supremo objetivo é algo que não sabemos nem podemos saber.[10]
Em 1921 – quando o Estado Soviético substitui o comunismo de
guerra pela Nova Política Econômica (NEP), abrindo
espaço para um relativo desenvolvimento da economia camponesa,
do capitalismo privado e do capitalismo de Estado, inclusive com
concessões a capitais estrangeiros –, Lenin responde aos que o
acusavam de retrocesso:
a expressão
“República Socialista Soviética” significa a decisão do Poder
dos Sovietes de levar a cabo a transição ao socialismo, mas de
modo algum o reconhecimento do novo regime econômico como
socialista. (...) o que significa a palavra transição? Não
significará, aplicada à economia, que no atual regime existem
elementos, partículas, pedacinhos tanto de capitalismo como de
socialismo? (...) Enumeremos esses elementos: 1) economia
camponesa patriarcal (...); 2) pequena produção mercantil (...);
3) capitalismo privado; 4) capitalismo de Estado; 5) socialismo.[11]
É
importante perceber a introdução por Lenin de uma nova categoria
teórica: não mais a transição do capitalismo ao comunismo (cuja
primeira etapa é o socialismo)[12],
mas, agora, a transição do capitalismo (ou do pré-capitalismo)
ao socialismo. Aqui, Lenin desenvolve de forma criadora a teoria
marxista da transição ao identificar a importância e o papel do
capitalismo de Estado (agora sob a direção do proletariado) e da
avançada técnica capitalista, com base na ciência moderna, na
passagem do capitalismo ao socialismo:
Não é o
capitalismo de Estado o que luta contra o socialismo, e sim a
pequena burguesia e o capitalismo privado que lutam juntos, de
comum acordo, contra o capitalismo de Estado e contra o
socialismo. (...) O capitalismo de Estado é incomparavelmente
superior desde o ponto de vista econômico à nossa economia
atual. (...) O socialismo é inconcebível sem a grande técnica
capitalista, baseada na última palavra da ciência moderna.[13]
Prosseguindo a sua análise, Lenin nos mostra como o capitalismo
de Estado se dá através de “compromissos” entre o Poder
Soviético e os capitalistas privados nacionais e estrangeiros:
métodos de
compromisso ou de indenização aos capitalistas cultos, que
aceitam o “capitalismo de Estado”, que podem aplicá-lo e que são
úteis ao proletariado como organizadores inteligentes e expertos
de grandíssimas empresas que verdadeiramente alcancem abastecer
de produtos a dezenas de milhões de pessoas. (...) uma
“indenização” que os operários devem oferecer aos capitalistas
mais cultos, mais inteligentes e mais capazes desde o ponto de
vista da organização, dispostos a servir ao Poder Soviético e
ajudar honestamente a por em marcha a produção estatal grande e
grandíssima. (...) é necessário ajudar, em certa medida, a
restauração da pequena indústria, que não exige maquinaria, que
não requer reservas estatais nem grandes reservas de matérias
primas, de combustível e de víveres, a qual pode prestar
imediatamente certa ajuda à economia camponesa e elevar suas
forças produtivas. (...) “Implantando” o capitalismo de Estado
sob a forma de concessões, o Poder Soviético reforça a grande
produção contra a pequena, a produção avançada contra a
atrasada, a produção tendo por base a maquinaria contra a
produção manual (...).[14]
Em todas essas formulações de Marx, Engels e Lenin, sobre a
transição do capitalismo (ou do pré-capitalismo) ao socialismo,
percebe-se a visão de um processo demorado e complexo, onde
coexistem diversas formas de propriedade sobre os meios de
produção, onde persiste por longo tempo a produção de
mercadorias e continua atuando a lei do valor. Da mesma forma,
se observará uma grande semelhança entre a política econômica
executadas pelo Poder Soviético, principalmente no período da
NEP, e as “reformas” chinesas.
Anos mais tarde, em 1951, Stalin – em sua obra Problemas
econômicos do socialismo na URSS, que procura sistematizar
os ensinamentos da construção do socialismo na União Soviética –
reitera a persistência do mercado e da lei do valor no
socialismo, primeira etapa da sociedade comunista:
No nosso país, a
lei do valor estende a sua ação, sobretudo, na circulação de
mercadorias, no intercâmbio de mercadorias mediante a compra e a
venda, no intercâmbio principalmente das mercadorias de consumo
pessoal. (...) mas, a ação da lei do valor não fica limitada à
esfera da circulação de mercadorias. Estende-se também à
produção. (...) a esfera de ação da lei do valor está limitada
no nosso país pela existência da propriedade social sobre os
meios de produção.[15]
A
título de introdução ao tema, sem aprofundar ainda a análise da
“teoria chinesa da transição ao socialismo”, podemos afirmar que
Mao-Zedong e os reformadores – com Deng Xiaoping à frente –,
inspiraram-se na teoria marxista-leninista e em todo acúmulo da
experiência soviética para colocarem os fundamentos da ação
revolucionária do PCCh – seja na etapa da conquista do Poder,
seja na etapa da transição socialista –, sempre preocupados em
evitar as cópias mecânicas, sempre procurando ter em conta as
especificidades da realidade da China:
“em
1938, nós dissemos que ‘toda a afirmação sobre Marxismo,
desligada das características específicas da China, é apenas
marxismo abstrato, marxismo no vácuo.’ Quer dizer, devemos
opor-nos a toda a afirmação vazia sobre o marxismo, e os
comunistas que vivem na China devem estudar o marxismo ligando-o
às realidades da revolução chinesa.”[16]
3
- A CONQUISTA DO PODER (1924/1949)
|
De
início, os boxers estavam mal equipados e
desorganizados, mas altamente motivados a
livrar a China dos "demônios" estrangeiros. |
|
A
China entrou no século XX sob o estigma da humilhação nacional.
Parte do seu território, inclusive de sua capital estava ocupada
por oito potências estrangeiras – Inglaterra, Estados Unidos,
Alemanha, França, Rússia czarista, Japão, Itália e Áustria.
Em 1900, a rebelião dos Boxers foi cruelmente sufocada
por uma coligação militar dos países europeus sob o comando do
exército alemão, ao qual o Imperador Guilherme II recomendara
que seguissem o exemplo de Átila e “arrasem Beijing”:
Não haverá
clemência e os prisioneiros não terão sorte. Cada qual que caia
nas vossas mãos, cairá sob vossa espada (...) Que pela vossa
obra, possa a denominação de “alemão” afirmar-se por milênios n
China, tanto que nenhum chinês, com amêndoas nos olhos ou não,
possa jamais ousar olhar o rosto de um alemão.[17]
O
domínio estrangeiro sobre a China e a incapacidade da monarquia
manchu em resistir-lhe, fizeram com que a dinastia Qing caísse
no descrédito da população. O movimento republicano, liderado
por Sun Yat-sen – que em 1894 fundara a “União pelo Renascimento
da China” –, ganhou força e a República foi proclamada em 1911.
Mas Sun Yat-sen – que representava a nascente burguesia chinesa
em aliança com a pequena-burguesia urbana, ainda sumamente
débeis – não conseguiu manter-se no poder e foi obrigado a
renunciar, sendo substituído pelo despótico general Yuan Shikai.
Esse governo fez concessões ainda maiores aos estrangeiros e a
China mergulhou na anarquia, dilacerada pela luta entre os
diferentes “senhores da guerra”.
A
“União pelo Renascimento da China” deu origem, em 1912, ao
“Partido Nacional do Povo” (Guomindang), tendo como líder
civil Sun Yat-sen e como dirigente militar o jovem general Jiang
Jieshi. A Revolução Russa, em 1917, influenciou e impulsionou os
nacionalistas chineses.
Em 4 de maio de 1919, grandes manifestações estudantis – contra
a dominação estrangeira e contra o governo – sacudiram a China,
congregando intelectuais, artesãos e trabalhadores, o que deu um
novo impulso à luta antiimperialista.
Em julho de 1921, em Shangai, foi fundado o Partido Comunista da
China (Kungchantang), tendo a sua frente, entre outros, Mao
Zedong.
Sun Yat-sen formulou, nessa época, a sua doutrina das Três
Políticas: “colaboração com a URSS, colaboração com o PC
da China e apoio aos operários e camponeses”. Em 1923, é
assinado o “Pacto Yoffe-Sun Yat-sen”, através do qual os
soviéticos passaram a proporcionar assistência administrativa e
militar ao Guomindang.
3.1 - A PRIMEIRA GUERRA CIVIL REVOLUCIONÁRIA (1924-1927)
|
Entre
1924 e 1927, varre a China uma nova vaga
revolucionária – conhecida como “a grande
Revolução” –, tendo por esteio a Frente
Única entre o Guomindang e o
P. C. da China. |
|
Entre 1924 e 1927, varre a toda a China uma nova vaga
revolucionária – conhecida como “a grande Revolução” –, tendo
por esteio a Frente Única entre o Guomindang e o Partido
Comunista da China.
Em março de 1925, falece Sun Yat-sen, amigo sincero da URSS e
defensor da aliança com o Partido Comunista. À medida que o
tempo passava e a luta avançava, crescia no seio do Guomindang a
ala anticomunista, liderada pelo Jiang Jieshi. Mas, a “Expedição
do Norte” contra os caudilhos militares do norte – apoiados
pelas potências imperialistas e muito bem armados – necessitava
do apoio da URSS e do PC da China, o que neutralizou
temporariamente as atitudes anticomunistas.
A
aproximação do “Exército Nacional Revolucionário” das cidades de
Shangai, Cantão e Wuhan estimulou insurreições operárias que,
dirigidas pelos comunistas, ocuparam esses grandes centros
urbanos.
Preocupado com o crescimento e o fortalecimento dos comunistas,
Jiang Jieshi rompeu, em abril de 1927, a Frente Única com o PC
da China e iniciou uma feroz repressão aos seus militantes. Só
em 1927, foram mortos 40 mil comunistas, sendo que 13 mil foram
executados posteriormente. Assim, a “primeira guerra civil
revolucionária” terminou com a derrota das forças
revolucionárias.
Batidos, os comunistas refugiaram-se em áreas do interior, para
fugir ao massacre, e iniciaram uma das mais longas guerras civis
dos tempos modernos, que só terminaria 22 anos depois, em 1949,
com a vitória da Revolução Chinesa, dirigida por Mao Zedong.
3.2 - A SEGUNDA GUERRA CIVIL REVOLUCIONÁRIA (1927-1937)
|
A partir
de 1927, Mao Zedong lidera os comunistas no
rumo de uma nova visão que visava organizar
o campesinato chinês. |
|
Em 1º de agosto de 1927, sob a liderança de Zhu De e Zhou Enlai,
ocorreu o levante de dois corpos do antigo Exército Nacional
Revolucionário de Nanchang, onde encontravam-se mais de 20
mil soldados controlados ou influenciados pelos comunistas. Esse
levante foi seguido de outros, como o da Colheita de Outono, em
Hunan, dirigido por Mao Zedong. Em um primeiro momento a
estratégia dos comunistas foi a de tomar grandes cidades, o que
logo revelou-se inadequado, levando-os a derrotas.
A
partir de então, sob a direção de Mao Zedong, os comunistas
chineses orientaram-se no sentido de organizar bases de apoio no
campo e desenvolver a luta de guerrilhas. Em abril de 1928
formou-se o “4º Corpo do Exército Vermelho de Operários e
Camponeses”, que passou a combater nas montanhas de Jing Gang,
na província de Jiangxi, tendo por Comissário Político Mao
Zedong e por Chefe Militar Zhu De.
Beneficiando-se das condições topográficas favoráveis – “região
fácil de defender e difícil de atacar” – logo as bases de
apoio se multiplicaram, principalmente nas províncias de
Tzian-Si, Fu-Tzian, Hunan, Hubei, Huan-si e outras, situadas na
China central e meridional
A
medida que as áreas liberadas se consolidavam, o poder passava
às mãos de Conselhos (Soviets) de operários e camponeses,
que confiscavam as terras aos latifundiários e as entregavam aos
camponeses pobres. Da mesma forma, as empresas dos capitalistas
estrangeiros eram confiscadas. Já os capitalistas chineses
podiam manter as suas empresas e eram apoiados pelo novo poder.
Em dezembro de 1931, na cidade de Chzhui-Tzin, reuniu-se o
“Primeiro Congresso dos Soviets”, estando representadas
nele todas as bases revolucionárias da China. Esse congresso
elegeu um governo central operário-camponês das regiões
libertadas, tendo à sua frente Mao Zedong.
Entre 1930 e 1932, Jiang Jieshi organizou quatro campanhas
militares contra as regiões libertadas, mas não conseguiu
destruí-las. Em setembro de 1931, o Japão invadiu o nordeste da
China (Manchúria), sem maior resistência do Governo de Nanquim,
mais preocupado em combater os comunistas. Em 1932, foi
constituído, no território ocupado pelos japoneses, o estado
títere de Man-chuko, governado por Pu Yu, último imperador da
dinastia manchu.
Frente aos apelos dos comunistas para a constituição de uma
grande frente única para combater os japoneses, Jiang Jieshi
respondeu com sua quinta campanha contra as bases
revolucionárias, lançando sobre elas, em outubro de 1933, um
exército de um milhão de soldados. Erros “esquerdistas” na
condução da luta (sob influência de Wan Min, que abandonou a
tática de guerrilhas e passou à ofensiva contra as grandes
cidades e à defesa a qualquer preço dos territórios), somados à
grande superioridade numérica das forças de Jiang Jieshi (as
forças revolucionárias totalizavam em torno de 100 mil
combatentes), forçaram o abandono das bases revolucionárias da
China Central e Meridional e deram origem a “Grande Marcha”.
Em outubro de 1934, o Exército Vermelho conseguiu romper o cerco
e iniciou uma grande retirada em direção ao noroeste da China,
que durou um ano. Em meio a encarniçadas batalhas e sofrendo
graves perdas, as unidades remanescentes do Exército Vermelho
cruzaram onze províncias, percorrendo um trajeto de doze mil
quilômetros. Apenas dez mil dos noventa mil guerrilheiros que
iniciaram a “Grande Marcha” chegaram, em fins de 1935, à
província de Shensi-Kansu, que se converteu na principal base
dos revolucionários, tendo por capital Yenan.
Nesse processo, Wan Min e a sua política aventureira foram
derrotados na direção do PC da China e Mao Zedong e a sua
política tornaram-se hegemônicos no partido.
3.3 - A GUERRA DE LIBERTAÇÃO CONTRA O JAPÃO (1937/1945)
|
Em Nanjing, a barbárie japonesa extrapolou todos os parâmetros
de violência, sendo assassinados 300 mil chineses: “O saque e
o ‘estupro de Nanjing’ em 1937 é singularmente o episódio mais
sangrento da 2ª Guerra Mundial; houve mais mortos do que em
Dresden, Hiroshima ou Nagasaki. É o ‘holocausto esquecido’. Nas
regiões onde a resistência é mais encarniçada, os invasores
recorrem à política dos “três tudo”, isto é: “saquear tudo,
matar tudo, queimar tudo”. Em seu diário, um coronel japonês
anota: ‘Recebi de meu oficial superior a ordem segundo a qual
toda pessoa deve ser morta’.”[18]. |
|
Em julho de 1937, as tropas japonesas passaram à ofensiva no
norte da China visando a ocupação de todo o país. Em pouco
tempo, tomaram Beijing, Nanjing, Tien-Tsin, Shangai e outras
importantes cidades da China.
Em toda a China, “a agressão japonesa a partir de 1937 deixou
cerca de 31 milhões de vítimas, entre mortos, feridos e
definitivamente incapacitados.”[19]
Sob forte pressão, inclusive de seus generais, Jiang Jieshi
viu-se obrigado, enfim, a aceitar a Frente Única proposta pelos
comunistas para enfrentar o Japão.
Na prática, porém, as tropas do Guomindang pouco faziam contra
os japoneses, que apoderaram-se de todas as províncias do
litoral chinês e de todos seus centros econômicos e políticos.
Quem de fato enfrentava as tropas japonesas eram o Quarto e o
Oitavo Exércitos Vermelhos, secundados pelos movimentos
guerrilheiros que se multiplicavam na retaguarda do inimigo. As
vitórias da URSS contra as tropas japonesas no Lago Hasán (1938)
e junto ao Rio Jaljin-Gol (1939) também favoreceram muito a luta
das forças patrióticas chinesas.
Em 1940, as regiões libertadas pelos comunistas já abrangiam um
território com uma população de 100 milhões de habitantes e as
fileiras das unidades regulares do Exército Popular
Libertador contavam com mais de meio milhão de combatentes.
Em 1941 e 1942, os japoneses
lançaram suas principais forças contra as regiões libertadas e
contra o Exército Popular Libertador da China, mas sem
conseguir vencê-lo. Enquanto isso, a resistência do Guomindang
havia-se desfeito totalmente e Jiang Jieshi colaborava
abertamente com os japoneses.
Em agosto de 1945, o exército soviético passou à ofensiva na
Manchúria, destruindo as principais forças do exército japonês.
O “Exército Popular Libertador da China” aproveitou as
circunstâncias para lançar uma grande ofensiva, libertando 150
cidades e novos territórios na China Central e do Norte,
aproximando-se de Beijing, Nanquim e Changai. Preocupados com o
avanço das tropas revolucionárias, os Estados Unidos
desembarcaram um exército de mais de cem mil homens em várias
regiões da China e, junto com as forças do Guomindang, ocuparam
Beijing, Shangai e Nanquim.
3.4 - TERCEIRA GUERRA CIVIL REVOLUCIONÁRIA (1946/1949)
|
Julho de
1947, tropas do Exército de Libertação do
Povo avançam para a China Central. |
|
Derrotados os japoneses, os comunistas propuseram a retirada de
todas tropas estrangeiras da China e a formação de um governo de
coalizão, com a participação de todos os partidos políticos.
Mas, em julho de 1946, depois de uma trégua de sete meses, os
exércitos do Guomindang iniciaram seu ataque ao “Exército
Popular Libertador”, no norte e no centro do país. Eram
quatro milhões e trezentos mil homens do Guomindang –
abastecidos pelos Estados Unidos com o que havia de mais moderno
em armamentos – contra um milhão e duzentos mil homens das
forças revolucionárias, precariamente armados.
Aplicando amplamente a tática de guerrilhas, em combinação com
tropas regulares, o “Exército Libertador” resistiu aos ataques
de Jiang Jieshi e em julho de 1947 passou à contra-ofensiva em
escala nacional. Em pouco mais de dois anos, o “Exército
Popular” libertou toda China Central e Setentrional e penetrou
no Sudoeste, tomando Nanquim, Shangai, Hanchou e outras
importantes cidades.
Nesses três anos de luta, o “Exército Popular de Libertação”
chegou a contar com mais de cinco milhões de combatentes,
enquanto o exército do Guomindang reduziu-se a um milhão.
Em 23 de abril de 1949, os revolucionários tomaram Nanquim, sede
do governo do Guomindang. No dia 1º de outubro de 1949, foi
proclamada em Beijing a República Popular da China. Jiang Jieshi
e seus aliados fugiram para a ilha de Taiwan (Formosa), sob a
proteção da esquadra e do exército norte-americano...
4- AS TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICAS INICIAIS (1949/1957)
|
Mao
Zedong anunciando a fundação da República
Popular da China em 1 de outubro de 1949. |
|
Ao assumir o Poder, o Partido Comunista da China se deparou com
um quadro de grande atraso e deterioração econômica. Em
comparação ao nível da economia chinesa em 1936, o valor global
da produção industrial em 1949 estava reduzido à metade, sendo
que a indústria pesada havia diminuído 70% e a indústria ligeira
30%. A produção de aço, por exemplo, havia baixado para 158 mil
toneladas – queda de 80% – e a de carvão caíra para 32 milhões
de toneladas – redução de 48%. Na agricultura, a produção de
cereais era de tão somente 113 milhões de toneladas – uma
diminuição de 25% – e o algodão descendera a 444 toneladas –
redução de 48%. Segundo a ONU, a renda per capita dos
chineses passara a ser apenas 27 dólares norte-americanos.
4.1 - A NOVA DEMOCRACIA
Partindo da realidade de um país empobrecido, tecnologicamente
atrasado, com 80% da população vivendo da agricultura e carente
de terras cultiváveis, os comunistas chineses buscaram desde o
início um caminho próprio para a construção do socialismo na
China – de acordo com a realidade do país – expresso no conceito
da Nova Democracia, onde o poder revolucionário estaria
nas mãos de uma aliança entre operários, camponeses, pequena
burguesia e burguesia nacional. Os inimigos do povo eram o
imperialismo, os latifundiários e a burguesia monopolista e
“compradora”:
O que se entende
por povo? Na China, na presente etapa, se entende por povo a
classe operária, o campesinato, a pequena burguesia urbana e a
burguesia nacional. Dirigidas pela classe operária e o Partido
Comunista, essas classes se unem, formam seu próprio Estado,
elegem seu próprio governo e exercem a ditadura sobre os lacaios
do imperialismo, isto é, sobre a classe latifundiária e a classe
capitalista burocrática, assim como sobre seus representantes,
os reacionários do Koumintang (...) A democracia se pratica no
seio do povo, o qual goza das liberdades de palavra, de reunião,
de associação, etc. Só o povo goza do direito eleitoral, e não
os reacionários. A combinação desses dois aspectos – democracia
para o povo e ditadura para os reacionários – constitui a
ditadura democrática popular.[20]
Nesse mesmo artigo – escrito às vésperas da tomada do Poder, em
junho de 1949 – Mao Zedong desenvolve o conceito da Nova
Democracia como o caminho para a industrialização do país e
uma etapa de transição ao socialismo:
Nossa tarefa
atual é fortalecer o aparato do Estado Popular (...). Essa é a
condição para que a China, sob a direção da classe operária e do
Partido Comunista, possa transformar-se com passos seguros de
país agrícola em país industrial, passar da sociedade de nova
democracia à sociedade socialista e comunista (...).[21]
4.2 - A REFORMA AGRARIA E A COOPERATIVIZAÇÃO NO CAMPO
|
Após a
conclusão da reforma agrária, o agricultor
Gao Guancai e sua família examinam o novo
certificado de terras no condado de Jiaxing,
província de Zhejiang, em 1950. [XinhuaNet]. |
|
Por outro lado, Mao apontou a necessidade de uma socialização da
agricultura estreitamente articulada ao desenvolvimento
industrial (tendo por núcleo as estatais) e de um correto
aproveitamento dos incipientes “elementos de capitalismo”
existentes na China para acelerar a modernização econômica do
país:
Sem a
socialização da agricultura não pode haver um socialismo
completo e sólido. A socialização da agricultura deve
coordenar-se em sua marcha com o desenvolvimento de uma poderosa
indústria que tenha como setor principal as empresas estatais.
(...) A burguesia nacional é de grande importância na atual
etapa. Ainda temos frente a nós o imperialismo, inimigo muito
feroz. A indústria moderna da China ainda representa só uma
parcela muito reduzida do total da economia nacional. (...) Para
fazer frente à opressão imperialista e elevar a sua economia
atrasada a um nível mais alto, a China deve utilizar todos os
elementos do capitalismo da cidade e do campo que sejam
beneficiosos e não prejudiciais para a economia nacional e a
vida do povo, e devemos unir-nos com a burguesia nacional para
uma luta comum. Nossa política atual é limitar o capitalismo, e
não destruí-lo. (...) Devemos vencer as dificuldades, devemos
aprender o que ignoramos. Devemos aprender com todos os
entendidos (sejam quem forem) a trabalhar no terreno econômico.[22]
O
primeiro passo foi uma ampla reforma agrária nas áreas recém
liberadas (com uma população de 310 milhões de pessoas), onde as
terras dos latifundiários foram confiscadas e distribuídas aos
camponeses pobres, respeitando-se as propriedades dos camponeses
médios e ricos. Deve-se ressaltar que nas antigas regiões
libertadas, principalmente na Manchúria e Norte da China, a
reforma agrária já havia sido realizada:
O resultado foi
uma ampla extensão geográfica da reforma agrária na segunda
metade de 1950 (...). Embora as posses dos latifundiários fossem
confiscadas e redistribuídas, em muitos casos, as terras dos
camponeses ricos não foram tocadas. (...) Muitas mulheres
começaram a se beneficiar também com a reforma agrária porque
uma lei do matrimônio, promulgada em 1950, dava às mulheres
solteiras, divorciadas ou viúvas o direito de possuir terras em
seu próprio nome. Incluídos também nos cálculos de
redistribuição estavam os mendigos, monges, freiras, soldados
desmobilizados ou feridos e emigrados de aldeias que,
desempregados nas cidades, desejassem voltar para casa. (...)
estima-se que no Centro da China meridional (...) cerca de 40%
da terra cultivada foi desapropriada e redistribuída e que 60%
da população beneficiou-se com isso de alguma maneira.[23]
A
seguir, o Governo Popular procurou impulsionar milhões de
camponeses individuais no sentido da socialização, seja através
de “grupos de ajuda mútua no trabalho” – mantendo a economia
individual –, seja através de cooperativas de produção (onde a
terra era entregue sob a forma de ações). Excepcionalmente, onde
os camponeses estavam de acordo e havia condições técnicas para
isso, foram criadas granjas coletivas de caráter socialista, a
título de experiência e de modelo. Em conseqüência, em fins de
1954 os grupos de ajuda mútua já eram cerca de 10 milhões e as
cooperativas de tipo inferior totalizavam 480 mil. O número de
famílias camponesas incorporadas aos grupos de ajuda mútua e às
cooperativas aumentou de 21 milhões em 1951 para 70 milhões em
1954 – 19,2% e 60,3%, respectivamente, do total de famílias
camponesas da China. Em meados de 1955 o número de cooperativas
de tipo inferior já era de 670 mil.
Através do trabalho coletivo das massas camponesas – envolvendo
mais de 20 milhões de pessoas – e com o apoio do Estado, foram
realizadas obras hidráulicas colossais, removendo 1.700 milhões
de metros cúbicos de terra, o equivalente à construção de 23
canais de Suez.
Desde 1953, para enfrentar a especulação e o risco de
desabastecimento nas cidades, o Governo instituiu o monopólio
estatal da compra e venda de cereais. Os comerciantes
particulares de cereais só puderam continuar atuando como
agentes do Estado para a sua venda. Logo se passou à venda
centralizada do óleo comestível. Em 1954, foi implantado o
monopólio da compra do algodão e da compra e venda dos tecidos
de algodão.
4.3 - A SOCIALIZAÇÃO DA INDÚSTRIA E DO COMÉRCIO
Todos esses passos impulsionaram a transformação socialista da
indústria e do comércio privados:
após três anos de
recuperação da economia nacional, a economia capitalista privada
também experimentou uma profunda reorganização e transformação.
A maioria das empresas privadas se conectavam, de distintas
maneiras, com a economia socialista e cooperavam com ela, e as
relações de produção nas empresas capitalistas haviam
experimentado mudanças em diferentes graus; essas empresas
haviam deixado de ser de caráter exclusivamente capitalista
privado, para converter-se em empresas de capitalismo de Estado,
sob a administração do Governo Popular, vinculadas com a
economia socialista e supervisionadas pelos operários. O curso
do desenvolvimento da indústria privada, passando da forma
inferior de capitalismo de Estado (o monopólio estatal da compra
e venda de cereais, a função de processamento e ordens de compra
exclusiva por parte do Estado) à forma superior (empresas mistas
estatal-privadas) era, na realidade, um processo de
transformação de suas relações de produção e de desenvolvimento
gradual ao socialismo. (...) A partir de 1954, se começou a pôr
ênfase no desenvolvimento de empresas mistas estatal-privadas,
forma superior do capitalismo de Estado. (...) a gestão
estatal-privada significava uma cooperação no interior das
empresas, entre os elementos socialistas e capitalistas; a parte
pública possuía uma considerável cota de ações e as duas partes,
pública e privada, administravam em conjunto as empresas, com a
parte pública no papel dirigente. (...) se praticava a
distribuição dos lucros (...) em quatro partes: imposto sobre a
renda para o Estado, fundos de acumulação das empresas, fundos
para o bem-estar dos operários e dividendos para os
capitalistas, representando estes últimos mais ou menos a quarta
parte, enquanto que a maioria dos lucros das empresas ia para as
mãos do Estado e dos operários, servindo basicamente ao fomento
da economia nacional e a vida do povo. Isto fez com que as
empresas referidas adquirissem, em distintos graus, um caráter
socialista.[24]
Devido a que as empresas privadas nacionais, na sua maioria,
tinham equipamentos e instalações antiquadas e uma gestão
atrasada, enfrentaram grandes dificuldades, e muitas solicitaram
ao Estado para serem convertidas em empresas mistas
estatal-privadas. Assim, entre 1953 e 1955, as empresas mistas
aumentaram de 1.036 para 3.193, e o valor da sua produção chegou
a 49,6% do total das indústrias privadas (incluídas as mistas).
Evidenciando a superioridade da gestão socialista, enquanto nas
empresas mistas os índices de produtividade aumentaram de 100
para 314, nas empresas privadas aumentaram de 100 para 158.
O
confisco do “capital burocrático” também concentrou enormes
forças econômicas nas mãos do Estado e fortaleceu o setor
estatal: “80% do ativo fixo das indústrias, das empresas de
mineração e de transportes do país, de antes da Libertação,
converteram-se em bens estatais. Os bancos de todo o país, no
fundamental, também passaram a ser administrados pelo Estado.”[25]
O Governo Popular investiu fortemente na construção de empresas
modernas nos setores prioritários – carvão, metalurgia,
mecânica, maquinaria pesada, tecidos, ferrovias.
Também a transformação socialista da produção artesanal foi
empreendida pelo Governo Popular, sendo que, no final de 1956,
91,7% do total das pessoas ocupadas nesta atividade econômica já
participavam de cooperativas.
4.4 - OS AVANÇOS ECONÔMICOS DOS TRÊS PRIMEIROS ANOS
Como resultado dessas profundas transformações, entre 1949 e
1952 – apesar da Guerra da Coréia – o valor global da produção
agrícola e industrial aumentou 77,5%, o que significou uma taxa
anual média de 21%. No mesmo período, a produção industrial
cresceu 145%, a uma taxa anual de 34,8%. Quanto à produção
agrícola, incrementou-se em 53,5%, a uma média de 15,3% ao ano.
Nesses mesmos três anos, o número de operários e empregados
passou de oito para dezesseis milhões e seus salários médios
aumentaram 70%. Já a renda dos camponeses subiu 30%.
Da mesma forma, ocorreram profundas alterações na estrutura da
economia chinesa, que passou a assentar-se nos seguintes
setores: economia estatal, capitalismo de estado,
capitalismo privado, pequena
produção individual no campo e na cidade e economia cooperativa.
Em 1952, 56% da produção das indústrias modernas do país e 60%
do comércio atacadista já estavam sob o controle do setor
estatal. Ao mesmo tempo, o valor da produção industrial
totalizava 41,5% da economia chinesa (35,5% dos quais
correspondiam à indústria pesada).
4.5 - AS CONQUISTAS DO 1º PLANO QÜINQÜENAL
|
Trabalhadores da planta de aço Anshan Iron
and Steel
Company comemoram o primeiro tubo de aço sem
costura fabricado em 1953. |
|
O
Primeiro Plano Qüinqüenal foi elaborado sob a direção de Zhou
Enlai e Chen Yun em 1951, tendo sido iniciado em 1953 e
concluído em 1957:
O princípio
orientador e a meta fundamental do 1º Plano Qüinqüenal eram:
concentrar a força principal no desenvolvimento da indústria
pesada, assentar uma base preliminar para a industrialização do
país e a modernização da defesa nacional; desenvolver de forma
correspondente os transportes, a indústria leve, a agricultura e
o comércio; formar e preparar pessoal para satisfazer as
necessidades da construção; fomentar de forma metódica a
cooperativização da agricultura e o artesanato; continuar a
transformação da indústria e do comércio capitalistas; garantir
o crescimento constante do peso específico dos elementos
socialistas na economia nacional e, ao mesmo tempo, por em jogo
corretamente o papel da agricultura individual, o artesanato e a
indústria e o comércio capitalistas; e garantir a elevação
paulatina – tendo por base o desenvolvimento da produção – do
nível de vida material e cultural do povo.[26]
Esse foi o período de maior cooperação entre a China e a URSS:
as 156 obras construídas com a ajuda soviética eram o núcleo da
construção industrial do 1º Plano Qüinqüenal; os soviéticos,
além de empréstimos, deram orientação e ajuda concreta para a
localização e exploração dos recursos naturais, seleção dos
locais para as empresas, desenho técnico, máquinas e
equipamentos, construção e montagem e, inclusive, a formação de
pessoal, prova das instalações e sua colocação em funcionamento.
Três mil especialistas soviéticos foram enviados para a China e
o número de estudantes e técnicos chineses que foram preparar-se
na União Soviética chegou, respectivamente, a sete e cinco mil.
O
ano de 1956 marca a conclusão, no fundamental, do processo de
conversão da propriedade privada individual e capitalista dos
meios de produção em uma das formas de propriedade socialista
(cooperativada ou “de todo povo”). O ano de 1957 foi de grandes
êxitos e ao final do mesmo a maioria das metas do 1º Plano
Qüinqüenal havia sido cumprida com folga: “o Primeiro Plano
Qüinqüenal obteve um aumento extraordinário da produção
industrial de um amplo setor de bens (...). A maioria dos seus
objetivos já tinha sido alcançada no final de 1956. (...) o
plano foi uma realização formidável.”[27]
Os capitalistas deixaram de ser donos das empresas que antes
comandavam, passando a ser empregados das mesmas, conforme as
suas aptidões, ao mesmo tempo que continuavam recebendo
dividendos fixos durante um período de sete anos (depois
prorrogados para dez anos), correspondentes a 5% do valor das
ações que possuíam.
Assim, em 1956 a economia estatal já representava 32,2% da renda
nacional, a economia cooperativada 53,4% e a mista
estatal-privada 7,1%, totalizando 92,7%. Na produção industrial,
o setor socialista chegou a 67,5% e o capitalismo de Estado a
26,9%, enquanto o capitalismo privado reduziu-se a quase zero.
Nas vendas ao varejo, o comércio estatal e cooperativo de
abastecimento e venda totalizou 68,3% e o comércio capitalista
de Estado e cooperativo de pequenos comerciantes alcançou 27,5%,
enquanto o comércio particular reduziu-se a 4,2%.
Em 1957, a produção industrial havia crescido 128,3% em relação
a 1952 (18% ao ano), sendo que a fabricação de meios de produção
havia aumentado 210% (25,4% ao ano) e a de artigos de consumo
83% (12,9% ao ano). Em consequência, a indústria pesada passou a
representar 45% do total da produção industrial do país. A
produção agrícola cresceu 25% em relação a 1952 (4,5% anuais). O
nível de vida do povo também se elevou de forma persistente,
sendo que consumo per capita de operários e empregados
aumentou 38,5% em relação a 1952 e o dos camponeses 27,4%.
Fazendo um balanço dos grandes êxitos alcançados nesses
primeiros anos de construção econômica, o Partido Comunista da
China afirmou que o período de transição de industrialização
socialista ainda necessitaria de mais dois quinquênios e que
para levar a cabo a construção de um grande país socialista
seriam necessários 50 anos.
4.6 – O 8º CONGRESSO DO PARTIDO COMUNISTA DA CHINA
|
A plenária do 8º Congresso, realizado em
Pequin, contou com a participação de 1.026
delegados(as) e 107 delegados(as)
suplentes.. |
|
Havia se consumado, no fundamental, a transformação socialista
da China e o centro de gravidade do Partido voltava-se cada vez
mais para a construção econômica e para o desenvolvimento das
forças produtivas. No quadro internacional, o fato novo havia
sido a realização do 20º Congresso do Partido Comunista da URSS,
em fevereiro de 1956, ocasião em que Kruschev assumira a direção
do PCUS e denunciara os erros de Stalin, desqualificando
totalmente a obra de construção do socialismo na União
Soviética. Esse acontecimento causou grande perplexidade nos
partidos comunistas de todo o mundo e deu origem a uma ofensiva
sem precedentes do imperialismo contra o comunismo e o
socialismo.
Em abril de 1956, Mao Zedong apresentou o seu informe “Sobre
as dez grandes relações”, sintetizando a experiência chinesa
e tirando lições das experiências negativas da União Soviética,
antecipando questões que serão retomadas quando das chamadas
“Reformas Econômicas” da China, após a Revolução Cultural.
Mao foi enfático na defesa da necessidade de romper com a “cópia
de modelos” e de integrar o marxismo à realidade chinesa:
Nossa teoria é a
integração da verdade universal do marxismo-leninismo com a
prática concreta da revolução chinesa. (...) Nas ciências
naturais, estamos bastante atrasados e devemos fazer esforços
especiais para aprender com os demais países. Mas, também aqui
a nossa aprendizagem deve ser crítica e não cega (...). No
referente a todo o corrupto sistema e a todas as corruptas
idéias e práticas da burguesia estrangeira, devemos boicotá-los
e criticá-los de forma resoluta. Mas isso não impede que
aprendamos a avançada ciência e tecnologia dos países
capitalistas e o que há de científico em seus métodos para a
administração de empresas. As empresas dos países
industrialmente desenvolvidos operam com pouco pessoal e elevada
eficiência e sabem fazer negócios. Tudo isso devemos aprender de
forma conscienciosa e à luz dos nossos princípios. Rechaçar em
bloco, sem fazer uma análise, a ciência, a tecnologia e a
cultura dos demais países, da mesma forma que o mencionado
fenômeno de transplantar sem análise tudo o que é estrangeiro,
não é uma atitude marxista, é uma atitude desfavorável à nossa
causa.[28]
Nesse informe, Mao Zedong busca explorar caminhos próprios para
a construção do socialismo na China, diferenciando-se da
experiência soviética:
não se deve tomar
em consideração só um setor mas, simultaneamente, os três: o
Estado, a coletividade e o indivíduo (...).preocupar-se pelas
condições de vida das massas e combater a atitude burocrática de
indiferença frente a suas necessidades. (...) convém falar um
pouco do problema da independência de cada fábrica sob direção
unificada. Pelo visto, é inadequado concentrar tudo nas mãos das
autoridades centrais ou provinciais e municipais, sem deixar às
fábricas um mínimo de atribuições, um mínimo de margem de
manobra, nem os menores ganhos. (...) Por princípio, unificação
e independência constituem uma unidade de contrários. Tanto a
unificação como a independência são necessárias. (...) Cada
unidade de produção deve gozar de determinada independência,
vinculada com a unificação; só assim poderá desenvolver-se com
maior vivacidade. (...) Também se deve tratar de forma acertada
a relação entre as cooperativas e os camponeses. É preciso fixar
adequadamente, nos ingressos das cooperativas, os percentuais
que correspondem ao Estado, às cooperativas e aos camponeses.[29]
A fim de
construir um poderoso país socialista, se requer uma forte
direção central unificada, uma planificação e disciplina
unificadas a escala nacional (...) ao mesmo tempo, se faz
necessário pôr em pleno jogo a iniciativa local e permitir que
cada localidade tenha algo que seja particular e que concorde
com suas próprias condições. (...) para desenvolver a construção
socialista é indispensável fazer valer a iniciativa local. Se
queremos consolidar a direção a nível central, é preciso ter em
conta os interesses locais.[30]
E
o 8º Congresso, realizado entre 15 e 27 de setembro de 1956,
afirmou em sua Resolução Final:
no nosso país
foram basicamente resolvidas as contradições entre o
proletariado e a burguesia, terminou no fundamental a história
de milênios do sistema de exploração de classe e foi implantado
no essencial o sistema socialista. (...) a contradição principal
no nosso país já é a existente entre a demanda do povo de
estabelecer um país industrial avançado e a realidade de um país
agrícola atrasado, a existente entre as necessidades do povo de
um rápido desenvolvimento econômico e cultural e a incapacidade
da economia e da cultura para satisfazer tais necessidades.
(...) esta contradição é, em essência, a contradição entre o
sistema socialista avançado e as forças produtivas sociais
atrasadas.[31]
Para resolver essa contradição, o Congresso aprovou o princípio
do avanço com passo firme, garantindo o equilíbrio do
desenvolvimento dos diversos ramos da economia, opondo-se, por
um lado, ao conservadorismo e, por outro, ao avanço temerário.
Quanto aos diversos segmentos que formavam a economia chinesa,
definiu que:
na exploração
industrial e comercial, o grosso da economia seria estatal e
coletivo, complementado por certo percentual de economia
individual. Em relação à planificação da produção, o grosso da
produção industrial e agrícola seria constituído pela produção
planificada, acompanhada, de forma suplementar, de uma produção
livre, realizada de acordo as oscilações do mercado, mas mantida
dentro do permitido pelos planos do Estado. Enquanto ao mercado
socialista único, o grosso seria constituído pelo mercado
estatal, complementado por certo mercado livre, dirigido pelo
Estado e mantido dentro de certos limites.[32]
O
ano de 1957 – durante o qual foram aplicadas as orientações do
8º Congresso – apesar de divergências quanto ao ritmo do
crescimento – teve um dos melhores resultados econômicos desde a
proclamação da República Popular da China.
5
- O GRANDE SALTO À FRENTE (1958/1960)
No final de 1957, surgiu dentro do Partido um clima de
“entusiasmo voluntarista”, fruto dos grandes êxitos obtidos.
Alguns começaram a achar que os ritmos de crescimento podiam ser
bem maiores que os do 1º Plano Qüinqüenal, e o próprio Mao
Zedong passou a afirmar que a crítica do 8º Congresso a um
pretenso “avanço temerário” havia sido um erro.
Na 2ª sessão do 8º Congresso Nacional, em maio de 1958, Mao
adotou uma posição de superestimação do papel da vontade
subjetiva no processo das transformações socialistas, destacando
a “rapidez” como o elo principal da consigna de “quantidade,
rapidez, qualidade e economia”. Aqueles dirigentes que haviam se
oposto ao “avanço temerário” – como Zhou EnLai e Chen Yun –
tiveram que fazer autocrítica nessa reunião. As metas que
estavam sendo elaboradas para o 2º Plano Qüinqüenal foram
arbitrariamente aumentadas, a produção prevista para o aço
passou de 12 para 30 milhões de toneladas e foi colocada a meta
de ultrapassar a produção de aço da Inglaterra nos próximos 15
anos. Era a política do Grande Salto à Frente que ia se
formando.
5.1 - CRESCIMENTO ACELERADO E COLETIVIZAÇÃO VIA AS “COMUNAS”
|
Camponeses chineses saúdam a chegada de
tratores comprados por uma cooperativa de
agricultores em abril de 1958, durante a
campanha do Grande Salto para a Frente. |
|
Desconsiderando o baixo nível das forças produtivas no campo,
Mao Zedong passou a defender a integração da agricultura, da
indústria, do comércio e das atividades militares e
administrativas, através de grandes unidades de produção
denominadas “comunas”, reunindo sob uma concepção igualitarista
dezenas de milhares de famílias. Da mesma forma, promoveu-se uma
intensa campanha de massas para fundir ferro e aço,
construindo-se em todo o país milhares de pequenos altos-fornos
e fornos de coqueificação. Esse processo anárquico e caótico
acarretou um grande desperdício de investimentos, matérias
primas e força de trabalho e uma grave desproporção na economia
nacional. Para dar um exemplo, em fins de 1958 haviam sido
produzidas 11 milhões de toneladas de aço, das quais somente 8
milhões eram de qualidade aceitável.
“Como
um ‘pernicioso legado do capitalismo’, foram proscritos os
pequenos comerciantes e vendedores ambulantes, o comércio
feirante e as ocupações secundárias domésticas que antes
existiam nas zonas rurais”, dentro da concepção de que “quanto
menos intercâmbio mercantil houver, mais perto se estará do
comunismo”[33],
o qual, aliás, deixava de ser uma questão para um futuro
longínquo.
O resultado foram fortes desequilíbrios entre os diversos
setores da economia, retrocessos econômicos, redução do
crescimento agrícola – aumento de apenas 1% na produção de grãos
– e desabastecimento de gêneros alimentícios. Agravaram esse
quadro os desentendimentos com a URSS – decorrentes da política
de Kruchev –, culminando com a retirada dos técnicos soviéticos
e com a paralisação, a meio caminho, de importantes projetos
conjuntos.
Em dezembro de 1958, na reunião do Comitê Central, em Wuhan, Mao
Zedong renunciou à Presidência do Governo – cargo que passou a
ser ocupado por Liu Shaoqi – mas manteve a Presidência do
Partido e da Comissão de Assuntos Militares. Mao já havia
anunciado que deixaria o cargo, mas inúmeros estudiosos entendem
que o momento em que isso ocorreu refletiu o seu desgaste com o
Grande Salto à Frente:
O fracasso da
estratégia do grande salto acirrou as diferenças internas no
governo chinês. Duas linhas eram identificadas e podem ser
caracterizadas da seguinte forma: de um lado, aqueles que
privilegiavam o vínculo soviético, reforçando o aparelho
burocrático do Estado (Liu Shaoqi e Peng Zhen) e, de outro, os
maoístas, identificados pela defesa do ressurgimento do ardor
revolucionário compatível às peculiaridades chinesas. Além
disso, os problemas advindos da aplicação da estratégia
contribuíram para o refluxo da influência de Mao Zedong, que
renunciou à Presidência em 1958. Liu Shaoqi assumiu no ano
seguinte, adotando algumas reformas que possibilitaram aos
moderados, reformistas e pragmáticos uma ascensão política.[34]
5.2 - A RETIFICAÇÃO DO GRANDE SALTO À FRENTE (1961/1965)
O
agravamento da situação levou a que, em janeiro de 1961, a 9ª
Sessão Plenária do 8º Comitê Central suspendesse o Grande
Salto à Frente e a criação de novas comunas. Em fevereiro de
1962, realizou-se em Beijing uma reunião ampliada da direção
central do Partido, com a presença de sete mil pessoas, onde foi
feita uma autocrítica sobre o Grande Salto à Frente:
Primeiro, as
metas dos planos de produção foram demasiado altas e a
construção básica abarcou esferas supremamente extensas, o que
deu origem a uma tremenda desproporção entre os diversos ramos
da economia nacional; segundo, no trabalho das comunas populares
se confundiram a propriedade coletiva e a de todo o povo, e se
observou o afã pela transição de uma forma à outra de
propriedade, violando o princípio de “a cada um segundo o seu
trabalho” e do intercâmbio de valores iguais e incorrendo em uma
série de erros de “comunização” e de igualitarismo; terceiro, se
tratou indevidamente de estabelecer por todo o território
nacional vários sistemas industriais completos, foram
descentralizados os poderes para os níveis inferiores e cresceu,
com graves seqüelas, a tendência à dispersão; e quarto, se
sobreestimou o ritmo de incremento da produção agrícola e se
exigiu um desenvolvimento demasiado acelerado da construção, de
modo que a população urbana aumentou em proporções indevidas e
se agravaram as dificuldades no abastecimento urbano e a
produção rural.[35]
Feitos os ajustes, ainda que perdurassem questões não
resolvidas, a situação econômica melhorou e a China retomou o
seu crescimento.
Em 1962, em meio ao recrudescimento da controvérsia
sino-soviética e da luta contra o “revisionismo”, a 10ª Sessão
Plenária do 8º Comitê Central aprovou – por iniciativa de Mao
Zedong um comunicado onde se afirmava:
ao largo de todo
o período da revolução proletária e da ditadura do proletariado,
em toda a etapa histórica da transição do capitalismo ao
comunismo (esta etapa requer várias dezenas de anos e,
inclusive, um tempo mais longo), existe a luta de classes entre
o proletariado e a burguesia e existe a luta entre os dois
caminhos, o socialista e o capitalista.[36]
Esta opinião – que expressava a preocupação de Mao Zedong com o
que ocorria na URSS e a sua busca de como impedir que tal viesse
a ocorrer na China – veio a fortalecer as tendências
“esquerdistas” no seio do PCCh e preparar o caminho para a
Revolução Cultural, quando a tarefa central da construção
socialista deixou de ser o “desenvolvimento das forças
produtivas” para transformar-se na “luta de classes permanente”.
Resumindo esse período, pode-se dizer que os três primeiros anos
do 2º Plano Qüinqüenal (1958-1960) foram do Grande Salto à
Frente, deixando de lado o plano original e causando grandes
dificuldades econômicas. Nos dois últimos anos do 2º Plano
Qüinqüenal (1961-1962) foram realizados ajustes na economia
nacional. Logo vieram três anos de continuação dos reajustes
(1963-1965), em um período de transição para o 3º Plano
Qüinqüenal (iniciado em 1966).
Tomando por base o ano de 1962 – quando se registrou o maior
descenso da economia chinesa – nos três anos seguintes o valor
global da produção industrial e agrícola aumentou a uma média
anual de 15,7%, sendo que a produção agrícola cresceu a uma
média de 11% e a industrial de 17,9%. Independentemente dos
erros, foi um período de grande diversificação e ampliação da
economia chinesa (indústria petrolífera e petroquímica,
siderurgia, eletrificação, transporte ferroviário, etc.) e de
grandes conquistas tecnológicas, como a fabricação da bomba
atômica chinesa, em julho de 1964, fortalecendo a defesa
nacional e colocando a China no concerto das grandes potências
mundiais:
Foi uma vitória
do desenvolvimento técnico científico chinês e oportunidade para
o governo de Beijing declarar solenemente que “jamais, em
nenhuma circunstância e sob nenhum pretexto a China será a
primeira a lançar uma bomba atômica”. Essa declaração não foi
acompanhada até hoje por nenhum país detentor da arma nuclear.[37]
6
- A REVOLUÇÃO CULTURAL (1966/1976)
Em 1966, quando começou a ser executado o 3º Plano Qüinqüenal, a
China entrou em um dos períodos mais tumultuados de sua
história, com a Grande Revolução Cultural, deflagrada por
Mao Zedong. Preocupado com a degeneração revisionista da URSS –
Mao tinha a intenção de prevenir a restauração capitalista na
China:
O conflito,
grosso modo, estaria assentado na disputa entre os voluntaristas
(associados a Mao Zedong) e os pragmáticos (vinculados a Liu
Shaoqi). Como questões de fundo, deve-se destacar as
concernentes relações sino-soviéticas, bem como a crítica
maoísta ao caráter capitalista das reformas empreendidas pelo
Estado sob a administração dos moderados. Liu Shaoqi defendia a
retomada da responsabilidade privada na agricultura, dos
incentivos materiais aos operários, a formação de um corpo de
profissionais na administração das indústrias, bem como medidas
políticas assentadas na estabilidade e no profissionalismo, que
visassem a modernização. Mao Zedong, por sua vez, continuava
apostando na coletivização, no fortalecimento da moral comunista
e numa maior participação operária na administração –
gerenciamento das fábricas e do Estado – ressaltando a
permanência do caráter revolucionário.[38]
6.1 – “CANHONEAR O QUARTEL GERAL”
|
A juventude, que ainda não estaria
“contaminada pelo revisionismo”, foi
mobilizada através da “Guarda Vermelha” e
lançada contra os quadros superiores do
Partido e do Estado, sob o lema “canhonear o
Quartel Geral”, título de um dos artigos de
Mao Zedong. |
|
A
primeira fase da Revolução Cultural iniciou em novembro
de 1965 pela crítica à obra literária “A destituição de Hai
Rui”, acusada de contra-revolucionária. Rapidamente, a crítica a
essa obra estendeu-se às demais áreas da literatura, da arte, da
história, da filosofia, tornando-se uma vasta campanha de
crítica no campo ideológico e cultural. À frente do movimento
estavam Jiang Qing (terceira esposa e secretária de Mao Zedong)
e Lin Biao (ministro da Defesa Nacional), que logo começaram a
fazer críticas veladas a importantes dirigentes do CC do PCCh,
acusando-os de conivência com a “linha negra e anti-socialista”
na área da cultura.
A
segunda fase da Revolução Cultural teve início com o
afastamento de Peng Zhen da Prefeitura de Beijing, em abril de
1966, com a reunião ampliada do Birô Político, em maio, e com a
11ª Sessão Plenária do 8º Comitê Central, em agosto,
acontecimentos que marcam o desencadeamento em toda linha da
Revolução Cultural, chamada a “criticar e repudiar aos
representantes burgueses que se infiltraram no Partido, no
Governo, no Exército e nos diversos Domínios culturais”.[39]
A
juventude, que ainda não estaria “contaminada pelo
revisionismo”, foi mobilizada através da “Guarda Vermelha” e
lançada contra os quadros superiores do Partido e do Estado, sob
o lema “canhonear o Quartel Geral”, título de um dos
artigos de Mao Zedong. Sob o comando de Chen Boda e Lin Biao,
abriu-se uma vasta temporada de “caça às bruxas”, que afastou
antigos quadros partidários e levou a China à beira da anarquia:
dirigentes
importantes e de todos os níveis foram sendo criticados,
pressionados, humilhados e afastados, como Liu Shaoqi, Deng
Xiaoping, Peng Zhen, Yang Shangkun e muitos outros. Zhou Enlai e
Zhu De passaram a uma posição relativamente subalterna. À
proporção que figuras de proa em torno de Mao Zedong eram
afastadas, outros tipos dele se acercavam, como Lin Biao, Jiang
Qing, Wang Hong Wen, Zhang Chunqiao, Yao Wenyuan. O culto da
personalidade de Mao Zedong, exacerbado por Lin Biao, foi levado
a níveis grotescos e, como diz a Breve História, “a errônea
direção pessoal, ‘esquerdista’ de Mao Zedong substituía de fato
a direção coletiva do Comitê Central do Partido”.[40]
6.2 – A CRIAÇÃO DOS “COMITÊS REVOLUCIONÁRIOS”
Tendo por pano de fundo a concepção de que “a política deve
estar no comando de tudo” e de que “a luta de classes tem
primazia sobre a economia”, a Revolução Cultural
desestabilizou o Partido, o Estado e a economia. Elogiando o
movimento, Mao afirmou que “uma grande desordem sob os céus
conduzirá infalivelmente a uma grande ordem sob os mesmos”.
Em janeiro de 1967, primeiro em Shanghai e logo em todo o país,
os rebeldes propuseram a “tomada total do Poder” e desataram uma
campanha para arrebatar o poder da direção do Partido.
Disseminou-se a luta entre as distintas facções rebeldes – cada
uma “mais revolucionária que a outra –, ou entre elas e os
órgãos partidários ou de governo, sob a consigna “duvidar de
tudo, derrubar tudo”.
Buscando dar alguma ordem ao processo de “tomada do poder”, Mao
propôs a criação dos “Comitês Revolucionários” através da
“triple integração”, entre os responsáveis pelas organizações
revolucionárias de massas, os representantes das unidades do
Exército Popular de Liberação (na localidade) e os “quadros
dirigentes revolucionários”.
A
institucionalização da Revolução Cultural através da
constituição dos “Comitês Revolucionários”, no primeiro semestre
de 1967, constitui a sua terceira fase.
A
quarta fase teve início em setembro de 1967, quando Mao Zedong
descarta a “ultra-esquerda”, e termina em abril de 1969, com a
vitória de Mao e a realização do 9º Congresso do PCCh.
Em outubro de 1968, na 12ª Sessão Plenária Ampliada do 8º Comitê
Central, 53% dos membros titulares e suplentes eleitos no 8º
Congresso foram privados do direito de participar, acusados de
serem “elementos antipartido”, “renegados” e “agentes secretos”.
Nessas circunstâncias, foi decidido “expulsar Liu Shaoqi do
Partido, para todo o sempre, e destituí-lo de todos os cargos
dentro e fora do Partido”.[41]
Em 1º de abril de 1969, reuniu-se o 9º Congresso Nacional do
PCCh, que referendou a linha da Revolução Cultural e
afastou 70% dos membros do Comitê Central, colocando nos
Estatutos que “O camarada Lin Biao é o íntimo companheiro de
armas e o sucessor do camarada Mao Zedong”, afirmação
inédita nos Estatutos de um Partido Comunista.
6.3 - O DESAPARECIMENTO DE LIN BIAO E O RETORNO DE DENG XIAOPING
Considerando que no fundamental estava resolvido o problema da
“reconstrução do Partido”, Mao transladou o centro dos seus
esforços para a “reconstrução do governo”. Para isso, convocou a
4ª Assembléia Popular Nacional e propôs a reforma da
Constituição. No processo da sua convocação, Lin Biao – ansioso
por assumir a Presidência do país – passou a divergir de Mao que
defendia a extinção desse cargo na China:
Mao começara a ter outras idéias sobre Lin e a maneira como o
ELP estava lidando com os demorados expurgos e investigações
sobre cargos partidários veteranos. (...) Em março de 1970, Mao
decidiu retirar o cargo de presidente do Estado, vago desde a
prisão de Liu Shaoqi, do projeto de constituição, o que
significava que Lin, além de não poder assumir tal posto,
continuaria abaixo do premiê Zhou Enlai. (...) Segundo
documentos liberados mais tarde pelo PCC, Lin Biao, levado ao
desespero pelo colapso de suas ambições políticas, buscara apoio
entre seus amigos mais íntimos para uma tentativa de assassinato
de Mao. Impossibilitado de levar adiante seu plano, Lin entrou
em pânico e fugiu do país com esposa e filho em um jato Trident.
Os documentos do partido acrescentam que o avião estava indo
para a União Soviética, mas não tinha combustível suficiente
para a viagem; também não havia a bordo navegador ou
radioperador. A queda ocorreu na Mongólia em 13 de setembro de
1971 e todos os passageiros morreram queimados.[42]
Segundo a Breve História do Partido Comunista da China, o
desfecho do episódio Lin Biao– o mais ardoroso defensor do culto
à personalidade de Mao Zedong – abriu os olhos de muita gente no
Partido e fez o próprio Mao reavaliar alguns aspectos da
Revolução Cultural. Depois desse incidente, Mao assumiu
pessoalmente a política em relação aos quadros e – em estreita
colaboração com Zhou Enlai – reabilitou diversos deles, como
Deng Xiaoping que em março de 1973 retornou para o seu cargo de
vice-primeiro-ministro do Conselho de Estado.
Em dezembro de 1973, em uma reunião da Comissão Militar, Mao
Zedong propôs a revogação da condenação de diversos dirigentes e
fez sua autocrítica: “Fui eu quem se equivocou ao aceitar os
argumentos unilaterais de Lin Biao.”[43]
Apesar de tudo isso, Mao continuou a acreditar na correção, no
fundamental, da Revolução Cultural e a dizer que o
unicamente os seus excessos deviam ser corrigidos.
6.4 – A APROXIMAÇAO DA CHINA COM OS ESTADOS UNIDOS
|
Nixon sendo recebido por Zhou Enlai em 1972. |
|
O
início da década de 70 se destaca, ainda, por uma política
externa chinesa bastante ativa. Em julho de 1971, Henry
Kissinger – Conselheiro de Nixon para Assuntos de Segurança
Nacional – foi recebido pelo governo chinês e iniciaram-se
negociações tendo em vista a normalização das relações entre os
dois países. Em outubro desse mesmo ano, a China reconquistou o
seu assento nas Nações Unidas e no Conselho de Segurança e em
fevereiro de 1972, o Presidente Nixon foi recebido por Mao
Zedong e ambos firmaram o “Comunicado Conjunto
Chino-Norteamericano”.
Esse acontecimento – que não pode ser desligado das crescentes
contradições entre a China e a URSS – levou à normalização das
relações diplomáticas entre a China e o Japão, no início de 1973
e a um auge no estabelecimento de relações diplomáticas entre a
China e um grande número de países da Europa e do resto do
mundo, assinalando a superação do relativo isolamento em que a
China se encontrava desde o seu rompimento com a União
Soviética.
6.5 - AS CONSEQÜÊNCIAS ECONÔMICAS DA REVOLUÇÃO CULTURAL
Apesar do processo da Revolução Cultural ter iniciado no
primeiro semestre de 1966, será de 1967 em diante que se farão
sentir com mais força os seus efeitos na economia, exatamente
quando a turbulência se estendeu às empresas industriais, de
transporte e de comunicações.
O
Plano econômico de 1967 não pôde ser executado e de fato foi
descartado. O Plano anual de 1968 sequer foi elaborado. Nas
empresas, muitas das normas e regulamentos que haviam sido
criadas no decorrer dos anos anteriores foram desconsiderados
por serem vistos como medidas “revisionistas” de “controle,
restrição e repressão”.
Em conseqüência, em 1967 o valor global da produção industrial e
agrícola caiu 9,6% em relação a 1966 e em 1968 baixou 4,2% em
relação ao ano anterior e a renda nacional diminuiu 13,3%, em
comparação com 1966.
O
ano de 1969 registrou uma recuperação da economia chinesa,
decorrente da estabilização dos “comitês revolucionários” e da
realização do 9º Congresso do PCCh. Foi retomada a atividade de
planificação da economia e obtido um crescimento de 23,8%, em
relação a 1968, da produção industrial e agrícola e de 19,3% na
renda nacional. Em comparação com 1966, porém, praticamente não
houve crescimento.
Em março de 1970, foram elaborados o Projeto de Programa do
Plano de Desenvolvimento da Economia Nacional, para 1970 e o
Programa do 4º Plano Qüinqüenal de Desenvolvimento da
Economia Nacional, viabilizando através de um grande
tensionamento de forças um razoável crescimento econômico.
Assim, ao final desse ano, foram alcançados os principais
índices previstos no 3º Plano Qüinqüenal. Porém, esse avanço
causou graves desequilíbrios entre os diversos setores da
economia:
a produção de
cereais e cultivos econômicos não podia satisfazer as demandas
do desenvolvimento industrial e do crescimento demográfico; as
indústrias de materiais e matérias primas não se adequava, às
necessidades do progresso da industria de transformação; a
envergadura da construção infra-estrutural era demasiado ampla,
acompanhada de uma quantidade excessiva de projetos e de uma
taxa de acumulação demasiado alta; os produtos baixaram de
qualidade; descuidou-se da reparação de equipamentos; o número
de acidentes aumentou (...) os meios de macro-controle das
autoridades centrais foram em grande parte debilitados e as
localidades “estenderam suas frentes de trabalho” a todos os
âmbitos e se propuseram, uma após a outra, a “duplicar” a
produção, com o objetivo de criar cada uma o seu próprio sistema
econômico, “pequeno mas auto-suficiente” (...) a tendência ao
avanço temerário na construção econômica cresceu sem cessar.[44]
Em fins de 1971, apareceu o problema do “sobre-cumprimento” do
Plano previamente definido em três aspectos: o número de
operários e empregados ultrapassou os 50 milhões, a soma dos
salários superou os 30 bilhões de yuans e as vendas de
cereais os 80 bilhões de jins. As conseqüências foram um
grave desequilíbrio nas relações proporcionais da economia
nacional, um grave desabastecimento no mercado e o descenso do
nível de vida do povo.
Entre 1972 e 1973, o Conselho de Estado – sob o comando de Zhou
Enlai – adotou uma série de medidas para reajustar a economia
nacional. Mesmo sem conseguir erradicar os fundamentos
esquerdistas da Revolução Cultural, que prosseguia, ao
fim de dois anos de reajustes a situação econômica melhorou
sensivelmente. Tanto que em 1973 a produção industrial aumentou
9,2% em relação ao ano anterior e a renda nacional cresceu 8,3%.
6.6 - OS ANOS FINAIS DA REVOLUÇÃO CULTURAL
|
Zhou Enlai em nome do Comitê Central
apresenta o relatório político no décimo
Congresso Nacional do PCCh em agosto de
1973. |
|
O
10º Congresso do PCCh, realizado em agosto de 1973, manteve
muitos dos erros “esquerdistas” do Congresso anterior. É verdade
que alguns quadros veteranos, que haviam sido perseguidos e
afastados de todas as tarefas de responsabilidade, foram
reconduzidos ao Comitê Central. Em contrapartida, os principais
elementos da facção de Jiang Qing foram eleitos para o CC, em
número ainda maior. Tanto que, após o X Congresso, formou-se no
Birô Político do Comitê Central o que mais adiante, veio a ser
denominado o “bando dos quatro”, composto por Jiang Qing, Zhang
Chunqiao, Yao Wenyuan e Wang Hongwen.
Em janeiro de 1974, sob a orientação de Mao, o CC do PCCh lançou
uma campanha para a “crítica a Lin Biao e a Confúcio”.
Jiang Qin e seu grupo viram nela uma forma de conquistar a
hegemonia sobre o Partido e afastarem os dirigentes da velha
geração. Assim, voltaram o gume de suas críticas contra Zhou
Enlai, Ye Jianying e outros.
Novamente o Partido e o Governo se viram paralisados pelas
disputas e a produção industrial voltou a decair. Mao, mesmo
apoiando a campanha de crítica a Lin Biao e Confúcio,
compreendeu que não convinha um novo caos social de grande
envergadura (“Agora, quando a Grande Revolução Cultural já
alcança oito anos, convém a estabilidade. Todo o Partido e todo
o Exército devem unir-se.”[45]).
Assim, procurou manter a situação sob o controle do Partido e
inclusive admoestou Jiang Qing e outros que utilizavam dessa
campanha de crítica com interesses particulares: “Deixa já de
criar essas duas fábricas, a de ferro e aço e a de etiquetas,
tremendas etiquetas que sem motivo algum colocas aos demais.
(...) Ela não representa a mim, senão a si mesma. (...) Tenham
cuidado e não cheguem a formar uma pequena fração de quatro
pessoas!”[46]
As críticas de Mao ao grupo de Jiang Qing, a designação do
trabalho rotineiro do Comitê Central do Partido e do Governo a
Zhou EnLai e a nomeação de Deng Xiaoping para importantes cargos
– “Deng Xiaoping é forte no político e no ideológico, é
talentoso como poucos. Deve assumir três cargos: primeiro
vice-primeiro ministro, vice-presidente da Comissão Militar e
Chefe do Estado Maior Geral”[47]
–, serviram de dique às articulações do “bando dos quatro” e
assegurou uma exitosa convocação da 4ª Assembléia Popular
Nacional, que reuniu-se de 13 a 17 de janeiro de 1975, em
Beijing.
Coroando uma longa discussão dentro do Partido e do Estado, a 4ª
Assembléia aprovou uma nova Constituição, tendo como principais
pontos:
a) a definição da
República Popular da China como um “Estado Socialista de
Ditadura do Proletariado”; b) a afirmação da supremacia do
Partido sobre o exército e do Estado sobre os indivíduos; e c) a
autorização das atividades privadas e a garantia à propriedade
dos rendimentos do trabalho (apesar de não reconhecer a
propriedade privada dos meios de produção.)[48]
No seu informe sobre o trabalho do Governo, Zhou Enlai voltou a
apresentar a concepção dos “dois passos” para a construção do
socialismo na China, formulada pela primeira vez em dezembro de
1964, na 3ª Assembléia Popular Nacional:
Como primeiro
passo, em um prazo de 15 anos, isto é, antes de 1980, concluir a
construção de um sistema industrial e um sistema de economia
nacional independentes e relativamente completos; e, como
segundo passo, dentro do presente século, levar a cabo, em todos
os aspectos, a modernização da agricultura, da industria, da
defesa nacional e da ciência e da tecnologia, colocando assim a
nossa economia nos primeiros postos do mundo.[49]
Zhu De foi eleito Presidente do Comitê Permanente da Assembléia
Popular Nacional que manteve Zhou Enlai como Primeiro Ministro
do Conselho de Estado. Deng Xiaoping, Zhang Chunqiao, Li
Xiannian, Hua Guofeng e outros oito dirigentes foram eleitos
vice-primeiros ministros e a Assembléia deliberou que o Conselho
de Estado tivesse como núcleo Zhou Enlai e Deng Xiaoping.
Em função do agravamento da doença de Zhou Enlai, a nova equipe
teve em Deng Xiaoping seu principal dirigente. Com o apoio de
outros quadros veteranos, Deng Xiaoping desenvolveu grandes
esforços pelo reordenamento econômico, com o que a situação
econômica melhorou rapidamente. Assim, em 1975 o valor global da
produção industrial e agrícola aumentou 11,9% em relação ao ano
anterior (15,1% a industrial e 4,6% a agrícola).
No início de 1975, Jiang Qing e seu grupo retomaram os ataques a
Zhou Enlai e a Deng Xiaoping, utilizando para isso de opiniões
emitidas por Mao Zedong em fins de 1974:
De imediato, foi
lançada em todo o país uma campanha de estudo dessas opiniões.
Sob a batuta do “bando dos quatro”, a imprensa publicou grande
quantidade de artigos que impugnavam o “empirismo”, conclamavam
a “romper com o direito burguês” e instigavam a “assaltar as
aldeias fortificadas”. Eles condenaram como “empirismo” as
diversas medidas implementadas no trabalho de reordenamento, com
o objetivo de atacar a Zhou Enlai, Deng Xiaoping e outros
dirigentes do Partido e do Estado (...) ao dar-se conta, em
certo grau, da intenção maligna do “bando dos quatro” em sua
oposição ao “empirismo”, Mao a criticou.[50]
Em novembro de 1975, Mao, já bastante enfermo e isolado, acolheu
acusações que Jiang Qing e seu grupo fizeram contra Deng
Xiaoping e o afastou da maioria de suas atividades. A China
entrou novamente em um período de exacerbamento da luta
ideológica e os dirigentes partidários foram convocados a
estudar as últimas palestras de Mao Zedong:
Nessas palestras, Mao Zedong reafirmou uma vez mais que “a luta
de classes é como a corda chave de uma rede, e tudo mais são
malhas”. Disse mais: “O que faz a Grande Revolução Cultural?
Justamente a luta de classes”; e a razão porque alguns quadros
veteranos mostravam-se descontentes com essa “revolução” era que
“ainda estavam atolados ideologicamente na etapa da revolução
democrática burguesa”. “Se está fazendo a revolução socialista
e, entretanto, não se sabe onde está a burguesia. Ela está
justamente dentro do Partido Comunista, trata-se dos dirigentes
seguidores do caminho capitalista no Partido”.[51]
Em 8 janeiro de 1976, faleceu Zhou Enlai, aos 78 anos de idade,
causando grande comoção popular. Em fevereiro, Hua Guofeng foi
indicado por Mao para Primeiro Ministro Interino do Conselho de
Estado e Primeiro Vice-Presidente do Comitê Central do PCCh, com
a responsabilidade das atividades rotineiras do CC.
Por ocasião do “Dia da Claridade” (4 de abril no ano lunar
chinês de 1976), dedicado a reverenciar os antepassados, uma
multidão vinda de diversas partes do país lotou a Praça
Tian’anmen para homenagear Zhou Enlai e depositar no memorial
aos mártires da revolução chinesa coroas de flores, estandartes,
poemas, cartazes e flores. No dia seguinte, uma nova multidão
reuniu-se no memorial e ao descobrir que os tributos do dia
anterior haviam sido removidos pela polícia, realizaram
protestos massivos que geraram tumultos e agressões durante
diversos dias. Deng foi acusado de estar por traz dessas
manifestações e destituído em 7 de abril de todos os seus
cargos, dentro e fora do Partido:
Hua Guofeng
(herdeiro direto de Mao Zedong) promoveu uma verdadeira campanha
de massa contra a “reabilitação da direita”, personificada por
Deng Xiaoping, que foi obrigado a deixar temporariamente a cena
política. Um novo embate entre as diferentes facções iniciou-se
e, em abril, o Comitê Central do PCC destituiu Deng de suas
funções políticas instituindo Hua como primeiro-ministro e
vice-presidente do Comitê Central. Contudo, o poder instituído
de Hua era demasiado frágil, principalmente em função da
popularidade dos moderados e da forte oposição à “esquerda
oficial”.[52]
No início de julho, morreu Zhu De, aos 90 anos. No dia 9 de
setembro, faleceu Mao Zedong, causando grande comoção popular.
Poucos dias depois, iniciou-se a luta pela sucessão:
Se foi Hua
Guofeng que fez o elogio fúnebre final e recebeu assim a maior
atenção do público, os quatro líderes radicais da Revolução
Cultural também estavam bem visíveis. Wang Hongwen presidiu as
cerimônias finais e Zhang Chunqiao foi o diretor da comissão do
funeral. Jiang Qing, acompanhada por seus filhos e os de Mao,
ocupou lugar de destaque no funeral, e as câmaras também
enfocaram Yao Wenyuan.[53]
Segundo a Breve História do Partido Comunista da China:
No dia 11 de
setembro, Wang Hongwen, passando por cima (...) do Comitê
Central, instalou-se em Zhonnanhai e notificou aos comitês das
províncias, municípios e regiões autônomas do Partido que,
sempre que se tratasse de problemas importantes, deviam informar
e pedir instruções (...) Além disso, o “bando dos quatro”
instruiu os seus seguidores para que acelerassem os preparativos
para armar os milicianos de Shangai em respaldo à sua tomada do
poder. (...) Hua Guofeng (...) tendo obtido a concordância da
maioria dos camaradas do Birô Político do Comitê Central,
decidiu tomar medidas resolutas. Na noite do 6 de outubro (...)
ordenaram submeter à investigação Jiang Qing, Zhang Chunqiao,
Wang Hongwen, Yao Wenyuan (...) Na mesma noite reuniu-se o
Comitê Central (...) A reunião aprovou também a decisão de
nomear a Hua Guofeng Presidente do CC do PCCh e Presidente da
Comissão Militar do Comitê Central (...).[54]
Concluíam-se, dessa forma, dez anos da Revolução Cultural.
A sociedade chinesa encontrava-se cansada do constante
tensionamento de forças. A ciência e o ensino da China haviam
sofrido sérios danos. O processo produtivo havia sofrido
importantes perdas econômicas e o nível de vida do povo havia
diminuído. As estruturas do Estado e do Partido estavam
debilitadas. O Partido e o povo ansiavam por um novo rumo para o
país.
7 - A TRANSIÇÃO PÓS REVOLUÇÃO CULTURAL (1977/1978)
Tão logo assumiu, Hua Guofeng lançou uma campanha contra os
“ultra-esquerdistas” (o “bando dos quatro”) e contra os
“direitistas” liderados por Deng Xiaoping, mas logo teve que se
reconciliar com esses últimos, para poder governar.
Assim, o primeiro semestre de 1977 foi marcado pela
estabilização da situação nacional e pela revisão das punições
realizadas sob a égide do “bando dos quatro”.
7.1 - A REABILITAÇÃO DE DENG XIAOPING
Já na reunião de trabalho do Comitê Central, de março de 1977,
Chen Yun colocou por escrito a necessidade da reabilitação de
Deng Xiaoping e do seu retorno ao seu posto de trabalho. Wang
Zhen expressou a mesma opinião. Mas será somente na 3ª Sessão
Plenária do 1º Comitê Central, realizada em julho de 1977, que
Deng Xiaoping será reabilitado e reassumirá os cargos de membro
do Comitê Permanente do Birô Político do CC do PCCh,
vice-presidente da Comissão Militar do CC, vice-primeiro
ministro do Conselho de Estado e chefe do Estado Maior Geral do
Exército Popular. Nessa mesma reunião, foram expulsos do Partido
Wang Hongwen, Zhang Chunqiao, Jiang Qing e Yao Wenyuan.
Deng Xiaoping voltou-se ao trabalho no âmbito das ciências, da
tecnologia e da educação, enfatizando que “a ciência e a
tecnologia são forças produtivas” e procurando romper com a
postura “esquerdista” e sectária em relação aos trabalhadores
intelectuais e buscando criar estímulos para as suas atividades:
“Os cientistas mandados para o campo em anos passados
deveriam ser chamados de volta e designados novamente para
cargos profissionais. (...) Durante 1978, um grupo preliminar de
480 estudantes chineses foi mandado a 28 países para estudar”.[55]
No final de 1977 foi restabelecido o sistema de exames nas
escolas, que havia sido abolido pela Revolução Cultural.
Em seguida, depois de resolver os problemas mais urgentes no
terreno dos transportes, das comunicações e da produção
industrial e mineira, Deng Xiaoping dedicou-se ao reordenamento
das empresas, estabeleceu novas normas e regulamentos e retomou
o crescimento econômico. Os primeiros resultados mostraram o
acerto da nova orientação: no ano de 1977, o valor global da
produção industrial cresceu 14,3% em relação ao ano anterior e
pela primeira vez em dez anos 60% dos operários e dos empregados
tiveram aumentos de salários.
Em agosto de 1977, realizou-se o 11º Congresso do PC Chinês que
declarou o fim da Revolução Cultural e colocou como a
tarefa fundamental do novo período a conversão da China em um
moderno e poderoso país socialista. O novo Comitê Central elegeu
Hua Guofeng como seu Presidente e Deng Xiaoping, Ye Jianying, Li
Xiannian e Wang Dongxing como seus vice-presidentes:
O retorno de Deng
às suas funções de vice-primeiro ministro, chefe do estado maior
do exército e membro do birô político do PCC, bem como o de seus
aliados (velhos quadros alijados do poder na Revolução Cultural)
foi consagrado no 11º Congresso, em agosto de 1977. Esse
Congresso foi marcado pela ambivalência de legitimar o poder de
Hua Guofeng e, ao mesmo tempo, indicar o início do seu declínio.
Apesar de evidente, a ascensão de Deng e, conseqüentemente, a
vitória do seu projeto modernizador, foram resultados de uma
acirrada disputa política com Hua Guofeng, na qual os elementos
centrais da discussão eram concernentes às vantagens e
desvantagens do processo de abertura.[56]
No primeiro trimestre de 1978, realizou-se a 1ª Sessão da 5ª
Assembléia Popular Nacional. Ye Jianying foi eleito seu
presidente, Hua Guofeng Primeiro Ministro do Conselho de Estado,
Deng Xiaoping, e outros onze dirigente, como vice-primeiros
ministros.
7.2 - AS AMBIGÜIDADES DE HUA GUOFENG E O “TODOÍSMO”
|
Plenária do 11º Congresso do PC da China, os
dois
retratos na parede são de Mao e Hua Guofeng. |
|
O
11º Congresso tinha como principal tarefa elaborar uma linha e
uma orientação corretas para a nova etapa que se iniciava com o
fim da Revolução Cultural, mas não foi capaz disso pelas
próprias características do momento – de transição – e,
principalmente, pelas debilidades e ambigüidades do principal
dirigente, Hua GuoFeng:
Ainda que Hua
Guofeng tivesse méritos na luta pelo esmagamento da camarilha
contra-revolucionária de Jiang Qing e tivesse tentado pôr freio
ao caos produzido pela “Revolução Cultural”, não chegou a
esclarecer pela raiz o problema dessa revolução e, em especial,
não conseguiu formar uma consciência clara sobre a relação entre
dita revolução e os erros cometidos por Mao Zedong nos últimos
anos de sua vida. Não tinha nem a perspicácia nem a coragem para
resolver o complicado problema consistente em eliminar
cabalmente o erro que implicou a “revolução cultural” e, ao
mesmo tempo, defender a posição histórica de Mao Zedong e a
posição do seu pensamento como pensamento guia do Partido. (...)
Hua GuoFeng seguia persistindo (...) em “tomar como elo
principal a luta de classes” e na “continuação da revolução sob
a ditadura do proletariado”, teorias pregadas durante a
“revolução cultural”. (...) Essa sua idéia se expressou em forma
concentrada em duas frases que são: “devemos manter com firmeza
todas as decisões tomadas pelo presidente Mao e seguir
invariavelmente todas suas instruções” Na realidade, esse
“todoísmo”, para chamá-lo de alguma maneira, que rechaçava
qualquer análise, longe de defender a posição histórica de Mao
Zedong e a autoridade de seu pensamento, as prejudicava.[57]
7.3 - “AVANÇO TEMERÁRIO BASEADO NO ESTRANGEIRO” DE HUA GUOFENG
No terreno econômico, Hua Guofeng – que não havia rompido
essencialmente com a concepção da Revolução Cultural –
defendia um projeto de desenvolvimento de caráter “ortodoxo”,
centrado na planificação, altas taxas de acumulação, maior
controle das empresas pelo Estado, maior regulamentação do
trabalho e uma remuneração de forte conteúdo “igualitarista”.
Ainda que o Governo de Hua Guofeng tenha tido o mérito de tirar
o país do estado de semi-paralização em que encontrava desde a
Revolução Cultural, cometeu o erro do “avanço temerário”,
na busca de êxitos rápidos e de altos ritmos de crescimento, de
forma unilateral. Expressando a visão “esquerdista” que ainda
existia no novo governo chinês, um informe do Conselho de
Estado, publicado em julho de 1977, afirmava: “está se
iniciando a situação de um novo salto adiante na economia
nacional”.[58]
Foram propostas metas extremamente exageradas e inviáveis no
âmbito da mecanização agrícola, produção de grãos, petróleo,
carvão, aço e indústria química. O Programa Decenal de
Desenvolvimento Econômico apresentado por Hua Guofeng no
início de 1978 exigiria – só para os oito anos compreendidos
entre 1978 e 1985 – investimentos equivalentes ao que havia sido
investido durante os 28 anos anteriores. Para isso, os fundos de
acumulação foram elevados para 36,5%, reduzindo-se os fundos
para o consumo. Para tornar isso possível, Hua Guofeng
introduziu tecnologias e equipamentos do exterior, tomando
empréstimos em quantidade excessiva, na expectativa de pagá-los
com exportações crescentes de petróleo. Os críticos desse
processo passaram a denominá-lo “avanço temerário baseado no
estrangeiro”:
Este “avanço”
ocorreu em momentos em que a economia nacional (...) necessitava
urgentemente um período de recuperação e repouso. Era como pedir
a um convalescente de uma grave enfermidade que se lançasse a
correr em alta velocidade; o resultado não podia ser senão o
contrário do desejado. Como o “avanço temerário baseado no
estrangeiro” ia em detrimento do princípio do desenvolvimento da
economia nacional de forma proporcional e dava, unilateralmente,
importância ao aço, ao petróleo, à indústria química e a outros
setores da indústria pesada, na busca de um alto ritmo de
crescimento, uma alta taxa de acumulação de fundos e uma alta
quantidade de inversões, não contribuiu, obviamente, para mudar
o anormal estado de desarmonia nas relações proporcionais da
economia nacional, mas só serviu para agravá-lo.[59]
7.4 - “A PRÁTICA COMO CRITÉRIO DA VERDADE” E A ASCENSÃO DE DENG
Já em abril de 1977, antes mesmo de ser reabilitado, Deng
Xiaoping criticou a visão existente de que todo o pensamento de
Mao Zedong era uma “verdade absoluta” e a necessidade de nele
distinguir o “correto” do “errôneo”, colocando a prática como o
único critério da verdade. Durante o ano de 1977, Deng
aprofundou em diversas ocasiões a sua crítica ao “todoísmo”,
mostrando nele a persistência de idéias equivocadas. No primeiro
semestre de 1978, desenvolveu-se em todo o Partido um grande
debate em torno dessas questões, apesar da opinião contrária a
esse debate de Hua Guofenge de Wang Dongxing.
Aos poucos, com o apoio de prestigiados quadros dirigentes –
como Chen Yun, Ye Jianying, Li Xiannian, Hu Yaobang, Nie
Rongzhen e outros –, as opiniões de Deng Xiaoping foram ganhando
o conjunto do Partido que começava a compreender a necessidade
de uma ruptura definitiva com as concepções esquerdistas da
Revolução Cultural e de uma justa avaliação dos erros e
acertos de Mao Zedong, rompendo com qualquer dogmatismo ou
“culto da personalidade”:
Em diferentes
ocasiões, puseram ênfase no princípio de buscar a verdade nos
fatos (...) e reafirmaram que na construção econômica se devia
atuar dentro dos limites das forças disponíveis e fazer esforços
para conter e superar a tendência “esquerdista” que ainda
subsistia. (...) Deng Xiaoping assinalou que se alguém se
opusesse a buscar a verdade nos fatos, não restaria nada do
marxismo-leninismo e do pensamento de Mao Zedong, e que isso só
nos conduziria ao idealismo e à metafísica, acarretaria
prejuízos ao nosso trabalho e derrotas à revolução. Portanto,
pronunciou-se a favor de “eliminar as perniciosas influências
deixadas por Lin Biao e o ‘bando dos quatro’, endireitar o
torcido, romper as cadeias espirituais e emancipar em grande
medida a nossa mente.[60]
8
- AS REFORMAS ECONÔMICAS NA CHINA A PARTIR DE 1978
8.1 - A GRANDE VIRAGEM DA 3ª SESSÃO PLENÁRIA DO 11º COMITÊ
CENTRAL
|
O 11º Comitê Central do Partido Comunista da
China realizou sua terceira sessão plenária
em Pequim entre 18 e 22 de dezembro de 1978.
Participaram 169 membros e 112 suplentes do
Comitê Central. Hua Guofeng, presidente do
Comitê Central do PCC, e Ye Zhenying, Deng
Xiaoping, Li Xiannian, Chen Yun e Wang
Dongxing, vice-presidentes, estavam
presentes. |
|
A
3ª Sessão Plenária do 11o Comitê Central
do PCCh – realizada entre 18 e 22 de dezembro de 1978 – foi um
momento de viragem na história da China.
Anteriormente à Sessão Plenária, ocorreu uma reunião de trabalho
do Comitê Central. Nessa ocasião, Chen Yun e diversos outros
dirigentes da velha geração revolucionária defenderam a
necessidade da correção em diversos terrenos dos erros da
Revolução Cultural e a revogação das condenações injustas.
Dessa forma, a proposta de Hua Guofeng de fazer uma discussão
unicamente econômica foi superada pela proposta de Deng de
priorizar uma discussão mais geral de balanço dos erros da
Revolução Cultural e de retificação dos rumos da construção
socialista na China.
Ao final da reunião Deng Xiaoping fez um importante discurso
intitulado “Emancipar a mente, atuar em função da realidade e
olhar unidos para frente”, dando as diretrizes fundamentais
para a 3a Sessão Plenária.
8.1.1 - As “Quatro Modernizações” e o “Socialismo de Tipo
Chinês”
Depois de quase trinta anos de aplicação de um modelo econômico
de inspiração soviética, de planificação ultra-centralizada,
estatização total dos meios de produção e uniformidade de
distributiva, a economia chinesa carecia de agilidade e estava
burocratizada. Na medida em que o nível tecnológico a eficiência
econômica ficavam a desejar e as leis do mercado e do valor não
eram consideradas, muitas estatais viviam em uma situação de
permanente intervenção governamental. A ação governamental se
confundia com a da gerência das empresas, retirando dessas
qualquer autonomia de gestão. No campo, as comunas populares –
onde uma elevadíssima coletivização da produção e da vida em
comum convivia com um baixíssimo nível das forças produtivas –
desestimulavam o empenho e a iniciativa dos camponeses. A
distribuição de rendimentos orientava-se mais pelo
“igualitarismo” do que pelo princípio socialista de “a cada um
segundo seu trabalho”, fazendo decair a emulação socialista.
Após um amplo debate acerca dos estrangulamentos econômicos,
políticos, culturais e tecnológicos que dificultavam o avanço da
China, a Sessão Plenária aprovou a proposta de Deng Xiaoping de
uma profunda Reforma do país, que passou a ser conhecida
como a política das “Quatro Modernizações”; uma estratégia de
desenvolvimento a longo prazo nas esferas econômica, política,
militar e cultural, que podem ser sistematizadas nos seguintes
pontos:
1)
Modernização industrial: desenvolvimento concentrado em alguns
setores, com prioridade para a indústria pesada; aquisição no
exterior de tecnologia de ponta; regulamentação das relações de
trabalho; ênfase no aumento da produtividade, com retorno aos
incentivos materiais segundo o rendimento do trabalho.
2)
Modernização agrícola: desenvolvimento tecnológico e
mecanização acelerada; sistema de responsabilidade na produção,
fixando cotas de trabalho por grupo ou família (recuo em relação
à “propriedade de todo o povo” das comunas populares) e
ampliação dos incentivos materiais.
3)
Modernização tecnológica e educacional, pondo os princípios da
eficácia e da produtividade como parâmetros fundamentais;
seleção dos mais aptos e valorização do saber formal.
4)
Modernização da defesa: profissionalização das Forças Armadas;
modernização e sofisticação dos equipamentos; treinamento
avançado.[61]
Diante dos escassos recursos disponíveis, Deng Xiaoping
enfatizou a necessidade da concentração de esforços nos projetos
energéticos e de transportes e na agricultura:
É preciso
estabelecer uma ordem de prioridade nos projetos e não
acometê-lo todos ao mesmo tempo. (...) Se há escassez de
recursos financeiros e materiais, preferimos reduzir os projetos
de caráter local, sobretudo os das indústrias de transformação
de tipo corrente. Pouco ajuda realizar projetos desse tipo, por
mais numerosos que sejam. (...) Durante os primeiros anos, é
preciso empenhar-se sem vacilações nos projetos de energéticos,
como o carvão, a energia elétrica e o petróleo, nos projetos de
transporte, sem que se permita demora alguma. (...) o ponto de
ênfase está nos energéticos e o transporte, assim como na
agricultura. O desenvolvimento dessa última depende, em primeiro
lugar, da política que se aplique e, em segundo lugar, da
ciência. É infinito o desenvolvimento da ciência e da
tecnologia, assim como o papel que desempenham.[62]
As resoluções da Sessão Plenária também referendaram as
consignas de “emancipar a mente e eliminar o esclerosamento
ideológico”, “romper com o culto aos livros”, “partir
da realidade” e considerar “a prática como o único
critério da verdade”:
Só emancipando a
mente e eliminando o estancamento ideológico de “esquerda” se
cumpriria, no verdadeiro sentido da palavra a grandiosa tarefa
histórica de transladar a modernização no centro de gravidade do
trabalho de todo o Partido. O Comunicado da Sessão Plenária
assinalou: “A realização das quatro modernizações exige que se
elevem em grande medida as forças produtivas e pressupõe, como é
lógico, mudar em muitos aspectos aquilo que nas relações de
produção e na superestrutura não concorde com o desenvolvimento
das forças produtivas, assim como toda forma de administração,
atuação ou pensamento que resulte inadequada.[63]
No fundo, isso queria dizer que o Partido precisava romper com
todo forma de dogmatismo (o “todoísmo” era uma das expressões
disso) e desatrelar-se de quaisquer modelos de construção do
socialismo – especialmente do modelo soviético – buscando um
caminho de construção do socialismo que tivesse em conta as
particularidades da China, o que depois veio a ser conhecido
como “socialismo de tipo chinês” ou “socialismo com
peculiaridades chinesas”: “temos reafirmado repetidas vezes a
necessidade de persistir no marxismo e no caminho socialista.
Mas há de ser um marxismo integrado com a realidade da China e
um socialismo que corresponda à realidade do país e que tenha
peculiaridades próprias da China.”[64]
8.1.2 - Ampliar a democracia, reforçar a legalidade,
descentralizar
Deng Xiaoping expôs a opinião de que para garantir o avanço do
socialismo era indispensável a ampliação da democracia no seio
do Partido e na sociedade: “a democracia é uma condição
importante para a emancipação mental. (...) [sem democracia]
como será possível propugnar a emancipação mental e o uso da
inteligência? Como serão levadas à prática as quatro
modernizações?”[65]
Sem debilitar a ditadura do proletariado, era essencial
distinguir as contradições no seio do povo das contradições
entre o povo e seus inimigos. Para garantir a democracia
popular, era preciso reforçar o sistema legal socialista, de
forma que as instituições e as leis tivessem caráter estável e
contínuo, garantindo a todos a igualdade perante a lei.
Além de situar a questão da democracia política, Deng colocou a
questão da democracia no âmbito econômico, criticou a excessiva
centralização das decisões e defendeu a descentralização de
forma planificada, visando favorecer o pleno desenvolvimento da
iniciativa nos quatro setores, isto é, o Estado, as autoridades
locais, as empresas e os trabalhadores enquanto indivíduos,
indicando que o mais urgente nesse momento era ampliar os
direitos autônomos das fábricas, minas, empresas e equipes de
produção, para que cada um deles fizesse todo o possível para
fazer valer a sua iniciativa criadora. Para isso, fazia-se
necessário simplificar com energia os organismos de
administração econômica nos diversos níveis, trabalhar de acordo
com as leis econômicas, respeitar a lei do valor e resolver o
problema da confusão entre o Partido, a administração pública e
as empresas.
8.1.3 - Romper com o “igualitarismo” e instituir a remuneração
segundo o trabalho
A
Sessão Plenária também reconheceu a enorme importância da
agricultura, base da economia chinesa. Para colocar em jogo o
entusiasmo de centenas de milhões de camponeses, elevou os
preços de compra dos cereais pelo Estado e reduziu os preços de
venda de diversos artigos industriais de uso agrícola. Ao mesmo
tempo, colocou a necessidade da superação do “igualitarismo” no
campo, estabeleceu um sistema de responsabilidade na produção,
fixando cotas de trabalho tendo por base o grupo ou a família, e
incentivou a remuneração em função do rendimento.
Deng Xiaoping também indicou a necessidade de romper com o
“igualitarismo” em todos os campos, incentivando os exemplos
positivos através de maiores ganhos salariais e do desfrute de
uma vida melhor:
me parece
necessário permitir que uma parte das zonas do país, uma parte
das empresas e uma parte dos operários e camponeses tomem a
dianteira na obtenção de maiores ganhos e de uma vida melhor,
graças aos melhores resultados obtidos com duros esforços. O
fato que uma parte da gente tome a dianteira em viver melhor
será um exemplo de incalculável força de atração, que influirá
em seus vizinhos e impulsionará as pessoas de outras zonas e
entidades a seguir seu exemplo. E isto, por sua vez, contribuirá
para um incessante avanço ondulatório de toda economia (...).[66]
A
Sessão Plenária formulou uma política de Abertura ao
exterior que corrigisse os erros do “avanço temerário baseado no
estrangeiro” e enfatizou a importância da ciência e da educação
para a edificação socialista: “necessidade
de desenvolver, baseando-se nas próprias forças e de forma
ativa, a cooperação econômica com os diversos países de mundo,
segundo o princípio de igualdade e benefício recíproco, fazer
esforços para utilizar as tecnologias e equipamentos avançados
do mundo e reforçar com energia o trabalho científico e
educacional (...)”
[67]
8.1.4 – Eliminar o “Culto à Personalidade” e fortalecer o
Partido
Para fortalecer o centralismo democrático, corrigir os desvios
ocorridos e eliminar qualquer “culto à personalidade”, a Sessão
Plenária enfatizou a importância da direção coletiva em todos os
níveis do Partido e exigiu que os meios de comunicação e as
obras artísticas e literárias elogiassem menos os indivíduos e
mais as massas operárias, camponesas e de soldados, o Partido e
a velha geração de revolucionários. Para preservar as normas e
os regulamentos do Partido, foi eleita uma Comissão Central de
Controle Disciplinar, tendo como seu primeiro secretário o
veterano Chen Yun.
A
Sessão Plenária também procurou fazer um balanço inicial do
período mais recente da história do PCCh, principalmente da
Revolução Cultural, anulando documentos errôneos,
anteriormente aprovados pelo CC, e reabilitando camaradas que
teriam sido injustamente condenados, atendo-se ao princípio de “buscar
a verdade nos fatos e corrigir todos os erros descobertos”:
Que a correção
dos erros “esquerdistas” da “Revolução Cultural” e do período
anterior a ela conduzisse ou não à negação de Mao Zedong e de
seu pensamento, era um problema que deixava algumas pessoas
perplexas. A Sessão Plenária (...) partia da realidade histórica
para fazer uma plena apreciação dos grandes méritos de Mao
Zedong e assinalou que a aspiração a que um líder revolucionário
estivesse isento de todo defeito e erro não concordava com o
marxismo, nem com a apreciação que o camarada Mao sempre havia
feito de si mesmo.[68]
A
Sessão Plenária fez diversas alterações na composição do Comitê
Central, no seu Birô Político e na Comissão Permanente do mesmo.
Ainda que Hua Guofeng continuasse desempenhando o cargo de
Presidente do Comitê Central (Hu Yaobang foi nomeado pouco
depois Secretário Geral, com a responsabilidade do trabalho
cotidiano do CC), Deng Xiaoping tornou-se de fato o principal
dirigente do Partido.
A
partir dessas alterações, o Partido envidou esforços para
superar os defeitos no seu estilo de trabalho: “as principais
mazelas são o burocratismo, a excessiva centralização de
poderes, o patriarcalismo, o sistema de cargos vitalícios de
direção e a presença de todo tipo de prerrogativas elitistas.”[69]
Especial atenção foi dada à política de renovação dos quadros de
direção – que em nível do Comitê Central eram de idade bastante
avançada – através da aposentadoria compulsória de dirigentes
veteranos e da seleção e promoção de quadros jovens e de meia
idade, tendo em conta a sua capacidade e fidelidade à causa
socialista e ao Partido.
8.2 - O DESENVOLVIMENTO DAS FORÇAS PRODUTIVAS COMO CENTRO
Para “tomar o desenvolvimento das forças produtivas como o
elo principal” e fazer da modernização socialista o centro
de gravidade do trabalho, era preciso superar as concepções
“esquerdistas” acerca da relação entre a construção econômica e
a luta de classes, descartando a consigna de “tomar a luta de
classes como o elo principal”:
Em Março de 1979,
Deng Xiaoping afirmou: “É muito baixo o nível de desenvolvimento
de nossas forças produtivas e está longe de satisfazer as
necessidades do povo e do Estado, e esta é a contradição
principal que enfrentamos no presente período e a sua solução
constitui a nossa tarefa central.” Desde logo, isso não queria
dizer que daí em diante não houvesse luta de classe: “A luta de
classes na sociedade socialista é algo que existe objetivamente,
e não devemos nem diminuí-la, nem exagerá-la.”[70]
Não existe maior absurdo do que a gritaria do “bando dos quatro”
que exaltava um “socialismo da pobreza” e um “comunismo da
pobreza”, assim como sua falácia de que o comunismo é
essencialmente espiritual. O que nós sustentamos é que o
socialismo é a primeira fase do comunismo. Quando se constrói o
socialismo em um país atrasado, durante um longo período inicial
o nível de suas forças produtivas permanece inferior ao dos
países capitalistas desenvolvidos e é impossível acabar por
completo com a pobreza. É por isso que o socialismo pressupõe a
necessidade de desenvolver energicamente as forças produtivas,
eliminando passo a passo a pobreza e elevando sem cessar o nível
de vida do povo. De outra maneira, como vai o socialismo vencer
o capitalismo? Só na segunda fase, a fase superior do comunismo,
com um alto desenvolvimento da economia e com a abundância das
riquezas materiais, será possível aplicar o princípio “de cada
um segundo as suas capacidades e a cada um segundo as suas
necessidades”. (...) Por isso, sublinhei a necessidade de
transladar resoluta e rapidamente o centro de gravidade do nosso
trabalho para a construção econômica. O problema ficou resolvido
na 3ª Sessão Plenária do 11º Comitê Central, o que significou um
transcendental ponto de viragem.[71]
Diante dessa revisão dos erros da Revolução Cultural,
desse chamamento a tomar o desenvolvimento das forças produtivas
como o elo principal, a romper com todo dogmatismo e “culto à
personalidade”, a “emancipar a mente” para dar solução aos novos
problemas, surgiram dentro do Partido e na sociedade chinesa
pessoas que começaram a negar o papel do Partido Comunista, do
marxismo e do próprio socialismo e – em nome da “democracia” e
dos “direitos humanos” – passaram a defender o capitalismo e a
democracia liberal.
A eclosão do
“movimento democrático” foi o principal motor para o fim das
disputas internas, produzindo um resultado favorável a Deng
Xiaoping. (...) A democracia passou a ser caracterizada como a
“Quinta Modernização”. Ao longo de 1978, o movimento se
radicalizou, alastrando-se para as principais cidades do país. À
causa democrática, agregaram-se questões relativas aos “direitos
do homem chinês” e, no início de 1979, as contestações contra a
opressão e por uma maior abertura ganharam novo vigor (a
celebração da morte de Zhou Enlai, em janeiro de 1979, foi
marcada por vários atos de oposição ao regime). O governo, em
contrapartida, promoveu uma forte repressão(...).[72]
Em março de 1979, fazendo frente aos ventos liberalizantes, o
Partido definiu os “Quatro Princípios Fundamentais” que deveriam
nortear as quatro modernizações: 1) O caminho socialista; 2) A
ditadura democrática popular; 3) A direção do Partido Comunista;
4) O marxismo-leninismo e o pensamento Mao Zedong.
8.2.1 - O balanço sobre o papel de Mao Zedong e os reajustes na
direção do Partido
O
balanço da atuação de Mão Zedong durante os diversos períodos da
revolução chinesa, que havia sido iniciado na 3a
Sessão Plenária, só foi concluído na 6a Sessão
Plenária do 11o Comitê Central, realizada em junho de
1981, através da “Resolução sobre alguns problemas da história
do PCCh”. Essa questão era, sem dúvida, um sério problema que
enquanto não fosse solucionado entorpeceria o avanço no sentido
das Reformas e da Abertura:
A Resolução
assinalou que a história do Partido Comunista da China no
período posterior à proclamação da República Popular da China
era, em termos gerais, um processo em que, sob a direção do
marxismo-leninismo e do pensamento de Mao Zedong, o nosso
Partido conduziu o povo de todas as nacionalidades do nosso país
na revolução e construção socialistas, com grandes êxitos. (...)
cometemos erros, tais como nos excedermos na luta de classes,
trabalhar com impaciência, avançar temerariamente na construção
econômica e, até, fazer a “revolução cultural”, grave erro que
durou um longo tempo e que comprometeu a situação no seu
conjunto. Mas, de toda maneira, os êxitos que obtivemos durante
os 32 anos ocupavam o primeiro lugar. (...) A Resolução (...)
indicou que Mao Zedong foi um grande marxista, um grande
revolucionário, estrategista e teórico do proletariado. Olhando
o conjunto da sua trajetória, os serviços meritórios que prestou
à revolução chinesa eram muito superiores às suas falhas. Seus
méritos constituíam o aspecto principal e seus erros, o
secundário. O pensamento de Mao Zedong era a aplicação e o
desenvolvimento do marxismo-leninismo adaptado às condições
próprias da China, o correto princípio teórico da revolução
chinesa e a síntese de suas experiências, confirmados pela
prática, representando a cristalização da sabedoria coletiva do
Partido Comunista da China.[73]
Durante a discussão que precedeu a referida Resolução, muitas
críticas foram feitas a Hua Guofeng, devido aos erros por ele
cometidos após a derrota do “bando dos quatro”, e foi exigido um
ajuste dos cargos que ele desempenhava. Por proposta do Birô
Político, Hua Guofeng – que em setembro de 1980 deixara de ser o
Primeiro Ministro do Conselho de Estado (cargo em que foi
substituído por Zhao Ziyang) – foi afastado da Presidência do
Comitê Central e da Presidência da Comissão Militar. A seguir, a
6a Sessão Plenária elegeu Hu Yaobang para a
Presidência do Comitê Central, Deng Xiaoping para a Presidência
de sua Comissão Militar e Hua Guofeng como vice-presidente do
Comitê Central:
O enfrentamento
se dava agora dentro do próprio grupo de Deng, entre os
veteranos que haviam sido vítimas da Revolução Cultural
(chamados de conservadores no Ocidente) e os liberais
ultra-reformistas, geralmente mais jovens e ligados à emergente
tecnocracia. Nesse contexto, com o afastamento de Hua Guofeng
(um “maoísta”) em 1980, seu poder foi dividido entre Hu Yaobang,
que ficara com o comando do Partido, e Zhao Zyiang, novo
primeiro-ministro.[74]
8.2.2 - O reordenamento econômico do país (1979/1980)
Logo após a 3a Sessão Plenária, os principais
dirigentes econômicos – Chen Yun e Li Xiannian – colocaram a
necessidade de um período de reajuste de dois ou três anos para
corrigir no fundamental o desequilíbrio proporcional entre os
diversos setores da economia. Deng Xiaoping fez um chamamento
para a busca de um caminho próprio para a modernização
socialista da China, que tivesse em conta as particularidades do
país, entre as quais a existência de uma base material pobre,
uma imensa população – 80% vivendo nas áreas rurais – e pouca
terra cultivável. Portanto:
devíamos atuar
partindo das condições do nosso país e em consonância com as
leis da economia e da natureza; devíamos trabalhar dentro dos
limites da nossa capacidade, avançar segundo uma ordem de
prioridades e (...) prestar atenção aos resultados reais, de
modo que a produção se desenvolvesse em estreita combinação com
a melhoria da vida do povo; devíamos, com base na independência
e nas nossas próprias forças, desenvolver ativamente a
cooperação econômica e o intercâmbio tecnológico com o exterior.[75]
Os anos de 1979 e 1980 ainda foram de reordenamento da economia,
com vistas à correção dos problemas, mas com resultados ainda
limitados. Será somente a partir de 1981 que a situação
econômica começou a melhorar de forma rápida e as relações entre
a acumulação e o consumo, entre a agricultura e a indústria, e
entre a indústria leve e a indústria pesada começaram a ser
resolvidas. Segundo a Breve história do PCCh:
Engels havia assinalado, há tempo, que a sociedade socialista,
igual que outras, não era imutável, mas necessitava constante
desenvolvimento e Reforma. (...) No passado, devido às condições
históricas, foi indispensável aplicar um sistema econômico e
social no qual o Estado controlava tudo, de maneira unificada,
sistema que mostrou a sua eficácia em uma determinada etapa do
desenvolvimento histórico. Porém, caso se continuasse
aplicando-o, não só o Estado se veria incapacitado para suportar
a carga excessivamente pesada, senão que se veria prejudicada a
vitalidade dos diversos setores sociais em seu crescimento e
desenvolvimento e surgiria uma situação de enrijecimento, o que
impediria seriamente o desenvolvimento contínuo das forças
produtivas. Portanto, era preciso transformar aquilo que nas
relações de produção não se ajustava às forças produtivas e
aquilo que na superestrutura não concordava com a base
econômica, visando manter a vigorosa vitalidade do sistema
socialista e evidenciar em maior medida a sua superioridade.[76]
8.2.3 - O início das Reformas e a modernização da
agricultura
|
Seguindo a linha de reordanamento da
economia, Deng viajou para os Estados Unidos
em 1979 e visitou a fábrica de montagem da
Ford em Atlanta. Nesse mesmo ano, a Ford
vendeu 750 caminhões da Série F para a
China. |
|
Após a cooperativização agrícola, as forças produtivas no campo
tiveram um grande incremento. Mas, nas comunas populares que era
aplicado o sistema da “integração do governo e da comuna em um
todo”, a gestão e a administração eram excessivamente
centralizadas e levava a um forte igualitarismo na distribuição
dos rendimentos. Esse sistema não punha em jogo o entusiasmo dos
camponeses, contrapunha-se à enorme inversão estatal na
agricultura e redundava em um ritmo bastante lento de
crescimento da produção agrícola e de melhora da vida dos
camponeses.
Em diversas localidades, sob a orientação do Partido,
implantou-se a título de ensaio o sistema de fixação de cotas de
produção com base no grupo ou na família e a fixação de cotas de
trabalho com base na família. As inversões na agricultura foram
aumentadas e os índices da compra centralizada passaram a ser
melhor controlados. Desde que garantidas as exigências
constantes no Plano Nacional, foi dada uma maior autonomia às
comunas e às brigadas de produção, no sentido de decidirem sobre
os seus planos de produção, tendo em conta as condições locais e
as temporadas de cada região. Essa política de propiciar uma
maior autonomia às unidades produtoras estimulou amplamente a o
espírito criador, a iniciativa e o entusiasmo dos camponeses, o
que se refletiu no crescimento da produção.
Frente à preocupação de alguns quadros do partido se isso não
levaria ao abandono do socialismo, o Comitê Central emitiu em
setembro de1980 a diretiva de que “o sistema de fixação de
cotas de produção tendo por base a família, praticado sob a
direção da equipe de produção está subordinado à economia
socialista e não se afastará da via socialista (...)”.
No início de 1983, 93% das equipes de produção nas zonas rurais
havia implantado o sistema de cotas de produção com base na
família e de cotas de trabalho com base na família,
principalmente essa última forma. Em seguida, as terras
coletivas foram contratadas por longo prazo pelas famílias
camponesas e a produção agrícola passou a ser gerida
fundamentalmente por cada família que – garantida a sua
obrigação com o Estado e os seus compromissos com a coletividade
– passou a ficar com os excedentes. Constituiu-se, assim, um
sistema onde a coletividade e a família camponesa mantinham uma
relação contratual, tendo por base a propriedade pública da
terra.
Da mesma forma que superou a prática nociva do igualitarismo, de
“todos comerem por igual na mesma panela”, esse sistema
também corrigiu a exagerada centralização da administração e a
excessiva uniformidade nas formas de gestão:
esse sistema de
responsabilidade por contrato com base na família é diferente da
pequena economia privada de antes da cooperativização agrícola,
pois, em lugar de negar a superioridade da economia coletiva
depois da cooperativização, implica tanto a gestão unificada
como a individual, combinando ambas, e põe em jogo tanto a
superioridade da economia coletiva como a iniciativa dos
camponeses, através da gestão familiar.[77]
Esse sistema elevou o empenho e o entusiasmo dos camponeses pelo
trabalho e levou a um rápido aumento da produção e a um grande
crescimento dos seus rendimentos, que em alguns lugares
duplicaram ou quadruplicaram. Alguns, na China e no exterior,
preocuparam-se com esse rápido “enriquecimento” dos camponeses,
perguntando se isso não levaria ao capitalismo. Em entrevista ao
jornalista Mike Wallace (EUA), Deng Xiaoping respondeu:
Não pode haver
nem comunismo, nem socialismo da pobreza. Enriquecer-se não é
delito. Mas o enriquecimento de que falamos não é o mesmo de que
falam vocês. A riqueza socialista é do povo e o enriquecimento
no socialismo é um enriquecimento comum de todo o povo. O
primeiro dos princípios socialistas é o desenvolvimento da
produção e o segundo é alcançar um enriquecimento comum. Ao
permitir que algumas pessoas e zonas se adiantem a outras
enquanto ao melhoramento de suas condições, o que nos propomos é
alcançar com maior rapidez o enriquecimento comum. É
precisamente por isso que a nossa política consiste em manter a
sociedade a salvo da polarização, isto é, não deixar que os
ricos se tornem mais ricos e os pobres mais pobres. Falando com
franqueza, não permitiremos que surja uma nova burguesia. (...)
Atualmente, no campo têm merecido elogios algumas famílias com
10.000 yuans de renda, mas essa renda não eqüivale a mais que
2.000 ou 3.000 dólares, e isso durante todo um ano. Podem ser
considerados ricos? Para nós são ricos, mas que importância tem
essa soma? Frente aos países desenvolvidos, a nossa renda per
capita é muito baixa.[78]
Mas, “nem tudo eram flores” e também surgiram falhas no processo
de implantação do sistema de responsabilidade com base na
família. Em alguns lugares não foi dada a devida atenção à
proteção dos bens coletivos e às obras hidráulicas nos campos de
cultivo e outras instalações públicas; as terras foram divididas
em parcelas demasiado pequenas, dificultando a irrigação e o uso
de máquinas. À medida que esses problemas foram sendo
detectados, o Partido procurou corrigi-los.
8.2.4 - Os passos iniciais da Reforma na indústria
A
Reforma da estrutura econômica nas cidades era muito mais
complexa que a Reforma da agricultura. O primeiro passo
foi ampliar um pouco a autonomia das empresas. Para isso, uma
parte das empresas do governo central e dos governos das
províncias e regiões autônomas, foi entregue à administração dos
municípios e implantou-se a separação da administração das
empresas em relação aos governos.
Para garantir trabalho para mais de 10 milhões de jovens
instruídos de todo o país, que durante a Revolução Cultural
haviam sido enviados a trabalhar nas regiões rurais e nas
regiões montanhosas e agora retornavam para as cidades, na busca
de emprego, o Governo flexibilizou a economia e incentivou o
estabelecimento de pequenas empresas individuais, por conta
própria.
Criou-se, então, um contexto econômico onde coexistiam os
setores coletivo, cooperativo e individual, da mesma forma que
coexistiam distintas formas de propriedade e diferentes
modalidades de gestão, tendo a propriedade pública e a
distribuição “segundo o trabalho de cada um” como
predominantes.
8.2.5 - A Abertura ao exterior
|
Implatação da zona industrial de Shekou em
1981. |
|
As Reformas também impulsionaram a Abertura
externa da China. Em julho de 1979, o Comitê Central do PCCh e o
Conselho de Estado decidiram implementar políticas específicas e
medidas preferenciais nas relações com o exterior às províncias
de Guangdong e Fujian, devido à sua proximidade com Hong Kong e
Macau, e por seus vínculos com os chineses de ultramar. Assim,
foram estabelecidas zonas econômicas especiais em Shenzhen,
Zhuhai e Shantou – na província de Guangdong – e em Xiamen – na
província de Fujian – para a captação de capitais e tecnologia
estrangeiros e a instalação de empresas multinacionais, voltadas
prioritariamente para a exportação, incluindo a compra de
pacotes tecnológicos e fábricas prontas. Inicialmente,
adotou-se, em muitos desses empreendimentos, o processamento de
matérias primas proporcionados por clientes do exterior, a
montagem de peças provenientes de fora, investimentos em
parceria com capitais estrangeiros, tudo com o objetivo de
atrair fundos do exterior e de aprender as suas tecnologias e
métodos de gestão e administração avançados:
As zonas
econômicas especiais são como janelas abertas em termos de
tecnologia, administração, know-how e política exterior. Através
dessas zonas é possível introduzir tecnologia, obter know-how e
aprender a arte da administração, o que também é um tipo de
know-how. As zonas econômicas especiais serão bases para a
abertura ao exterior, não somente será proveitoso no terreno
econômico, como também nos permitirá ampliar a influência no
exterior. Deve-se aproveitar os recursos intelectuais do
exterior contratando estrangeiros para que colaborem na
construção das obras prioritárias e na edificação do país nos
diversos campos (...) Não há porque vacilar em gastar algum
dinheiro na contratação de estrangeiros.[79]
Esses investimentos ocorreram a partir de objetivos definidos
pelo governo chinês e dentro de um plano nacional de
desenvolvimento. Nessas Zonas Especiais, foram
introduzidas legislações próprias para permitir, dentro de
certos limites, o estabelecimento de relações e de mecanismos
capitalistas. Para atrair esses capitais externos, a China
dispõe de um mercado interno inesgotável, uma boa
infraestrutura, mão de obra especializada e barata e matérias
primas em profusão. Obteve-se um êxito especial na atração de
investimentos de chineses de além-mar, de Hong Kong e Taiwan,
que atenderam os apelos para a reconstrução da Pátria.[80]
8.2.6 - Os resultados positivos da Reforma e da
Abertura
O
reajuste da economia chinesa e a aplicação da Reforma e
da Abertura, rapidamente começaram a surtir efeito. De
1978 a 1982, o valor global da produção industrial e agrícola
cresceu a uma taxa média anual de 7,3%, em um quadro em que as
principais relações proporcionais da economia do país tendiam a
harmonizar-se.
Refletindo, uma grande melhoria nas condições de vida do povo, a
renda per capita dos camponeses de todo o país duplicou
no ano de 1982 em relação ao ano de 1978, e a renda dos
operários e empregados aumentou em quase 40% no mesmo período
8.3 - O 12º CONGRESSO E O SOCIALISMO DO TIPO
CHINÊS (1982)
|
O 12º Congresso Nacional do Partido
Comunista da China realizou-se em Pequim
durante o período de 1 a 11 de setembro de
1982. Contou com 1.600 delegados titulares e
149 suplentes, representando 39,65 milhões
de filiados. |
|
O
12º Congresso do PCCh, realizado em setembro de 1982,
teve como diretriz central a idéia da construção de um “socialismo
com peculiaridade chinesas”:
A modernização do
nosso país deve realizar-se a partir da nossa própria realidade.
Tanto na revolução como na construção, é necessário conceder
importância ao aprendizado e aproveitamento das experiências
estrangeiras e ao uso das mesmas como ponto de referência. Mas a
cópia e o transplante de forma mecânica das experiências e
modelos de outros países, nunca nos conduzirão ao êxito. Nesse
sentido temos tido muitas experiências negativas. Integrar a
verdade universal do marxismo com a realidade concreta do nosso
país, seguir o nosso próprio caminho e construir um socialismo
com peculiaridades chinesas é a conclusão fundamental que
tiramos ao sintetizar as experiências acumuladas em um longo
período histórico.[81]
O
12º Congresso colocou para o PCCh a tarefa de –
apoiando-se nas próprias forças – realizar passo a passo a
modernização da indústria, da agricultura, da defesa nacional e
da ciência e da tecnologia, para fazer da China “um país
socialista altamente avançado e democrático”. Analisando
esse processo, Deng Xiaoping enfatizou o caráter socialista das
“Quatro Modernizações”:
Queremos tornar
realidade a modernização da indústria, da agricultura, da defesa
nacional e da ciência e tecnologia, mas essas quatro
modernizações devem levar a qualificação de “socialista” e
denominar-se “quatro modernizações socialistas”. A agilização da
economia no interior e a abertura ao exterior de que estamos
falando, realizam-se de acordo com o princípio de persistir no
socialismo. Isso tem duas facetas importantes. Em primeiro
lugar, mantém a supremacia da propriedade social; em segundo
lugar, não permite a polarização entre pobres e ricos. Esse tipo
de propriedade se ramifica em propriedade de todo o povo e
propriedade coletiva. Na atualidade, a propriedade social
representa mais de 90% de toda nossa economia. Permitimos, por
outra parte, o desenvolvimento de um pequeno setor individual da
economia, atraímos fundos e tecnologia de outros países, damos
boa acolhida às empresas de inversão mista e à de cooperação e
inclusive acolhemos de forma favorável o estabelecimento de
fábricas de inversão exclusivamente estrangeira na China. Tudo
isso serve como complemento para a economia socialista. Se são
montadas empresas desses três tipos [empresas mistas de inversão
nacional e estrangeira, as de cooperação entre a China e países
estrangeiros e as de capital exclusivamente externo], os
operários poderão receber salários, o Estado impostos, e uma
parte dos lucros das empresas dos dois primeiros tipos irá para
o Estado socialista. O mais importante é que possamos aprender
dessas empresas tudo de útil de sua experiência administrativa e
o avançado de suas tecnologias, para aplicá-lo ao
desenvolvimento da economia socialista. (...) É possível que
surja uma nova burguesia? Pode surgir um ou outro burguês, em
nível individual, mas é impossível que se forme uma burguesia
como classe. (...) nossa reforma mantém a supremacia da
propriedade social e ao mesmo tempo, cuidamos de evitar a
polarização.[82]
Foi estabelecida a meta de quadruplicar o valor global da
produção industrial e agrícola em um período de 20 anos (a
contar de 1981), de forma que as condições de vida do povo
alcançassem um nível de vida modestamente acomodado. Os
primeiros dez anos seriam para criar uma base sólida para o
desenvolvimento do país. A segunda década seria de um amplo e
persistente crescimento econômico.
Foram definidos os setores essenciais para o desenvolvimento
econômico do país – agricultura, energia, transportes, educação,
ciência e tecnologia – e aprovadas as principais orientações
para a modernização socialista da China:
concentração dos
investimentos na construção de obras essenciais; continuidade do
melhoramento da vida do povo, à luz do princípio de “comer e ao
mesmo tempo construir”; manutenção da posição dirigente do setor
estatal da economia; aplicação do princípio de assegurar o papel
dirigente da economia planificada e o papel auxiliar do mercado
como fator regulador; e adesão ao princípio da auto-sustentação
e expansão do intercâmbio econômico e técnico com o exterior.
[83]
O
12º Congresso também abordou a questão do fomento da
civilização socialista no terreno espiritual – da cultura e da
ideologia – e do contínuo desenvolvimento da democracia
socialista – para o que se impunha a necessidade da criação de
um sistema legal socialista.
O
Congresso elegeu o novo Comitê Central – substituindo a função
de Presidente pela de Secretário Geral –, a Comissão Central de
Assessoramento – formada pelos quadros veteranos, com funções
consultivas e para auxiliar a seleção e promoção de quadros
jovens para a direção do Partido – e a Comissão Central de
Controle de Quadros. Foram eleitos Hu Yaobang para a Secretaria
Geral do CC, Deng Xiaoping, Ye Jianying, Zhao Ziyang, Li
Xiannian e Chen Yun para o Comitê Permanente do Birô Político.
Dentro da política de renovação de quadros, Deng Xiaoping, Li
Xiannian e Chen Yun já haviam deixado de ser vice-primeiros
ministros, desde setembro de 1980.
No terreno político, verificou-se a implantação e o
aperfeiçoamento do sistema de assembléias populares em todos os
níveis e a preocupação pela legalidade socialista, através de um
grande esforço pela instituição de normas legais nos diversos
âmbitos da vida da nação. No final do ano de 1982, a 5ª Sessão
da 5ª Assembléia Popular Nacional aprovou a 4ª Constituição da
República Popular da China, fazendo profundas alterações na
Constituição de 1978, entre elas a recriação do cargo de
Presidente da República que havia sido abolido no período da
Revolução Cultural.
Em junho de 1983, realizou-se a 1a Sessão da 6a
Assembléia Popular Nacional, que elegeu Li Xiannian como
Presidente do Estado, Peng Zhen como Presidente da Assembléia
Nacional, Zhao Ziyang como Primeiro Ministro do Conselho de
Estado e Deng Xiaoping como Presidente da Comissão Militar
Central do Estado.
8.3.1 - O aprofundamento da Reforma na agricultura
|
Até 1987, 180 milhões de famílias camponesas
(98% do total) já trabalhavam sob o sistema
de responsabilidade por contrato na base da
família, o que significava na prática a
eliminação do sistema da comuna popular
(“propriedade de todo o povo”). |
|
No campo, buscou-se o aperfeiçoamento do sistema de
responsabilidade por contrato, com base na família. No início de
1984, foi anunciada a prorrogação do prazo de contratação das
terras pelas famílias por mais 15 anos, prazo que podia ser
ainda maior nos casos de culturas com longos ciclos de produção
– como árvores frutíferas, bosques, montanhas áridas e terrenos
baldios.
Em outubro de 1983, foi aprovada a separação entre as funções
governamentais e as funções das comunas, o estabelecimento dos
governos de cantões (povoados) como órgãos de poder básico, e a
instalação de Conselhos de aldeia, organizações autônomas das
massas. Em fins de 1984, havia sido realizada no fundamental a
separação entre as funções governamentais e as da comuna e
estabelecidos 91 mil governos de cantão e 926 mil comitês de
aldeia.
Até 1987, 180 milhões de famílias camponesas (98% do total) já
trabalhavam sob o sistema de responsabilidade por contrato na
base da família, o que significava na prática a eliminação do
sistema da comuna popular (“propriedade de todo o povo”).
Em janeiro de 1985, foi suprimido o sistema de compra
centralizada e de cotas de venda obrigatória ao Estado dos
produtos agrícolas e ocupações secundárias. Para os produtos
mais importantes – como os grãos e o algodão – foi implantado o
sistema de venda por contrato, segundo os planos estatais,
respeitada a autonomia dos camponeses. Tornou-se livre a venda
dos produtos excedentes depois da venda contratual ao Estado (“Em
1978, menos de 6% da produção agrícola era vendida a ‘preços de
mercado’; em 1992 este número chegava a 68%”). Ao mesmo
tempo que os demais produtos iam sendo liberados, de forma
gradual o Estado deixou de determinar planos obrigatórios de
produção aos camponeses e os impostos agrícolas deixaram de ser
cobrados em espécie, passando a ser cobrados em dinheiro.
Por esse caminho, o Governo procurou encaminhar a economia rural
chinesa para a órbita da economia mercantil planificada e
impulsionar a agricultura tradicional no rumo da
mercantilização, da especialização e da modernização.
Outro grande êxito da reforma rural – que não havia sido
previsto – foi a proliferação das empresas de cantão e de
povoado, em conseqüência da liberação de grande quantidade de
mão de obra, a partir da implantação do sistema de
responsabilidade por contrato com base na família. Sob o impulso
da Reforma e da Abertura, as empresas rurais de
propriedade coletiva e gestão individual ou privada tiveram um
desenvolvimento acelerado. Em 1987, o número de trabalhadores
nas empresas de cantão e de povoado alcançou 88 milhões, e o
valor dos seus produtos totalizou 50,4% do produto bruto do
campo, ultrapassando o valor da produção agrícola e tornando-se
um fator fundamental para a modernização e elevação dos
rendimentos da população rural:
Na reforma rural,
o maior avanço, que em absoluto havíamos imaginado, foi o
desenvolvimento das empresas de cantão e povoado, que vêm
multiplicando-se, diversificando as atividades econômicas do
campo e ampliando a economia mercantil e a produção industrial
de pequena dimensão. (...) Essas empresas têm aumentado o valor
da sua produção a um ritmo de mais de 20% ao ano. (...) São, na
sua maioria, empresas industriais, mas também existem de outros
ramos econômicos.[84]
Tão logo se
efetuou a reforma e a abertura e se introduziu o sistema de
responsabilidade por contrato, reduziu-se o número dos que se
dedicavam à agricultura. O que fazer, então, com as pessoas
excedentes? A experiência dos últimos dez anos nos mostra que se
pode resolver esse problema pondo em movimento a iniciativa da
base e do campesinato para diversificar a exploração e
desenvolver um novo tipo de empresa de cantão e de povoado.
Essas empresas já absorvem 50% da mão de obra excedente no
campo. Essa solução não a havíamos pensado nós, os dirigentes,
sendo uma criação das entidades agrícolas de base e dos próprios
camponeses.[85]
8.3.2 - A Reforma nas cidades e a “Economia de Mercado
Planificada”
Após o 12o Congresso, a reforma da estrutura
econômica acelerou-se em todos os terrenos. Mas o centro de
gravidade das Reformas deslocou-se do campo para as
cidades, fazendo com que a reforma econômica urbana deixasse de
ser uma experiência piloto para transformar-se em um processo
massivo.
Os excelentes resultados da Reforma no campo criaram
condições favoráveis para a reforma da estrutura econômica agora
tomando as cidades como o elo principal. O êxito dessa
experiência levou o Partido ao entendimento de que a economia
planificada e a economia mercantil não se contrapunham e que a
economia socialista chinesa deveria ser, no atual estágio, uma
economia mercantil planificada, tendo por base o sistema de
propriedade pública:
Enquanto a que
haja mais planificação ou mais mercado, não é aí onde radica a
diferença essencial entre socialismo e capitalismo. Economia
planificada não é sinônimo de
socialismo, pois no
capitalismo também há planificação; e economia de mercado
tampouco é sinônimo de capitalismo, já que no socialismo também
há mercado. Tanto a planificação como o mercado são mecanismos
econômicos. A essência do socialismo radica na emancipação das
forças produtivas, no seu desenvolvimento, na eliminação da
exploração, na erradicação da polarização e na consecução final
do enriquecimento comum.[86]
A
partir dessa compreensão, a 3ª Sessão Plenária do 12º Comitê
Central, realizada em outubro de 1984, formulou as principais
diretivas para as Reformas na indústria e no comércio:
reforçar a
vitalidade das empresas, tomando isso como a questão chave da
reforma da estrutura econômica; instituir um sistema de
planificação no qual seja aplicada de forma consciente a lei do
valor e desenvolver a economia mercantil socialista; implantar
um sistema racional de preços (...); separar as atribuições do
governo e as das empresas (...); instaurar o sistema multiforme
de responsabilidade econômica e aplicar de forma consciente o
princípio de “a cada um segundo o seu trabalho”, desenvolvendo
ativamente diversas formas econômicas e ampliando ainda mais o
intercâmbio econômico e tecnológico, dentro e fora do país.[87]
A
aplicação dessas orientações causou importantes alterações na
estrutura econômica do país. Ainda que a economia pública tenha
continuado sendo a dominante, desenvolveram-se múltiplos setores
econômicos e modificou-se em grande proporção a estrutura
homogênea de propriedade pública até então existente, que – no
entender dos dirigentes chineses – não se ajustava ao nível real
das forças produtivas. Em comparação com 1978 (anterior à
Reforma), em 1987 o valor da produção das empresas estatais,
apesar de crescer, diminuiu de 77,6% para 59,7% do total da
produção industrial do país; as empresas de economia coletiva
aumentaram o seu peso de 22,4% para 34,6%; e, as empresas
individuais, privadas, de investimentos mistos, de cooperação,
de capitais exclusivamente externos e outros setores econômicos
não públicos, aumentaram de quase zero a 5,6%. No comércio
varejista, a participação do setor estatal baixou de 54,6% a
38,7%, o comércio coletivo de 43,3% a 35,7% e a dos setores não
públicos subiu de 2,1% a 25,6%. Em conseqüência, nas cidades e
povoados de todo o país, o número de pessoas dedicadas à
indústria, ao comércio e a outros negócios de gestão individual
aumentou de 150 mil para 5,7 milhões.
Outra importante mudança – a partir da distinção entre as
funções governamentais e as funções empresariais – foi a
separação entre o “direito de propriedade” e o “direito de
gestão” das empresas estatais:
Na reforma das
empresas, a tarefa principal é resolver o problema de como
revitalizar as empresas estatais grandes e médias. Um dos
aspectos mais importantes da reforma é separar, mediante uma
grande variedade de formas, o direito de propriedade do poder de
gestão das empresas, a fim de pôr em jogo a sua iniciativa.
(...) Na realidade, muitas das formas de gestão não são mais do
que mecanismos e métodos para o desenvolvimento das forças
produtivas da sociedade, que podem servir tanto ao capitalismo
como ao socialismo.[88]
Nesse sentido, foi suprimido o monopólio das autoridades
centrais sobre a definição das despesas e receitas das empresas
estatais e foi concedida uma maior autonomia a seus
administradores em relação à produção e à gestão. Assim, em
1987, em comparação com 1978, os lucros retidos pelas empresas
estatais subiu de 3,7% a 40% do total, fortalecendo sua
capacidade de autotransformação e de autodesenvolvimento. Nesse
mesmo ano, 80% das empresas estatais do país já trabalhavam
através de “contratos de gestão” e no seu interior aplicava-se o
sistema de “responsabilidade do diretor”.
Em consequência dessas reformas, também foram alterados os
controles macroeconômicos. Assim, o número de produtos
industriais administrados pela Comissão Estatal de Planejamento,
mediante planos obrigatórios, reduziu-se de 120 para 60 e o seu
peso no valor global da produção industrial baixou de 40% a 17%;
da mesma forma, os materiais de distribuição estatal diminuíram
de 259 tipos a 26, e as mercadorias administradas mediante
planos estatais, de 188 a 23 tipos. Quanto aos fundos destinados
à produção e à construção econômica do país, os obtidos pelas
finanças públicas baixaram de 76,6% a 31,2% e os captados pelos
bancos aumentaram de 23,4% a 68,8%.
O
conjunto dessas Reformas levou uma grande dinamização da
vida econômica das cidades, mas, pela falta de um
fortalecimento, em tempo hábil, dos controles macroeconômicos,
gerou alguns efeitos anárquicos na produção, que tiveram que ser
corrigidos. No geral, a mudança foi extremamente positiva, no
sentido de uma “economia mercantil planificada, tendo por
base o sistema de propriedade pública”:
Não há
contradição essencial entre o socialismo e a economia de
mercado. Do que se trata é de como desenvolver com maior
eficácia as forças produtivas. No passado sempre praticamos a
economia planificada, mas longos anos de experiência demonstram
que, em certo sentido, praticar de modo exclusivo este tipo de
economia limita o desenvolvimento das forças produtivas.
Combinando a economia planificada com uma economia de mercado se
pode emancipar ainda mais as forças produtivas e acelerar o
desenvolvimento econômico.[89]
8.3.3 - A reforma educacional, científica e tecnológica
O
desenvolvimento da Reforma nas cidades e no campo colocou
na ordem do dia a necessidade da Reforma nos campos da
ciência, da tecnologia e da educação. Em março de 1985, o Comitê
Central do PCCh aprovou sua “Decisão sobre a reforma da
estrutura científico-tecnológica”, propondo:
reformar o
sistema de distribuição [de recursos]; abrir mercados de
tecnologias; proporcionar condições de autodesenvolvimento e
capacidade de serviço voluntário para a construção econômica às
instituições científicas e tecnológicas; fortalecer a capacidade
de assimilação e desenvolvimento tecnológico das empresas;
fomentar a cooperação e a associação das instituições de
pesquisa e projeto e dos centros docentes superiores com as
empresas; modificar o estado de coisas caracterizado pela
separação entre as instituições de pesquisa e as empresas, assim
como a compartimentação no seio dos departamentos e das
localidades; promover uma mobilidade racional das pessoas de
valia, etc.[90]
No essencial, a Reforma foi no sentido impulsionar a
mercantilização dos avanços tecnológicos e acelerar a sua
materialização em capacidade de produção, com o objetivo de dar
resposta às crescentes necessidades de desenvolvimento da
economia mercantil socialista.
Em maio do mesmo ano, o Partido também aprovou a “Decisão sobre
a reforma da estrutura educacional”, que colocou a necessidade
de ampliar a autonomia dos centros docentes em seu trabalho
específico; reformar o seu sistema de trabalho e de pessoal; e
transformar as idéias, os conteúdos e os métodos de educação que
não se ajustassem à modernização socialista. A colocação em
prática da referida “Decisão” levou ao fortalecimento da empresa
da educação na China.
8.3.4 – O aprofundamento da Abertura ao exterior
Após o 12º Congresso Nacional do PCCh, além de continuar
impulsionando a Reforma nas cidades e no campo, foram
dados grandes passos na Abertura ao exterior.
Em abril de 1983, passaram a ser aplicadas na ilha de Hainan –
que possui dimensões similares à Taiwan – algumas políticas já
implantadas nas zonas econômicas especiais, visando acelerar o
seu desenvolvimento. Esse processo será coroado em 1988 com o
estabelecimento da província de Hainam, toda ela designada como
“zona econômica especial”.
Em abril de 1984, foram transformadas em “zonas especiais de
abertura ao exterior” outras 14 cidades portuárias do litoral:
Abrimos ao
exterior 14 cidades costeiras, todas grandes ou médias. Damos
boa acolhida às inversões estrangeiras e também às técnicas
avançadas de outros países, dentro das quais se encontra a
administração. Abalará isso ao nosso socialismo? Ceio que não,
pois no nosso país a economia socialista é o setor principal da
economia nacional. A base em que se apoia a economia socialista
é muito extensa e não será abalada por admitir várias dezenas ou
uma centena de bilhões de dólares de inversões estrangeiras.
Dessa maneira, a admissão de capitais estrangeiros constituirá,
sem dúvida alguma, um importante complemento para nossa
construção socialista e, desde o ponto de vista de hoje, pode-se
dizer que é um complemento imprescindível. Claro, isto causará
certos problemas mas, depois de tudo, os efeitos negativos serão
muito menores que os positivos na utilização das inversões
estrangeiras. Há algo de perigo, mas não é tão grande.[91]
Em fevereiro de 1985, essa Abertura se estendeu ao delta
do rio Changjiang e do rio Pérola, e à região do triângulo
formado por Xiamen, Quanzhou e Zhangzhou (ao Sul de Fujian).
Formou-se, assim, uma rede de cidades abertas ao exterior,
abrangendo 2 municípios diretamente subordinados ao poder
central, 25 cidades subordinadas ao poder provincial e 67
distritos, totalizando uma população de 150 milhões de
habitantes:
A estratégia de
Pequim é transformar as regiões costeiras em centros industriais
de alta tecnologia para o desenvolvimento do setor terciário, à
semelhança do que ocorreu nos quatro tigres da economia asiática
– Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Cingapura –, enquanto induz
a criação de indústrias de trabalho intensivo no interior.[92]
Nessas regiões e zonas especiais, foram dados passos acelerados
no sentido da introdução de investimentos, tecnologias e
equipamentos avançados do exterior, e foi reforçada a capacidade
de captação de divisas através de incentivos às exportações.
Para se ter uma idéia do ritmo desses passos, só em 1987 foram
assinados em todo o país 10.350 contratos com a participação de
investimentos estrangeiros, num valor total de 62,5 bilhões de
dólares, dos quais 25,8 bilhões foram inversões diretas de
empresários do exterior. Esse processo impulsionou a
transformação técnica das empresas existentes, a renovação e a
mudança de geração dos seus produtos e o reajuste das suas
estruturas. Ao mesmo tempo, foram importadas uma série de novas
tecnologias e desenvolvidos novos produtos, preenchendo lacunas
existentes no país.
8.3.5 - O êxito no cumprimento do 6º Plano Qüinqüenal
(1981/1985)
Os êxitos da Reforma e da Abertura na construção
econômica podem ser medidos pelo cumprimento do 6º Plano
Qüinqüenal (Plano de Desenvolvimento Econômico e Social para
1981-1985). Em comparação com 1980, o valor da produção
industrial e agrícola teve um crescimento médio anual de 11% e o
produto nacional bruto um crescimento de 10%. Elevaram-se a
rentabilidade e a eficiência da economia nacional e as finanças
governamentais alcançaram o equilíbrio. O nível de consumo do
conjunto da população teve um incremento anual de 8,7%,
superando em muito a média de 2,6% anuais entre 1953 e 1980.
Graças ao crescimento da produção em geral e ao aumento da
produção de grãos e de algodão, o problema da subsistência
elementar do povo chinês foi solucionado no fundamental. Foram
suprimidas as cotas máximas para muitas mercadorias, exceto para
os cereais e o azeite comestível, sujeitos à distribuição em
quantidades fixadas e ao regime de racionamento.
Apesar o êxito em geral na aplicação do 6º Plano Quinquenal,
também ocorreram falhas durante a sua execução, principalmente
por responsabilidade do Secretário Geral Hu Yaobang que, à
revelia da opinião do coletivo, impôs ritmos demasiado elevados
de crescimento econômico e estímulos exagerados ao consumo para
promover a produção, o que ocasionou o inflacionamento dos
preços de diversas mercadorias e certa instabilidade econômica.
Quanto às relações trabalhistas, houve a preocupação com a
regulamentação do trabalho, tendo sido elaboradas normas sobre a
contratação e a demissão dos trabalhadores, sobre a previdência
social – inclusive para os desempregados – e sobre o
estabelecimento de um sistema de pensões nas estatais. No
ensino, em 1985 foi instituído o ensino obrigatório de nove
anos.
8.3.6 - O combate às “tendências liberalizantes” no seio do
Partido
A
2ª Sessão Plenária do 12º Comitê Central, realizada em outubro
de 1983, definiu quatro tarefas para a consolidação: 1) combater
as ideias tanto “esquerdistas” como de direita no seio do
Partido; 2) retificar o estilo de trabalho, resgatando o
espírito revolucionário de “servir ao povo de todo coração”
e eliminando toda busca de proveito próprio, valendo-se dos
cargos e funções outorgadas pelo Partido; 3) fortalecer a
disciplina e o centralismo democrático; 4) depurar das
organizações partidárias todos que não se mostrassem à altura
das altas responsabilidades do Partido.
Como era natural, o desenvolvimento da economia mercantil e a
Abertura ao exterior trouxeram consigo uma série de
facilidades para a difusão das ideias liberalizantes e
estimularam o surgimento da corrupção nos aparatos partidário e
estatal, exigindo medidas vigorosas para reforçar a têmpera
ideológica dos militantes, em todos os níveis.
Para isso, o Partido procurou desenvolver a luta contra a
contaminação ideológica, que se manifestava através da difusão
de todo tipo de ideias decadentes da burguesia e de outras
classes exploradoras e da disseminação da desconfiança na causa
do socialismo e na direção do Partido Comunista. Ao mesmo tempo,
devia prosseguir a crítica às ideias “esquerdistas” – que
acusavam o Partido de estar caminhando no rumo do capitalismo:
O que desperta
receio entre alguns camaradas nossos é a possível introdução de
coisas nocivas e o que mais os preocupa é a eventual
transformação do país em capitalista. Pode ser que alguns dos
nossos camaradas veteranos tenham essa preocupação. Eles
dedicaram toda a sua vida à causa socialista e comunista, de
modo que lhes choca e assusta o surgimento súbito de algo que
lhes parece capitalista. Em absoluto, não seremos afetados. Sem
dúvida alguma, virão alguns fatores negativos; isso devemos ter
em conta, mas não será difícil eliminá-los, teremos meios para
fazê-lo. (...) Sempre e quando apliquemos a abertura da mesma
forma que hoje, não poderá surgir uma nova burguesia entre nós
(...) pois os meios de produção básicos são de propriedade
estatal e coletiva, ou seja, de propriedade social. (...)
Inclusive as empresas mistas de inversão nacional e estrangeira
são em 50% de caráter socialista. Além disso, a maior parte dos
lucros reais que essas empresas obtêm, chega para nós.[93]
Nada há a temer
sempre que mantenhamos a mente lúcida. Temos vantagens, pois
contamos com as empresas estatais grandes e médias e as de
Cantão e povoado e, o que é mais importante, o poder político
está em nossas mãos. (...) Descrever a reforma e a abertura como
a introdução e o desenvolvimento do capitalismo e considerar que
o perigo de evolução pacífica procede no essencial do domínio
econômico, isto é deveras uma manifestação “esquerdista.”[94]
Era preciso compreender que naquele momento o principal problema
ideológico era retificar as tendências direitistas de
liberalização burguesa que – em nome da “democracia” e do
“humanismo” – combatiam o socialismo, a ditadura democrática
popular, a direção do Partido Comunista e o marxismo. Porém, a
luta do Partido contra os ventos liberalizantes, não conseguiu
ter êxito, devido à postura passiva e ambígua de Hu Yaobang:
Este período –
marcado pela deterioração da Reforma – testemunhou a alteração
de forças políticas internas no Partido. Deng Xiaoping, no
combate ao esquerdismo, representado pelos defensores da
revolução cultural, estava associado aos elementos da direita,
chamados de ultra-reformadores. No entanto, ao opor-se ao
processo de liberação
burguesa – fruto da abertura – ele se identificou com a
esquerda, que defendia a estabilidade política para a manutenção
do projeto socialista. Por essa razão, seus simpatizantes foram
chamados conservadores. (...) Os conservadores eram favoráveis
às críticas à Revolução Cultural, mas não aos valores
socialistas. Este grupo era representado pela “velha guarda” do
Partido, nomeadamente Peng Shen e Chen Yun. Por outro lado, para
os ultra-reformadores o grande benefício da reforma era o
aumento da qualidade de vida. Contudo, consideravam que ainda
deveriam ser dados passos importantes no terreno político,
passos esses identificados com a causa democrática. A democracia
era considerada como a “Quinta Modernização”. Simpáticos a essas
idéias eram Hu Yaobang, Secretário do Partido, e Zhao Ziyang,
Primeiro Ministro, responsáveis, como se vê, pelos postos mais
importantes do Partido e do governo. Tanto Hu Yobang como Zhao
Ziyang chegaram ao poder com o apoio de Deng Xiaoping que, por
sua vez, era mais favorável ao aprofundamento das reformas no
nível econômico que no político. (...) Na medida em que as
agitações políticas por uma maior abertura – nos moldes
ocidentais – tomavam fôlego no país, Deng Xiaoping aproximava-se
dos conservadores no terreno político, mas permanecia ao lado
dos ultra-reformadores na economia.[95]
Em conseqüência desses fenômenos e da insuficiente luta
ideológica no interior do Partido e na sociedade, em dezembro de
1986 ocorreram graves distúrbios estudantis, propugnando uma
liberalização burguesa e envolvendo inúmeras cidades.
Em janeiro de 1987, o Birô Político convocou uma reunião
ampliada, onde Hu Yaobang fez a autocrítica dos erros cometidos
durante a sua atuação como Secretário Geral do Partido e
solicitou ao Comitê Central que aceitasse a sua renúncia ao
cargo que ocupava. A reunião fez uma séria crítica a Hu Yaobang
e aceitou sua renúncia, mas o manteve como membro do Comitê
Permanente do Birô Político. Para o seu lugar, foi eleito Zhao
Ziyang, que havia assumido o cargo de Primeiro Ministro do
Conselho de Estado em 1980.
8.4 – O 13º CONGRESSO E A “ETAPA PRIMÁRIA DO SOCIALISMO” (1987)
|
O 13º Congresso Nacional do Partido
Comunista da China realizou-se em Pequim
durante o período de 25 de outubro a 1º de
novembro de 1987. Contou com 1.936 delegados
titulares e 61 delegados especialmente
convidados, representando 46 milhões de
filiados. |
|
O
13º Congresso, realizado entre 25 de outubro e 1º de novembro de
1987, sistematizou a teoria do Partido Comunista da China sobre
a “etapa primária do socialismo”.
Nesse sentido, o Congresso indicou que a afirmação de que a
China estava construindo a etapa primária do socialismo tinha
dois significados: primeiro, que a China já era um país
socialista; segundo, que ainda se encontrava na fase inicial do
socialismo:
por um lado, se
haviam estabelecido definitivamente o sistema econômico
socialista, baseado na propriedade pública dos meios de
produção, o sistema político da ditadura democrática popular e a
posição hegemônica do marxismo no campo ideológico; haviam sido
eliminados o sistema de exploração e as classes exploradoras;
havia crescido enormemente o poderio econômico da nação e haviam
se desenvolvido em considerável medida a educação, a ciência e a
cultura. Por outro lado, tínhamos uma população numerosa e uma
base material pobre, e o nosso país ainda estava muito atrasado
em relação a outros países do mundo em termos de renda per
capita. O atraso das forças produtivas determinava nas relações
de produção um grau muito baixo de socialização da produção –
socialização que era indispensável para o fomento da propriedade
pública socialista –, um escasso desenvolvimento da economia
mercantil e do mercado interno, e um sistema econômico
socialista pouco maduro e imperfeito; no que se refere à
superestrutura, se observava uma grave insuficiência de toda uma
série de condições econômicas e culturais para o fomento de uma
política democrática socialista altamente desenvolvida e, ainda,
uma grande influência no âmbito social das forças decadentes do
feudalismo e do capitalismo, e da força do costume – própria dos
pequenos produtores –, as quais corroíam constantemente as filas
dos quadros do Partido e dos funcionários do Estado. Isso
demonstrava que nesse momento ainda estávamos longe de haver
superado a etapa primária do socialismo.[96]
O
Congresso estabeleceu três passos para o desenvolvimento
econômico da China: no primeiro, o objetivo seria duplicar o
produto nacional bruto de 1980, resolvendo o problema de
subsistência elementar do povo; no segundo, duplicar novamente o
PNB até o final do século XX, assegurando ao povo uma vida
modestamente acomodada; no terceiro passo, alcançar – até meados
do século XXI – o nível dos países medianamente desenvolvidos,
em termos de produto nacional bruto per capita,
garantindo ao povo uma vida mais ou menos folgada e consumando
no fundamental a modernização do país.
Também se decidiu aplicar às empresas estatais o princípio da
separação entre o direito de propriedade e o direito de gestão;
ampliar a integração econômica horizontal; acelerar o
estabelecimento e o fomento de um sistema de mercado socialista;
aperfeiçoar o sistema de regulação macro-econômica, com ênfase
na administração indireta; continuar desenvolvendo uma economia
de múltiplas formas de propriedade, sob o predomínio da
propriedade pública; adotar múltiplas modalidades de
distribuição, tendo por conteúdo básico o princípio de “a
cada um segundo o seu trabalho”.
No terreno político, o 13º Congresso procurou colocar na prática
a orientação advogada por Deng Xiaoping de “rejuvenescimento
da direção” em todos os níveis, elegendo
para o Comitê Central 96
novos nomes (45,7% do total), dos quais a maioria era
relativamente jovem ou especialistas em questões econômicas.
Deng abriu mão de todos seus cargos, com exceção da presidência
das comissões militares do Partido e do Estado. Em novembro de
1987, foi adotada a “Lei Orgânica dos Comitês de Vila
[Aldeia]”, cujos membros são eleitos diretamente pela população,
independentemente de pertencerem ou não ao Partido Comunista.[97]
8.4.1 - As dificuldades econômicas e os incidentes da praça
Tian’anmen
Apesar dos avanços, persistiram debilidades na construção
econômica. Na agricultura, após a grande colheita de 1984, a
produção de cereais se manteve vários anos sem crescer. Na
indústria, foi modificada a excessiva centralização e o controle
demasiado rígido, mas descuidou-se do equilíbrio integral da
economia e do aperfeiçoamento dos controles macro-econômicos. Em
conseqüência, agravou-se a inflação, o desequilíbrio entre a
produção e o consumo, a falta de harmonia entre diversos setores
da economia, o aumento da capacidade ociosa de inúmeras
empresas, a queda na produtividade em alguns setores e a
diminuição das receitas públicas.
Em 1988, os índices de preços ao consumidor registraram um
crescimento de 18,5%, gerando inquietude entre a população.
Nessas circunstâncias, foi anunciada de forma inapropriada um
ampla reforma dos preços, o que causou uma escalada de compras
na segunda metade desse ano e o agravamento dos problemas
econômicos. Diante desse quadro, o Partido decidiu centrar a
Reforma e a construção dos anos de 1989 e 1990 no saneamento
da ordem econômica.
A esse quadro de dificuldades econômicas somou-se o quadro de
crise dos países do Leste Europeu e da própria União Soviética,
jogando água no moinho daqueles que queriam solapar a construção
do socialismo na China e a direção desse processo pelo Partido
Comunista:
Não foram somente
as contradições internas mas claramente também as manobras do
imperialismo que alimentaram uma agitação que se prolongava de
maneira interminável, apesar de todas as tentativas de mediação
e de diálogo com os estudantes promovidas pela direção chinesa.
Não se deve perder de vista o contexto histórico. Trata-se do
período em que os Estados Unidos desenvolviam sua ofensiva final
contra o ‘socialismo real’, desmembrando a URSS e a Iugoslávia.
Depois de um longo período de incerteza e de tentativas de
restabelecer a ordem pública pela via pacífica, a direção
chinesa decide não permitir em nenhum caso ser arrastada pela
derrocada geral. Deve-se dizer que, não obstante seus graves
custos, essa sofrida decisão eximiu a China (e o mundo) de uma
reedição, em escala muito mais ampla, da tragédia que golpeou a
URSS e a Iugoslávia, e impediu que os Estados Unidos
conquistassem o triunfo final que já saboreavam antecipadamente.[98]
Internamente, a luta contra a liberalização burguesa continuava
paralisada, por conta da atitude passiva de Zhao Ziyang que – a
revelia das opiniões do Comitê Central – passou a afirmar que a
tendência conservadora de oposição à Reforma e à
Abertura já supunha o mesmo perigo que a corrente ideológica
da liberação burguesa, desviando assim o centro da luta
ideológica do Partido. Ao mesmo tempo, as manifestações de
arrivismo e de corrupção no seio do Partido e do aparelho do
Estado não eram tratadas com o devido rigor, causando
descontentamento nas massas e um sério prejuízo à imagem do
Partido e da Ditadura Democrática Popular.
Os defensores da liberação burguesa, de dentro e de fora do
Partido, aproveitaram-se dessa situação para atacar o PCCh e
defender a transição ao capitalismo e a plena ocidentalização do
país. Desde finais de 1988, até inícios de 1989, sucederam-se
comícios e manifestações políticas de claro questionamento ao
Partido e ao socialismo, principalmente em Beijing. Em abril
essas manifestações levaram à ocupação da Praça
Tian’anmen por milhares de
pessoas. Diante dessa situação, o Secretário Geral Zhao Ziyang
assumiu a mesma postura de Hu Yaobang e ao invés de se opor e
resistir à liberalização burguesa, adotou uma atitude de
tolerância e conivência com elas:
Uma mobilização popular multifacetada e contraditória emergia no
país, especialmente como movimento contra a corrupção. Os
ultra-reformistas do PCC, nucleados em torno de Zhao Ziyang,
procuraram capitalizá-la em sua luta contra os reformistas
moderados (“conservadores” ou “neo-autoritários) em abril de
1989, duzentos estudantes da Universidade de Beijing
dirigiram-se para a Praça da Paz Celestial (Tian’anmen), na
esteira da mobilização gerada com os funerais do reformista Hu
Yaobang, falecido dias antes. (...) Wang Dan, também um dos
dirigentes, era um jovem estudante da Universidade de Beijing,
que declarou desejar “implantar um sistema político ocidental”
(...) A crítica à corrupção era o que unificava a todos, pois
muitos se manifestavam contra as reformas econômicas, enquanto
outros as apoiavam e reivindicavam reformas políticas.[99]
No final de abril, o Comitê Central e Deng Xiaoping denunciaram
publicamente o caráter anti-socialista e anti-partido dessas
manifestações e conclamaram os estudante e os trabalhadores a se
absterem de participar nas mesmas, o que causou o seu refluxo.
Poucos dias depois, Zhao Ziyang desautorizou essas opiniões da
direção do Partido e afirmou que as referidas manifestações “de
nenhum modo pretendem se opor ao nosso sistema fundamental”.
Esse comportamento de Zhao Ziyang, de apoio tácito aos
manifestantes, levou a uma retomada das mobilizações em todo o
país e ao início de uma greve de fome na Praça Tian’anmen,
novamente ocupada por milhares de pessoas.
No dia 17 de maio, o Comitê Central decidiu decretar o estado de
sítio na capital, o que foi efetivado a partir do dia 20. Zhao
Ziyang se opôs a essa decisão e se afastou das atividades de
direção, desertando de suas responsabilidades. No dia 31 de
maio, em uma conversa com dirigentes do Comitê Central, Deng
Xiaoping afirmou:
Uma coisa é certa e é que todos – sejam operários, camponeses,
intelectuais ou estudantes – desejam a reforma. Esta vez, foram
levantadas as mais variadas consignas, mas nenhuma é contrária à
reforma. Porém, o que algumas pessoas denominam reforma deve ter
outro nome, o de liberalização, ou seja, transformação
capitalista. O eixo da sua Reforma é a transformação
capitalista. A nossa reforma é diferente da sua (...) É
inadmissível vacilar na luta contra a liberalização burguesa e
na persistente aplicação dos quatro princípios fundamentais.
(...) Persistir ou não na ditadura democrática popular, no
marxismo, no socialismo e no papel dirigente do Partido
Comunista é um problema fundamental.[100]
No dia 3 de junho, quando algumas unidades do exército se
deslocaram para as áreas que lhes haviam sido designadas pelo
Estado de Sítio, tiveram que enfrentar barricadas e a
resistência armada de uma parte dos manifestantes, o que causou
a morte de alguns oficiais e soldados e a destruição de diversos
veículos. Na noite do dia 3 de maio, o Comitê Central, o
Conselho de Estado e a Comissão Militar Central ordenaram às
tropas que se encontravam acampadas nos arredores da capital
para que avançassem e esmagassem a sedição
contra-revolucionária. Depois de alguma resistência, na
madrugada do dia 4 de junho a praça Tian’anmen foi totalmente
ocupada pelas tropas responsáveis pelo Estado de Sítio e os
milhares de estudantes que lá encontravam tiveram que
retirar-se. Rapidamente a sublevação foi derrotada em todo o
país.
Com o prolongamento do impasse e a divisão do Partido, Li Peng
declarou a lei marcial em Beijing. (...) Estudantes da Escola de
Artes construíram, então, uma estátua denominada “Deusa
Democracia”, praticamente uma réplica da Estátua da Liberdade de
Nova Iorque. Isso, mais a depredação do retrato de Mao, que se
encontra na entrada da Cidade Proibida, deu aos que desejavam
reprimir os pretextos necessários, além de afastar grande parte
da população que simpatizava com os manifestantes (...) Num
quadro de reinicio das manifestações, foram distribuídas armas
aos estudantes na noite de 2 para 3 de junho. Na noite seguinte
o exército recebeu ordens para desocupar a praça, sendo
autorizado a revidar agressões. De fato, alguns policiais
munidos apenas com sprays de gás foram feridos ou mortos, e o
exército avançou sobre os manifestantes, reprimindo-os e dando
fim ao episódio. Em torno de cinqüenta manifestantes foram
mortos em Beijing, e aproximadamente o mesmo número no resto do
país.[101]
8.4.2 - O fortalecimento da luta ideológica e o combate à
corrupção e ao arrivismo
Logo após a derrota da onda de manifestações anti-socialistas e
anti-Partido que culminaram nos incidentes de
Tian’anmen, reuniu-se em fins de junho de 1989 a 4ª Sessão
Plenária do 13º Comitê Central, com o objetivo de avaliar os
acontecimentos, definir as medidas para corrigir os erros e
reformular os órgãos dirigentes do Comitê Central.
Tendo em vista os graves erros cometidos por Zhao Ziyang, este
foi afastado dos cargos que ocupava a frente do Partido e do
Estado (mas não foi expulso do Partido), junto com outros três
membros do Birô Político que apoiaram ativamente as posições
errôneas de Zhao Ziyang. A seguir, a reunião elegeu Jiang Zemin
para Secretario Geral – com o papel de núcleo do Comitê Central
– e incluiu outros camaradas no Birô Político.
Depois de reafirmar a continuidade das Reformas e da
Abertura, o Comitê Central destacou a necessidade de
persistir no caminho socialista, na ditadura democrática
popular, na direção do Partido Comunista e no marxismo-leninismo
e pensamento Mao Zedong. Foram definidas quatro tarefas: 1)
acabar completamente com a sedição, distinguindo com cuidado as
contradições no seio do povo e as contradições entre o povo e os
seus inimigos; 2) buscar o saneamento do ambiente econômico,
perseverando na Reforma e na Abertura; 3)
fortalecer o trabalho ideológico e político, lutando contra a
liberalização burguesa, educando o povo no patriotismo e no amor
ao socialismo e promovendo um estilo de vida simples e de
trabalho duro; 4) fortalecer a construção do Partido, da
democracia e do sistema legal, eliminando de forma resoluta a
corrupção e os privilégios.
Nesse sentido, em julho de 1989 o Partido decidiu, entre outras
medidas: 1) intensificar o trabalho de revisão e reordenamento
das companhias comerciais; 2) por fim de forma resoluta na
participação dos filhos dos altos dirigentes em atividades
comerciais; 3) abolir a “venda especial” de certo tipo de
alimentos aos quadros dirigentes; 4) rigidez na destinação de
automóveis, proibindo com rigor a importação de automóveis; 5)
proibir o convite para banquetes e o oferecimento de presentes à
custa do erário público; 6) restringir ao máximo as visitas dos
quadros dirigentes ao exterior; 7) investigar e tratar com
severidade a corrupção, o suborno, a especulação e o
acaparamento.
Deng Xiaoping, que há bastante tempo defendia a “aposentadoria”
dos quadros veteranos, já havia pleiteado, antes da 4ª Sessão
Plenária, o seu afastamento dos cargos de direção do Partido e
do Estado. Finalmente, esse pedido foi aceito na 5ª Sessão
Plenária (novembro de 1989), concluindo com êxito o processo de
transição entre o núcleo dirigente liderado por Deng Xiaoping e
o novo núcleo dirigente liderado por Jiang Zemin.
8.4.3 – O reajuste da economia e o 7º Plano Qüinqüenal
(1986/1990)
Em outubro de 1988, a 3ª Sessão Plenária do 13º Comitê Central
havia decidido realizar o saneamento e a retificação no terreno
econômico, aprofundando a Reforma e a Abertura ao
Exterior, devido ao sobreaquecimento detectado na produção.
Em 1988, em comparação com o ano anterior, o incremento da renda
per capita nas áreas rurais e nas cidades foi,
respectivamente, de 17,7% e 22,2%, muito superior aos 11,1% de
crescimento da renda nacional. Também as inversões em ativos
fixos elevaram-se em 23,5% e o ritmo de crescimento da indústria
de transformação foi demasiado alto, ultrapassando a capacidade
de fornecimento de energia elétrica, de matérias primas, de
transportes e comunicações. Na agricultura, em contrapartida,
por razões climáticas e pela política vigente, houve redução na
produção de grãos, algodão e oleaginosas. As conseqüências foram
certo desabastecimento e inflação. A turbulência política do
início de 1989 e as “sanções econômicas” impostas pelas
potências capitalistas ocidentais, devido à repressão aos
distúrbios da praça de Tian’anmen, agravaram ainda mais os
problemas.
A
5ª Sessão Plenária do 13º Comitê Central, em novembro de 1989,
deliberou um período de 3 anos, ou um pouco mais, para o
saneamento e retificação econômicas, reduzindo a demanda global,
persistindo na austeridade financeira e creditícia, fortalecendo
a agricultura e outros setores básicos e procurando harmonizar a
relação entre os diversos ramos da economia. Na construção
econômica era preciso persistir, a longo prazo, no princípio do
desenvolvimento sustentado, estável e coordenado.
Resultado disso, em 1990 a inflação foi controlada – baixando de
18,5% para 2,1% – e se atenuou a contradição entre uma demanda
superaquecida e a oferta realmente existente. Aumentaram os
investimentos na agricultura, em infraestrutura e nos elos
débeis da cadeia produtiva, ao mesmo tempo em que se restringiu
os investimentos não produtivos (edifícios luxuosos, hotéis,
salões, etc.). O produto nacional bruto, que havia aumentado
3,9% em 1989, elevou-se 5% em 1990. Também foram obtidas boas
colheitas em 1989 e 1990, superando o estancamento dos quatro
anos anteriores. Em 1989 e em 1990, a produção industrial teve
um crescimento médio anual de 8,1%.
Apesar das sanções, o volume total das exportações cresceu 10,5%
em 1989 e 18,1% em 1990, aumentando consideravelmente o peso
relativo dos produtos industriais acabados (principalmente
mecânicos e eletrônicos). A importação de artigos de consumo
suntuosos foi colocada sob controle e melhorou a composição dos
produtos importados. A Balança de Pagamentos com o exterior
passou a ser superavitária e cresceram as reservas em divisas do
país. Também foi criada a zona econômica especial de Pudong
(Shangai) e em 1990 a primeira bolsa de valores do país, em
Shanghai:
Em relação aos
títulos de valor e ao mercado acionário, são coisas boas ou más?
Envolvem ou não perigo? São exclusivas do capitalismo? E, pode
ou não o socialismo servir-se delas? (...) Ao final das contas,
se o socialismo se propõe a conquistar a supremacia sobre o
capitalismo, deve atuar com audácia para assimilar ou tomar como
referência todos os avanços da civilização criada pela sociedade
humana, assim como todas as modalidades de gestão e métodos de
administração avançados dos diversos países do mundo atual –
incluídos os países capitalistas desenvolvidos – modalidades e
métodos que refletem as leis objetivas da produção socializada
moderna.[102]
A propriedade
pública pode e deve assumir diferentes formas. Todos os métodos
de administração e formas de organização que refletem as leis
que governam a produção socializada devem ser utilizados com
audácia. (...) O sistema de propriedade do capital por ações é
uma forma de composição do capital das empresas modernas que
serve para separar a propriedade da administração e elevar a
eficiência da operação da empresa e do capital. O mesmo pode ser
usado tanto sob o capitalismo como sob o socialismo. Não podemos
dizer em termos gerais que o sistema de propriedade do capital
por ações é público ou privado, porque o ponto chave reside em
quem tem capacidade de controle da empresa assim organizada.[103]
Desenvolveu-se em grande escala a ciência, a tecnologia, a
educação. O lançamento exitoso do satélite de telecomunicações
Asiasat-1 e do foguete reforçado Changzheng-2, a
construção do reator termonuclear experimental de cinco
megawatts, de baixa temperatura, assim como a colocação em
funcionamento experimental do trem unitário para 10 mil
toneladas, mostraram que a China havia alcançado a maioridade
tecnológica.
Em fins de 1989, o 7º Plano Qüinqüenal havia sido cumprido no
fundamental, tendo o produto nacional bruto crescido a uma média
anual de 7,8% e a renda nacional 7,5%, superando as metas do
próprio Plano. A produção agrícola aumentou 4,7% ao ano e a
produção industrial 13,1%. Quanto à renda per capita,
elevou-se 4,1% ao ano nas cidades e povoados e 2,4% no campo.
Se tomarmos como referência o decênio 1980/1990, o produto
nacional bruto cresceu a uma média anual de 9%, três vezes
superior ao crescimento médio da economia mundial no período. O
valor da produção industrial aumentou 289%, a produção agrícola
103%. Já a renda per capita nas cidades e povoados,
cresceu 68,1%:
O poder de compra
das amplas massas camponesas se ampliou, o que não só fez
possível a construção de um grande número de novas moradias,
como também o acesso nos lares dos agricultores comuns dos
“quatro artigos de valor”, a saber, bicicleta, máquina de
costurar, rádio e relógio, assim como de alguns artigos de
primeira ordem. Por outra parte, o aumento dos produtos
agrícolas e das ocupações secundárias, a expansão do mercado
rural e a recolocação da mão-de-obra excedente do campo, deram
um forte impulso ao desenvolvimento da indústria. (...) Os
produtos industriais relacionados com a alimentação, roupa,
moradia, transporte e de uso cotidiano, incluídos o televisor
colorido, a geladeira e a lavadora se expandiram em grande
proporção. O mesmo ocorreu com as lâminas de aço, o cimento e
outros insumos. Foi precisamente dessa forma como interagiram e
se promoveram de forma recíproca a agricultura e a indústria, o
campo e a cidade.[104]
8.4.4 - O 8º Plano Qüinqüenal (1991/1995)
Em dezembro de 1990, foi aprovado o 8º Plano Qüinqüenal de
Desenvolvimento Econômico e Social, em combinação com o Programa
Decenal 1990/2000, tendo como meta um aumento médio do produto
nacional bruto de 6% ao ano, quadruplicando-o até o final do
século (em relação a 1980), tendo por objetivo:
fazer que todo o
povo passe do nível de uma subsistência elementar ao de uma vida
modestamente acomodada; fomentar a educação, impulsionar o
avanço científico e tecnológico; melhorar a administração da
economia, reajustar a estrutura econômica e reforçar a
construção de obras chaves, com o objetivo de criar uma base
material e técnica para um desenvolvimento econômico e social
sustentado de nosso país no início do próximo século;
estabelecer de forma preliminar um sistema econômico e
mecanismos operativos que se ajustem ao desenvolvimento da
economia mercantil planificada socialista, baseada na
propriedade pública, e combinem a economia planificada com a
função reguladora do mercado; levar a uma nova etapa a
civilização socialista no terreno espiritual, aperfeiçoando
ainda mais a democracia e a legalidade socialistas.[105]
Para isso, o Partido definiu uma série de orientações: 1) manter
com firmeza o caminho da construção do socialismo com
peculiaridades chinesas; 2) levar adiante a Reforma e a
Abertura; 3) seguir com firmeza a orientação de
independência, auto-sustentação, luta dura e vida simples,
laboriosidade e economia na construção nacional; 4) aplicar a
orientação de fomentar a civilização tanto material como
espiritual
8.5 - O 14º CONGRESSO E AS “DEZ TAREFAS” (1992)
|
O 14º Congresso Nacional do Partido
Comunista da China realizou-se em Pequim
durante o período de 12 a 18 de outubro de
1992. Contou com 1.989 delegados titulares e
46 delegados especialmente convidados,
representando 51 milhões de filiados. |
|
Em outubro de 1992, reuniu-se o 14º Congresso do PCCh. Em seu
informe, Jiang Zemin iniciou por um balanço dos quatorze anos de
Reforma e de Abertura na China:
nosso Partido desbancou categoricamente a política errônea de
“tomar a luta de classes como alavanca” (...) e transferiu o
centro do trabalho do Partido e do Estado para a construção
econômica. (...) O sistema de responsabilidade por contrato
familiar com remuneração em função dos rendimentos foi uma
grande criação dos camponeses chineses. (...) Suprimiu-se a
comuna popular e, em lugar de enveredar o caminho da
privatização da terra, implantou-se o mencionado sistema de
responsabilidade como forma principal (...) Os 800 milhões de
camponeses obtiveram direitos de autonomia de exploração das
terras; (...) As empresas de vilas e comarcas, surgidas com uma
força fulgurante, constituem outra criação dos camponeses
chineses (...) a economia socialista do nosso país é uma
economia de mercado planificada com base na propriedade pública.
A crescente ampliação da abertura ao exterior e o
desenvolvimento acelerado da região litorânea, onde vivem 200
milhões de pessoas, impulsionaram energicamente a reforma e a
abertura (...).[106]
O Congresso dedicou-se, ainda, a sistematizar a teoria do PCCh
sobre a construção do
“socialismo de tipo chinês”, que parte do entendimento que não
existe um “modelo universal” de socialismo, a ser copiado, e que
é preciso partir da realidade concreta da China – o país mais
populoso do mundo, com dimensões continentais, 80% da sua
população vivendo no campo e um baixo nível de desenvolvimento
das forças produtivas – para construir um socialismo com
peculiaridades chinesas. Socialismo que ainda se encontra em sua
etapa primária, subdesenvolvida, que tem como sua tarefa
fundamental o desenvolvimento das forças produtivas, tendo por
base uma economia de mercado socialista, a propriedade pública e
o princípio de “a cada um de acordo com o seu trabalho”.
8.5.1 - Avançar na Reforma e na Abertura,
implementando as “Dez Tarefas”
Por fim, o Congresso apresentou
as “Dez Tarefas” principais para dar continuidade e acelerar a
Reforma e a Abertura e garantir o êxito na
construção econômica socialista:
-
Primeira tarefa: “acelerar a reforma econômica, tendo
como trilho o estabelecimento do sistema de economia de
mercado socialista.” Essa tarefa subdivide-se em quatro:
1) “modificar o mecanismo de funcionamento das empresas
estatais, especialmente as grandes e médias, empurrá-las ao
mercado, reforçar sua vitalidade e melhorar sua qualidade”;
2) “acelerar o fomento do sistema de mercado (...) em
especial o dos meios de produção (...) o mercado financeiro
(...) os mercados de tecnologia, de serviços laborais, de
informações e de bens imóveis”; 3) “aprofundar a
reforma dos sistemas de distribuição e seguridade social
(...) acelerar a reforma do sistema de salários e
estabelecer o mecanismo de incremento regular dos salários
(...) estabelecer um sistema de seguridade social para os
casos de desemprego, aposentadoria, assistência médica, etc.”;
4) “acelerar a transformação das funções governamentais
(...) separar as funções governamentais das empresariais”.[107]
Tratando ao desenvolvimento do mercado financeiro, Deng Xiaoping
destacou a importância das finanças também no socialismo
É preciso dar
maiores passos na reforma financeira. Se deve fazer com que os
bancos sejam bancos no verdadeiro sentido da palavra. Até agora,
nossos bancos não passam de corporações emissoras de moeda ou
bodegas de dinheiro e não bancos dignos desse nome. Já que não
temos suficientes conhecimentos sobre os problemas financeiros,
podemos contratar especialistas estrangeiros como assessores.[108]
As finanças são
muito importantes, pois constituem o núcleo da economia moderna.
Basta que as finanças andem bem para que todos os demais
problemas se resolvam com facilidade (...). Em outros tempos,
Shanghai era um centro financeiro, onde havia liberdade de
câmbio monetário. No futuro deverá ser como naquela época. Que a
China alcance uma posição internacional nas atividades
financeiras depende sobretudo de Shanghai.[109]
-
Segunda tarefa: “continuar ampliando a abertura ao
exterior e utilizar em maior quantidade e melhor forma os
capitais, recursos, tecnologia e experiências de gestões
estrangeiras”, de forma planejada, procurando
direcioná-los “principalmente à infra-estrutura, à
indústria básica e à transformação tecnológica das empresas,
às indústrias de capital e tecnologia intensivos e, na
medida apropriada, às finanças, ao comércio, ao turismo e ao
setor imobiliário (...) ampliar as exportações, melhorar sua
composição elevar sua qualidade e categoria e,
simultaneamente, aumentar, na medida apropriada, as
importações, utilizando mais recursos do exterior e
introduzindo mais tecnologias avançadas.”[110]
-
Terceira tarefa: “reajustar e otimizar a correlação entre
os diversos ramos da economia, atribuindo grande importância
à agricultura e acelerando o desenvolvimento das indústrias
de base, da infra-estrutura e do setor terciário (...)
apoiar-se firmemente na ciência, na tecnologia e na educação
para impulsionar o desenvolvimento da agricultura (...)
acelerar o desenvolvimento e a construção de serviços de
infra-estrutura e de indústrias básicas, tais como o
transporte, as telecomunicações, os recursos energéticos, as
principais matérias-primas e obras hidráulicas (...)
vitalizar as indústrias mecânica, eletrônica, petroquímica,
automobilística e da construção civil e fazer delas os
pilares da economia nacional e desenvolver, sem deixar
escapar o momento, as indústrias de alta e nova tecnologia.”[111]
-
Quarta tarefa: “acelerar o progresso científico e
tecnológico, desenvolver energicamente a educação e pôr em
plena função o papel dos intelectuais (...). A ciência e a
tecnologia constituem a primeira força produtiva. Vitalizar
a economia pressupõe, antes de tudo, vitalizar a ciência e a
tecnologia (...) integração da ciência e tecnologia com a
economia (...) sua transformação em força produtiva real
(...) proteção da propriedade intelectual (...) Os
intelectuais consistem em uma parte da classe operária que
(...) como pioneiros das forças produtivas avançadas,
desempenham um papel de particular importância na reforma e
abertura e na modernização do país.”[112]
-
Quinta tarefa: “fazer valer plenamente as vantagens das
diversas zonas, acelerar o desenvolvimento econômico
regional e promover uma distribuição geográfica racional na
economia do país (...) de acordo com as características
geográficas e os vínculos econômicos que lhes são inerentes,
e esforçar-se por desenvolver diversas economias regionais,
cada qual com suas respectivas peculiaridades.”[113]
6.
Sexta tarefa: “avançar ativamente a reforma da
estrutura política (...) fomento da democracia e da legalidade
socialista (...) construir uma democracia política socialista do
tipo chinês e, em absoluto, não aplicar os sistemas
multipartidários ou parlamentares do ocidente: a
democracia que é praticada na sociedade capitalista é a
democracia burguesa, que é na realidade uma democracia do
capital. São só três aspectos que a caracterizam: a competição
eleitoral multipartidária, a separação dos três poderes e o
sistema bicameral. O nosso é um regime de assembléias populares,
um regime de democracia popular sob a direção do Partido
Comunista”.[114]
(...) “A democracia popular é uma exigência essencial e uma
propriedade inerente ao socialismo. Sem democracia e legalidade,
não há socialismo, nem modernização socialista. (...) Deve-se
aperfeiçoar o sistema de cooperação multipartidária e de
consulta política, dirigido pelo Partido Comunista (...) fazer
valer efetivamente o papel das assembléias de trabalhadores, dos
comitês dos moradores urbanos e dos comitês de aldeões (...)
garantir que os tribunais populares e os fiscais estejam em
condições de trabalhar independentemente e sempre sujeitos às
leis.”[115]
-
Sétima tarefa: “realizar a reforma do sistema
administrativo (...) reduzir de forma seletiva o seu pessoal
e simplificar o seu aparato, assim como elevar sua
eficiência.”[116]
-
Oitava tarefa: “tomar o trabalho com as duas mãos e ter a
mesma firmeza em ambas [na construção material e na
construção espiritual], elevando assim a um novo
nível a civilização espiritual socialista (...) assegurar a
liberdade acadêmica, atribuir importância à integração da
teoria com a prática, realizar pesquisas com espírito
criador, fazer prosperar a filosofia e as ciências sociais e
defender e desenvolver o marxismo (...) perseverar na
orientação de ‘servir ao povo e ao socialismo’ (...)
retificar com decisão as práticas mafiosas e abuso de
atribuições em procura de benefícios egoístas (...)
fortalecer a educação na ética social”.[117]
-
Nona tarefa: “melhorar constantemente as condições de
vida do povo, controlar estritamente o crescimento
demográfico e reforçar a proteção do meio ambiente.”[118]
10
Décima tarefa: “fortalecer a construção do exército e
fortalecer nosso poderio de defesa nacional, a fim de assegurar
a feliz marcha da reforma e abertura e da construção econômica
(...) manter inabalavelmente a absoluta direção do Partido sobre
o exército.”[119]
De forma muito resumida, podemos dizer que o 14º Congresso
consolidou a vitória dentro do Partido da Reforma e da
Abertura preconizadas por Deng Xiaoping, concluiu com êxito
a transição da 2ª geração dirigente (nucleada por Deng Xiaoping)
para a 3ª geração dirigente (liderada por Jiang Zemin) – depois
dos problemas com Hu Yaobang e Zhao Ziyang –, sistematizou a
teoria sobre a construção do socialismo de tipo chinês e definiu
as tarefas para o aprofundamento da Reforma e da
Abertura, visando o estabelecimento de um “sistema de
economia de mercado socialista”:
No 14º Congresso,
o Partido tomou três decisões políticas de grande significado.
Primeiro, aproveitar as oportunidades para acelerar o
desenvolvimento; segundo, definir o estabelecimento de um
sistema de economia de mercado socialista como meta da
reestruturação econômica da China; e, terceiro, estabelecer a
posição orientadora da teoria de Deng Xiaoping sobre a
construção do socialismo do tipo chinês em todo o Partido.[120]
8.5.2 – O aprofundamento da “Modernização Socialista”
(1992/1997)
|
Em 31 de dezembro de 1996, o então ministro
da Indústria Metalúrgica Liu Qin, anunciou
que a produção de aço da China ultrapassou
100 milhões de toneladas, tornando o país o
maior produtor de aço do mundo. |
|
Entre 1992 e 1997, foi dada continuidade no essencial à política
de Reforma e de Abertura ao exterior, prosseguindo
o desenvolvimento acelerado do país, tendo o PIB crescido a uma
taxa média anual de 12,1%. Em conseqüência, já em 1995 a China
conseguiu quadruplicar seu PIB em relação a 1980, concluindo com
cinco anos de antecipação a meta definida para o “segundo
passo”:
Após a 3ª
plenária do 11º Comitê Central do Partido, a disposição
estratégica da construção econômica do nosso país divide-se em
três passos: primeiro, dobrar o PIB com base no de 1980 e
resolver a questão da alimentação e abrigo do povo. Esta tarefa
foi fundamentalmente cumprida. Segundo: quadruplicar o PIB em
fins deste século, de forma que o povo leve uma vida
modestamente confortável. E terceiro, em meados do próximo
século, o PIB per capita atingirá o nível dos países
medianamente desenvolvidos, o povo levará uma vida relativamente
abastada e a modernização será concretizada.”[121]
No comércio exterior verificou-se um boom de exportações
(148,8 bilhões de dólares em 1995, 151,1 bilhões em 1996 e 182,7
bilhões em 1997), com a China passando a ter superávits
permanentes (16,7 bilhões de dólares em 1995, 12,3 bilhões em
1996 e 40,3 bilhões em 1997) e acumulando sólidas reservas
(139,9 bilhões de dólares em 1997).
Em 1993, o Banco Popular da China foi transformado em Banco
Central e o setor financeiro estatal chinês teve um grande
crescimento:
o controle do Estado dá-se em todas as áreas importantes; por
exemplo, no setor bancário; aí, temos quatro grandes bancos
estatais que controlam 80% de todo capital bancário existente no
país, o Banco da China, o Banco da Indústria e Comércio, o Banco
da Construção e o Banco agrícola; além desses quatro, temos 80
outros, dos mais importantes, de governos locais, provinciais,
etc., que representam menos de 20% do capital bancário; e temos
os 24 estrangeiros que chegam mais ou menos a 2% do capital
bancário total.[122]
A produção de cereais chegou a 492,5 milhões de toneladas em
1997 e a produção agrícola em geral aumentou de forma constante.
A obras de infra-estrutura – incluídos os projetos hidráulicos,
de transporte, de telecomunicações – e as indústrias básicas –
como a siderurgia e a de energia – se expandiram enormemente. O
grande crescimento da economia nas regiões centrais e do oeste
diminuíu, em parte, as diferenças regionais. Iniciou-se, também,
a reforma das empresas estatais, buscando a sua modernização e
maior eficiência.
Do total da produção industrial de 1997, o valor agregado das
empresas estatais foi de 31,2%; das empresas com participação
estatal foi, 5,8%; das empresas coletivas, 37,4% (somando 68,6%
de empresas de propriedade social, mais 5,8% com participação
estatal); das empresas mistas nacionais e estrangeiras, de
cooperação e de capital exclusivamente estrangeiro, 14%; das
empresas individuais, urbanas e rurais, 17,4%. Em fins de 1997,
havia 696 milhões de trabalhadores na China, dos quais 147,6
milhões (21,2%) eram trabalhadores urbanos, 26,7 milhões (3,8%)
eram trabalhadores individuais nas cidades e povoados e os
demais se dedicavam à agricultura (75%).[123]
As condições de vida do povo também melhoraram
consideravelmente: a renda per capita aumentou a uma
média anual de 7,2% nas cidades e de 5,7% no campo. Em
conseqüência, nesses cinco anos o número de pobres nas áreas
rurais decresceu 32 milhões. O mercado não sofreu
desabastecimento de mercadorias e as condições de acesso do povo
aos alimentos, roupas, moradia, artigos de uso cotidiano e
transporte melhoraram muito.
No terreno político, houve uma grande renovação dos quadros
dirigentes do Partido e do Estado, substituindo sem traumas os
quadros veteranos. Em fevereiro de 1997, morreu Deng Xiaoping,
sem que isso afetasse em qualquer aspecto a continuidade do
projeto reformador por ele iniciado. Em julho do mesmo ano, Hong
Kong retornou para a soberania chinesa, com júbilo de ambos
lados, sem causar qualquer crise econômica na capitalista Hong
Kong.
Mas, segundo a própria liderança chinesa, avessa às “euforias”,
persistiram problemas, deficiências e limitações:
a qualidade e eficiência da economia nacional em seu conjunto
continuam representando um problema bastante destacado e,
especialmente, parte das empresas estatais carece de vitalidade;
o estilo de trabalho do Partido e do Governo, a conduta social e
a segurança pública, continuam abaixo das expectativas do povo,
a decadência, a corrupção e o esbanjamento e desperdícios, bem
como outros fenômenos indesejáveis continuam difundindo-se e
crescendo, e o burocratismo, o formalismo e a falsificação
constituem sérios problemas; a relação entre a receita e a
distribuição deve ser racionalizada, o desenvolvimento regional
desigual é evidente, parte dos residentes urbanos e rurais leva
uma vida difícil e o crescimento demográfico e o desenvolvimento
econômico causam sérias tensões sobre os recursos naturais e o
meio ambiente.[124]
8.6 - O 15º CONGRESSO E A “ETAPA PRIMÁRIA DO SOCIALISMO” (1997)
|
O 15º Congresso do PC da China realizou-se
em Pequim entre 12 e 18 de setembro de 1997.
Contou com 2.048 delegados titulares e 60
delegados convidados, representando 58
milhões de filiados. |
|
O 15º Congresso do PCCh – realizado em setembro de 1997, após a
morte de Deng Xiaoping e o retorno de Hong Kong à China –
enfatizou, sob a liderança de Jiang Zemin, a necessidade de
defender a bandeira da “Teoria de Deng Xiaoping”, que “é
o marxismo da China atual e representa uma nova etapa do
desenvolvimento do marxismo na China”.
Além do esforço de sistematização da “teoria de Deng Xiaoping”
e da defesa da continuidade do projeto reformador, o 15º
Congresso procurou definir os eixos fundamentais da política do
Partido para a “etapa primária do socialismo”:
A fase inicial do socialismo é uma etapa histórica na medida em
que gradualmente poremos fim ao subdesenvolvimento e
materializaremos fundamentalmente a modernização socialista; é
uma etapa histórica na qual um país agrícola, em que as pessoas
dedicadas à agricultura ocupam uma percentagem muito grande da
população e dependem principalmente do trabalho manual,
gradualmente se converterá num país industrial onde a população
não rural será a maioria e em que se praticará uma agricultura
moderna, além de desenvolver o setor de serviços; é uma etapa
histórica em que uma sociedade com uma grande proporção de
economia natural e semi-natural gradualmente se converterá em
outra com uma economia voltada para um mercado bastante
desenvolvido; é uma etapa histórica em que a sociedade com uma
grande proporção analfabetos ou semi-alfabetizados e com uma
ciência, uma tecnologia, uma educação e uma cultura atrasadas se
converterá, passo a passo em outra com ciência, tecnologia,
educação e cultura relativamente desenvolvidas; é uma etapa
histórica em que uma sociedade onde a gente afetada pela pobreza
é uma grande parte da população e as pessoas ainda têm um nível
de vida relativamente baixo e se converterá gradualmente em
outra, onde toda a população terá uma vida relativamente
confortável; é uma etapa histórica em que uma sociedade com
desenvolvimento econômico e cultural muito desigual entre as
regiões se converterá em outra em que a brecha se reduzirá
gradualmente (...). Este processo histórico levará pelo menos um
século.[125]
Ao analisar as questões econômicas, o Congresso levantou oito
pontos:
1)
Reajustar e melhorar a estrutura de propriedade, mantendo a
propriedade pública como dominante, mas utilizando todas as
demais formas que sirvam ao incremento das forças produtivas:
O setor público
inclui não somente os setores de propriedade estatal e coletiva,
mas também os elementos de propriedade estatal e coletiva no
setor da propriedade mista. A posição dominante da propriedade
pública deve manifestar-se principalmente da seguinte maneira:
os ativos públicos dominam o total dos ativos da sociedade e o
setor de propriedade estatal controla os aspectos fundamentais
da economia nacional e tem um papel dirigente no desenvolvimento
econômico.[126]
2)
Acelerar a reforma das empresas estatais, separando a
propriedade da gestão, garantindo uma administração moderna e
científica.
3)
Melhorar a estrutura e o modo de distribuição, tendo o trabalho
como fundamento; combinar a remuneração de acordo com o trabalho
com a remuneração de acordo com os fatores de produção,
permitindo, além do trabalho, considerar o capital, a tecnologia
e outros fatores de produção na distribuição dos lucros; para
coibir a polarização, aperfeiçoar o imposto de renda e criar
novos tributos como sobre a herança.
4)
Pôr em pleno jogo o papel do mercado e aperfeiçoar os controles
macro-econômicos.
5)
Fortalecer a agricultura como fundamento da economia e otimizar
a estrutura econômica.
6)
Implementar estratégias de prosperidade do país mediante a
ciência e a educação, buscando um desenvolvimento sustentável;
fortalecer o controle sobre a poluição e melhorar o ambiente
ecológico.
7)
Aperfeiçoar a abertura ao exterior.
8)
Melhorar as condições materiais de vida da população e
enriquecer a sua vida cultural.
No tocante à reforma do sistema político, o Congresso enfatizou
cinco pontos:
1)
Aperfeiçoar o sistema de democracia.
2)
Reforçar o sistema legal.
3)
Promover a reforma das instituições.
4)
Melhorar o sistema de supervisão democrática.
5)
Salvaguardar a estabilidade e a unidade.
O Congresso ainda se debruçou sobre a “construção da cultura
socialista do tipo chinês”, “a reunificação pacífica da
pátria” e “o partido comunista frente ao novo século”.
Ao analisar o foco da luta ideológica, o Congresso fez uma clara
flexão ao afirmar: “Devemos manter-nos vigilantes em relação
às tendências de direita, mas principalmente em relação às
tendências de esquerda”.[127]
O
15º Congresso reelegeu Jiang Zemin Secretário Geral do Comitê
Central e Presidente da Comissão Militar do Comitê Central. Para
o Comitê Permanente do Birô Político do Comitê Central, além de
Jiang Zemin, foram eleitos Li Peng, Zhu Rongji, Li Ruihuan, Hu
Jintao, Wei Jianxing e Li Lanqing.
Na 1ª Sessão Plenária da Assembléia Popular Nacional da China,
realizada em março de 1998, Jiang Zemin foi reeleito Presidente
da República Popular da China e Presidente da sua Comissão
Militar Central; Hu Jintao foi eleito Vice-Presidente da RPC e
Li Peng Presidente da APN.
8.6.1 – O elevado crescimento chinês no contexto da Crise
Asiática
Apesar de todo o vendaval que significou a “crise asiática” de
1997, a economia chinesa continuou crescendo em ritmo elevado,
como se nada tivesse acontecido: 8% em 1998 e 8% em 1999; o seu
comércio internacional se ampliou ainda mais (324 bilhões de
dólares em 1998 e 360,7 bilhões em 1999), os seus superávits
comerciais cresceram (43,6 bilhões de dólares em 1998 e 29,1
bilhões em 1999) e as suas reservas bateram novos recordes (145
bilhões de dólares em 1998 e 157,4 bilhões em 1999).
O contraste com o crescimento da economia mundial é enorme: se
em 1997 este já havia sido pequeno – apenas 4,1% –, em 1998
despencou para apenas 2%. Mesmo no dinâmico sudoeste asiático,
os chamados “tigres” e “dragões”, de primeira e de segunda
geração, entraram em crise: a Coréia do Sul, a Malásia e a
Tailândia viram os seus PIBs diminuírem 6,5%; na Indonésia, a
queda ainda foi maior, 16%:
No campo econômico, mesmo num quadro da crise das economias
asiáticas e de desaceleração do crescimento da economia mundial,
o PIB chinês variou a impressionantes médias anuais (97/02) de
7,7%, as maiores do planeta. Dentre outras, as causas para isso
estão, por exemplo, no crescimento do investimento em C&T e
Inovação em relação ao PIB, que evoluiu de 0,64% em 1997 para
1,13% em 2002. As reservas internacionais em divisas aumentaram
de US$ 139,9 bilhões para 286,4 bilhões no mesmo período, cifra
bastante elevada num país em desenvolvimento. Já é o 5º país do
mundo em volume do comércio exterior. A taxa de desemprego
permanece baixa para um país das dimensões chinesas, na casa de
4,5%, e a renda per capita da população urbana e das aldeias
avançou, na média anual, em 8,6%.[128]
Esses resultados, verdadeiramente impressionantes, desmentem as
opiniões daqueles que vêem no atual desenvolvimento chinês algo
frágil e artificial, baseado puramente no mercado externo, uma “inserção
subordinada na globalização imperialista”, que teria
aumentado enormemente a dependência da China aos países
capitalistas avançados e elevado a sua vulnerabilidade externa:
As exportações,
crescentemente industriais (...) aumentaram rapidamente. Entre
1985 e 1996, multiplicaram-se mais de cinco vezes; na primeira
data representavam cerca de 10% do PIB, na Segunda, 22% (Banco
Mundial - China, 1997). A proporção subiu, mas se manteve muito
abaixo dos níveis alcançados pelos tigres asiáticos. Por
exemplo, a Coréia do Sul, na mesma época, superava 44%. O salto
exportador coexistiu com uma retaguarda interna muito ampla.
Ainda que as vendas externas tivessem agora um enorme peso
relativo na economia nacional, não a satelizaram, como ocorreu
com os tigres e dragões asiáticos. Também aumentaram os
investimentos, mas isso se produziu com uma taxa de poupança
interna elevada. (...) tratava-se de uma posição externa sólida
se a compararmos com o resto dos países emergentes dessa região.
Foi essa situação que atraiu enormes fluxos de investimentos
diretos, sobretudo na década de 90 (3,7 bilhões de dólares em
1990, 11,3 bilhões em 1992, quase 38 bilhões em 1995), ainda que
a participação de países ou grupos econômicos não-chineses tenha
permanecido minoritária: em 1995 só 8% provinham dos Estados
Unidos. Os outros dois grandes investidores externos, a Coréia
do Sul e o Japão mantinham proporções semelhantes (Banco Mundial
– China, ibid.).[129]
Nesse sentido, é importante conhecer a visão da liderança
chinesa acerca da relação entre o mercado interno e o mercado
externo na modernização socialista:
Persistir na
ampliação da demanda interna é uma diretriz estratégica de longo
alcance no desenvolvimento econômico do nosso país. A promoção
da economia tomando a demanda interna como principal é
determinada pela realidade fundamental do nosso país. Como um
país populoso em desenvolvimento, a China tem amplos espaços
para acelerar a construção econômica e elevar o nível de vida do
povo. O amplo mercado interno é a nossa maior vantagem. Ante a
concorrência cada vez mais acirrada no mercado internacional e
as mudanças complexas na economia mundial, apoiar-se na demanda
interna possibilita à nossa economia uma grande margem de
operação para elevar a capacidade de resistência aos riscos
econômicos internacionais. (...) Nos últimos anos, resistimos
com sucesso ao impacto da crise monetária asiática, controlamos
com eficácia a tendência inflacionária e mantivemos um rápido
desenvolvimento econômico. Tudo isso se deve, em grande grau, à
diretriz de ampliar a demanda interna.[130]
No terreno político, o PCCh colocou o centro dos seus
esforços na ampliação da democracia através das assembléias e
conselhos de aldeias e a simplificação dos governos nas vilas e
comarcas [cantões]:
Atualmente, deve-se priorizar a construção do sistema
democrático no nível de aldeia e implementar, conforme a lei,
três sistemas: primeiro, o sistema de eleição direta da comissão
dos aldeões para que as massas camponesas elejam as pessoas
satisfatórias para a administração dos assuntos das aldeias.
Segundo, o sistema de debate dos aldeões sobre os assuntos da
aldeia, todos os assuntos importantes, especialmente as questões
relacionadas com os interesses vitais das famílias devem ser
discutidos pelas assembléias dos aldeões ou pelos representantes
eleitos pelos aldeões, em vez de ser decididos por poucas
pessoas. E, terceiro, pôr em prática o sistema de transparência
dos assuntos da aldeia: todos os assuntos de interesse das
massas devem ser publicados periodicamente entre os aldeões e
supervisionados pelas massas. (...) Os governos de vilas e
comarcas também deve, transformar efetivamente as funções e
simplificar seu organismo e pessoal. Agora os encargos dos
camponeses são muito pesados, e um dos principais motivos disso
reside na quantidade excessiva de pessoal sustentado pelos
camponeses.[131]
8.6.2 – A reforma das Estatais, elo central da Reforma econômica
|
Obra representativa do investimento estatal,
a represa Yangtze Three Gorges é o maior
complexo hidrelétrico já construído no
mundo. A construção começou em 14 de
dezembro de 1994, e o fechamento do rio foi
concluído em 8 de novembro de 1997, marcando
a conclusão bem-sucedida da Fase I do
projeto. |
|
O
PCCh sempre procurou fortalecer o papel preponderante das
empresas públicas “de propriedade de todo povo” na
construção da “sociedade socialista de mercado”:
Nos vinte anos
entre 1978 e 1998, em média, o valor global da produção
industrial das empresas estatais e das holdings estatais
aumentou 8,7% ao ano, o valor total dos ativos 16,8% ao ano e o
valor de impostos, 12,3%. Os setores chaves, como financeiro,
ferroviário, de telecomunicações, de aviação civil, petrolífero
e de energia elétrica, estão fundamentalmente sob o controle das
empresas estatais; nos setores básicos, como os de energia,
transporte e correios, e em importantes setores de
matérias-primas e indústria de base – como os siderúrgico,
petroquímico, automobilístico, mecânico e eletrônico – a
economia estatal ocupa a posição dominante. A produção de
importantes produtos industriais como aço, carvão e
fertilizantes saltou para o primeiro lugar no mundo, e a de
eletricidade, petróleo bruto e fibras sintéticas está na
dianteira do mundo. Todos os produtos acima referidos são
fabricados principalmente pelas empresas estatais ou pelas
holdings estatais. As empresas estatais continuam sendo a fonte
principal da receita financeira do Estado, 55% da qual vêm dos
impostos por elas pagos (...). Ao mesmo tempo, algumas empresas
carecem de flexibilidade no mecanismo operacional, sua produção
e operação encontram-se numa situação difícil, com baixa
rentabilidade econômica e um índice demasiadamente alto de
passivos, numeroso pessoal excedente, pesados encargos sociais e
vida relativamente difícil por parte de seus empregados. (...)
Algumas minas encontram-se em estado difícil devido ao
esgotamento dos recursos decorrente do abuso de exploração
durante muitos anos (...) ao impulsionar a reforma e o
desenvolvimento das empresas estatais, visamos (...) fortalecer
o papel dirigente e a capacidade de controle da economia
estatal. (...) Devemos empreender ativamente o trabalho e
avançar com coragem, mas não podemos realizar a privatização.
Trata-se de um grande princípio em que não podemos hesitar.[132]
Chamamos a atenção, nessa longa citação, para a afirmação
peremptória no sentido da “não privatização das estatais”,
questão considerada, inclusive, como uma questão de princípio.
Ao mesmo tempo, porém, que o Partido continuou reafirmando o
papel dirigente das empresas estatais no processo da
modernização socialista, nunca deixou de se preocupar com o
número exagerado de estatais (e a dispersão de esforços que isso
significa) e os graves problemas de burocratismo, ineficiência e
baixa produtividade de algumas delas:
existem na China
79.000 empresas de propriedade estatal*, e algumas
são muito pequenas, com apenas algumas dezenas de trabalhadores
(...) porém, existem 500 empresas extraordinariamente grandes
(...) somente 10% dessas 500 empresas, umas 50, têm prejuízos
atualmente (...) em três anos tiraremos das dificuldades a maior
parte delas.
(“O número de estatais na China varia de acordo com os
critérios. Rongji refere-se as estatais, digamos, federais.
Admite-se que incluindo estatais de províncias esse número vai
de 300 a 400 mil.” [nota de autoria de Haroldo Lima])[133]
Em função disso, a partir de certo momento o Partido fez da
reforma das estatais o elo central da Reforma econômica:
“Para estabelecer o sistema de economia de mercado socialista
e integrar organicamente o sistema de propriedade pública com a
economia de mercado, é necessário considerar a reforma das
empresas estatais o elo central da reforma do sistema econômico”[134].
Para isso, buscou revitalizar o setor estatal, concentrando os
seus esforços em um número menor de grandes empresas e nos
setores estratégicos, as quais passaram por transformações
estruturais com o objetivo de aumentar a produtividade do
trabalho, incorporar tecnologias avançadas e ganhar
competitividade, tudo isso combinado com uma “gestão empresarial
moderna”. Alguns exemplos são elucidativos desses ajustes:
Baogan é a maior
estatal que opera com ferro e aço na China e situa-se em
Shanghai. Sua primeira fase começou a operar em 1985, quando o
processo de reforma já se iniciava. Sua segunda fase foi
inaugurada em 1991 e, nas duas fases, trabalhavam 40.000
pessoas. A reforma encampou a idéia das corporações ou dos
conglomerados, encaminhando para separar do corpo principal da
siderúrgica, a partir de 1990, os departamentos que pudessem
manter ligações próprias com o mercado. A oficina de lingotes
deu lugar à Fundição de Baogang. Outra oficina se converteu em
fábrica de processamento de Maquinaria. O setor de transporte
formou a Companhia de Transporte de Baogang. E todas essas
empresas passaram a funcionar com a concepção de “gestão
empresarial moderna”, buscando aumentar a produtividade do
trabalho, incorporar tecnologia avançada e ganhar
competitividade. (...) Baogang deve se converter, em 2010, em
uma transnacional estatal, que atua na indústria, no comércio e
nas finanças (...).[135]
Ao mesmo tempo, o Governo não descurou de milhares de empresas
estatais menores, em dificuldades, e manteve tarifas aduaneiras
protetoras para viabilizar sua recuperação ou a sua
transformação em “propriedade cooperativa por ações”,
“propriedade por ações” ou “propriedade individual”. As reformas
passaram a prever, também, a possibilidade de reorganização,
associação, fusão com outras, arrendamento, operação sob
contrato, cooperação por ações, falência, dissolução ou venda:
Devemos conduzir
reformas padronizadas nas empresas grandes e médias de
propriedade estatal de acordo com os requerimentos de ‘nítida
definição das relações de propriedade, definição dos direitos e
responsabilidades, separação da administração governamental na
gestão das empresas e administração científica’ (...) devemos
efetuar uma reorganização estratégica das empresas de
propriedade estatal, administrando bem as grandes empresas, ao
mesmo tempo em que adotamos uma política flexível com relação às
pequenas. (...) devemos organizar grandes grupos de empresas
altamente competitivas trans-regionais, inter-setoriais, de
diversas formas de propriedade, e multinacionais. Devemos,
também, acelerar o passo na redução do controle sobre as
pequenas empresas de propriedade estatal e revigorá-las por meio
de reorganização, associação, fusão, arrendamento, operação sob
contrato, cooperação por ações ou venda.[136]
Para evitar mal-entendidos, é importante esclarecer que a
hipótese de “venda” só se aplica às pequenas estatais, sem valor
estratégico, como alternativa à sua falência ou dissolução.
De todas essas alternativas, a mais importante foi a propriedade
cooperativa por ações, onde os trabalhadores de uma firma
compram seus ativos em ações. Essa venda só é permitida a quem
trabalha na empresa. Se o trabalhador sair da empresa, não
poderá levar as suas ações, que devem ser transferidas a
trabalhadores da empresa. A remuneração é feita de acordo com o
princípio “a cada um de acordo com o seu trabalho”, mas
também são admitidos rendimentos por participação acionária.
Entre 1993 e 1997, em Sichuam, no oeste da China, 3.700 pequenas
estatais deixaram de ser propriedade exclusivamente estatal
através dessa política. Surgiram diversas formas de propriedade,
havendo uma alteração nos direitos de propriedade dessas
empresas, que tinham no máximo 500 trabalhadores cada. A
propriedade cooperativa por ações predominou e cerca de 100 mil
trabalhadores tornaram-se acionistas das empresas anteriormente
estatais.
É
importante observar o cuidado do Governo com os trabalhadores
dispensados pelo processo de reajustamento das estatais e com as
medidas para enfrentar o problema:
A transferência
do pessoal excedente a outros postos, a redução do pessoal, a
elevação da eficiência e a execução do projeto de recolocação
constituem uma importante medida para a solução da questão do
pessoal excedente das empresas estatais. (...) Para julgar se é
bem feita a reforma e o desenvolvimento em uma empresa, é
necessário não só considerar se ela conseguiu reduzir o seu
prejuízo e aumentar o seu lucro, mas também se ela zelou
verdadeiramente pela ideologia, pela vida e pela recolocação do
pessoal. As autoridades centrais decidiram elevar o nível de
garantia da vida básica e o seguro-desemprego dos trabalhadores
deslocados das empresas estatais e o nível de garantia mínima da
vida dos residentes urbanos. Os departamentos financeiros
centrais concederão subsídios adequados às velhas bases
industriais e à região Centro-Oeste com dificuldades financeiras.[137]
Um exemplo disso é o processo de ajuste da mina nº 1 de Shanxi,
que produzia 900 mil toneladas anuais de carvão, utilizando
5.000 trabalhadores. Em novembro de 1991, o seu processo de
produção, sistemas de trabalho, pessoal e salários foram
reformados e racionalizados. Nos seis meses seguintes, a mina
havia produzido 807.000 toneladas de carvão com apenas 1.300
trabalhadores, 36,5% a mais que no mesmo período do ano
anterior. A produtividade aumentou quase sete vezes. Em
conseqüência, o custo do carvão baixou e a mina – que no ano
anterior havia tido um prejuízo de 19 milhões de yuans – fechou
o ano com um lucro de 5 milhões de yuans. O que fazer, então,
com os 3.700 trabalhadores ociosos? Não despedir ninguém
manteria a empresa deficitária. Um socialismo que se baseasse em
empresas deficitárias mergulharia em uma profunda crise e, a
médio prazo, o colapso dessas empresas ou do conjunto da
economia, levaria ao desemprego de todos. Para enfrentar esse
dilema, a administração criou uma corporação para organizar
novas indústrias com o pessoal excedente. Assim, surgiram uma
empresa de construção civil, uma fábrica de brita e areia, uma
agroindústria, uma organização comercial e um setor de serviços.
A estatal foi mantida, sua eficiência aumentada e os empregos
garantidos.[138]
8.7 – O 16º CONGRESSO E O “TERCEIRO PASSO” DA MODERNIZAÇÃO
(2002)
|
O 16º Congresso Nacional do PC da China
realizou-se em Pequim entre 8 e 14 de
novembro de 2002. Contou com 2.114 delegados
titulares e 40 delegados convidados,
representando 66 milhões de filiados. |
|
Em novembro de 2002, realizou o 16º Congresso do PCCh, o
primeiro do novo século, no contexto do “terceiro passo da
modernização socialista”. Sob a direção de Jiang Zemin, o
conclave avaliou positivamente a aplicação da Reforma e
da Abertura no qüinqüênio anterior:
Estabeleceu-se de maneira preliminar o sistema de economia de
mercado socialista. Fortaleceu-se ainda mais a economia de
propriedade pública e impulsionou-se a passos sólidos a reforma
das empresas de propriedade estatal. A economia individual, a
privada e outras de propriedade não pública registraram um
desenvolvimento relativamente veloz. Desenvolveu-se em todos os
terrenos a construção do sistema de mercado, aperfeiçoou-se
ininterruptamente o sistema de regulação e controle
macro-econômicos e se agilizaram os passos na transformação das
instituições governamentais. Com a incorporação do nosso país à
Organização Mundial do Comércio, a abertura ao exterior entrou
em uma nova etapa.[139]
A Abertura ao exterior havia prosseguido com grandes
vantagens para a China, que ampliou enormemente o seu comércio
internacional, tornou-se o principal país do mundo em atração de
investimentos externos diretos, obteve sucessivos superávits
na balança comercial, acumulou divisas significativas e
obteve tecnologia de ponta em setores estratégicos da economia:
Mais de 85% do
investimento estrangeiro na China provém de Hong Kong, Taiwan,
Cingapura e Japão. (...) Segundo o jornal China Daily, nada
menos que 80% dos 57,5 bilhões em investimentos estrangeiros
contratados em 1992 provêm dos compatriotas de Taiwan,
Hong Kong, Macau e de chineses de outros países. O poder
emocional dessa ligação não pode ser subestimado. Os membros da
diáspora não estão só investindo. Eles constroem hospitais,
universidades e contribuem com as cidades onde nasceram, para
onde retornam com o objetivo de reverenciar os ancestrais.[140]
O 16º Congresso incorporou no Programa e nos Estatutos
partidários o conceito da “Tripla Representatividade”, formulado
por Jiang Zemin em 2000, que significa que a ação do Partido
deve guiar-se pelo desenvolvimento das forças produtivas
avançadas da China, pelo progresso de sua cultura avançada e
pelos interesses fundamentais das mais amplas massas populares.
Em seu informe, Jiang Zemin elencou dez pontos orientadores:
1.
Persistir em tomar a teoria de Deng Xiaoping como guia e
impulsionar incessantemente a inovação teórica. (...) 2.
Persistir em tomar a construção econômica como a tarefa central
e resolver com o método do desenvolvimento os problemas surgidos
no curso do avanço. (...) 3. Persistir na reforma e na
abertura e melhorar continuamente o sistema de economia de
mercado socialista. (...) 4. Persistir nos quatro
princípios fundamentais e desenvolver a política democrática
socialista. (...) 5. Persistir em fomentar a civilização
tanto no material como no espiritual e combinar a administração
do país segundo a lei com a administração do mesmo pela
moralidade. (...) 6. Persistir no princípio de apreciar a
estabilidade acima de tudo e tratar corretamente a relação entre
a reforma, o desenvolvimento e a estabilidade. (...) 7.
Persistir na direção absoluta do Partido sobre o exército e
seguir o caminho com peculiaridades chinesas para construir uma
força seleta. (...) 8. Persistir em unir as forças
suscetíveis de serem unidas e incrementar sem cessar a coesão da
nação chinesa. (...) 9. Persistir na política exterior
independente e de paz, salvaguardar a paz mundial e promover o
desenvolvimento comum. (...) 10. Persistir em fortalecer
e melhorar a direção do Partido e levar adiante a nova e grande
obra da construção do Partido em todos os sentidos.[141]
No âmbito econômico e social, o 16º Congresso colocou como meta
central para os próximos 20 anos a quadruplicação do Produto
Interno Bruto e a construção de uma sociedade em que o povo
chinês tenha uma vida “modestamente acomodada”, “onde
cada cidadão deve contribuir segundo a sua capacidade, cada um
ter a sua adequada colocação e todos viverem em harmonia”.
Três fenômenos, aparentemente contraditórios, foram apontados
para um maior desenvolvimento teórico: 1) A unidade entre
a adesão aos princípios fundamentais do marxismo e a inovação
teórica; 2) A unidade entre a fidelidade às tradições do
Partido e o aprendizado do espírito da época; 3) A
unidade entre o fortalecimento da base classista do Partido e a
ampliação de sua base de massas.
O 16º Congresso foi marcado também por uma ampla renovação da
direção do Partido e do Estado e pela ascensão da “quarta
geração” de líderes da revolução chinesa (a primeira foi a
nucleada por Mao Zedong, a segunda por Deng Xiaoping e a
terceira por Jiang Zemin). Fiel à política – instituída por Deng
Xiaoping – de “aposentadoria” dos quadros mais velhos, para
abrir caminho aos jovens – Jiang Zemin (74 anos), que estava a
frente do PCCh desde 1989 (quando substituiu Zhao Ziyang na
Secretaria Geral do Partido), renunciou e foi substituído por Hu
Jintao.
Hu Jintao (...)
no início dos anos 80 era um jovem integrante da Comissão de
Construção na obscura e árida província de Guizhou, no noroeste
do país. Sua inteligência e eficácia foram notadas pelo
secretário provincial do partido que o guindou ao posto de
sub-chefe da comissão, atropelando diversos postulantes. De lá,
Hu passou à Liga da Juventude Comunista, em Pequim, onde
permaneceu pouco tempo. Aceitou as designações para
secretário-geral do partido em duas das províncias mais pobres –
Guizhou e Tibete. Nesta última, decretou lei marcial em março de
89, para enfrentar uma onda de protestos. Ao fazê-lo, abriu um
precedente na história da República Popular da China e se
antecipou às autoridades centrais, que adotariam o mesmo
procedimento três meses mais tarde em Pequim, contra a revolta
de Tian’anmen. (...) Houve uma única disputa: Li Ruihuan,
considerado favorável a eleições mais abertas, amplas, deveria
ou não permanecer na Comissão Permanente? Ela foi resolvida em
favor do novo secretário Geral: Li ficou de fora, como queria
Hu.[142]
Hu Jintao, hoje com 59 anos, foi 1º Secretário da Liga da
Juventude Comunista, em meados da década de 80, Secretário-Geral
do Partido em Guizhou e no Tibet, membro da Comissão Permanente
do Birô Político do Comitê Central e Vice-Presidente da
República, desde 1998. Todos os outros membros da Comissão
Permanente também se afastaram, sendo substituídos por Wen
Jiabao (60), Wu Bangguo (61), Luo Gan (67), Zeng Qinghong (63),
Li Changchum (58), Jia Qinglin (62), Huang Ju (64) e Wo
Guangzheng (64). Jiang Zemin continuou a frente da Comissão
Militar do PCCh.
Em março de 2003, quando se reuniu a 1ª Sessão da 10ª Assembléia
Popular Nacional (APN). Jiang Zemin também renunciou a seu cargo
de Presidente da República, continuando somente na Presidência
da Comissão Militar da APN. Nessa ocasião, Hu Jintao foi eleito
Presidente da República Popular da China. Para a Presidência do
Comitê Permanente da APN foi eleito Wu Bangguo (que já havia
sido Vice-Primeiro-Ministro na década de 90), em substituição a
Li Peng.
A APN definiu as principais tarefas econômicas para o próximo
período:
Dentre elas, se
destacam a consecução da melhoria do nível de vida do povo como
um objetivo econômico – o que soaria muito estranho na cabeça de
um tecnocrata ocidental –; a necessidade premente de retificar,
regulamentar e incrementar a supervisão e o controle sobre a
ordem da economia socialista de mercado, colocando o setor
privado da economia socialista sob a direção e indução dos
interesses maiores do Estado; a realização de uma campanha pelo
desenvolvimento do Oeste da China, buscando desenvolver mais
rapidamente as províncias do Leste (mais desenvolvidas) e as
províncias do Oeste (menos desenvolvidas), inclusive com a
realização de grandes obras de infraestrutura; o enfrentamento
das diferenças entre a cidade e o campo e a necessidade de
melhorar o nível de renda dos camponeses, haja visto que se
registra movimentos de cerca de 80 milhões de camponeses em
direção às prósperas cidades da costa leste.[143]
8.8 - HONG KONG, MACAO, TAIWAN E CHINA: “UM PAÍS, DOIS
SISTEMAS”
|
Em 1º de julho de 1997, Hong Kong foi
devolvida à China pelo Reino Unido. Hong
Kong torna-se uma Região Administrativa
Especial da República Popular da China sob o
princípio "um país, dois sistemas". |
|
Ainda que não seja o nosso objetivo analisar a política externa
chinesa, faremos alguns rápidos comentários sobre a problemática
da reunificação e sobre a política chinesa de “Um país, dois
sistemas”.
Desde o início dos anos 80, o PCCh orientou sua política externa
pela “luta contra o hegemonismo e em defesa da paz mundial”,
buscando construir um ambiente de paz, favorável à concretização
das “quatro modernizações”. Política à qual devem ser
agregados os “Cinco Princípios de Coexistência Pacífica”,
defendidos pela China desde a década de 50:
A China,
atendo-se firmemente a sua política exterior independente e aos
cinco princípios – respeito mútuo à soberania e à integridade
territorial, não agressão, não intervenção de um nos assuntos
internos de outro, igualdade e benefício recíproco e
coexistência pacífica –, desenvolve suas relações diplomáticas e
intercâmbios econômicos e culturais com os demais países;
persiste na luta contra o imperialismo, o hegemonismo e o
colonialismo, fortalece sua unidade com os outros povos do
mundo, apóia as nações oprimidas e os países em desenvolvimento
em sua justa luta pela conquista e a salvaguarda da
independência nacional e pelo fomento da economia nacional, e
trabalha para defender a paz mundial e promover a causa do
progresso da humanidade.[144]
Tendo por Norte essas esses princípios, a China procurou nos
anos 80 enfrentar a tarefa histórica da reunificação da pátria,
o que implicava, inicialmente, o retorno à soberania do Estado
chinês de Hong Kong e Macao. Era necessário estabelecer
negociações com os governos da Inglaterra e de Portugal e
resolver intrincados problemas, como o fato da existência do
sistema capitalista em Hong Kong e Macao e do sistema socialista
na China.
Para isso, Deng Xiaoping – então à frente do governo e do
Partido – propôs a política de “Um país, dois sistemas”,
que significava no essencial a aceitação da existência, dentro
da China reunificada, de dois sistemas sociais coexistindo por
um longo período. Assim, quando a China recuperasse a sua
soberania sobre Hong Kong e Macao, estabeleceria em ambos os
territórios Regiões Administrativas Especiais, com alto grau de
autonomia, onde está assegurado por 50 anos a manutenção do
sistema capitalista de produção: “Em um grande país
socialista como este, permitir a algumas pequenas regiões
particulares a aplicação do sistema capitalista não será
prejudicial, e sim favorável, para o desenvolvimento da causa
socialista no seu conjunto.”[145]
Com base nessa política, em dezembro de 1984, após dois anos de
negociação, os governos chinês e britânico assinaram em Beijing
a “Declaração Conjunta sobre o Problema de Hong Kong”,
definindo o retorno de Hong Kong à soberania chinesa no dia 1º
de julho de 1997. De maneira similar, em abril de 1987, China e
Portugal firmaram em Pequim a “Declaração Conjunta sobre o
Problema da Macao”, estipulando que Macao retornaria a ser
território chinês a partir de 20 de dezembro de 1999. Ambas
reintegrações ao território da China já ocorreram, sem qualquer
trauma na transição ou prejuízo no terreno econômico.
Cabe notar que esta unificação – principalmente com Hong Kong e
futuramente com Taiwan – foi sendo construída sobre bases
econômicas sólidas, tendo em vista o grande incremento das
relações comerciais e os pesados investimentos diretos, que
criaram laços cada vez mais estreitos entre as suas economias:
É importante salientar (...) a cada vez mais estreita imbricação
do que alguns autores chamam de “triângulo de crescimento da
China meridional” ou de “Área Econômica Chinesa”, que inclui as
novas “regiões administrativas especiais” de Hong Kong e de
Macau, assim como Taiwan. Com a incorporação de Hong Kong, o
território da China aumentou 0,01% e a sua população 0,5%, mas o
seu PIB cerca de 20% em dólares correntes (e quase 5% em
paridade de poder aquisitivo. Com Taiwan, seria mais um aumento
em torno de 40% (ou de quase 10%). (...) Os vínculos entre a
República Popular, Hong Kong e Taiwan cresceram aceleradamente
como conseqüência da abertura chinesa. Das exportações de
Taiwan, a porcentagem destinada a Hong Kong passou de menos de
10% em 1980 para mais de 20% em 1993, ultrapassando em 1995 as
que se dirigiam aos Estados Unidos. Desde 1995, uma manobra
administrativa permite contornar a proibição de laços comerciais
diretos pela criação bastante artificial de um porto off-shore
em Taiwan, teoricamente fora do seu território aduaneiro. (...)
Algo semelhante passou com as exportações de Hong Kong, onde o
mercado chinês superou o norte-americano no início dos anos 90.
A China, que exportava porcentagens similares para Hong Kong e
para o Japão em 1980, enviava mais de 40% do total ao enclave
inglês em 1992, contra pouco mais de 10% ao Japão. (...)
Resumindo, a crescente interconexão de Taiwan, Hong Kong e a
República Popular pelo comércio e os investimentos mútuos fazem
surgir, independentemente das tensões políticas recorrentes, um
gigante econômico que supera amplamente as cifras que
correspondem apenas à China. A maior parte dos investimentos
“estrangeiros” na China provém de Hong Kong e, em muito menor
escala, de Taiwan. Por outro lado, a China Popular já é o
primeiro investidor exterior em Hong Kong há vários anos.[146]
Essa mesma política – de “Um país, dois sistemas” – está
sendo proposta para a reunificação de Taiwan:
Como uma região
administrativa especial, Taiwan gozará de um alto grau de
autonomia, terá independência judicial e não requererá a
autorização de Beijing para as sentenças de última instância;
poderá manter o seu exército e os interesses das autoridades
taiwanesas e das partes pertinentes, assim como do povo de
Taiwan, serão garantidos de maneira efetiva.[147]
Hong Kong e Macao já voltaram a fazer parte na China. Falta
unicamente que Taiwan o faça para que o antigo sonho da
reunificação da China se torne realidade.
9
- OS GRANDES ÊXITOS DA CHINA REFORMADA
Um balanço objetivo dessas décadas transcorridas desde o início
das Reformas na China, nos permite perceber enormes
êxitos econômicos, sociais, político e diplomáticos.
Em conseqüência da Reforma e da Abertura e do novo
modelo de Economia Socialista de Mercado, a China é o
país que mais cresce no mundo há quatro décadas, de forma
ininterrupta e a uma taxa média de 9% ao ano. Por essa razão, em
1995 havia quadruplicdo o seu Produto Interno Bruto em relação a
1978. Em 2003 – segundo matéria da revista VEJA –, o seu PIB já
era estimado em US$1,2 trilhões, ao câmbio oficial.[148].
Porém, como o custo de vida de vida na China era cinco vezes
inferior ao dos Estados Unidos, o seu PIB real (em valores
equivalentes) subiria para US$ 6 trilhões, tornando-se, em
valores absolutos, a segunda economia do mundo, atrás somente do
EUA (então com um PIB de US$10,4 trilhões) e a frente do Japão
(US$3 trilhões):
estimar a ordem
de grandeza da economia chinesa é difícil. À primeira vista, não
chega a ser impressionante: convertida pela taxa de câmbio é de
menos de US$ 1 trilhão (...). Mas, segundo estimativas usadas
pelo insuspeito serviço de informações americano (CIA), o custo
de vida na China é cinco vezes menos que nos Estados Unidos – ou
seja, um yuan compra cinco vezes mais do que o câmbio sugere.
Aluguéis, produtos básicos e serviços públicos são subsidiados
pelo Estado e extremamente baratos. Levando isso em conta, (...)
a economia chinesa salta para US$ 4,9 trilhões (metade da
americana ) e é a segunda do mundo – 70% maior que a do Japão -
com renda per capita de US$ 4.000, comparável à média dos países
latino-americanos.[149]
O
Governo chinês prevê um crescimento anual de 7,2% nas duas
primeiras décadas desse século e de 5,4% entre 2030 e 2050. Para
isso tem um grande programa de investimentos em infra-estrutura
(energia, telecomunicações, transportes, saneamento) e de
desenvolvimento do Oeste da China. Segundo o economista Jorge
Beinstein, “um recente documento do FMI chega à conclusão de
que se a China e os Estados Unidos continuarem crescendo às
taxas médias das últimas três décadas (respectivamente 8,5% e
2,4% ao ano), a China vai superar os Estados Unidos no ano 2007,
a partir do qual passaria a ser a primeira potência econômica
global.”[150]
Entre 1978 e 2002, o comércio exterior chinês cresceu 30 vezes,
passando de US$ 20,6 bilhões para US$ 622,2 bilhões. Em 2002, a
China exportou US$ 325,6 bilhões (22,3% a mais que em 2001),
tendo um superávit comercial de US$ 27,8 bilhões e tornando-se o
4º exportador mundial, atrás somente dos EUA, Alemanha e Japão.
Seus superávits comerciais somaram US$ 220 bilhões entre 1995 e
2002 (US$ 43,6 bilhões em 1998). Em março de 2003, a China já
acumulava US$ 310 bilhões em reservas. Suas exportações passaram
a ser crescentemente industriais (37% em 1995), inclusive de
alta tecnologia (20% de suas exportações, contra 19% da União
Européia e 32% dos EUA).[151]
No alvorecer do terceiro milênio, a China passou a ostentar de
índices macroeconômicos invejáveis: assim, em 2002 o índice
geral de preços ao consumidor baixou 0,8% em relação ao ano
anterior (os preços diminuíram 1% nas cidades e 0,4% nas áreas
rurais); a taxa de juros real foi de 6% ao ano (para empresas);
sua dívida externa limitou-se a 15% do PIB e a sua receita
fiscal em 2002 foi de US$ 210 bilhões (17,5% do PIB).
Por sua estabilidade – econômica e política – pelo dinamismo da
sua economia, pelo seu imenso mercado interno, por sua
mão-de-obra qualificada e barata, por sua política de
Abertura ao exterior, a China é, há anos, um dos países que
mais recebe Investimentos Externos Diretos. Já em 2002
assumiu o primeiro lugar – desbancando pela primeira vez os EUA
–, com um total de US$ 52,7 bilhões (US$ 46,8 em 2001). Desses,
70% foram inversões na indústria eletrônica e de
telecomunicações. Das 500 maiores empresas do mundo, 416 têm
investimentos diretos no país e estima-se que nos últimos anos
ocorreram investimentos estrangeiras em valor superior a US$ 400
bilhões: “Em 1999 e 2000, os IED desceram do patamar de 45
bilhões de dólares para o de 40 bilhões, voltando ao anterior e
ainda superando-o, com um recorde de 46,8 bilhões em 2001. O
total dos anos 1979-2001 chegou assim a cerca de 400 bilhões
(...) O êxito parece inquestionável e a locomotiva continua a
todo vapor.”[152]
Na virada do milênio, a China já era a terceira potência
espacial do planeta, o segundo maior produtor de eletricidade do
mundo, consumia 40% de toda a produção mundial de cimento e 25%
da produção mundial de aço (sendo o seu maior produtor);
dominava 30% do mercado mundial de confecção e de têxteis (70%
das máquinas têxteis exportadas, em 2002, no mundo, tiveram por
destino a China) e tornou-se a maior produtora de cereais do
planeta. Enfim, passou a ser um gigante da economia mundial, com
um potencial de crescimento ainda inexplorado.
Também a agricultura chinesa teve grandes avanços. Em 1997,
apesar dos problemas climáticos, a produção de cereais atingiu
492,5 milhões de toneladas de grãos, 62% mais do que em 1978 (em
1996 haviam sido 505 milhões de toneladas). A de algodão chegou
a 4,3 milhões de toneladas Só em 1997 foram reflorestados 4,2
milhões de hectares. A produção de carne atingiu 53,5 milhões de
toneladas e a de produtos aquáticos 35,6 milhões de toneladas.
As empresas de Cantão e Povoado contribuíram para a urbanização
e industrialização rurais, sendo responsáveis por cerca de 60%
do valor agregado da produção rural em 1997, absorvendo 130
milhões de trabalhadores.
Mas os avanços foram não são só econômicos, refletindo-se em uma
melhoria significativa das condições de vida do povo chinês.
Segundo o relatório “Um mundo melhor para todos”,
assinado pelos presidentes do FMI e do Banco Mundial, e
divulgado pela ONU e pela OCDE:
a China, “que não
seguiu a orientação do Fundo”, foi o país que mais reduziu a
pobreza entre 1990 e 1998, As cifras do Relatório são
eloqüentes. “o número de pobres na China diminuiu de 360 milhões
para 210 milhões. No mundo, no mesmo período, a redução foi de
1,3 bilhão para 1,2 bilhão”. Significa que a China retirou da
faixa de pobreza mais gente – 150 milhões de pessoas – entre
1990 e 1998, do que todo o restante do mundo junto, onde esse
número chegou a 100 milhões.[153]
E
até a tendenciosa revista VEJA é obrigada a reconhecer os
avanços sociais da China:
Os ritmos
chineses são alucinantes. Em dez anos eles elevaram o padrão de
vida de 270 milhões de pessoas, ou 20% de sua população, que
saiu da miséria quase absoluta para um padrão razoável de vida.
Desse grupo, nada menos que 65 milhões de pessoas atingiram os
padrões de classe média, que compra automóveis, telefones
celulares e assinam televisões a cabo.[154]
Nessa mesma edição da revista VEJA, em depoimento concedido a
Ariel Kostman e Chrystiane Silva, o brasileiro Luiz Cabral –
dono de oito escolas de inglês em Pequim e Shanghai – afirma em
tom de espanto: “Quando fui a China pela primeira vez, pensei
que ia encontrar um país com muita gente pobre, todos andando de
bicicleta. Levei um choque. O que vi foram pessoas com carro
novo, telefone celular. Elas parecem contentes com o
desenvolvimento”.[155]
Manifestação que traduz bem o nível de desinformação em relação
à China a que os meios de comunicação, com raras exceções,
submetem a nossa população.
Segundo Viktor Sukup:
todos os
observadores concordam que o nível de vida do chinês médio
melhorou substancialmente, especialmente entre os agricultores.
Não só a comida é hoje relativamente abundante, mas também
bicicletas, os aparelhos de televisão e outros itens estão agora
muito acessíveis à massa camponesa. A eletrificação, indicador
essencial da eliminação da pobreza, seria hoje comparável à dos
países mais adiantados, chegando a 98-99% da população. A fome
(...) parece ter desaparecido.[156]
Muitos outros índices – nos terrenos da habitação, da educação,
da saúde, da cultura, da ciência, da tecnologia – poderiam ser
apresentados. Mas não é esse o objetivo desse capítulo, que
pretende, unicamente, dar uma idéia geral dos grandes avanços já
obtidos pela China Socialista com as Reformas e as
enormes perspectivas que ela ainda tem pela frente.
11 – CONCLUSÕES
11.1 - A TEORIA CHINESA DE TRANSIÇÃO AO SOCIALISMO
Tendo por base as formulações dos líderes do PCCh sobre a
construção do socialismo na China, tentaremos sistematizar,
resumidamente, a “teoria do socialismo do tipo chinês”.
Em primeiro lugar, uma de suas principais marcas – desde os
tempos de Mao Zedong – é a aversão ao dogmatismo, pugnando pela
aplicação criadora do marxismo à realidade concreta da China, “tomando
a prática como o único critério para comprovar a verdade,
emancipando a mente, buscando a verdade nos fatos e respeitando
a iniciativa das massas”.[157]
Visão integralmente dentro da tradição marxista-leninista, que
sempre afirmou que “o marxismo não é um dogma, e sim um guia
para a ação” e que “só existe verdade concreta.”
Portanto, não existe um “modelo
universal de socialismo” a ser copiado. É preciso partir da
realidade singular da China – o país mais populoso do mundo, com
dimensões continentais, com 80% da população vivendo no campo e
com um baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas –
para construir “um socialismo com peculiaridades chinesas.”
Para Marx, o socialismo será construído “sobre a base de um
alto desenvolvimento das forças produtivas” pois para
chegarmos à etapa comunista – “onde cada um aportará
segundo as suas
capacidades e receberá de acordo com suas necessidades” – é
preciso edificar uma sociedade da abundância, onde as
necessidades básicas de todos estejam supridas.
A
construção do socialismo, em um país atrasado como a China,
requer toda uma época histórica – de ao menos cem anos – e se
encontra hoje em sua “etapa primária”.
Como não existe um “socialismo da pobreza”, nem um
“comunismo da pobreza”, a questão chave durante toda a etapa
socialista é o mais impetuoso desenvolvimento das forças
produtivas. Sem negar a continuidade da luta de classes no
socialismo, o elo principal tem de ser a construção econômica e
o critério básico para avaliar qualquer medida é se ela
contribui ou não para um maior desenvolvimento das forças
produtivas.
O
atraso das forças produtivas determina relações de produção com
um grau muito baixo de socialização da produção, socialização
que é indispensável para o fomento da propriedade pública
socialista. Por isso, na etapa primária do socialismo, a
economia deve apoiar-se em “múltiplas formas de propriedade
dos meios de produção”, de maneira a guardar correspondência
com o baixo nível das forças produtivas, inclusive utilizando
(dentro de certos limites) os aportes da propriedade privada
nacional e estrangeira, desde que “assegurado o predomínio da
propriedade social”, nela incluída a “propriedade de todo
povo” (estatal). Toda e qualquer “queima de etapas” nesse
terreno desestimulará os camponeses e os trabalhadores em geral,
dificultando um avanço mais rápido das forças produtivas:
No que se refere
à estrutura da propriedade, predominará a propriedade pública,
incluída a do povo e a coletiva, no entanto, servirá de
complemento o setor privado e de capitais externos, de modo que
esses distintos regimes de economia se desenvolvam conjuntamente
por longo tempo (...). Quanto ao sistema de distribuição, deve
prevalecer a remuneração conforme a contribuição de cada um,
complementado por outros métodos de remuneração, para o qual
deve-se ter em conta tanto a eficiência como a eqüidade. (...) O
planejamento estatal é uma das mais importantes formas do
macro-controle econômico.[158]
Da mesma forma, a distribuição da riqueza e a remuneração do
trabalho deverão guiar-se pelo princípio de “a cada um de
acordo com o seu trabalho”, rompendo com as práticas
igualitaristas, que só atrasam o desenvolvimento das forças
produtivas. Em forma complementar, na etapa primária do
socialismo podem ser utilizadas outras modalidades de
distribuição, inclusive os dividendos de ações de empresas ou
cooperativas.
Como é impossível que todos progridam ao mesmo tempo e de forma
parelha, é necessário estimular algumas regiões e algumas
pessoas para que atinjam a prosperidade antes que outras, de
maneira que com o seu exemplo impulsionem os demais, criando uma
grande emulação pela prosperidade comum. Aqui, porém, é preciso
impedir a polarização, isto é, que alguns fiquem cada vez mais
ricos e outros cada vez mais pobres. Para impedir isso, cabe ao
Estado criar políticas fiscais sobre os lucros e sobre as
heranças.
O
essencial é garantir a propriedade pública dos principais meios
de produção, nos setores estratégicos da economia, evitar a
polarização e manter com firmeza o controle do poder político
pela classe operária e seus aliados, através da direção do
Partido Comunista e da Ditadura Democrática Popular. Aliás, se
equivoca quem pensa que os riscos da restauração do capitalismo
advém essencialmente do domínio da economia. Na verdade, eles
nascem principalmente nos âmbitos político e ideológico. Por
isso, zelar pela saúde política e ideológica do Partido
Comunista e do Estado de Democracia Popular é o que realmente
conta.
Assim como o socialismo herda determinadas forças produtivas do
capitalismo, também herda determinados mecanismos de
funcionamento da economia e determinados métodos e técnicas
administrativas ou organizacionais. Não é pelo fato de elas
terem sido criadas pelo capitalismo que as torna
“intrinsecamente más”:
Para acelerar o
desenvolvimento econômico do nosso país, devemos liberar ainda
mais nossa mente e acelerar a reforma e a abertura, sem ficar
presos mentalmente nas polêmicas abstratas sobre se isso ou
aquilo é classificado como socialista ou capitalista. Pará
ganhar superioridade sobre o capitalismo, o socialismo deve
assimilar e tomar de forma audaz como referência o que há de
mais avançado em matéria de métodos de gestão e administração
nos demais países do mundo – incluídos os países capitalistas
desenvolvidos –, que refletem as leis gerais da moderna produção
socializada e da economia de mercado. Devem e podem ser
utilizados pelo socialismo fundos, recursos, tecnologia e
talentos do exterior, assim como o setor privado da economia,
que desempenha um proveitoso papel complementar. Isso, com o
poder estatal nas mãos do povo e a presença de uma poderosa
economia de propriedade pública, não prejudicará o socialismo,
mas redundará em benefício ao seu desenvolvimento.[159]
Sob esse prisma é que deve ser examinado o falso antagonismo
entre planificação e mercado. Na verdade nem a planificação é
intrínseca ao socialismo, nem o mercado é intrínseco ao
capitalismo. Assim como a planificação existe tanto no
socialismo como no capitalismo, o mercado existe tanto no
capitalismo como no socialismo. A prática inclusive já
demonstrou – na experiência do socialismo do século passado –
que o planejamento exagerado só leva ao enrijecimento da
economia, ao refreamento do desenvolvimento das forças
produtivas e à ineficiência produtiva. Da mesma forma, o livre
mercado absoluto tem como conseqüência a extrema polarização
entre a riqueza e a pobreza e a anarquia na produção, o que se
expressa nas crises periódicas e na estagnação prolongada em que
vicejam os países capitalistas, avançados ou não.
Impõe-se a construção de uma economia de mercado planificada,
tendo por base a propriedade pública dos meios de produção, com
a tarefa central de propiciar o desenvolvimento acelerado das
forças produtivas, eliminar a exploração e evitar a polarização,
tendo por objetivo a prosperidade comum. Assim, na etapa
primária do socialismo, devem ser utilizados esses dois
mecanismo para controlar a economia: o planejamento
macroeconômico e o mercado, “cabendo ao Estado regular o
mercado e a este orientar as empresas”.
Da mesma forma, é preciso aprender a utilizar outros mecanismos
econômicos criados pelo capitalismo, como os bancos e as
sociedades por ações. Estas, na sua essência, significam a
separação dos direitos decorrentes da propriedade do direito de
gestão. Mecanismo, aliás, que a maioria das empresas modernas
utiliza para transferir a sua administração a profissionais
capacitados.
Porque esse mecanismo não pode ser utilizado pelo socialismo?
Com esse objetivo, os comunistas chineses procuraram separar a
administração das empresas estatais da direção governamental,
obtendo excelentes resultados. Isso contraria o marxismo? Ou, ao
contrário, resgata a essência do marxismo que – ao tratar da
extinção do Estado no comunismo – nos diz que o Estado se
extinguirá no dia em que o “governo das pessoas” for
substituído pelo “governo das coisas”? O que é esse
“governo das coisas” senão a auto-administração econômica na
sociedade comunista avançada, que não mais necessita de um órgão
de coerção política – “para governar as pessoas”, como o Estado?
Não será essa uma experiência inovadora, que caminha exatamente
no sentido contrário da frustrada experiência soviética, de
crescente fortalecimento do Estado, cada vez mais centralizador?
Coerentes com essa visão, os chineses têm procurado valorizar a
ciência da administração capitalista – considerada também uma
importante força produtiva – entregando a gestão
“micro-econômica” (das empresas) a profissionais e técnicos,
separando-a da gestão “macro-econômica”, exercida pelo Estado. A
preocupação fundamental passa a ser o fortalecimento da função
regulatória e planejadora do Estado, que se dá basicamente no
campo macroeconômico.
Para concluir esse ponto, gostaríamos de dizer que, no nosso
entender, a “teoria do socialismo do tipo chinês” não
representa uma ruptura com o marxismo e sim uma tentativa de
desenvolvimento do marxismo a partir da experiência prática. Se
ela terá êxito ou não é algo que nesse momento está pendente de
respostas práticas e teóricas.
11.2 - O ALCANCE INTERNACIONAL DA EXPERIÊNCIA CHINESA
Aqui, a primeira questão que devemos examinar é se o “caminho
chinês para o socialismo” tem caráter puramente específico,
singular, irrepetível – decorrente das particularidades da
China, do seu povo, da sua história e da sua cultura – ou se ao
mesmo tempo nos proporciona ensinamentos e orientações de
caráter universal, principalmente para a construção do
socialismo nos países dependentes e atrasado, mas também nos
países capitalistas avançados.
Por tudo o que já foi dito no decorrer desse trabalho, estamos
convencidos que a experiência chinesa engloba tanto ensinamentos
específicos à realidade chinesa, como ensinamentos de caráter
universal. Ou seja, incorpora avanços teóricos importantes na
concepção marxista da transição do
capitalismo ao socialismo e
deste ao comunismo. Expressão disso são as reformas econômicas
que vêm sendo implementadas no Vietnã e em Cuba, com ótimos
resultados, cuja inspiração nas Reformas chinesas é
inegável.
Um segundo interrogante, que também nos parece importante tentar
responder, é quais os ensinamentos que podemos retirar da
experiência chinesa para os países que tentam romper com o
neoliberalismo – ainda que nos marcos de uma sociedade
capitalista – e buscam construir um novo modelo de
desenvolvimento econômico soberano e inclusivo.
Também aqui a nossa resposta é positiva: a experiência chinesa
de realização de uma ampla reforma agrária e de crescimento
econômico com distribuição de renda; de grandes investimentos em
cultura, ciência e tecnologia; de apoiar-se essencialmente no
mercado interno e na poupança interna; de atrair capitais
externos produtivos em áreas de alta tecnologia, definidas
prévia e soberanamente pelo Estado Nacional; de combinar a
existência de um mercado regrado com o planejamento estratégico
pelo Estado; de combinar investimentos em indústrias de alta
tecnologia (que utilizam pouca mão-de-obra) com o investimento
em empresas de uso intensivo de mão-de-obra; de impulsionar a
iniciativa e a criatividade das massas trabalhadoras; devem ser
levadas em conta por todos que buscam construir um projeto
econômico alternativo ao neoliberalismo imperante.
Por fim, também nos parece importante estudar com muita atenção
a experiência chinesa de inserção soberana no mercado
internacional e inclusive de associação com o capital
internacional em condições bastante favoráveis, com
transferência de tecnologia. Os ensinamentos daí advindos podem
ser úteis não só para os países em transição para o socialismo,
como também para aqueles que – nos marcos do capitalismo –
tentam romper com o funesto modelo neoliberal.
11.3 – PARA ONDE VAI A CHINA?
A
ninguém mais é permitido ignorar, na atualidade, a exitosa e
original experiência chinesa. Mas, a partir daí, toda
unanimidade desaparece.
Alguns, “à esquerda”, afirmam que para isso a China abandonou a
“ortodoxia” marxista e o caminho construção do socialismo,
adotando o modelo capitalista e se submetendo aos ditames do
capital financeiro internacional.
Outros, à direita, repetem quase o mesmo, acrescentando – em tom
de triunfo – que isso comprova a superioridade do capitalismo
sobre a “utopia socialista”. Só não explicam porque o “seu
capitalismo” não dá certo no resto do mundo e vive uma profunda
crise estrutural, sincrônica, seja nas metrópoles imperialistas
– Estados Unidos, Europa e Japão –, seja no resto do mundo
“emergente” ou “subdesenvolvido”.
Portanto, a primeira questão que requer uma resposta é a
elucidação do sentido das transformações sociais e econômicas em
curso na sociedade chinesa – caracterizada pelos comunistas
chineses como “socialismo com peculiaridades chinesas” –,
buscando esclarecer o sentido “socialista” ou “capitalista”
dessas mudanças.
O
acúmulo que temos do estudo das experiências soviética e chinesa
de construção do socialismo, assim como das concepções teóricas
dos clássicos do marxismo sobre a transição do capitalismo ao
comunismo (passando pela etapa socialista), nos dão a convicção
de que as transformações sociais e econômicas em curso na
sociedade chinesa apontam no sentido de transformações
socialistas – de um forma original e extremamente audaciosa – e
não no sentido do retorno ao capitalismo. Ainda que o resultado
da luta e a definição de quem vencerá a quem – o capitalismo ou
o socialismo – não esteja de antemão decidido. O que, aliás, é
da natureza de todo processo de transição.
Uma segunda questão, associada à anterior, é a problematização
da “teoria chinesa de transição ao socialismo”,
identificando suas “continuidades” e “rupturas” com o
marxismo-leninismo, com a visão soviética tradicional e com o
“maoísmo”.
Como já dissemos, entendemos que a teoria chinesa de transição
ao socialismo não se constitui em uma ruptura com o pensamento
marxista clássico. Ao contrário, bebe criativamente em suas
fontes originais. Ao mesmo tempo, porém, sistematiza em forma
crítica a experiência soviética – inspirando-se inclusive na
Nova Política Econômica (NEP), implementada por Lenin. Mais,
busca tirar lições da derrota do socialismo na União Soviética e
nos países do Leste Europeu, assim como do fracasso da
Glasnost e da Perestroika (ainda que as tenha
precedido). Tampouco significa um ruptura com o
“maoismo”, aqui identificado com a produção teórica de Mao
Zedong desde a década de 20 (apesar dos seus equívocos durante o
Grande Salto Adiante e na Revolução Cultural). Mas
representa, isso sim, uma ruptura com as concepções de Mao
durante a Revolução Cultural.
Quaisquer que sejam os percalços que o futuro reserve para a
revolução chinesa – que, junto com as revoluções russa,
vietnamita, cubana, coreana, e tantas outras, faz parte do
enorme patrimônio de experiências dos povos de todo o mundo, em
sua luta pela emancipação política, econômica e social –, uma
coisa é certa: a experiência de transição para o socialismo sai
extremamente renovada e enriquecida pelas Reformas da
China pós-Revolução Cultural!
CONCLUSÃO
Tendo em vista o objetivo central desse estudo – o
de examinar as reformas de Deng Xiaoping, que alteraram os
rumos da construção socialista na China – e sem pretender fazer
uma “atualização geral’ (desnecessária) do texto, achei
importante agregar um pequeno capítulo de “conclusão”, para
atualizar alguns dados sobre os grandes avanços econômicos e
sociais que a China teve no último período.
Assim, podemos constatar que após 70 anos da vitória
da Revolução Chinesa e 40 anos das “Reformas”, a China passou da
120º PIB mundial para o 20º PIB, em 1978, e – de acordo com o
critério de paridade do poder de compra – para o 1º PIB, em
2013. Em 2018, segundo esse critério, sua economia representou
18,7% do PIB Mundial, contra 15,1%% dos EUA (dados da UNAM).
Entre 1950 e 1977, teve um crescimento anual médio de 5%, que
saltou para 9,8%, entre 1978 e 2015. Em contrapartida, os EUA
cresceram a uma media anual de 3% de 1950 a 1980, caindo para
2,7%, entre 1980 e 2015. Em 2017, a China contribuiu com 30% do
crescimento global.
A China tornou-se a maior potência manufatureira e a
maior potência comercial do mundo, com saldos permanentes na
balança comercial, acumulando quatro trilhões de dólares em
reservas internacionais, as maiores reservas do mundo,
equivalentes a mais de 30% do total. Em 2015, só de janeiro e
outubro, a China exportou 1,86 trilhões USD e importou 1,37
trilhões USD, tendo um saldo favorável de 490 bilhões USD. Tanto
na produção industrial como nas exportações, o peso dos produtos
de alta tecnologia e alto valor agregado tem aumentado mais
rapidamente (em 2017 as exportações chinesas de baixa tecnologia
foram de apenas 29%)
Segundo a Oxford Economics, desde 2001 –
quando ingressou na OMC – o valor agregado produzido na China
cresceu a uma taxa anual média de 12,8%, ante 1,9% do Japão,
1,8% da Alemanha, 1,4% dos EUA e 0% do Reino Unido. Fruto disso,
a China responde hoje por 27% do valor agregado da manufatura
global – 1,7 vezes mais que os EUA, 2,8 vezes mais que o Japão e
4,4 vezes mais que a Alemanha. Em 2014, uma comparação os
setores secundário e terciário da economia (os principais na
China de hoje) nos mostra que 42,6% do valor agregado total foi
produzido nas indústrias e 48,2% nos serviços. E grande parte do
setor de serviços cumpre funções produtivas de apoio ao setor
industrial. Fica claro porque a China é hoje a “fábrica do
mundo”.
A China também construiu um amplo e sólido sistema financeiro
que – à diferença dos sistemas financeirizados, rentistas e
especulativos do ocidente capitalista – é um poderoso
instrumento a serviço da produção e da economia nacional. Quatro
grandes bancos nacionais controlam 80% do capital bancário do
país e outros 80 bancos menores – distritais ou locais – detém
outros 18%, restando 2% nas mãos de bancos privados,
principalmente estrangeiros. Através da ação desse sistema
financeiro público, dos mecanismos de controle macroeconômico em
mãos do Estado (câmbio, juros, moeda, investimentos públicos,
alocação de mão-de-obra, disponibilidade de infra-estrutura e
matérias-primas, etc.) e da predominância estatal nos setores
econômicos estratégicos, é perfeitamente possível dirigir a
economia no rumo de um crescimento virtuoso. Isso tem garantido
grande estabilidade da moeda, com inflação reduzida, fazendo com
que o Yuan já seja a 5ª moeda internacional, atrás do
dólar, euro, libra e yen.
Ao contrario do que muitos pensam, apesar da importância que a
China dá aos investimentos estrangeiros e ao comércio
internacional – até por sua carência de matérias primas e
insumos –, o motor decisivo do seu dinamismo econômico é a sua
poupança interna e o seu imenso mercado nacional, formado por
1,4 bilhões de pessoas, com crescente capacidade aquisitiva, o
qual, em 2015, foi responsável por 66% do crescimento econômico.
Mais que isso, a China está deixando de ser um país meramente
importador de capitais para tornar-se também um país exportador
de capitais. Tanto que, em 2014, os investimentos produtivos
estrangeiros na China foram de 120 bilhões USD, ante
investimentos diretos da China no exterior de 103 bilhões de
dólares. Entre 2017 e 2022, a China prevê captar investimentos
de 600 bilhões de dólares e investir no exterior 750 bilhões de
dólares.
Os investimentos em Educação e Ciência & Tecnologia são enormes.
A cada ano as universidades chinesas – que são sete entre as dez
melhores dos BRICS (as três primeiras) – diplomam a cada ano
mais de sete milhões de jovens. E até 2020 a China estará
aplicando 2,5% do seu PIB em Pesquisa & Desenvolvimento. Não por
acaso a China é líder mundial em tecnologia 5G (10 anos à frente
dos demais) de comunicações, está extremamente avançada nos
terrenos de Big Data e Inteligência Artificial. Há anos os seus
super-computadores têm conquistado o 1º lugar em velocidade e
desempenho. A China domina o ciclo completo da energia nuclear,
da tecnologia espacial, construiu o maior radiotelescópio do
mundo, envia sondas espaciais à Lua (inclusive sua face
encoberta) e brevemente lançará sua estação espacial. O
progresso técnico-científico responde hoje por 60% do aumento da
produção. É nesse enorme avanço tecnológico da China que devemos
buscar as causas da chamada “guerra comercial” de Trump contra a
China, que são muito mais tecnológicas do que comerciais.
Enormes são os seus investimentos em infra-estrutura energética,
de transportes e comunicação. Além de ter a maior Hidroelétrica
do mundo – a das “Três Gargantas”, com 22.500 MW –, a China é
líder mundial em geração e transmissão de energia elétrica e
deverá aplicar, entre 2016 e 2020, 102 bilhões de dólares em
energia eólica, modalidade que já ocupa o terceiro lugar em sua
matriz energética, acima da energia nuclear. A China também tem
desenvolvido fortemente a geração de energia solar. No âmbito
dos transportes, possui a maior rede ferroviária de alta
velocidade do mundo (20 mil km) e vem interligando o país
inteiro através de moderníssimas rodovias, ferrovias, portos e
aeroportos. Percebe-se nos últimos anos um claro direcionamento
dos investimentos em direção ao interior da China, buscando
diminuir as distâncias econômicas e sociais entre as áreas
litorâneas e o oeste do país
O seu Projeto de integração intercontinental “Nova Rota da Seda”
(Cinturão e Rota) abrange 65 países, que totalizam 62% da
população mundial, 30% do PIB e 75% dos recursos energéticos do
Planeta. Fala-se em investimentos da ordem de um trilhão de
dólares! Da mesma forma, a articulação do BRICS e o recém
constituído Banco do BRICS posicionam a China como o mais
dinâmico ator geopolítico dos dias de hoje no mundo
Nesse seu vertiginoso processo de crescimento
econômico – principalmente após as “reformas” – a China dobrou a
cada década o seu PIB, garantindo grandes avanços sociais,
retirando – segundo John Ross, do Instituto para Estudos
Financeiros Chongyang da Universidade de Renmin da China –
890 milhões de chineses da pobreza (rendimentos abaixo de 3,2
dólares/dia), enquanto que no mesmo período o número de pobres
no mundo aumentou 275 milhões.
Em conseqüência, a China foi o país onde mais cresceu no mundo a
expectativa de vida de sua população, passando de 35 anos, em
1949, para 67 anos em 1978, último ano pré-reforma. Já de 1978 a
2017, a expectativa de vida aumentou para 76,4 anos. Também a
desigualdade – medida pelo índice de Gini – decresceu
enormemente, sendo hoje de 0,40 (2018). Da mesma forma houve uma
melhoria constante do nível de vida dos trabalhadores e da
população em geral, sendo que atualmente os salários médios
chineses já são superiores ao pagos na América Latina e a renda
per cápita já atingiu 16.000 dólares PPA (ainda inferior
à norte-americana). Tomando os atuais ritmos de crescimento de
ambas as economias, estima-se que o PIB per cápita chinês
superará o dos EUA em 2045.
O 13º Plano Qüinqüenal (2016-2020) – diante do
quadro internacional de profunda crise do sistema capitalista e
de crescente protecionismo – decidiu reduzir de forma planejada
os índices de crescimento econômico da China, por um tempo, para
em torno de 7% ao ano (o que ainda é extremamente alto),
sacrificando a velocidade pela qualidade e maior harmonização da
economia. Mesmo assim, o objetivo é duplicar o PIB e as receitas
dos trabalhadores até 2020.
No terreno da soberania nacional e da defesa
nacional, a China passou – nesses últimos 70 anos – da situação
de uma nação semi-colonial, repartida entre as principais
potências imperialistas, com seu povo humilhado e espoliado (não
esqueçamos os cartazes nos parques dizendo “proibida a entrada
de cães e chineses”) à condição uma nação soberana – que já
recuperou Hong Kong da Inglaterra e Macau de Portugal, sempre de
forma pacífica – que é a terceira maior potência militar do
Planeta, com elevada capacidade dissuasória nuclear, preparada
para enfrentar, inclusive, ataques cibernéticos ou espaciais.
Aqui é importante referir que a China tem reiterado, em alto e
bom tom, que luta pela paz e não possui qualquer objetivo de
expansão territorial ou de domínio econômico pela força e a sua
declaração solene – desde que dominou a tecnologia nuclear – de
que nunca será a primeira, em qualquer circunstância ou sob
qualquer pretexto, em utilizar armas nucleares.
Sem dúvida, o “socialismo com características
chinesas” – que ainda se encontra em sua “etapa primária” – tem
garantido grandes conquistas ao povo chinês e demonstra de forma
evidente a sua superioridade sobre o decrépito capitalismo
financeirizado, em sua etapa neoliberal. É fundamental, para
todos aqueles que lutamos pela superação da sociedade
capitalista de exploração e opressão, estudarmos com atenção a
experiência chinesa – sem qualquer espírito de “cópia” –
buscando extrair dela aqueles ensinamentos que possam ter
validade universal.
NOTAS
[1]
MARX, Karl. Crítica ao Programa de Gotha.
In: MARX, Karl e ENGELS, Friedrich.
Obras
Escolhidas,
Vol 2 Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1961, p.
223.
[2]
ENGELS, F. Princípios do Comunismo. Rio de
Janeiro: Livraria Editora Cátedra, 1987, p.29.
[4]
LENIN, V. I. O Estado... Op. Cit., p. 377.
[5]
MARX, Karl. Crítica... Op. Cit, pp. 216-217.
[6]
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich.
O Manifesto
do Partido Comunista..
In: MARX,
Karl e ENGELS, Friedrich. Obras Escolhidas,
Vol 1. São Paulo: Editora Alfa-Omega, s/d, p. 37.
[7]
LENIN, V. I. O Estado... Op. Cit., pp.371.
[8]
LENIN, V. I. A revolução proletária e o renegado
Kautsky. In: LENIN, V. I. Obras Escogidas, Vol.3.
Moscou: Ediciones en Lenguas Extranjeras, s/d, p.1351.
[11]
LENIN, V. I. Acerca del impuesto en especie. In:
LENIN, V. I. Obras Escogidas, Vol. 3. Moscú:
Ediciones en Lenguas Extranjeras, s/d, p.627.
[12]
“É necessário compreender quais são os caminhos, os
métodos, os recursos, os elementos intermediários
, necessários para a passagem das relações
pré-capitalistas ao socialismo.” (LENIN, V. I.
Sobre... Op. Cit., p. 645.
[14]
Idem, pp. 634-635, 639, 642.
[15]
STALIN, José. Problemas económicos del socialismo en
la URSS. In: ZEDONG, Mao e STALIN, José. La
construcción del socialismo en la URSS y China.
Buenos Aires: Pasado y Presente, nº 65, 1976, pp. 148,
152.
[16]
TSETUNG, Mao. Contra o estilo de clichê do Partido.
In: TSETUNG, Mao. Obras Escolhidas. - Tomo III
[1941-1945. São Paulo: Editora ALFA-OMEGA, 1979, p. 91.
[17]
LOSURDO, Domenico. A esquerda, a China e o
imperialismo. In: Revista Princípios, nº58.
São Paulo: Editora Anita, 1999, p. 23-24.
[18]
LIMA, Haroldo, PEREIRA, Duarte e CABRAL, Severino.
China, 50 anos de República Popular. São Paulo:
ANITA Garibaldi, 1999, p.8.
[19]
LOSURDO, Domenico. Op. Cit., p. 24.
[20]
ZEDONG, Mao. Sobre a Ditadura Democrática Popular.
In: Obras Escogidas de Mao Tse-Tung - 4o
Tomo (1945-1949). Madrid: Editorial Fundamentos,
1974, pp. 432.
[22]
Idem, pp. 434, 435-436.
[23]
SPENCE, Jonathan D. Em busca da China Moderna -
Quatro séculos de história. São Paulo: Companhia das
Letras, 2000, p. 491.
[24]
SHENG, Hu et all - Oficina de investigación de la
História del Partido, subordinada al CC del PCCh.
Breve História del Partido Comunista de China.
Beijing: Ediciones en Lenguas Extranjeras, 1994, pp.560,
562.
[27]
SPENCE, Jonathan D. Op. Cit., p. 514.
[28]
ZEDONG, Mao Sobre diez grandes relaciones. In:
Obras Escogidas de Mao Tse-Tung - Tomo 5
[1949-1957]. Madrid: Editorial Fundamentos, 1978, pp.
330-331.
[31]
PARTIDO COMUNISTA DA CHINA. Resolução do 8º Congresso
Nacional do Partido Comunista da China acerca do informe
político.
Apud: SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 592-593.
[32]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 594.
[33]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p.
629.
[34]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. O dragão
chinês e os tigres asiáticos. Porto Alegre: Novo
Século, 2000, p. 18.
[35]
SHENG, Hu et all. Op. Cit.,
pp. 673-674.
[37]
LIMA, Haroldo. Mao Zedong na história da China.
In: Revista Princípios, nº42. São Paulo: Editora
Anita, 1996, p. 49.
[38]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. Op. Cit., p. 19.
[39]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 734-735.
[40]
LIMA, Haroldo.
Mao Zedong... Op. Cit.,
p.50.
[41]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 764.
[42]
SPENCE Jonathan D. Op. Cit., pp. 579-580.
[43]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 791.
[44]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 785-786.
[45]
Comitê Central do PCCh. Circular de 11 de Outubro de
1974.
Apud: SHENG, Hu et all.
Op. Cit., p.
811.
[46]
ZEDONG, Mao. Reunião do Burô Político do Comitê
Central (17.07.1974). Apud: SHENG, Hu et all. Op.
Cit., pp. 810-811.
[47]
ZEDONG, Mao. Conversações com Zhou Enlai e Wang
Hongwen (23.12.1974). Apud: SHENG, Hu et all. Op.
Cit., p. 812.
[48]
“Em 1974, Zhou Enlai, em função de problemas de saúde
(câncer) deixou o poder. Deng Xiaoping assumiu,
organizando uma verdadeira ofensiva dos moderados contra
os radicais. Os primeiros conquistaram importantes
vitórias com a tomada do controle do exército por Deng e
com a convocação da 4ª Assembléia Nacional Popular em
janeiro de 1975.” [VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES,
Gabriela. Op. Cit., p. 58]
[49]
ENLAI, Zhou. Informe à 1ª Sessão da 4ª Assembléia
Popular Nacional. Apud: SHENG, Hu et all. Op. Cit.,
p. 813.
[50]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 818-819.
[52]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. Op. Cit., p. 59.
[53]
SPENCE, Jonathan D. Op. Cit., p. 607.
[54]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 826-827.
[55]
SPENCE, Jonathan D. Op. Cit., p. 612.
[56]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. Op. Cit., p.
60-61.
[57]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 839-840.
[61]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela.
Op. Cit., p. 61-62.
[62]
XIAOPING, Deng.
Preparar en
el primer decenio un buen terreno para el segundo.
In: XIAOPING, Deng. Textos Escogidos - Tomo 3
(1982/1992).Beijing: Ediciones em Lenguas
Extrangeras, 1994, pp 22- 23.
[63]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 849.
[64]
XIAOPING, Deng. Socialismo con peculiaridades chinas.
In: XIAOPING, Deng. Textos...Op. Cit., p. 72.
[65]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 849.
[66]
XIAOPING, Deng. Discurso na 3a Sessão
Plenária do 11o Comitê Central. Apud
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 851-852.
[67]
Comunicado da 3a Sessão Plenária do 11o
Comitê Central.
Apud SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 852.
[68]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 854.
[71]
XIAOPING, Deng. Consagrarnos a la construcción
nacional.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., pp.
16-17.
[72]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela.
Op. Cit., p. 64.
[73]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 859-860.
[74]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. Op. Cit., p. 69.
[75]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 870.
[78]
XIAOPING, Deng. Entrevista con Myke Wallace. In:
XIAOPING, Deng. Textos Op.
Cit, p.
181-182.
[79]
XIAOPING, Deng. Aprovechar los recursos intelectuales
del exterior y ampliar la Apertura. In: XIAOPING,
Deng. Textos... Op. Cit., p. 39.
[80]
XIAOPING, Deng. Manejar bién las Zonas Económicas
Especiales.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., p. 60.
[81]
XIAOPING, Deng. Discurso de apertura del 12o
Congresso Nacional del PCCh.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., pp. 8-9.
[82]
XIAOPING, Deng. La Reforma, camino imprescindible.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., pp.
147-148.
[83]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 880-881.
[84]
XIAOPING, Deng. Es necessário acelerar la reforma.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., pp. 248.
[85]
XIAOPING, Deng. Hay que partir de la realidad.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., pp.
260-261.
[86]
XIAOPING, Deng. Puntos essenciales de conversaciones
sostenidas en Wuchang, Shenzhen, Zhuhai y Shanghai.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., p. 386.
[87]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 887.
[88][88]
XIAOPING, Deng. La reforma de las empresas y la
reforma financiera. In: XIAOPING, Deng. Textos...
Op. Cit., p. 202.
[89]
XIAOPING, Deng. No hay contradicción fundamental
entre el socialismo y la economia de mercado.
In: XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., p. 156.
[90]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., p. 890. SHENG, Hu et all.
Op. Cit., p. 890.
[91]
XIAOPING, Deng. Socialismo con... Op. Cit., p.
74.
[92]
DRUMMOND, Carlos. Viagem à Grande China. São
Paulo: Editora Página Aberta, 1994, p. 45.
[93]
XIAOPING, Deng. Intervención em la 3ª Sesión Plenária
de la Comisión Central de Asesoramiento. In:
XIAOPING, Deng. Textos... Op. Cit., p. 100.
[94]
XIAOPING, Deng. Puntos esenciales... Op. Cit., p.
386, 389.
[95]
RODRIGUES, Gabriela. As Reformas implementadas pelo
Estado Chinês e pelo Partido Comunista da China
(1978/1997). Porto Alegre: Dissertação de Mestrado,
IFCH-UFRGS, datilografada, 2001, p. 94.
[96]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 904-905.
[97]
RODRIGUES, Gabriela. As Reformas... Op. Cit.,
p.98.
[98]
LOSURDO, Domenico. Op. Cit. p.32.
[99]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela.
Op. Cit., pp. 72-73.
[100]
XIAOPING, Deng. Formar un promisorio colectivo
dirigente que pratique la reforma. In: XIAOPING,
Deng. Textos... Op. Cit., p. 305-308.
[101]
VIZENTINI, Paulo e RODRIGUES, Gabriela. Op. Cit., pp.
74.
[102]
XIAOPING, Deng. Puntos essenciales... Op. Cit.,
p. 386-387.
[103]
ZEMIN, Jiang. Manter no Alto a Grande Bandeira da
Teoria de Deng Xiaoping para Impulsionar em todos os
Sentidos a Causa da Construção do Socialismo de Ripo
Chinês Rumo ao Século XXI - Informe ao 15º Congresso do
PCCh (12.09.97).
In ZEMIN, Jiang. Textos... Op. Cit., p. 222.
[104]
XIAOPING, Deng. Puntos essenciales... Op. Cit.,
p. 389-390.
[105]
SHENG, Hu et all. Op. Cit., pp. 942-943.
[106]
ZEMIN, Jiang. Acelerar a Reforma, a Abertura e a
Modernização e Conquistar Maiores Vitórias Para a Causa
do Socialismo do Tipo Chinês - Informe ao 14º Congresso
Nacional do PCCh (12.10.92). In: ZEMIN, Jiang.
Reforma e Construção da China. Rio de Janeiro:
Record, 2002, pp. 30-32.
[107]
ZEMIN, Jiang. Acelerar... Op. Cit., pp. 46-47.
[108]
XIAOPING, Deng. La reforma de las... Op. Cit., p.
203.
[109]
XIAOPING, Deng. Visita de inspeción a Shanghai.
In: XIAOPING, Deng.
Textos...
Op. Cit., pp. 377-378.
[110]
ZEMIN, Jiang. Acelerar... Op. Cit., pp. 48-49.
[111]
ZEMIN, Jiang. Idem, pp. 49-50.
[112]
ZEMIN, Jiang. Idem, pp.51-52.
[113]
ZEMIN, Jiang. Acelerar... Op. Cit., pp. 53-54.
[114]
XIAOPING,
Deng. Es necesario... Op. Cit., p. 250.
[115]
ZEMIN,
Jiang. Acelerar...
Op. Cit., pp. 54-55.
[116]
ZEMIN, Jiang.
Idem, p. 56.
[117]
ZEMIN,
Jiang. Idem, pp. 57-58.
[118]
ZEMIN,
Jiang. Idem, p. 59.
[119]
ZEMIN,
Jiang. Ibidem, pp. 60.
[120]
ZEMIN,
Jiang. Manter... Op. Cit., pp. 206-207.
[121]
13º
CONGRESSO NACIONAL DO PCCh. Apud: ZEMIN, Jiang.
Reforma... Op. Cit., Nota 1, p. 253.
[122]
GUIXIAN, Li.
Conversações com a delegação do PCdoB na China (junho
de 2000). Apud: LIMA, Haroldo.
Embandeirada com o socialismo, a China entra no século
XXI.
In:
Revista Princípios, nº59. São Paulo: Editora Anita,
2001, p. 25.
[123]
CHINA: hechos y cifras 1998.
Beijin: Editora Nueva Estrella, 1998, pp. 60-64.
[124]
ZEMIN, Jiang. ZEMIN, Jiang. Manter... Op. Cit.,
p. 209.
[125]
ZEMIN, Jiang.
Idem, p.
216.
[126]
ZEMIN,
Jiang. Idem, p. 221.
[127]
ZEMIN,
Jiang. Idem, p. 218.
[129]
BEINSTEIN,
Jorge. Op. Cit., p. 172-173.
[130]
ZEMIN,
Jiang. Algumas Questões nos Trabalhos Econômicos da
Atualidade. In: ZEMIN, Jiang. Reforma... Op.
Cit, p. 427.
[131]
ZEMIN,
Jiang. Continuar Promovendo a Reforma Rural Segundo o
Sistema de Economia de Mercado Socialista. ZEMIN
Jiang. Reforma... Op. Cit. pp. 280-281.
[132]
ZEMIN,
Jiang. Consolidar a Confiança, Aprofundar a Reforma e
Criar um Nova Situação de Desenvolvimento das Empresas
Estatais. (12.08.99) In: ZEMIN Jiang. Reforma...
Op. Cit., pp. 310-311, 322-323.
[133]
RONGJI, Zhu.
Pequim Informa, nº 14, abril de 1998. Apud: LIMA,
Haroldo. As estatais e o caminho socialista da
China.. In: Revista Princípios, nº53. São
Paulo: Editora Anita, 1999, p. 54.
[134]
ZEMIN,
Jiang. Consolidar... Op. Cit., p. 312.
[135]
LIMA,
Haroldo. As estatais...Op. Cit., p. 53.
[136]
ZEMIN,
Jiang. Manter... Op. Cit., p.223.
[137]
ZEMIN,
Jiang. Consolidar... Op. Cit., p. 318.
[138]
LIMA,
Haroldo. A propósito do Socialismo na China. In:
Revista Princípios, nº28. São Paulo: Editora Anita,
1993, pp. 32-33.
[139]
ZEMIN,
Jiang. Construir en todos los sentidos una sociedad
modestamente acomodada y abrir nuevas perspectivas para
la causa del socialismo con peculiaridades chinas –
Informe al 16º Congreso del PCCh. (08.11.2002).
Datilografado, pp. 2-3.
[140]
DRUMMOND,
Carlos. Viagem... Op. Cit., pp. 21, 78.
[141]
ZEMIN,
Jiang. Construir... Op. Cit., pp. 6-9.
[143]
CARMONA,
Ronaldo. China... Op. Cit., p. 3.
[144]
CONSTITUTION OF THE PEOPLE’S REPUBLIC OF
CHINA. Preamble.
In:
www.chinatoday.com
, p. 2 Acesso em: 01 Jan. 2004.
[145]
SHENG, Hu et
al. Op. Cit., p. 960.
[146]
SUKUP,
Viktor. China frente à globalização: desafios e
oportunidades. In: Revista Brasileira de Política
Internacional. Brasília: IBRI, 2002, pp. 98-99.
[147]
SHENG, Hu et
al. Op. Cit., p. 960, p. 961.
[148]
ALCÂNTARA,
Eurípedes. As ambições do Planeta China. In:
Revista VEJA.. São Paulo; Editora Abril, 22.10.03,
p.124.
[149]
COSTA,
Antônio Luiz Monteiro Coelho da. O Xadrez Chinês.
In: Revista Isto É. São Paulo: Editora
Três, 25.04.01, p. 80.
[150]
BEISNTEIN,
Jorge. Op. Cit. p. 177.
[151]
ALCÂNTARA,
Eurípedes. Op. Cit., p. 124.
[152]
SUKUP,
Viktor. Op. Cit., p. 101.
[153]
LIMA,
Haroldo. Embandeirada... Op. Cit., p. 23.
[154]
ALCÂNTARA,
Eurípedes. Op. Cit., p. 127.
[155]
KOSTMAN,
Ariel e SILVA, Chrystiane. Cobras e dólares. In:
Revista VEJA.. São Paulo: Editora ABRIL,
22.10.2003, p. 133.
[156]
SUKUP, Viktor. China... Op. Cit., p. 88.
[157]
ZEMIN,
Jiang. Acelerar... Op. Cit., p. 36.
[158]
ZEMIN, Jiang
, Idem, p. 45.
[159]
ZEMIN,
Jiang. Acelerar a Reforma, a Abertura e a Modernização e
Conquistar Maiores Vitórias para a causa do Socialismo
do Tipo Chinês. In: ZEMIN, Jiang. Reforma... Op.
Cit., p. 43.