2 - ANTECEDENTES
2.1 - A
industrialização e a formação da
classe operária no Rio Grande dos
Sul
Evidentemente, não temos
a pretensão de tratar exaustivamente
uma temática tão ampla, que por si
só ensejaria uma outra pesquisa. Nos
move unicamente a intenção de chamar
a atenção para algumas
particularidades do processo de
industrialização do Rio Grande do
Sul, e da formação da sua classe
operária, indispensáveis para o
desenvolvimento do nosso estudo
sobre o Partido Comunista do Brasil,
no Rio Grande do Sul.
2.1.1 -
A PECUÁRIA COM MÃO-DE-OBRA LIVRE E
AS CHARQUEADAS ESCRAVISTAS
O Rio Grande do Sul só
começa a ser efetivamente ocupado no
final do século XVII. Quanto à sua
integração ao resto do Brasil
colonial, só irá acontecer no
decorrer do século XVIII.
Antes, reduzira-se a uma área de
apresamento dos índios que viviam
das reduções jesuíticas, pelos
bandeirantes paulistas em busca de
escravos, e de caça ao gado xucro
que por aí vagava:
A exploração colonial assentava-se
basicamente em produção já existente
nas áreas coloniais (as riquezas
minerais, por exemplo) ou em forma
de produção agrícola aqui instaladas
segundo os interesses e necessidades
do capitalismo nascente (caso do
açúcar). O Rio Grande do Sul não se
enquadrava em nenhum dos dois casos,
daí a sua tardia integração ao
sistema colonial. (...) Desvinculado
da agricultura colonial de
exportação diretamente integrada ao
mercado internacional, o Rio Grande
do Sul carecia de sentido no
contexto do processo de acumulação
primitiva de capitais que se
verificava nos quadros do Antigo
Sistema Colonial.
No início do domínio
espanhol sobre Portugal (1580-1640),
a burguesia comercial lusa havia
obtido o direito de se instalar em
Buenos Aires, em recompensa pelo
apoio ao candidato espanhol ao trono
português. Com a Restauração,
os portugueses, hostilizados em
Buenos Aires, passaram a pressionar
no sentido da fundação de um
estabelecimento português no Prata,
o que obtiveram com a criação da
Colônia de Sacramento, em 1980: Por
trás dos interesses lusos no
contrabando do Prata, era
indisfarçável a presença britânica,
em busca de mercados.
A decadência da economia
agro-exportadora do açúcar, no final
do século XVII, compensada pela
descoberta das minas na região das
Gerais, cria novas perspectivas de
inserção do Rio Grande do Sul na
economia colonial, como fornecedor
de gado bovino, gado muar - para o
transporte - e couros. Pouco a pouco
vai se dando a ocupação da
Província de São Pedro, através
da concessão de sesmarias, em geral
em paga de serviços militares
prestados:
As estâncias de gado que se
constituíram realizavam uma criação
extensiva do rebanho, utilizando
como mão-de-obra os peões. Estes
eram elementos subalternos do antigo
bando armado que tropeava gado ou
índios egressos das missões. Embora
se registrasse o uso de escravos nas
estâncias, a atividade de criação,
subsidiária da economia central do
país, não foi capaz de propiciar uma
acumulação que permitisse a
introdução regular de negros na
região. Estes não se constituíram na
mão-de-obra fundamental no processo
do trabalho.
Os escravos utilizados
nas estâncias não o eram nas
atividades de peonagem
propriamente dita. À parte os
trabalhos domésticos, ocupavam-se na
agricultura de subsistência e de
outras tarefas de apoio à atividade
produtiva principal da estância.
Portanto, “o latifúndio no sul não
foi agro-exportador (...) não foi
fundamentalmente escravista. Assim,
nem o produto nem a estrutura
produtiva da grande propriedade
reproduziram, no sul, o trinômio
básico da estrutura social e
econômica do Brasil: latifúndio,
lavoura de exportação e escravismo.”
A
partir do tratado de Madrid (1750),
que a tornou a região das Missões
território luso, Portugal incentivou
a vinda de casais açorianos para o
seu povoamento. Estes, localizados
na parte norte do Estado,
dedicaram-se fundamentalmente à
agricultura, em especial à produção
de trigo. O enriquecimento de alguns
colonos, propiciou a introdução de
escravos nas lavouras, mas em
pequena proporção.
Será somente com
introdução das charqueadas - para
viabilizar a mercantilização da
carne bovina sob a forma do charque
- que a introdução de escravos
tonou-se massiva no Rio Grande do
Sul.
De forma similar ao resto do Brasil,
“a escravidão doméstica e a urbana
(artesanato, trabalho de reparação,
pequeno comércio e serviços)
desenvolveram-se amplamente no Rio
Grande do Sul.” Mas, “eles só
desempenharam um papel produtivo
essencial na produção de charque.”
Já o trabalho nas estâncias
continuou a pouco usar a mão-de-obra
escrava:
É lógico que a caça ao gado
selvagem, assim como o tropear, não
se coadunava com o trabalho
compulsório. Os peões que
trabalhavam na courama não só eram
senhores de seus destinos, pois
encontravam-se belamente montados,
como também deviam estar fortemente
armados. O contato com os
aborígenes, antigos senhores de uma
terra da qual se viam escorraçados,
as incursões lusitanas e espanholas
que se esparramavam por um
território sem senhor, tudo isso
fazia destas expedições verdadeiras
operações militares. A arma, a
montaria, os horizontes abertos, por
motivos óbvios, não se combinavam
com o homem escravizado. Os escravos
que participavam dessas atividades
terminavam transformando-se em
acompanhantes de seus senhores, mais
guarda-costas e pajens do que
servos. A escravidão assumirá,
então, uma qualidade meramente
jurídica. No geral, porém, a
mão-de-obra que assegurará essa
atividade será livre. Aqui teremos o
indígena em processo de absorção, o
espanhol transbandeado, aventureiros
paulistas, enfim, crioulos e
mestiços livres de todos os tipos.
As charqueadas platinas
(saladeros) levavam vantagem
em relação às nossas, devido ao uso
de mão-de-obra livre
e ao grande apoio governamental -
exatamente por serem a atividade
básica desses países, estando
isentas das taxas da importação do
sal e não pagando impostos de
exportação. As charqueadas
rio-grandenses só conseguiram
competir com elas, na primeira
metade do século passado, devido à
desorganização das atividades
produtivas nos países do Prata,
decorrente das guerras de
independência.
Em
1820, a anexação da Banda
Oriental pelas tropas de D. João
VI, favoreceu ainda mais os
interesses do Rio Grande do Sul,
colocando o gado e as pastagens do
Uruguai à disposição das suas
charqueadas. A economia sulina
orientou-se cada vez mais para o
abastecimento do mercado interno,
tornando-se o charque a base da
alimentação da escravaria do setor
agro-exportador. Como o preço dos
produtos alimentares incidia
diretamente no custo da manutenção
da mão-de-obra escrava, a política
econômica imperial - a serviço dos
produtores de café - resistia a
qualquer política protecionista em
relação aos alimentos gaúchos,
favorecendo, ao contrário, as
importações.
Por isso, a libertação
do Uruguai em relação ao Brasil, em
1828, significou um grave golpe na
competitividade da economia gaúcha,
especialmente do charque. A crise
econômica daí advinda, combinada com
o ressentimento rio-grandense com o
“desinteresse” do governo central em
relação à produção gaúcha, foi,
indiscutivelmente, uma das causas
mais importantes da Revolução
Farroupilha, que se prolongou de
1935 a 1845. Tanto é assim, que uma
das principais concessões do governo
central aos farrapos, quando da
assinatura da paz, foi a elevação de
25% da taxa alfandegária sobre o
charque importado. Essa e outras
medidas, somadas as graves
perturbações políticas que se
seguiram nos países platinos, deram
um certo fôlego às charqueadas
gaúchas, adiando a sua crise para a
década de 60. A partir de então, com
a recuperação e a modernização dos
saladeros platinos, que se
transformaram em verdadeiras
empresas capitalistas, e a proibição
do tráfico de escravos, a partir de
1850, a sua decadência tornou-se
inevitável:
No mercado interno brasileiro,
defrontavam-se os produtos de uma
economia subsidiária escravista
(riograndense) em crise e os de uma
economia central assalariada
(platina) em ascensão. A forma que o
Rio Grande do Sul teria para poder
vencer o concorrente seria pelo
controle dos mecanismos decisórios
de poder, subordinando a orientação
da política econômica nacional aos
interesses sulinos. Entretanto, as
pretensões rio-grandenses esbarravam
no fato de que a economia do estado
estava subordinada aos interesses do
centro do país (...) O interesse do
centro, no caso, era baratear o
charque, do qual era comprador.
(...) Nos quadros do Império, os
charqueadores buscavam resolver seu
problema pela antecipação da
abolição da escravatura, o que se
deu em 1884. Entretanto, o princípio
adotado foi o da liberação com a
“cláusula de prestação de serviços”,
o que implicava que o senhor
permanecesse com o trabalhador à sua
disposição, para uso de acordo com
suas necessidades reais e repassando
os gastos de manutenção para o
próprio liberto, agora chamado de
“contratado”. Significava, em última
análise, extinguir a escravidão sem
extinguir os escravos. Limitava-se,
com isso, a própria generalização
das relações assalariadas de
produção nas charqueadas sulinas,
comprometendo o desenvolvimento do
capitalismo na região.
2.1.2.
- A ECONOMIA COLONIAL IMIGRANTE
Depois da imigração
açoriana no final do século XVII, o
Rio Grande do Sul recebeu duas levas
migratórias principais, no século
XVIII: a alemã, iniciada em 1824, e
a italiana, a partir de 1875. Essas
imigrações inserem-se no processo de
expansão do capital a nível mundial.
O desenvolvimento do capitalismo em
países como a Alemanha e a Itália
criou grandes excedentes de
trabalhadores sem terra e sem
trabalho, sem possibilidade de serem
absorvidos em seus países. A
emigração para o Novo mundo
foi uma das formas encontradas para
aliviar as tensões sociais e abrir
novos mercados.
Diferentemente da imigração para as
regiões cafeeiras, que visava
resolver o problema da carência de
mão-de-obra para as plantations
agro-exportadoras - substituindo
a mão-de-obra escrava por
mão-de-obra livre, sob a forma do
colonato ou do assalariamento - a
imigração para o Rio Grande do Sul
tinha como objetivo a criação de uma
classe de pequenos agricultores
dedicados à produção de gêneros
alimentícios para o mercado
brasileiro.
Do ponto de vista dos pecuaristas e
dos charqueadores escravistas,
portanto, a imigração não atendia
aos seus interesses nem solucionava
sua falta de braços:
No Rio Grande do Sul, os motivos que
levaram à promoção da imigração
européia foram radicalmente diversos
daqueles que encontramos na região
cafeicultora. Helga Iracema L.
Piccolo [Abolicionismo e trabalho
livre no Rio Grande do Sul.
Porto Alegre, UFRGS, mimeografado,
1987, p. 8] a intenção manifesta da
Presidência da Província em 1848 não
era, em hipótese alguma, a de
promover a imigração européia com a
finalidade de fornecer braços para o
setor charqueador do Rio Grande do
Sul (...) explícita no sentido de
não permitir a criação de colônias
de imigrantes em áreas vizinhas à da
região charqueadora (...) essa
criação só poderia ser feita,
segundo ele, longe da região das
charqueadas.(...) Com isso, Piccolo
deixa claro que o impulso dado à
imigração, no Rio Grande do Sul, não
estava sendo concebido para resolver
os problemas virtuais de penúria de
mão de obra dos senhores de escravos
(...) E não somente isso, a
escravidão era interditada nas áreas
das colônias. A presença de escravos
nas colônias de imigrantes derivava
de sua existência no período
anterior (...) O sucesso econômico
das colônias de imigrantes permitia
a aquisição de escravos, mas as leis
imperiais e provinciais interditavam
o seu uso. A colonização no sul
fazia-se, também, nesse sentido, em
oposição à sociedade escravista. A
intenção imperial explícita era a de
criar uma classe de pequenos
proprietários (...) o Governo
Imperial incentivava o assentamento
de novas relações de propriedade e
de produção.
Alguns anos mais tarde,
em 1874, o relatório de um outro
Presidente da Província lamentava-se
dessa orientação dada a imigração no
Rio Grande do Sul:
(...) a exploração dos grandes
prédios rurais não encontra braços
que a auxiliem; o preço do salário
agrícola não guarda proporção com o
resultado do trabalho; (...) o
sistema de colonização atualmente
seguido produz, a par de todas as
suas vantagens, o inconveniente de
dificultara a união do capital e do
trabalho, afastando os imigrantes
dos estabelecimentos já criados, e
convidando-os a formarem pequenos
prédios rústicos (...)
Resumindo as peculiaridades do
escravismo no Rio Grande do Sul,
transcrevemos abaixo uma longa mas
esclarecedora citação do importante
trabalho de Luiz Roberto Targa:
(...) a grande propriedade fundiária
no sul não era agro-exportadora para
o mercado mundial, mas de pecuária.
Seu produto destinava-se ao próprio
mercado brasileiro (...) não tornou
necessária nem essencial a
utilização da escravidão no
pastoreio. No Rio Grande do Sul, não
houve, desse modo, a sobreposição
dessas duas instituições clássicas
das plantations brasileiras:
o escravismo e a grande propriedade.
(...) na sociedade sul-riograndense,
o escravismo havia ficado confinado
principalmente ao setor charqueador
(...) Enquanto firma escravista, a
charqueada distinguiu-se de qualquer
outra, pois não possuía produção de
subsistência dentro da unidade de
produção, o que a tornava vulnerável
à contração dos preços do charque.
Por fim, seu produto afetava o custo
da reprodução da escravaria do
Brasil e das camadas urbanas pobres,
o que criou conflitos entre a classe
dominante regional e as de outras
regiões do Brasil. (...) E mais, foi
crucial na diferenciação dos
escravismos construídos no sul e nas
plantations a identificação
das classes fundamentais do
escravismo agrário brasileiro: a dos
senhores e a dos escravos rurais.
(...) Ora, nenhuma dessas duas
classes existiu no Rio Grande do
Sul, desde que os senhores rurais
foram pecuaristas e que a atividade
pecuária se revelou não
essencialmente escravista. Disso
decorre que a classe dos escravos
rurais também não existiu no Brasil
meridional. As classes fundamentais
do escravismo gaúcho foram outras: a
dos proprietários e a dos escravos
das charqueadas. (...) as concepções
e a prática que cercaram a imigração
foram fundamentalmente diversas na
região do café e no Brasil
meridional. Na primeira, os
imigrantes vieram tomar o lugar dos
escravos na produção, enquanto no
sul eles foram encarregados de
criar uma nova sociedade
totalmente à parte da sociedade
escravista e onde o trabalho escravo
era legalmente interditado. (...) Em
São Paulo, houve uma relação de
causa e efeito entre a abolição da
escravidão e a imigração, pois, num
primeiro momento, a escravidão
fizera fracassar a imigração.
Totalmente outra foi a relação no
Rio Grande do Sul, onde o
desenvolvimento da imigração
asfixiou o escravismo (...) na
região cafeicultora, a abolição da
escravidão e a substituição do
trabalho escravo pelo livre tocava o
próprio coração da produção e da
sociedade regional, enquanto no sul
ele afetava um setor entre os três
que existiam: o pecuário, o colonial
e o charqueador. No sul, o setor
escravista da sociedade e da
produção não estava no centro, mas
ao lado, e, assim, ele ficou
relativamente isolado com seus
problemas.
2.1.3.
- A ACUMULAÇÃO DE CAPITAL E A
FORMAÇÃO DO PROLETARIADO GAÚCHO
Tendo em vista que a
atividade produtiva historicamente
predominante no Rio Grande do Sul
era a pecuária - à qual se ligava o
setor charqueador - se poderia
pensar que a origem do capital
industrial na economia gaúcha viesse
daí. Realmente, a pecuária e as
charqueadas possibilitaram uma
relativa acumulação de capital, mas
os dados empíricos demonstram que
esses capitais quase não foram
transferidos para as atividades
industriais.
Diante deste fato, é
bastante difundida a “lenda” de que
a origem da indústria gaúcha estaria
nos capitais acumulados pelos
pequenos proprietários das colônias
agrícolas de imigração,
e na lenta transformação do
artesanato, a eles ligado, em
produção industrial. Só que:
Se é inegável a grande importância
que tiveram os imigrantes no
processo de industrialização do
Estado (...) não é menos verdade que
entre esse artesanato e a indústria
de fato houve uma separação bem
nítida. (...) O artesanato (...)
jamais teve dinamismo suficiente
para transformar-se, gradualmente,
em indústria. (...) E a maior parte
do artesanato (...) foi destruída
pelo desenvolvimento comercial que
deu aos colonos acesso a produtos
importados (...) deixou espaço para
que surgisse a indústria
propriamente dita. (...) ao invés do
artesanato ter gerado a indústria,
foi o aniquilamento daquele que
propiciou o surgimento desta.
Na verdade - e os
pesquisadores são hoje mais ou menos
unânimes nessa questão - a
acumulação de capitais para a
indústria no Rio grande do Sul se
deu, fundamentalmente, entre os
imigrantes, mas não a partir dos
pequenos agricultores ou artesãos, e
sim a partir do capital comercial,
principalmente de imigrantes
alemães:
Entretanto, todo este
desenvolvimento da agricultura
colonial alemã não veio beneficiar
diretamente o pequeno proprietário,
mas sim aquele que realmente
acumulava capital através das
atividades de abastecimento do
mercado interno: o comerciante (...)
o comerciante alemão foi o elemento
que se destacou no mundo colonial.
Lucrava sobre a produção agrícola
mediante a diferença obtida pelos
produtos na colônia e em Porto
Alegre; lucrava com o transporte das
mercadorias da colônia à capital e
da capital à colônia; lucrava ainda
com as operações financeiras de
empréstimos e guarda de dinheiro
(...) É possível observar sua marcha
ascensional em termos de acumulação
de capital, desde a venda rural até
a constituição de grandes casas de
comércio de importação e exportação
(...) aplicando capital não só na
indústria como em empresas de
navegação, bancos, companhias de
seguros, loteamentos, hotéis.
Ao tratar do mesmo tema,
SILVA - abordando a questão da
origem do capital dos imigrantes -
procura responder se o mesmo
decorreu de uma acumulação local ou
prévia:
(...) as populações que aqui
aportavam não deveriam ser formadas,
em grande parte, por integrantes da
pequena burguesia ou outras camadas
intermediárias, e sim por
ex-camponeses expropriados de suas
terras ou por operários mal
empregados ou desempregados (...)
não poderiam ter trazido para o Rio
Grande qualquer capital mais
significativo. Entretanto, em alguns
casos, aqui chegavam imigrantes
detentores de um capital previamente
acumulado. O “burguês” imigrante é
identificável facilmente quando o
tempo que decorre entre a sua
chegada e o início de sua atividade
empresarial é pequeno (...)
Enquadrava-se nesta situação J.
Becker, que chegou no Rio Grande do
Sul em 1854 e já em 1856 iniciava
sua fundição em porto Alegre; de L.
Hädrich, que também gastou somente
dois anos entre sua chegada e o
estabelecimento de uma fábrica de
máquinas em Novo Hamburgo; de E.
Neugebauer que se estabeleceu com
uma fábrica de doces em Porto
Alegre, em 1891, e ainda de Emerich
Berta, J. Wallig e Mernak, na
metalurgia e mecânica, e de Kessler
e Teichmann na indústria de chapéus.
Estes e alguns outros exemplos,
contudo, não constituíam a maioria
da industrialização gaúcha, não
podendo ser considerados típicos no
processo de acumulação do capital
industrial no Rio Grande do Sul.
Mas, o imigrante não
forneceu só o capital inicial para a
industrialização gaúcha. Ainda foi a
origem da mão-de-obra livre para
essas indústrias
De fato, com o passar dos anos, e
com a crescente subdivisão da
propriedade colonial, esta começou a
liberar crescentes excedentes
populacionais, que não tinham mais
como ser absorvidos no trabalho
agrícola. Serão, portanto, esses
filhos de imigrantes, com certa
qualificação técnica, que irão
formar boa parte do nascente
proletariado gaúcho.
Também
não pode ser desprezado o papel
desempenhado pelos pequenos
proprietários coloniais na
dinamização da incipiente
industrialização, através da criação
de um próspero mercado para os seus
produtos:
Na consideração do mercado interno
gaúcho, há um elemento que se
destaca, não só por seu caráter
específico, como também pelo papel
que desempenhou em sua dinamicidade:
a imigração alemã e italiana.
Formando áreas de produção agrícola
que tinham como unidade produtiva a
pequena propriedade, ela marcou
profundamente a formação e a
potencialidade do mercado gaúcho,
dotando-o de uma parcela maior de
população com médio poder
aquisitivo. O imigrante possuía um
poder de compra bem maior do que o
daqueles que, radicados em outras
regiões do País, se integraram à
massa assalariada do campo e da
cidade.
Por
fim, a partir da década de 40, as
colônias alemãs já haviam
ultrapassado a fase da agricultura
de subsistência e começaram a
fornecer produtos alimentícios para
o mercado regional, especialmente
Porto Alegre, garantindo o
abastecimento da crescente população
urbana. A partir dos anos 70, essa
agricultura comercial já será capaz
de abastecer em inúmeros produtos o
mercado interno nacional, dinamizado
pelo café.
Todas
essas particularidades influenciaram
de uma forma significativa a
transição para uma economia
capitalista no Rio Grande do Sul,
onde
não foi dos charqueadores que
surgiram os empresários industriais,
nem dos escravos que surgiram os
operários (…) diferença fundamental
em relação a São Paulo. Nesta última
região, pelo menos alguns dos
capitalistas industriais importantes
que surgiram após a abolição da
escravidão provinham da classe dos
cafeicultores. Outro foi o caso no
Rio Grande do Sul, onde essa fração
da classe dominante regional [escravista]
não forneceu quadros de capitalistas
industriais e onde praticamente
todos os grupos industriais que se
formaram tiveram origem nas famílias
de imigrantes - não
obrigatoriamente, é claro, nas dos
pequenos proprietários - assim como
foram as populações de imigrantes
que forneceram grande parte dos
contingentes que formaram a classe
trabalhadora sul-riograndense.”
2.1.4.
- O CONTROLE DO PODER POLÍTICO
No Rio Grande do Sul -
desde meados da década de 70 até a
proclamação da República - deteve o
poder do Estado o Partido Liberal,
liderado por Gaspar Silveira
Martins, e integrado basicamente
pelos estancieiros da região da
campanha.
Mas, o
final do século XIX assistia a
decadência da charqueada e da
pecuária da campanha. O setor
agrícola colonial tornava-se cada
vez mais o setor dinâmico da
economia e surgiam novos atores
sociais - como a burguesia comercial
e a incipiente burguesia industrial.
Só que o setor pecuarista continuava
hegemônico, não abria espaços para
os demais setores e negociava com o
Império unicamente os seus
interesses.
Na
medida em que os partidos políticos
do Império não conseguiam
representar esses interesses
emergentes, abriu-se um espaço para
o surgimento de uma nova alternativa
política: o Partido Republicano
Rio-Grandense (PRR) transformou-se,
no Rio Grande do Sul, nessa
alternativa, sendo formado por
setores descontentes do latifúndio
pecuarista (liberais ou
conservadores) em aliança com
setores médios urbanos. Procurou
incorporar setores do colonato, além
de comerciantes e industriais.
Assumiu o positivismo como ideologia
- que tinha larga penetração nas
Forças Armadas brasileiras - e
aproximou-se do exército. Em última
análise, a proposta do PRR apontava
para o desenvolvimento capitalista
do Rio Grande do Sul:
No campo econômico, o positivismo
apresentava uma série de
idéias-força que visava derrubar as
barreiras que obstaculizavam a
expansão capitalista,
particularmente justificando-a em
suas etapas iniciais. Nesse
contexto, o PRR passa a congregar
industriais, comerciantes,
financistas, exportadores e parte
dos produtores rurais, especialmente
os pecuaristas do planalto
(anteriormente não representados na
estrutura do poder). Classes médias
urbanas e pequenos agricultores da
serra também integravam com menor
peso político esse partido. O PRR
administrava o conjunto desses
interesses dentro de uma estratégia
de desenvolvimento e reprodução do
capital, parecendo estar acima da
sociedades e de cada interesse
particular. Como afirma Pedro
Fonseca, há uma nítida convergência
entre positivismo e revolução
burguesa, como corolário de uma
transição conservadora numa
sociedade onde a escravidão recém
havia sido abolida. O resultado de
tal postura é que a economia gaúcha
durante a Primeira República
transita da especialização pecuária
à crescente diversificação, tornando
o estado o celeiro do Brasil.
Segundo Antonio Barros de Castro,
trata-se do “único caso bem sucedido
de desenvolvimento para dentro”. Mas
isso só foi possível contendo-se
politicamente a poderosa oligarquia
pecuarista da campanha. Daí o
“sentido” do autoritarismo do
regime, que se autodenominava
ditadura científica..
Com a
proclamação da República, o PRR -
liderado por Júlio de Castilhos -
ascende ao poder, marginalizando a
oligarquia liberal amplamente
dominante. Para manter o poder,
fortalece o aparato repressivo do
Estado - criando a Brigada Militar -
e impõe a Constituição de 1891,
autoritária e centralizadora. Os
antigos liberais respondem com a
Revolução Federalista de 1893, que
só é vencida em 1895, em grande
parte pela ação decisiva da recém
criada Brigada Militar e dos Corpos
Provisórios. Mas, pela própria
violência e barbarismo da luta, as
classes dominantes ficarão
irremediavelmente cindidas. Cisão
que só será superada por Vargas, no
final da década de 20. Ao contrário
do resto do país, no Rio Grande do
Sul não vigora o partido único
estadual, e surge “uma evidente
clivagem entre situação e oposição,
sendo esta última organizada e com
nítido perfil ideológico.”
Como não podia deixar de
ser, tudo isso terá importantes
conseqüências para as lutas da
classe operária nos anos seguintes.
2.2 - Primeiras organizações,
correntes hegemônicas e principais
lutas do movimento operário
na virada do século
Em que pese a tardia
industrialização, e a persistência
da escravidão até 1888, já a partir
dos anos 50 do século passado, são
criadas no Brasil as primeiras
entidades de trabalhadores e surgem
suas primeiras lutas. Assim,
Linhares nos dá a notícia da
fundação, em 1856, da “Sociedade
Beneficente dos Cocheiros” e, em
1858, da “Associação Protetora dos
Caixeiros”. Da mesma forma, nos
relata as greves dos tipógrafos, em
1858, dos trabalhadores da Estrada
de Ferro Pedro II, em 1863, e dos
Caixeiros, em 1866, todas no Rio de
Janeiro.
Inicialmente, predomina nessas
entidades - mas não de forma
absoluta - o caráter
assistencialista, e recreativo. Essa
primeira fase “mutualista” do
movimento operário estende-se até o
final dos anos 80, quando passam a
se desenvolver as organizações de
“resistência” - sindicatos, ligas e
uniões operárias - inicialmente sob
preponderância social-democrata e
com a preocupação de criar um
partido operário - segunda fase -
logo sob hegemonia
anarco-sindicalista - terceira fase.
Apesar dessas profundas
transformações, as organizações
mutualistas continuam a manter a sua
importância até meados da segunda
década deste século.
Nos primórdios, os
principais palcos da ação proletária
no Rio Grande do Sul são as cidades
de Porto Alegre, Pelotas e Rio
Grande, principais centros operários
do Estado.
Em Porto Alegre, surge, em 1877, a
“Sociedade Operária de Mútuo Socorro
e Beneficência Vitorio Emanuele
II” , organizada por imigrantes
italianos, com participação de
alguns brasileiros. Em 1880, o
“Instituto dos Artífices”. Em 1882,
é criado o “Clube Caixeral
Porto-Alegrense” - que já em 1884
conquista a Lei de fechamento de
portas, obrigando os
comerciantes a darem folga aos seus
empregados nos domingos. Seu
fundador, Ernesto Silva - balconista
de farmácia - já em 1874 escrevia no
primeiro jornal operário do Rio
Grande do Sul - O SOCIAL - e em 1878
em O CAIXEIRO, denunciando a
situação de sua classe Após a
criação do “Clube Caixeral”, Ernesto
passa a editar O ATLETA, porta-voz
dos balconistas da cidade. Também em
1882, é fundada a “Associação de
Socorros Mútuos - Pecúlio dos
Empregados da Diretoria-Geral da
Fazenda Provincial”. Em 1885, temos
notícia da criação do
“Musterreiter”, entidade que alguns
anos mais tarde se transformaria na
“Associação Sul-Riograndense dos
Viajantes Comerciais”. Em 1888/89,
surge a “Associação Beneficente
União Operária”, manipulada pela
classe patronal.
Em 1890, é fundado o Partido
Operário do Rio Grande do Sul. Seu
Programa defende o Socialismo e a
República: o sufrágio universal e as
mais amplas liberdades democráticas;
o ensino integral, secular e
profissional; o fim do direito a
herança; a emancipação da mulher;
etc.
O surgimento desse partido se dá no
contexto da proliferação de partidos
similares em todo o País:
A formação partidária que se diz
socialista aparece somente depois de
1890, isto é, na República. (...)
seus dirigentes, com exceção, não
são de origem proletária, mas
pequeno-burguesa e a maior parte é
brasileira, ao contrário das
lideranças sindicais. (...) a soma
de Partidos é espantosa para a
época. Temos um Partido Operário do
Rio Grande do Sul (1890); Partido
Operário ou Partido Socialista
Brasileiro, do Distrito Federal
(1890); Partido Operário de São
Paulo (1890); Partido Operário no
Brasil, do Distrito Federal (1892);
Centro Operário da Bahia (1894);
Partido Operário Socialista, do
Distrito Federal (1895); Centro
Socialista de São Paulo (1896);
Partido Democrático Socialista, de
São Paulo (1896); Partido Socialista
do Rio Grande do Sul (1897); Partido
Socialista Brasileiro, de São Paulo
(1902); Partido Operário Socialista,
do Distrito Federal (1909).
Alguns
desses partidos chegaram a ter
“repercussão” internacional.
Referindo-se ao “Partido Socialista
Brasileiro”, fundado por França e
Silva, Kautski envia uma carta a
Engels, dizendo:
(...)
envio-te anexo um jornal que me
remeteram do Rio de Janeiro. Contém
um artigo sobre o Partido Operário
brasileiro e seu programa.
Lamentavelmente não sei português, e
portanto, só posso adivinhar aqui e
ali algo de seu conteúdo. Talvez te
interesse o artigo. Talvez, se
valesse a pena, Ede [Eduardo
Berstein], que também é poliglota,
poderia fazer uma nota com esse
material. Já mencionei uma vez o
movimento brasileiro, em uma
informação baseada em um jornal
alemão de São Paulo.
Engels responde: “Dei a Ede o jornal
brasileiro, mas disse-lhe que a
importância destes partidos
sul-americanos está sempre na razão
inversa das demonstrações ruidosas
de seus programas (...)”.
Segundo PETERSEN, ao Centro do
Partido Operário de São Paulo “está
relacionada a primeira comemoração
localizada do 1º de Maio no Brasil,
em 1891.”
No ano seguinte, o médico e
jornalista anarquista Francisco
Colombo Leoni, natural da Itália,
funda em Porto Alegre o jornal
L’AVENNIRE e promove a primeira
comemoração pública do 1º de Maio em
Porto Alegre, reunindo um grupo de
operários e para eles discursando na
Praça da Alfândega.
Esse ato em Porto Alegre é anterior
ao 1º de maio de Santos, que -
segundo alguns autores - teria sido
a primeira comemoração desta data no
Brasil
Os socialistas de São Paulo e do Rio
Grande do Sul merecem uma referência
especial no livro Le Socialisme
et le Congres de Londres,
editado na capital inglesa no ano de
1897: “No Brasil o socialismo
encontra-se em estado embrionário.
Cresce mais na Província do Sul, São
Paulo e Rio Grande do Sul, graças à
imigração italiana e alemã. Em
Santos (SP) existe a União Operária,
um partido operário
social-democrata.”
No Rio Grande do Sul, em 1895, é
criada a “Allgemeiner
Arbeiterverein” - Associação Geral
dos Trabalhadores - por iniciativa
de imigrantes sociais-democratas
alemães comprometidos com o programa
do Partido Social-Democrata Alemão.
Cabe a ela, em 1896, comemorar pela
primeira vez o 1º de maio em Porto
Alegre. Também em 1895, Francisco
Xavier da Costa funda em Porto
Alegre a “Liga Operária
Internacional”. Sob a sua
influência, são formadas “Ligas” em
Rio Grande, Pelotas, São Leopoldo,
Cachoeira do Sul, Taquari e São
Gabriel. Em 1896, é fundado e
editado por Lucídio Prestes - 1º
secretário da “Liga Operária
Internacional” - o semanário
socialista O PROLETÁRIO. Em 1897 e
1898, a “Liga” e a “Allgemeiner”
organizam conjuntamente as
comemorações do 1º de maio. Em 1896,
José Rey Gil e José Ferla -
dirigentes da “Liga” - fundam a
“Sociedade Tipográfica
Riograndense”, em Porto Alegre. No
mesmo ano surge a “Cooperativa
Tipográfica de Porto Alegre”, de
breve duração. Em 1897, a
“Allgemeiner” e a “Liga Operária
Internacional” jogam papel
determinante na criação do Partido
Socialista Riograndense, cujo
programa é divulgado em português e
alemão.
Além do Socialismo e da “República
Democrática Social”, o partido
propõe o voto universal, inclusive
para as mulheres, e as mais amplas
liberdades; instrução geral e
profissional gratuita para os filhos
das classes pobres; redução dos
exércitos permanentes; assistência
médica gratuita; imposto gradual e
progressivo sobre heranças e
fortunas; jornada de 8 horas,
proibição do trabalho para menores
de 14 anos e jornada de 5 horas para
os de 14 a 18 anos; etc.
Na cidade portuária de Rio Grande, a
primeira sociedade operária que
surgiu foi a “Liga Operária”: “Os
seus princípios baseavam-se na união
dos operários para a defesa dos seus
interesses de classes, mas tudo
esperando dos poderes constituídos
(...) como aconteceu com a célebre
lei das cadernetas e vassoura para
os criados e desocupados em 1890 e
91.”
Depois, foi criado o “Centro
Operário”, formado na sua maioria
por operários das fábricas de
tecidos Rheingantz, manipulado pelos
patrões. Em 1892, é criada a “União
do Trabalho”, sob forte influência
da colônia alemã ali radicada, e que
para alguns estudiosos marca a
passagem para a fase de predomínio
social-democrata no sindicalismo
gaúcho. Em fins de 1893, os
socialistas de Rio Grande fundam a
“Sociedade União Operária”, que em
1896 passa a publicar o jornal
semanal o ECHO OPERÁRIO. Por ocasião
da sua instalação, em 1º de maio de
1894, a “União Operária” realizou um
ato comemorativo à data universal
dos trabalhadores. A “União
Operária” chega a ter mais de mil
sócios. Logo após a sua fundação, a
“União Operária” participou da greve
dos empregados da estrada de ferro,
saindo-se vitoriosa.
Em 24.10.1897, o ECHO OPERÁRIO
afirmaria: “os operários vão-se,
pouco a pouco desenganando da
mistificação dos partidos burgueses
para com eles, e não vão consentir
que inimigos seus e dos seus
interesses sejam eleitos com o seu
voto. Assim que os operários se
convencerem disso, a União
Operária terá um partido e as
câmaras verão representantes
socialistas.”
Nas
eleições realizadas em setembro de
1898, para preencher uma vaga de
Conselheiro Municipal em Rio Grande,
o Partido Socialista, recém fundado,
lançou o nome do jornalista Rodolpho
José Gomes. Vencedor, apesar do
boicote dos partidos tradicionais,
teve a sua eleição anulada pelo
governador do Estado, João Abbot.Em 1898, também é fundado em
Rio Grande o “Grêmio dos
Jornalistas”.
Em Pelotas, já em 1878 temos notícia
da existência do jornal O TRIBUNO
SOCIALISTA. Em 1880, é criada a
“Associação Beneficente das Classes
Laboriosas”. Em 1887, os fabricantes
de calçados de Pelotas - em choque
com o Gabinete João Alfredo, que
havia criado uma tarifa que os
prejudicava - formam o “Congresso
Operário”, entidade que logo se
transformaria na “Liga Operária”,
até se reduzir a uma mera sociedade
recreativa. Em 1889 é criada a
“Associação dos Jornalistas de
Pelotas”. Em 1892, começa a ser
publicado o periódico O OPERÁRIO -
de orientação socialista - e, em
1893, o semanário DEMOCRACIA SOCIAL..
Esse jornal trazia em epígrafe à
direita, abaixo do seus título, a
frase “Trabalhadores de todo o
mundo, uni-vos!” e a respectiva
autoria “Karl Marx”. Em sua edição
de 09.07.1893 - depois de denunciar
a “revolução” de 93 como uma luta
entre frações da mesma oligarquia
estancieira - afirmava com grande
lucidez política:
Este estado de coisas não se mudará
enquanto não aparecerem outros
partidos, embora burgueses, como,
por exemplo, um partido agrícola ou
industrial, que entre em combate com
a nossa burguesia criadora da vaca.
Mas não há esperanças que a
agricultura ou a indústria sejam
capazes de se levantar tanto, para
poder formar partidos, pois são
também embrionárias. Só resta uma
classe do povo que, pelo número,
podia enfrentar estes partidos e
esta política. O povo que trabalha,
que é explorado e sacrificado, o
verdadeiro povo. (...) o povo há de
se compenetrar da sua situação, há
de compreender os seus interesses,
há de formar um partido
verdadeiramente democrático, um
partido que possa contestar a
pretensão desta burguesia da vaca de
ser em si o estado, um partido que
possa pôr em questão o direito
divino que esta classe tem e
exerce no monopólio dos bens da
natureza, do Solo, do efeito do sol
e da chuva e de acumulação do povo,
etc. É só quando o povo se
compenetrar dos seus interesses,
quando o povo se organizar para a
resistência, formando um partido
forte democrático (...) poderemos
ver a confraternização destes dois
partidos. Inimigos tão ferozes hoje
e no entanto carne da mesma carne e
osso do mesmo osso. Então, unidos
para nos combater, dirão
enfaticamente: Temos de defender a
santíssima causa da propriedade.
Entre
1890 e 1893, ocorrem em Pelotas as
três primeiras greves do Rio Grande
do Sul. A primeira delas, em abril
de 1890, realizada pelos tipógrafos,
pleiteando melhorias salariais. A
segunda greve - do dia 7 ao dia 9 de
agosto de 1993 - foi deflagrada
pelos chapeleiros, exigindo aumento
de salários. Os grevistas
conquistaram as suas reivindicações.
Em outubro deste mesmo ano, foi a
vez dos carroceiros fazerem uma
greve geral pelo aumento dos preços
dos fretes, também vitoriosa. Em
1998, ocorreu nova greve em Pelotas,
desta vez dos trabalhadores do
Centro Telefônico, contra a dispensa
de um colega de trabalho.
Em
1883, em Garibaldi, por iniciativa
de imigrantes italianos, fora criada
a “Sociedade Operária de Mútuo
Socorro Stella D’Itália”. Em
1885, surgiu em Cachoeira do Sul O
FAROL, porta-voz dos comerciários e,
em 1886, foi fundado o “Clube
Caixeiral Cachoeirense”. Em 1895, em
Quaraí é fundado o “Clube União
Caixeral” - agregando patrões e
empregados - e em 1896 a “Sociedade
União Operária Beneficente”, cujo
porta-voz será o jornal O AMADOR. Em
1898, é fundada a “União Operária”
de Bagé.
O ano de 1898 é marcado por um
importante acontecimento: a
realização nos dias 1 e 2 de janeiro
do I Congresso Operário
Sul-Riograndense. Participam, entre
outros: a “Sociedade Mútua Proteção”
de Alegrete; a “Liga Internacional”
de Porto Alegre; a “Liga
Internacional de São Leopoldo; o
“Clube 1º de Maio” da Margem; a
“União Operária” de Cruz Alta; a
“Cooperativa Tipográfica” de Porto
Alegre; a “Liga Operária
Cachoeirense”; a “Allgemeiner
Arbeiterverein”; a “Sociedade
Tipográfica Riograndense”; o “Grupo
Libertários”; a “Floresta Aurora”.
Os delegados de Pelotas e Rio Grande
não chegaram a tempo para o
Congresso devido ao encalhe do barco
Mercúrio, a bordo do qual se
deslocaram para Porto Alegre. As
principais resoluções do Congresso
foram: criação de ligas operárias de
resistência em todo o Estado,
confederadas entre si; de câmaras de
trabalho nas sedes sociais para a
colocação de trabalhadores
desempregados; de bibliotecas nas
sedes sociais; de escolas nas sedes
sociais; aplicação da boicotagem
como arma de luta econômica; defesa
do socialismo; esforço para a
publicação de um jornal das
associações operárias confederadas;
eleição da omissão central da
“Confederação Operária
Sul-Riograndense”, cujo primeiro
nome era o de Francisco Xavier da
Costa. No Congresso, foi lido e
vivamente aplaudido o seguinte
telegrama procedente de Alegrete,
assinado por 10 pessoas: “Viva o
Socialismo Científico!”
Em 06.05.1896, o jornal republicano
A FEDERAÇÃO publica em francês a
letra do hino “A Internacional”.
O final do século foi marcado,
ainda, pelo florescimento cultural
do movimento operário, através da
multiplicação da imprensa operária,
o teatro, a música, a literatura
social, o ensino:
O florescimento da imprensa operária
socialista nos anos finais do século
XIX e iniciais do XX foi inegável;
encontrou-se referência aos
seguintes jornais: L’AVENNIRE
(1892), A GAZETINHA (1891, sem ser
um jornal operário, veiculava as
notícias socialistas), L’OPERARIO
ITALIANO (1893), O PROLETÁRIO
(1896), A VOZ DO OPERÁRIO (1899),
AVANTE (1901) e a VOZ DOS OPPRIMIDOS
(1903), todos de Porto Alegre. Em
Pelotas foram publicados O TRIBUNO
SOCIALISTA (1878), O OPERÁRIO (1892)
e a DEMOCRACIA SOCIAL (1893). Em Rio
Grande, o ECHO OPERÁRIO (1896), a
RAZÃO (1895?). Finalmente, sem que
com ele se esgote uma relação que
provavelmente seria bem mais ampla,
indica-se O SOCIAL (1897), de
Alegrete. O teatro também foi um
instrumento de formação cultural e
política (...) Em Porto Alegre
aparecem citados o Grupo Dramático
Operário (1897) e o Grêmio Dramático
Xavier da Costa (1909); em Rio
Grande, a União Operária fundou o
seu Grêmio Lírico Dramático em 1902.
Nesta segunda fase do movimento dos
trabalhadores - que se estende até o
final da primeira década deste
século - predomina de forma clara a
vertente social-democrata,
onde destacam-se os jornais AVANTE
(1901) e DEMOCRACIA (1905).
Mas já
desponta uma crescente participação
anarquista no movimento. O
crescimento desta tendência no Rio
Grande do Sul parece estar ligado à
dissolução no Paraná, nos anos
1895-1896, da Colônia Cecília,
formada por anarquistas italianos.
Em Porto Alegre, os anarquistas
fundam o jornal A LUTA (1894) e o
“Grupo de Estudos Sociais”. No I
Congresso Operário do Rio Grande do
Sul, em 1898, eles participam
através do “Grupo Libertários”.
Nesse Congresso começam a se aguçar
as divergências entre os
sociais-democratas - cujo principal
expoente era Xavier da Costa - e os
anarquistas. Em outubro de 1898,
Xavier da Costa se demite da
presidência da “Liga” por
divergências com José Rey Gil e
outros membros da sua direção. Este
assume a direção da “Liga”, que
passa a editar o jornal A VOZ DO
OPERÁRIO (1899). A “Liga” não
resiste aos rachas e pouco tempo
depois desaparece. Rey Gil se
converte ao anarquismo e passa a
disputar com Xavier da Costa a
hegemonia no movimento operário
gaúcho.
Os
primeiros anos do século XX vêem
surgir um grande número de novas
entidades de classe. Em 1901 é
fundada em Porto Alegre a
“Associação dos Sapateiros”,
entidade de resistência e auxílio
mútuo. Em 1905, a “União dos
Metalúrgicos” de Porto Alegre, que
inicialmente funcionou na sede da
“Allgemeiner”. Neste mesmo ano,
surge a “Sociedade da Resistência
Padeiral”, que em 1906 se transforma
na “União dos Empregados em
Padarias” e em 1913 assume o nome de
“Sindicato dos Padeiros”. Dando
mostras de sua combatividade, esta
categoria realizou oito paralisações
entre 1890 e 1919. Ainda em 1905, é
criada a “União dos Trabalhadores em
Madeira”, filiada a FORGS. O período
que vai de 1903 a 1909 é marcado por
um ascenso de greves e mobilizações
em todo o país: greve dos
carroceiros no Rio de Janeiro
(1903), greve dos ferroviários
paulistas (1905), greve dos
portuários de Santos (1905);
agitações e mobilizações de apoio à
revolução russa de 1905 e contra a
execução de Ferrer na Espanha
(1909).
Em 1905, Xavier da Costa cria o
“Grêmio de Artes Gráficas e
Correlatas” no lugar da antiga
“Sociedade Tipográfica
Riograndense”. Como resposta, em
outubro de 1906, os anarquistas, sob
a liderança de Rey Gil, fundam o
“Sindicato dos Gráficos” que, em
novembro de 1907, transforma-se no
“Sindicato Tipográfico”. Em 1905, os
anarquistas fundam a “União Operária
Internacional”, com o objetivo de
preencher a lacuna deixada com o
desaparecimento da “Liga Operária
Internacional” e para contrabalançar
a influência da nascente
“Confederação Operária
Sul-Riograndense” dirigida por
Xavier da Costa, de orientação
social-democrata. A primeira
diretoria da “União” era composta
por socialistas e anarquistas, mas
estes predominaram de forma absoluta
desde o início.
Como
uma reação à “União Operária
Internacional”, recém criada por Rey
Gil, e visando dar uma maior
organicidade ao movimento operário
gaúcho, Xavier da Costa e seu grupo
socialista fundaram, em setembro de
1906, a “Federação Operária do Rio
Grande do Sul” (FORGS), que veio a
substituir a extinta “Liga Operária
Internacional” e a efêmera
“Confederação Operária
Sul-Riograndense”. Os anarquistas ou
foram alijados da sua fundação, ou
preferiram dela não participar por
divergências políticas. Em poucos
anos a FORGS tornou-se o mais
importante órgão de representação
dos trabalhadores do Rio Grande do
Sul. Ainda em 1906, Xavier da Costa
lidera a criação do “Clube de
Imprensa Operária” - porta-voz da
fração socialista da FORGS - do
qual, anos depois, surgirá o
Sindicato dos Jornalistas de Porto
Alegre. A partir de 1906, o “Clube”
passou a editar o jornal A
DEMOCRACIA (que havia sido criado em
01.05.1905 por Xavier da Costa) e, a
partir de 1908, o AVANTE.
Em
1905, e fundado o Partido Operário
Riograndense - tendo a sua frente
lideranças da “Allgemeiner” e
Francisco Xavier da Costa. O Partido
Operário reclama da República “um
lugar ao sol” para o proletariado,
cita Marx e ameaça com a “violência
dos usurpados”:
A inevitável reorganização social já
se prenuncia na Europa, onde para
efetuá-la, os proletários,
precursores do advento da Justiça,
vão passando da ação apenas
doutrinária à luta armada, obrigados
a responder a violência dos
usurpadores com a violência dos
usurpados. (...) O quarto estado
precisa, deve e há de fazer valer os
seus direitos, influindo no governo!
É mister que ele seja emancipado,
porém não esqueçamos que, conforme
os ensinamentos do grande mestre
Carlos Marx, “a emancipação do
proletariado deve ser obra dele
mesmo.” (...) Habilitemo-nos todos
para enfrentar com nossos
dominadores no terreno político, que
é onde eles se firmam e de onde
dificultam os meios para a nossa
emancipação; qualifiquemo-nos
eleitores e concorramos, dispostos,
aos prélios eleitorais; urge
derrocar o principal reduto dos
adversários de nossa classe!
Em seu Programa, o Partido Operário
Riograndense propõe, entre outras
coisas, jornada de 8 horas,
construção de moradias para os
trabalhadores, decretação de um
Código de Trabalho discriminando
direitos e deveres mútuos de patrões
e operários, proibição do trabalho
em oficinas para menores de 15 anos,
sistema previdenciário para os casos
de morte ou invalidez, imposto
progressivo sobre as altas rendas,
educação obrigatória dos 8 aos 15
anos, direito de greve, ampliação
das liberdades democráticas e do
direito de voto.
Em
abril de 1906, por iniciativa da
Federação Operária Regional do Rio
de Janeiro, realiza-se no Rio de
Janeiro o 1º Congresso Operário do
Brasil. Aberto no dia 15, o mesmo
prolonga-se até o dia 20 de abril.
Participam cerca de 40 entidades de
trabalhadores do Rio de Janeiro, São
Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará,
Pernambuco, Bahia, Alagoas e Minas
Gerais. “União Operária” é a única
entidade gaúcha presente. Os
anarquistas, apesar de não serem a
maioria, por sua grande
combatividade dominam o plenário e
conseguem aprovar a maioria de suas
teses:
cabe observar que mesmo no Congresso
Operário de 1906 manifestou-se uma
forte corrente favorável à formação
de um partido político operário; mas
a corrente anarco-sindicalista
predominou ali de maneira
irredutível, com o seu visceral
preconceito “antipolítico”. Nasceu,
assim, em vez de um partido a COB
(...) Escaparia ao plano deste
trabalho aprofundar o exame das
causas de semelhante fato. Parece
claro, porém, que ele se deve
principalmente à própria estrutura
econômica semifeudal do País e, em
conseqüência, à própria formação do
proletariado nacional, aliás, quase
todo de imediata origem camponesa e
artesanal, inclusive o que provinha
de correntes imigratórias,
facilmente influenciável pela
ideologia pequeno-burguesa do
anarquismo. (...) o espírito de
revolta reinante nas massas de
trabalhadores - e produzido,
obviamente, pelas duras condições de
trabalho a que eram sujeitos - viria
a favorecer entre nós o surto do
anarquismo, uma vez que o
socialismo, confuso e vago
socialismo, se apresentava aqui
quase sempre sob as vestes do mais
frouxo reformismo, que apenas de
nome ouvira falar de Marx e do
marxismo. O que é fato é que o
anarquismo, sobretudo em sua forma
anarco-sindicalista, predominou no
movimento operário brasileiro
durante os anos que vão de 1906 a
1920. Isto não quer dizer que todo o
movimento operário e sindical
estivesse debaixo da influência
absoluta do anarquismo. Havia muitas
associações operárias de tipo
reformista, beneficente e mesmo de
resistência (...) que nunca ou
raramente aceitaram a orientação
anarquista.
A partir daí, abriu-se um longo
período de influência do
anarco-sindicalismo, radicalmente
antipolítico. O I Congresso Operário
aprovou a formação da “Confederação
Operária Brasileira”, com sede no
Rio de Janeiro - que só se
constituirá em 1908 - e a criação do
jornal A VOZ DO TRABALHADOR. Suas
principais decisões: que a luta
política partidária seja mantida
fora dos sindicatos; que só sejam
aceitos na COB os sindicatos de
trabalhadores assalariados que
tenham por objetivo central a
resistência; luta pela jornada de 8
horas; denúncia da guerra e do
militarismo; comemoração pública do
1º de maio. Nesse ano de 1906,
registra-se a existência do jornal
La Parola dei Socialisti,
editado pelo “Círculo Karl Marx” de
São Paulo.
Em
outubro de 1906, foi deflagrada em
Porto Alegre a chamada “Greve dos 21
dias”, que acabou conquistando uma
vitória parcial na dura luta pela
redução da jornada de trabalho. O
movimento começou em 4 de setembro
de 1906 com a greve dos marmoristas,
dirigida pelos anarquistas, que
pleiteavam a redução da jornada de
trabalho para 8 horas diárias. Logo
no seu início, os operários
organizam o “Sindicato dos
Marmoristas e Anexos” e lançam um
manifesto ao conjunto dos
trabalhadores da cidade pedindo a
sua adesão à luta pela jornada de 8
horas. O chamamento repercute
profundamente entre os trabalhadores
da cidade. Poucos dias depois, os
pedreiros declaram-se em greve
geral. Sucessivamente, somam-se à
greve os metalúrgicos, os
carpinteiros, os marceneiros, os
tecelões, os pintores, os alfaiates,
os estivadores, os correeiros.
Depois de oito dias a paralisação
dos serviços industriais de Porto
Alegre era quase total. Perto do
final do movimento, os comerciários
também aderiram à greve. No processo
da luta, foram formadas a “Federação
Operária do Rio Grande do Sul”
(FORGS) - que assume a direção do
movimento - a “União dos Pedreiros”
e a “União dos Chapeleiros”. Ao
todo, segundo relatório da FORGS,
foram 9.000 trabalhadores que
paralisaram suas atividades em Porto
Alegre nesta greve. Atemorizados, os
patrões propuseram a redução da
jornada de trabalho para 9 horas:
(...)
foi firmado um acordo pelo qual era
fixada para todo o proletariado a
jornada de 9 horas de trabalho. Até
então a jornada era de 9, 91/2,
10, 101/2 e 11 horas de
trabalho. Os marmoristas, porém, não
se conformaram com esse acordo e
continuaram em greve (...)
finalmente venceram e foi para eles
estabelecido o horário de 8 horas.”
Entre
1906 e 1910, refletindo de certa
forma a orientação reformista da II
Internacional, os socialistas
gaúchos passaram a adotar uma
orientação cada vez mais
conciliadora na luta de classes e
assumir uma política de aproximação
ao Partido Republicano Riograndense
- que acenava com a falácia
positivista da “integração do
proletariado à sociedade” - com o
objetivo de conquistar alguns
espaços no parlamento. Os
anarquistas respondem travando uma
violenta polêmica contra os
socialistas, através das páginas do
jornal libertário A LUTA, relançado
em 1906. O resultado é a crescente
influência dos anarquistas no
movimento operário gaúcho:
(...) essa influência vai crescendo
à proporção em que cresce o
comprometimento dos socialistas com
a classe dominante. (...) Os
socialistas (...) se jogam numa
aventura: entram numa frente
eleitoreira com um “racha” da
Partido Republicano Riograndense e
lançam o marceneiro Luiz Leopoldo
Wetter como candidato a vereador em
Porto Alegre. (...) acabaram sendo
usados eleitoralmente, mais uma vez,
perderam, e isso afastou de sua
órbita de influência uma grande
massa de trabalhadores. As teses
anarquistas, perante essa massa,
brilharam então como verdades
incontestáveis. Francisco Xavier da
Costa (...) se envolve no jogo da
política burguesa, perde espaço na
FORGS e ... deixa o caminho aberto
para os anarquistas. Em 1910 esse
“aparelho” cai nas mãos de Polidoro
Santos. Para não mais ser devolvido
aos socialistas. Em outubro de 1911,
Xavier da Costa é expulso da “União
dos Pedreiros”, perdendo sua
condição de “sócio benemérito”.
(...) em 1912 ele é eleito vereador
pelo Partido Republicano, cargo que
vai exercer por mais de duas
décadas.
2. 3 -
A hegemonia anarquista e as grandes
lutas de 1917 e 1919
A eleição de 1911 para a direção da
FORGS, marca o começo da
preponderância dos anarquistas no
movimento sindical gaúcho, situação
que perdurará até o início da década
de 20, quando os comunistas
começarão, paulatinamente, a
restar-lhes força. Segundo o
relatório da FORGS de 1913, estão
filiadas à ela 14 sindicatos de
Porto Alegre (2980 sócios), 2 de Rio
Grande (140 sócios), 1 de Santa
Maria (50 sócios), 1 de Passo Fundo
(40 sócios), 1 de Montenegro (40
sócios) e 1 de Caxias (30 sócios),
totalizando 20 entidades (3280
sócios). No mesmo relatório, são
listadas outras 50 entidades
sindicais do Estado ainda não
filiadas. Dessas, 5 são de Porto
Alegre, 7 de Pelotas, 6 de Rio
Grande, 5 de Livramento, 3 de Santa
Maria, 2 de Bagé, 2 de São Gabriel,
20 de outros municípios. O jornal
oficial da FORGS é A VOZ DO
TRABALHADOR. Além da orientação
contrária a qualquer participação
política - “contra as especulações
políticas no meio operário”;
“afastamento dos operários dos
compromissos políticos”; “uma nova
diretoria inteiramente contrária à
política operária” - a nova direção
da FORGS definia como o seu ideal a
“implantação de uma sociedade
baseada na solidariedade dos
indivíduos e onde haja lugar para
todos os que são úteis à
coletividade”. Como meios de ação, a
“organização de classes, ação direta
- constantes reclamações aos
patrões, greve nas suas variadas
formas”.
De 7 a 15 de novembro de 1912,
realiza-se no Rio de Janeiro, no
luxuoso palácio Monroe, o “4º
Congresso Operário Brasileiro”,
organizado e financiado pelo 1º
tenente e deputado federal Mário
Hermes - filho do então presidente
da República, Mal. Hermes da Fonseca
- com o apoio do presidente da “Liga
do Operariado do Distrito Federal”,
Pinto Machado. Quando a mesa
diretora dos trabalhos negou o
credenciamento à bancada da
Federação Operária do Rio De
Janeiro, dirigida pelo gaúcho
Cecilio Vilar - ex-dirigente da
FORGS, cujo verdadeiro nome era
Humberto Martins - tanto a bancada
carioca como a gaúcha retiraram-se
do conclave.
O assim chamado “Congresso dos
Pelêgos” - que reuniu “sessenta e
oito elementos” - concedeu a
presidência de honra da recém
fundada “Confederação Brasileira do
Trabalho” ao deputado Mário Hermes,
pouco mais se sabendo dela desde
então.
A Lei de expulsão de trabalhadores
estrangeiros levou a Confederação
Operária Brasileira a desenvolver
uma grande campanha nacional e, no
dia 20 de maio de 1913, a realizar
comícios de protesto em todo o país.
Entre 8 e 13 de setembro de 1913, a
COB realizou o 2º Congresso Operário
Brasileiro, no Rio de Janeiro. Dele
participaram 117 delegados,
representando 2 Federações Estaduais
(entre elas a FORGS), 5 Federações
locais (entre elas as Federações de
Porto Alegre e Pelotas), 52
sindicatos, Sociedades e Ligas e 4
Jornais. Ao todo, estiveram
representadas cerca de 350
associações operárias dos Estados de
São Paulo, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Sul, Distrito Federal,
Minas Gerais, Pará, Alagoas,
Amazonas. O 2º Congresso aconselhou
a greve geral revolucionária em caso
de guerra externa, definiu o combate
o cooperativismo nas entidades
sindicais - por “desvirtuar os
destinos reais do Sindicato” - e
assumiu integralmente a orientação
anarquista de combate à política.
Falando sobre o 2º Congresso
Operário, o Presidente da FORGS -
Luiz Derivi - afirmou:
C.O.B. (...) é totalmente contrária
à política como elemento da luta
operária. (...) O Sindicalismo
baseia-se unicamente na luta
econômica, excluindo toda a
preocupação política (...) A
intromissão das discussões
políticas(...) no meio operário
distraem-no das questões que
verdadeiramente o interessam. O
sindicalismo baseia todas as
conquistas, inclusive a da
liberdade, nos constantes
melhoramentos econômicos da classe
operária.
Entre
1911 e os anos 1917-1919 - quando
ocorrem grandes lutas operárias - a
FORGS, sob direção anarquista, se
firmou como centro dirigente do
movimento operário gaúcho e
desenvolveu um amplo trabalho
cultural, educacional e de
propaganda. Diversos novos
sindicatos são organizados. Entre
suas principais lutas destacam-se
diversas greves por categoria do
período - tipógrafos de Livramento
(1911) e Santa Maria (1913),
pedreiros (1911), metalúrgicos
(1911), alfaiates (1911), correeiros
(1911) e padeiros (1913/15/16) de
Porto Alegre, entre outras - o
movimento contra a carestia de 1912,
a luta contra a guerra, a luta em
solidariedade aos trabalhadores
estrangeiros perseguidos. Em outubro
de 1915, a C.O.B. realizou um
“Congresso da Paz” no Rio de
Janeiro, no qual o Rio Grande do Sul
se fez representar.
Em que pese a forte hegemonia
anarquista neste período, persiste
alguma influência do antigo grupo
socialista em algumas entidades
sindicais. Seu porta-voz é o jornal
A VANGUARDA de Porto Alegre, cuja
epígrafe registra: “Órgão do Partido
Socialista. Jornal de Combate”. Em
sua edição de 03.10.1914, esse
jornal divulga a nominata do
Diretório Central deste partido e o
seu candidato a deputado federal,
Dr. Pereira da Cunha. Em 1908,
segundo o CORREIO DO POVO de 03.09,
outro Partido Operário Socialista
havia sido fundado. Em 1919, o
CORREIO DO POVO de 04.03 noticiará a
realização de uma reunião para a
criação de um Partido Socialista
Operário, da qual teriam participado
sócios da “União Metalúrgica”, da
“Associação dos Trabalhadores em
Madeira”, da “União dos
Eletricistas”, da “União Operária
Musical”, do “Sindicato dos
Pintores”, da “União dos Empregados
em Açougues” e da “União dos
Tecelões”. Esse Partido Socialista
Operário apoiou Ruy Barbosa para a
Presidência da República nas
eleições de abril de 1919.
Observa-se, entre 1912 e 1916, um
certo refluxo do movimento operário
brasileiro e gaúcho, cujas grandes
lutas só serão retomadas no ascenso
de 1917-1919:
Nos anos de 1911 até 1913 passa-se
por um certo refluxo, quando os
desmantelamentos de sindicatos pela
polícia serão acompanhados de
legislação mais severa para expulsão
de estrangeiros. É nesse contexto
que tem lugar em 1912 o Congresso
convocado pelo filho do Presidente
da República. Mas também o ano
seguinte assistirá a realização do
II Congresso da Confederação
Operária Brasileira ainda sob
predomínio anarquista. Daí até 1917
uma relativa baixa do movimento
grevista é acompanhada de forte
mobilização contra expulsão de
estrangeiros, contra a guerra e o
militarismo, contra a carestia que
acompanhou os anos de guerra. O ano
de 1917 inaugura um novo ascenso e
mesmo uma nova fase de massividade
do movimento operário.
Para entendermos o grande ascenso
grevista de 1917 é preciso, alem das
suas causas de fundo, analisar a
conjuntura em que a mesma ocorreu.
Miguel Bodea - em seu trabalho sobre
a greve geral de 1917, no Rio Grande
do Sul - afirma que “O grande
movimento grevista que se alastra
pelo país em meados de 1917 tem a
sua causa conjuntural mais evidente
no modo de inserção do Brasil na
Primeira Grande Guerra (...) o País
transformara-se em um grande
fornecedor de gêneros alimentícios
às populações civis e às tropas
combatentes das nações da
‘Entente’(...).”
Os dados oficiais nos indicam que
entre 1914 e 1917 as exportações
brasileiras de gêneros alimentícios
aumentaram, em média, 11 vezes. No
caso da carne resfriada e do
charque, esses aumentos foram de 47
e de 30 vezes, respectivamente. Já a
exportação do arroz aumentou 14 mil
vezes e a do feijão 21 mil vezes! As
conseqüências disso foram o
desabastecimento e a disparada nos
preços: pelos cálculos de Bodea,
entre 1914 e 1917 os preços
praticamente duplicaram (82%), e
entre 1914 e 1919 triplicaram
(185%). A este enorme crescimento
dos preços, corresponderam salários
nominais fixos, o que implicou em
uma piora considerável das condições
de vida dos trabalhadores.
Referindo-se a essa mesma
conjuntura, Dules afirma: “Os preços
dos gêneros alimentícios continuaram
a subir durante os seis primeiros
meses de 1917. Artigos de primeira
necessidade tendiam a custar de 20 a
150 por cento mais caro do que no
ano precedente (...) O aumento do
custo de vida foi o tema dos
discursos do Primeiro de Maio de
1917.”
A essa situação econômica
insustentável, é preciso acrescentar
um razoável nível de consciência e
organização por parte dos
trabalhadores, sob influência
anarco-sindicalista, e o impacto das
primeiras notícias da Revolução da
Rússia de fevereiro.
Por
outro lado, para melhor
compreendermos a greve de 1917 no
Rio Grande do Sul, é importante
fazer uma rápida análise do
desenvolvimento industrial gaúcho no
início deste século. Segundo o censo
de 1907 - que levantou
principalmente as grandes e médias
empresas - o Rio Grande do Sul já se
tornará o 3º Estado industrial do
país, responsável por 15% da
produção manufatureira, contra 16%
de São Paulo e 33% do Distrito
Federal. Neste mesmo ano, no Estado
do Rio de Janeiro e no Distrito
Federal concentrava-se 31% do total
de operários, em São Paulo 14,7% e
no Rio Grande do Sul 10,2%. Já em
1920 Era o Estado que possuía “a
mais alta porcentagem nacional de
firmas industriais de propriedade
individual, o maior número de bancos
controlados por capitais nacionais e
o maior índice de investimentos
norte-americanos (no resto do país
ainda predominava o capital
britânico).”
Segundo o censo de 1920, 40% da
população economicamente ativa de
Porto Alegre trabalhava em 1919 na
indústria ou nos transportes, e 23%
no comércio, mostrando uma alta
concentração de “classes
trabalhadoras urbanas (...) os
atores principais do movimento
grevista que eclodiria na capital
gaúcha no final de julho de 1917.”
Quanto à sua composição, é
interessante notar que enquanto na
cidade de São Paulo os trabalhadores
estrangeiros englobavam 54,3% da
mão-de-obra na indústria,
transportes e comércio, em Porto
Alegre eles abarcavam somente 25,3%
(censo de 1920).
O que, entre outras coisas, se devia
ao fato de que a imigração
estrangeira no Rio Grande do Sul era
mais antiga, e havia sido
direcionada fundamentalmente para as
áreas rurais do Estado, fazendo com
que a maioria dos operários não
fossem imigrantes e sim filhos ou
netos de imigrantes.
Assim,
o ano de 1917 entrou prenhe de
grandes mobilizações operárias. Em
18 de abril, a Federação Operária do
Rio de Janeiro realizou uma grande
assembléia em sua sede, ocasião em
que foi decidido o envio de uma
mensagem ao Presidente da República
protestando contra a eventual
entrada do Brasil na guerra e
sugerindo medidas contra a crise que
sacrificava os trabalhadores. No dia
1º de maio, um grande massa de
trabalhadores desfilou pelas ruas da
capital protestando contra a
carestia e pedindo paz. Ainda
durante o mês de maio, irromperam
diversas greves em fábricas têxteis
do Rio de Janeiro, acompanhadas de
comícios, passeatas e choques com a
polícia. E, em julho de 1917,
eclodiu em São Paulo - já então o
principal centro industrial do
Brasil - a primeira grande greve
geral do país, que logo se
estenderia para o Rio de Janeiro e
Rio Grande do Sul.
No dia
10 de junho, iniciou a greve dos
trabalhadores do cotonifício Crespi,
no bairro industrial da Mooca, na
capital paulista, reivindicando um
aumento de 25%. No dia 15, os
grevistas realizam uma passeata
pedindo a solidariedade de seus
irmãos de classe e sofrem a
repressão policial. Rapidamente, o
movimento grevista começa a ganhar a
adesão dos operários de diversas
fábricas, ao mesmo tempo que
generaliza-se o descontentamento
entre o conjunto dos trabalhadores.
No dia 28 de junho, a “União dos
Operários em Fábricas de Tecidos de
São Paulo” faz um apelo às “Ligas
Operárias” do interior do Estado, do
Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul
e de Minas Gerais para que declarem
o boicote, impedindo que Crespi
consiga atender às suas encomendas
através de fábricas fora de São
Paulo. Neste mesmo dia, outra grande
manifestação operária é reprimida
pela polícia montada quando se
dirigia para a Praça da Sé. No dia 6
de julho , a primeira vitória: a
firma Nami Jafet concede um aumento
de 20% para o dia e de 25% para a
noite. O movimento se estende como
rastilho de pólvora e já são
milhares de grevistas
manifestando-se nas ruas. No dia 9
de julho a polícia dispara contra os
trabalhadores e fere gravemente o
operário Antonio Martínez; em
seguida são fechadas as sedes de
todas as “Ligas” e “Uniões” da
cidade. A greve atinge quase todas
as categorias industriais e de
serviços e cresce a indignação
proletária e os choques com as
forças de repressão.
No dia
10, falece o operário Martínez e a
“Comissão de Defesa Proletária”
convida a população de São Paulo a
acompanhar o enterro. Um “mar de
gente” acompanha o cortejo fúnebre,
desafiando o enorme aparato
policial-militar colocado nas ruas
pelo governo. Findo o enterro, uma
parte da massa dirigiu-se para a
Praça da Sé para ouvir os discursos
de protesto; outra parte da
multidão, calculada em milhares de
pessoas, dirige-se para os bairros
do Brás, Mooca, e Cambuci e força o
fechamento das empresas que
continuam trabalhando. Os dias 12 e
13 de julho foram de confronto
aberto. e muitas vezes armado, entre
os trabalhadores e as forças da
repressão, com o surgimento de
barricadas nos bairros operários.
Estima-se que em torno de 75 mil o
número de trabalhadores em greve.
Manifestações de solidariedade
chegam de todas as partes. As
informações acerca de atos de
indisciplina no seio das tropas
preocupa as autoridades e os
patrões:
Os 1º e 4º Batalhões da Força
Pública tornaram-se suspeitos, pois
deram-se diversos casos de
‘insubordinação’, isto é, recusa de
praticar violências contra os
grevistas. (...) há deserções na
Força Publica e outros soldados
alegam doença para não intervir na
repressão contra o povo
trabalhador.”
No dia 13 de julho, Crespi e os
demais industriais admitiram um
aumento de 20% para o conjunto dos
trabalhadores. Uma comissão de
jornalistas se propôs a mediar o
confronto. Depois de algumas
negociações, os patrões - além dos
20% de aumento - se comprometeram a
não despedir ninguém pela greve,
respeitar o direito de associação,
pagar os salários a cada 15 dias e
melhorar as condições materiais e
econômicas dos trabalhadores. Já o
Governo, concordou em libertar os
operários presos por motivo da
greve, reconheceu o direito de
reunião, se comprometeu com uma
fiscalização rígida das normas
trabalhista e com o controle dos
preços. No dia 16 de julho, os
trabalhadores aceitaram o acordo.
Dia 18, “ao comício do Largo da
Concórdia aflui uma massa superior a
oitenta mil almas. Um verdadeiro
oceano humano a espraiar-se pelo
Largo até a rua Bresser. Nunca se
viu, na cidade, uma concentração tão
numerosa, tão comovente e tão
conscientemente disciplinada.” O
comício é encerrado ao som da
Internacional.
No dia
18 de julho, o movimento grevista
alastra-se para o Rio de Janeiro.
Iniciado em duas pequenas fábricas
de móveis, em solidariedade aos
grevistas de São Paulo, se estende
rapidamente, sendo assumida pela
Federação Operária do Rio de
Janeiro:
“Na manhã de segunda-feira 23 de
julho, calculava-se que 50 mil
operários estavam em greve. No mesmo
dia, cerca de 20 mil operários
metalúrgicos deixaram o serviço. À
noite, os alfaiates e os
entregadores de pão decidiram aderir
ao movimento. No dia 24, os
sapateiros fundaram a União dos
Cortadores de Calçado e exigiram a
jornada de oito horas, bem como
aumento salarial de 20 por cento Os
grevistas da companhia de tecido
América Fabril exigiram aumento de
30 por cento e escolas para as
crianças. Os operários de outra
companhia têxtil, a Fábrica de
Tecidos Aliança, pediram aumento de
30 por cento e o término dos
castigos corporais. Bandos de
operários percorreram as ruas da
cidade. A 24 de julho, enquanto um
grupo deles solicitava a adesão de
companheiros ao movimento paredista,
a polícia investiu contra o mesmo a
golpe de espada e patas de cavalo. A
multidão, revoltada com este
“ataque” policial, marchou em
direção ao largo de São Francisco,
carregando uma bandeira vermelha e
berrando “abaixo o capital”. (...)
Enquanto isso, outros grupos
executavam os primeiros assaltos e
depredações. (...) Em 25 de julho,
uma força policial dispersou enorme
aglomeração nas vizinhanças da
Central de Polícia. (...) os
policiais foram recebidos a pedra,
saindo ferido na cabeça o tenente
que comandava o destacamento. (...)
a 26 de julho (...) os operários e
patrões das fábricas de calçados
chegaram a um acordo com a fixação
do salário mínimo de 8$500 (...) os
sapateiros retornaram ao trabalho. O
movimento grevista, no entanto,
ganhou a adesão dos operários de
várias fábricas, fortalecida pela do
pessoal da limpeza pública. Nos
últimos dias de julho, diversos
acordos foram efetuados. Os
representantes dos operários das
fábricas de tecidos, maior dos
grupos trabalhistas do Rio, ainda se
encontravam em negociações no dia
primeiro de agosto. Quando, no dia
seguinte, entraram em acordo com o
Centro Industrial do Brasil, a
“greve geral” carioca chegou ao
ponto final. O acordo estabelecia a
semana máxima de 56 horas e um
aumento de 10 por cento dos
vencimentos. Os problemas referentes
ao dia de oito horas, trabalho de
menores e responsabilidade dos
patrões nos acidentes de trabalho
seriam resolvidos por leis no
Congresso Nacional. E nenhum
operário seria dispensado por tomar
parte na greve.
Avançando como que “em ondas”, em 31
de julho o movimento grevista chega
ao Rio Grande do Sul. Em abril de
1917, um quebra-quebra em Porto
Alegre contra os bens dos teutos e
teuto-brasileiros, em reação ao
afundamento de navios brasileiros
por submarinos alemães, havia levado
à ocupação militar da cidade e à
proibição de atos públicos. Desde
então não haviam ocorrido greves nem
o 1º de Maio fora celebrado, tendo
em vista a proibição de
manifestações públicas. Apesar
disso, diante das greves gerais do
Rio de Janeiro e de São Paulo - esta
em andamento - desde 21 de julho a
imprensa portalegrense se indagava
sobre a possibilidade da eclosão de
uma greve. Depois de algumas
reuniões furtivas, a “União Operária
Internacional”, anarquista,
distribui boletins, convocando uma
reunião geral na FORGS para o dia
29, domingo:
“Na reunião, com mais de 500
pessoas, nenhum cargo administrativo
da FORGS tomou a palavra e criou-se
ainda (não elegeu-se) um órgão sob
controle dos anarquistas e dos
pedreiros sindicalistas (sem a
participação da diretoria da
Federação). A Liga de Defesa Popular
(LDP) estabelece uma pauta de
reivindicações e a entrega aos
governos municipal e estadual,
eximindo, portanto, a FORGS da
responsabilidade do movimento.”
Tudo indica que essas “precauções”
foram tomadas para prevenir qualquer
intervenção na FORGS em função da
greve.
Entre os integrantes da LDP
encontramos o, pedreiro Luiz Derivi
e o gráfico Cecílio Villar, ambos
conhecidos anarquistas e
ex-dirigentes da FORGS (não sabemos
se neste momento continuavam ou não
na suas direção, por nos faltarem
dados concretos sobre isso), além de
Abílio Nequete, um dos fundadores do
Partido Comunista do Brasil em 1922.
Imediatamente a “Liga” lançou uma
proclamação ao povo de Porto Alegre,
divulgando as suas reivindicações:
A Liga de Defesa Popular, investida
de poderes em solene reunião dos
trabalhadores de Porto Alegre (...)
vai agir no sentido de obter algumas
melhorias que lhes possam atenuar a
miséria em que se debatem. Povo!
Trabalhadores! (...) A Liga de
Defesa Popular espera o apoio do
povo de Porto Alegre para obter as
seguintes melhorias (...) -
Diminuição dos preços dos gêneros de
primeira necessidade em geral. -
Providência para evitar o
açambarcamento do açúcar. -
Estabelecimento de um matadouro
municipal para fornecer carne à
população a preço razoável. -
Criação de mercados livres nos
bairros operários. - Obrigatoriedade
de venda do pão a peso e fixação
semanal do preço do quilo. - A
Intendência cobrar pelo fornecimento
de água 10% sobre os aluguéis cujo
valor locativo seja inferior a
40$000. - Compelir a Companhia de
Força e Luz a estabelecer a passagem
de 100 réis, de acordo com o
contrato feito com a municipalidade.
- Aumento de 25% sobre os salários
atuais. - Generalização da jornada
de 8 horas. - Estabelecimento da
jornada de seis horas para mulheres
e crianças.
Um rápido exame destas
reivindicações deixa clara a sua
amplitude e o seu forte caráter
“popular”, e não exclusivamente
“proletário”, demonstrando a
intenção explícita de seus
dirigentes de ampliar o movimento
para o conjunto da população.
Talvez, como sugere Silva Jr.,
o reiterado apelo ao “Povo!” e a
própria denominação “Liga de Defesa
Popular” - diferentemente do
“Comitê de Defesa Proletária”
de São Paulo - não fosse casual.
No dia
30, a “Liga” envia, um documento ao
presidente do Estado - Borges de
Medeiros - e ao intendente municipal
- José Montaury, com as
reivindicações aprovadas. Na tarde
do dia 31, a “Liga” realiza um
comício com 5 mil pessoas e decreta
a greve geral:
Estalou finalmente a greve
geral, há tantos dias anunciada
nesta cidade, e cujos prenúncios se
fizeram sentir logo após o movimento
grevista que na capital da
República secundou o de São Paulo.
Como era de Prever, o operariado,
depois do comício realizado ontem à
tarde na Praça Senador Florêncio,
onde diversos oradores pregaram a
greve geral como único meio de
conseguir o decrescimento da
carestia da vida, resolveu abandonar
o trabalho, tendo muitas fábricas
deixado de funcionar ontem mesmo. A
agitação nas classes operárias é
extraordinária, como se pode notar,
desde ontem à tarde, na atitude
exaltada de grande número de
operários que, em grupos, percorriam
as ruas da cidade e estacionavam às
esquinas. A sede da Federação
Operária tem estado repleta de
associados”.
Paralisam as suas atividades os
calceteiros pedreiros, marceneiros,
carpinteiros, tecelões, chapeleiros,
metalúrgicos, estivadores, choferes,
carroceiros, padeiros, tipógrafos,
comerciários. Os motorneiros e
cobradores da Cia. Força e Luz
solicitam um aumento de salários e,
ao não serem atendidos, entram em
greve. Os trabalhadores da Viação
Férrea do RGS - controlada pela
empresa belga Compagnie
Auxiliaire e pela
norte-americana Brazil Railway
- reivindicam jornada de oito horas,
semana inglesa e aumentos salariais
de 10 a 30%. Diante da resposta
negativa, iniciam a greve em Santa
Maria e logo estendem o movimento a
todos os municípios, paralisando os
transportes a nível estadual. Em
Porto Alegre os grevistas dominam a
cidade. Zenon de Almeida - que anos
depois irá aderir ao Partido
Comunista do Brasil - edita o jornal
A ÉPOCA, porta-voz da “Liga de
Defesa Popular”.
No dia 1º de agosto, em um comício
na Praça da Alfândega com mais de 4
mil operários, o anarquista João
Baptista Noll refere-se
explicitamente à revolução russa em
andamento: “Camaradas! Que o som
produzido pelo choque do malho e da
bigorna seja o eco da liberdade a
ressoar pelo mundo. (...) O povo da
Rússia, dos cossacos, de Tolstoi,
Gorki e Kropotkine, depois de uma
escravidão quase infinita, conseguiu
por si um regime de liberdade”.
Um testemunho da época reproduz bem
o clima da greve:
Invadindo e dominando todas as
grandes companhias, estabelecimentos
e várias classes sociais, algumas
levadas à força, pelo temor de
represálias tremendas que os
grevistas prometiam (...) esse
movimento assumiu proporções
desmesuradas, paralisou totalmente a
vida da cidade, sem luz nem pão, sem
leite nem carne, sem legumes nem
frutas, sem bondes nem carros, sem
automóveis nem carroças. (...)
grevistas que chegaram à
petulância irrisória de colocar
destacamentos seus, vigilantes e
ameaçadores, em determinadas
embocaduras e encruzilhadas, para
impedir que os vendedores ambulantes
dos artigos imprescindíveis de
consumo diário, pudessem chegar ao
mercado ou casas dos fregueses.
Houve até um simulacro caricato de
governo que expedia salvo-condutos a
determinados indivíduos para poderem
transitar livremente. Dispondo de
numerosa gente espalhada aqui e
acolá em grupos de catadura menos
tranquilizadora, foram a reprováveis
atos de violência (...) A cidade
semelhava uma praça de guerra,
preparada para o combate. Em todos
os recantos suspeitos, os pelotões
de infantaria, embalados,
estacionavam previdentes: patrulhas
de cavalaria cruzavam constantemente
numa atividade formidável. (...) Os
comícios e assembléias operárias
eram freqüentes e numerosas, a
linguagem tribunícia inflamada,
excessiva, abundantíssima; as
exigências enormes; as imposições
demasiadas e inaceitáveis; a cólera
exacerbada e perigosa.
No dia
2 de agosto a LDP é recebida por
Borges de Medeiros que lhes comunica
a decisão de atender as
reivindicações quanto à redução da
jornada de trabalho e aumento de
salários de 5 a 25% para os
empregados do Estado, além de
medidas de controle das exportações
de arroz, banha, batatas, feijão e
farinha. As concessões do presidente
do Estado são festejadas por uma
multidão de 5 mil pessoas, que
aguarda a Comissão a saída do
Palácio; esta recomenda a
continuidade da greve, pois nem os
patrões haviam reduzido a jornada de
trabalho e concedido aumentos
salariais, nem o governo municipal
havia tomado medidas concretas para
o controle dos preços. Nesse mesmo
dia aderem à paralisação a Companhia
Fiat Lux, tamanqueiros, licoreiros,
canteiros, e diversas outras
empresas.
O Chefe
da Polícia, Firmino Paim Filho,
pressiona para que a greve seja
suspensa, alegando que as
reivindicações dos trabalhadores já
haviam sido satisfeitas. O CORREIO
DO POVO do dia 3 de agosto traz a
notícia do fim da greve.
Imediatamente a “Liga” distribui um
Boletim desmentindo o fim da greve e
“concita aos trabalhadores que já
tenham entrado em acordo com os
patrões, quanto ao aumento de
salário e às 8 horas, que continuem
em greve até a diminuição dos preços
dos gêneros alimentícios, do
contrário o que ganharmos voltará
para os cofres dos comerciantes.” No
dia seguinte, através do Ato 137, o
Intendente Municipal José Montaury
decretou o tabelamento dos preços do
arroz, açúcar, banha, cebola,
salame, ovos, erva-mate, leite,
manteiga, massa branca, milho,
fósforos, polvilhos, pão, sal,
charque, querosene, sabão e vela de
sebo. Também reeditou o Ato 107, de
1914, regulando as normas para a
venda da carne fresca.
Quanto
aos patrões, pressionados pelos
trabalhadores e pelo próprio
governo, concederam aumentos de 25%
e jornada de 8 horas para a maioria
das categorias. No dia 4 de agosto,
a Companhia Força e Luz dá aumento a
todos os seus funcionários.
Consultada a “Liga”, motorneiros e
cobradores só suspendem a greve no
dia 5 de agosto, quando a própria
“Liga” divulga o seu Boletim
aconselhando “a volta ao trabalho de
todas as classes que o julgarem
conveniente”, ao mesmo tempo que
assegura que “as que quiserem
prosseguir em greve, por não terem
conseguido seu objetivo, a Liga de
Defesa e a Federação Operária do Rio
Grande do Sul hipotecam a sua
solidariedade e se propõem a tudo
fazer por elas.” Um comício,
realizado nesse mesmo dia, encerra a
Guerra dos Braços Cruzados.
Algumas categorias permaneceram em
greve por alguns dias, até terem as
suas reivindicações atendidas.
Encerrava-se, de forma vitoriosa, a
lutas do proletariado portalegrense.
Já a greve dos ferroviários enfrenta
grande dificuldades. O
inspetor-geral da VFRGS - Mr.
Cartwright - ameaça despedir todos
os grevistas e solicita a
intervenção das tropas da 7ª Região
Militar: “No dia 2 de agosto o
General Carlos Frederico de Mesquita
comanda a ocupação da Estação de
Santa Maria. Em represália os
grevistas arrancam trilhos, derrubam
pontes e bloqueiam a via com
dormente e postes telegráficos em
vários pontos do Estado. Alguns
trens passam a circular guarnecidos
por tropas. Em Passo Fundo há
violentos choques entre ferroviários
e forças militares.”
No dia 9 de agosto a greve foi
interrompida sem que as
reivindicações dos trabalhadores
fossem atendidas. Mas em 17 de
outubro de 1917, os ferroviários
retomam a sua luta através de uma
greve ainda mais violenta e
prolongada. Operários armados
invadem a estação de Santa Maria,
danificam e chocam locomotivas,
paralisando completamente o tráfego.
A greve se espalha por todo o
Estado, com uma violência inaudita.
Trilhos são arrancados, linhas
telegráficas cortadas, pontes
destruídas. Novamente as tropas são
mobilizadas e trens militares voltam
a circular.
Os ferroviários denunciam os
“patrões estrangeiros” que os
exploram e não garantem um serviço
de qualidade, buscando ganhar o
apoio e a simpatia do empresariado
gaúcho, insatisfeito com os serviços
prestados pela VFRGS. O governo do
Estado - interessado em assumir a
concessão da Viação Férrea -
sinaliza neste sentido através das
páginas de A FEDERAÇÃO, propondo a
cassação da concessão à Brazil
Railway da ferrovia, e passa a
trabalhar junto ao governo federal
nesse sentido. Borges de Medeiros
recomenda cautela e comedimento da
Brigada Militar na repressão ao
movimento Os ferroviários em greve
delegam ao governo do Estado a
intermediação junto ao Governo
Federal e à Companhia, para negociar
um acordo. Em Santa Maria cresce a
violência: “em choques de rua, após
comício na Praça Saldanha Marinho,
no dia 21 de outubro, uma patrulha
do exército atira sobre os
manifestantes: há 1 morto e 29
feridos.”
No dia 27 de outubro a FORGS ameaça
com uma greve geral no Estado, caso
as reivindicações dos ferroviários
não sejam atendidas. No dia 31 de
outubro, Mr. Cartwright é exonerado
e Borges de Medeiros consegue a
concessão de aumentos salariais de
10 a 15%, além da satisfação de
grande parte das reivindicações dos
grevistas. Três anos depois, o
governo estadual assumirá o controle
da VFRGS.
Além da greve estadual dos
ferroviários, o movimento também se
alastrou para algumas cidades do
interior. Em Pelotas, se inicia no
dia 4 de agosto com a paralisação
dos motorneiros e cobradores da
Companhia Força e Luz, estivadores,
choferes, curtidores, alfaiates,
sapateiros e verdureiros. Também é
dirigido por um “Comitê de Defesa
Popular”. Diferentemente de Porto
Alegre, o Intendente Municipal
reprime violentamente os grevistas e
o movimento se radicaliza. No dia 10
de agosto, realiza-se uma passeata
dos trabalhadores no centro da
cidade, encerrada com um comício. A
repressão da policia e do 11º
Regimento de Cavalaria, acaba em um
conflito de grandes proporções, com
diversos feridos. Em protesto, os
grevistas concentram-se à noite na
sede da “Liga Operária”. A polícia
intervém novamente e os operários
resistem. Na refrega um funcionário
da Intendência municipal é
gravemente ferido - falecendo poucos
dias depois - e o cavalo do próprio
chefe de polícia é abatido a tiros.
Depois de muita luta os grevistas
são desalojados. Preocupado com a
violência dos conflitos, Borges de
Medeiros envia para Pelotas o Chefe
de Polícia da capital com a missão
de “manter a ordem assegurando o
direito de greve àqueles que nela
quiserem persistir, bem como
garantir a liberdade de ação dos que
não estivessem dispostos a
acompanhar esse movimento” (A
FEDERAÇÃO, 13.08.1917). Em meados de
agosto a greve em Pelotas é
encerrada, em troca de uma redução
nos preços dos gêneros de primeira
necessidade. A onda grevista se
espraia por diversos municípios do
Rio Grande do Sul, perdurando até o
mês de novembro.
Em
Recife, a onda grevista chegou no
mês de setembro, tendo também um
caráter geral.
Miguel Bodea, no seu esforço de
demonstrar as particularidades do
governo positivista de Borges de
Medeiros, e de destacar o seu
comportamento de “árbitro”, diante
das greves de 1917, no Rio Grande do
Sul - no que enxerga os prenúncios
do trabalhismo gaúcho,
antiimperialista, intervencionista e
estatizante, e “populista” -
desenvolve um relato da greve que
tende a idealizar a postura de
Borges de Medeiros (sem nunca
referir à sua postura altamente
repressiva em 1919) e subestimar a
independência de classe e a
combatividade dos trabalhadores
neste movimento. Sem desmerecer as
instigantes questões levantadas por
Bodea acerca do comportamento
distinto das classes dominantes
gaúchas - decorrente da diferente
inserção do Rio Grande do Sul na
economia brasileira, desde os tempos
da Colônia - entendo que esse
comportamento conciliador em 1917
deve ser debitado, em primeiro
lugar, à força e à radicalidade do
movimento que, sempre que a
repressão foi privilegiada (como em
Pelotas e na greve ferroviária), se
expressou com grande violência.
Também é preciso lembrar que a greve
no Rio Grande do Sul fora precedida
pelas greves paulista e carioca, com
graves confrontos e grandes
concessões, feitas a posteriori.
De certa forma, pode-se dizer que as
classes dominantes gaúchas
entenderam que era melhor
prevenir do que remediar,
fazendo desde o início algumas
concessões.
Por fim, no caso específico da greve
dos ferroviários, havia o claro
interesse do governo do Estado em
assumir a concessão da ferrovia.
No mesmo sentido, consideramos
incorreta a opinião de Adhemar L. Da
Silva Jr., de que os anarquistas
haviam perdido, nessa época, a
hegemonia na FORGS, e de que esta se
opunha a greve. E que, por isso, os
anarquistas tiveram que iniciar o
movimento através da sua “União
Operária Internacional” e conduzi-lo
através da “Liga de Defesa Popular”.
Como já afirmamos anteriormente,
vemos isso muito mais como uma
questão “tática”, de preservação da
FORGS. Todos os dados da época
indicam a continuidade da
preponderância libertária no
movimento sindical gaúcho -
inclusive na FORGS - e a
inexistência de qualquer polêmica
anarquista contra uma pretensa
direção “reformista” na Federação.
Além disso, o próprio desenrolar da
greve nos mostra a perfeita unidade
de ação entre a LDP e a FORGS. Por
fim, em 1925, diversos
ex-anarquistas, que na época do
movimento grevista de 1919 “atuavam
na Federação Operária”, afirmaram
publicamente que “Todas as entidades
proletárias que nele tomaram parte,
eram filiadas e inspiradas pela
Federação Operária do Estado do Rio
Grande do Sul e, portanto,
apolíticas e sim francamente
Sindicalistas”.
Em fins de 1917, depois do quarto
torpedeamento de um navio brasileiro
pelos alemães e diante da declaração
de guerra à Alemanha, os operários
das fábricas de tecidos em greve no
Rio de Janeiro foram constrangidos a
retornar ao trabalho. O Congresso
declarou o “estado de sítio” e o
governo aproveitou para fechar os
sindicatos e os jornais operários
que se opunham à guerra.
Em dezembro de 1917, procurando
antecipar-se às reivindicações
operárias, o Governo editou o
decreto nº 1.596, regulamentando o
trabalho infantil e feminino. Em
1918 é aprovada a lei sobre
acidentes de trabalho. Encerra-se,
assim, a primeira fase da onda
grevista iniciada em 1917.
Mas, nem a repressão, nem as
concessões - seja à nível da jornada
de trabalho, seja a nível salarial,
seja à nível legislativo -
conseguiram impedir o avanço do
movimento operário ou bloquear a
elevação do seu nível de
consciência, que começa a assumir
novas formas. Sob influência da
vitoriosa Revolução Russa, surgem
diversos grupos “comunistas” ou
“maximalistas” (bolcheviques),
inclusive no Rio Grande do Sul.
No 1º de Maio de 1918, o anarquista
Zenon de Almeida escreve no jornal A
LUTA: “Que a Revolução Russa é um
acontecimento grandioso na história
dos povos, para nós é um fato
indiscutível. (...) a burguesia não
faria o escarcéu que faz, se alguma
coisa de grande a Revolução não
anunciasse”. Neste mesmo ano, o
semanário O INFLEXÍVEL - editado
pelo veterano dirigente socialista
Francisco Xavier da Costa - publica
entre nós, pela primeira vez no
Brasil, a íntegra da Constituição
Soviética.
No 1º de Maio de 1918, no Rio de
Janeiro, uma reunião com 3 mil
trabalhadores aprova uma moção a
favor da revolução na Rússia e
contra a guerra imperialista.
Em Porto Alegre, “desfraldando a
bandeira da jornada de oito horas
(...) os metalúrgicos deflagraram a
maior greve já feita por uma
categoria de trabalhadores no Rio
Grande do Sul. Ficaram de braços
cruzados de 13 de julho a 18 de
agosto de 1919 e só voltaram ao
trabalho depois da vitória de seu
movimento.”
No decorrer do mês de agosto, a
greve dos metalúrgicos adquire um
caráter geral, paralisando milhares
de trabalhadores de Porto Alegre. No
dia 7 de setembro a polícia reprime
violentamente um comício dos
grevistas em frente à Prefeitura.
Referindo-se a esses movimentos, o
imigrante alemão e líder anarquista
Friedrich Kniestedt - que chegara em
Porto Alegre em 1917 - relata:
(...) os trabalhadores da indústria
metalúrgica iniciaram um movimento
pelas 8 horas, o qual se estendeu
por vários meses. Uma empresa grande
e todas as pequenas tinham
concordado, faltavam ainda três
fábricas grandes. Aí nós
trabalhadores da indústria
madeireira resolvemos iniciar uma
greve de solidariedade. (...) foi
aceita uma proposta feita pela
direção para entrar em greve pela
conquista da jornada de oito horas.
(...) depois de uma semana quase
todas as marcenarias tinham
concordado, depois de duas semanas
quase todas as serrarias, e mais uma
semana depois também a grande
fábrica de cadeiras e móveis de
Gerdau concordou. (...) Quando
iniciamos a greve, nosso sindicato
tinha 68, quando terminou, 1200
membros. (...) Os trabalhadores da
indústria metalúrgica tinham vencido
sua greve graças à nossa intervenção
e, como costuma acontecer, a febre
de greves se espalhou. Quase todas
as profissões fizeram exigências,
todo mundo se organizava, todo dia
tínhamos de criar um novo sindicato
(...) a coisa funcionou, todas as
greves tiveram sucesso total ou
parcial. Os funcionários da Força
e Luz, bem como os da
Companhia Telefônica não se
reuniam na nossa sede e conduziam
seu movimento de forma quase
autônoma. Sob protesto nosso, estes
dois sindicatos haviam convocado uma
manifestação pública diante da
Prefeitura (...) Haviam comparecido
mais ou menos 600 trabalhadores. A
reunião ainda não começara, quando
os presentes foram dispersados por
brigadianos a pé e a cavalo. (...)
como resultado da reunião um
trabalhador morto e vários feridos.
(...) No outro dia realizou-se o
enterro do trabalhador que fora
atingido pelas costas. Milhares de
trabalhadores, incluindo mulheres,
estavam no cortejo. Por todo o
trajeto, militares e policiais
ocupavam as ruas. Na Rua da
República, pouco antes da ponte, o
cortejo foi dispersado a um sinal da
polícia. Foram feitos três ataques
contra os trabalhadores por parte de
militares estaduais; a polícia
atirava de forma selvagem.
Naturalmente houve feridos também do
lado da polícia. O caixão ficou na
rua, guardado por umas 30 pessoas.
(...) Na mesma noite do enterro a
polícia estadual ocupou a sede da
Federação e do sindicato da Força
e Luz. (...) A polícia (...)
rebentou todos os móveis, mesas,
cadeiras, armários, etc., livro,
fotografias e bandeiras foram
rasgados (...)
Em agosto de 1918, tem lugar a greve
da Companhia Cantareira Viação
Fluminense, a qual aderem outras
categorias. Uma parte da tropa
enviada para reprimir o movimento
adere aos grevistas e sucedem-se
violentos choques armados.
Finalizada a I Guerra Mundial,
eclode no Rio de Janeiro, em
novembro, a Insurreição Anarquista
de 1918, que abre uma segunda grande
onda de lutas proletárias:
Em novembro de 1918, eclodiu uma
greve política geral no Rio de
Janeiro. Os primeiros a entrar na
luta foram 25 mil tecelões, que
exigiam aumento de salário e o
direito de criar livremente
sindicatos. Segundo o plano
elaborado por um Comitê
Revolucionário especialmente criado,
a greve deveria transformar-se em
rebelião armada. Os sindicalistas
revolucionários e os anarquistas,
que participavam desse comitê,
decidiram que o sinal para a
rebelião seria uma reunião geral dos
proletários, em uma das praças da
capital. Depois deveriam invadir
depósitos militares e apreender
armas. (...) em seu meio
infiltrou-se um provocador que
comunicou à polícia a rebelião em
preparação. Na véspera da rebelião,
na noite de 17 para 18 de novembro
de 1918, a polícia prendeu vários
membros do Comitê Revolucionário. Os
grupos de operários que se reuniram
pela manhã em uma das praças, foram
dissolvidos pela polícia. A rebelião
armada fracassou. (...) em alguns
bairros os operários começaram, de
acordo com o plano, a construir
barricada, mas logo foram obrigados
a recuar. Somente nos arredores do
Rio de Janeiro os trabalhadores de
Magé, rebelando-se, proclamaram a
República Operária, que durou alguns
dias. Os revolucionários tentaram
mesmo tomar sob seu controle as
fábricas, porém destacamentos
policiais afogaram em sangue a
República Operária - a primeira
tentativa dos operários de tomarem o
poder em suas mãos. (...) Muitos
operários foram mortos e presos.
(...) os acontecimentos de novembro
de 1918 demonstraram com toda
evidência que se havia acumulado,
nas fileiras do movimento operário,
uma grande energia revolucionária e
que espontaneamente os operários
eram atraídos a métodos mais
revolucionários de ação e que o
antagonismo entre o capital e o
trabalho havia crescido de maneira
excepcional. A questão estava apenas
em organizar e dirigir corretamente
essa luta. Os sindicalistas
mostraram sua incapacidade para
continuar desempenhando o papel
dirigente. O proletariado brasileiro
viu-se diante da necessidade de
elaborar uma nova orientação e criar
um partido político de tipo
bolchevique.
No Rio de Janeiro, em 1919, no
comício do 1º de Maio, compareceram
60 mil pessoas e diversos oradores
falaram em nome do “Partido
Comunista”. O orador mais aplaudido
foi o operário José Elias da Silva,
que três anos depois participará da
fundação do Partido Comunista do
Brasil. Em 2 de maio, os operários
da construção civil do Rio de
Janeiro conquistam a jornada de 8
horas. No mesmo dia, é deflagrada
uma greve geral em São Paulo, a
qual, em poucos dias, paralisa mais
de 50 mil trabalhadores: “O
movimento se estendeu a outras
cidades do Estado, de maneira bem
mais significativa do que acontecera
em 1917. (...) Em São Bernardo do
Campo, ao sul da capital, o operário
Constante Castellani foi morto por
uma bala do destacamento policial
que fizera fogo para dispersar uma
aglomeração de grevistas.”
São obtidas diversas vitórias
parciais, com redução da jornada e
aumentos salariais. No Rio de
Janeiro, a partir de 7 maio,
diversas categorias entram em greve,
e no dia 18 de maio já havia mais de
10 mil trabalhadores paralisados.
São conquistados alguns avanços.
Também explodem greves na Bahia e em
Pernambuco.
No Rio Grande do Sul também são
registradas importantes lutas em
1919. Em Santana do Livramento
eclode, no dia 13 de março,
a grande greve nos Frigoríficos
Armour, dirigida pela “Liga
Comunista de Livramento” - “a
primeira greve contra uma
empresa imperialista no Estado
sulino”
- pleiteando aumentos de salários, a
jornada de 8 horas, pagamento em
dobro nos domingos e nas horas
extras. Os patrões mantêm-se
intransigentes e o movimento se
alastra para os Frigoríficos Wilson,
sendo marcado por diversas
manifestações de rua. A população,
inclusive da vizinha cidade uruguaia
de Rivera, apoia os grevistas. Em
Rosário do Sul, cidade próxima, a
polícia prende diversas lideranças
para impedir que a greve se estenda
para os Frigoríficos Swift. No dia
1º de Maio, os grevistas realizam
uma grande manifestação de ruas, com
a presença de um representante da
FORGS: “Nessa mesma data, a direção
dos Frigoríficos Armour e Wilson
publicam um boletim reduzindo de 10
para 9 horas o trabalho diário e
aumentando em 10% o salário dos
trabalhadores por hora. O movimento
estava vitorioso”.
No fogo
da luta, os trabalhadores procuram
avançar sua organização. A 9 de
março de 1919, é fundado o “Partido
Comunista do Rio de Janeiro”, aberto
para “anarquistas, socialistas e
todos os que aceitarem o comunismo
social”. Em 16 de junho, é formado o
núcleo de São Paulo do “Partido
Comunista”. E em 21 de junho, abre
no Rio de Janeiro a “Primeira
Conferência Comunista do Brasil”, na
verdade, uma assembléia de todo o
movimento anarquista do país.
Participam 22 delegados
representando grupos “comunistas” do
Distrito Federal, Alagoas, Minas
Gerais, Paraíba, Pernambuco, Rio
Grande do Sul e São Paulo. Devido a
repressão, a Conferência teve que
reunir-se nos dias 22 e 23 em
Niterói. Mas o encontro se encerra
sem chegar a um acordo sobre o
programa do novo partido, delegando
ao núcleo de São Paulo a tarefa de
elaborá-lo. Mas, esse “Partido
Comunista” possuía uma contradição
insolúvel: por um lado, era
constituído, na sua imensa maioria,
por convictos “libertários”; por
outro, constituía-se como “Partido”
(o que era a própria negação do
apoliticismo anarquista) e era
entusiasta defensor da Revolução
Russa, onde a classe operária havia
colocado na prática a questão da
“tomada do Poder” e da constituição
de um “Estado Proletário” (o que era
inaceitável dentro da concepção
anarquista). Isso só poderia levar,
como efetivamente levou, à sua total
inoperância.
A
solução desta contradição só se dará
em 1922, depois que o campo
anarquista diferenciou-se e cindiu:
de um lado, aqueles que permaneceram
atrelados ao anarquismo, contrário à
toda ação política e
progressivamente anti-soviético; de
outro, aqueles que romperam com o
anarquismo, aderiram ao
marxismo-leninismo (em que pese
inúmeras incompreensões) e
mantiveram-se fiéis à primeira
revolução proletária. De 1920 e
1922, ocorre no interior do
movimento sindical uma intensa luta
ideológica entre “anarquistas” e
“maximalistas ou comunistas”,
amadurecendo as condições para o
surgimento de um “Partido Comunista”
marxista. Nesse processo, jogará um
papel importantíssimo a vitória da
Revolução Russa.
2.4. -
A falência teórica e prática do
anarquismo
Em outubro de 1919, fracassa uma
greve geral em São Paulo, dirigida
pelos anarquistas. Diversos
trabalhadores são presos e
despedidos, outros deportados para o
Rio Grande do Sul ou para o
exterior, como Everardo Dias. O ano
de 1920 ainda assistiu importantes
lutas operárias: em março, a greve
dos trabalhadores da Leopoldina
Railway e da Companhia de Estradas
de Ferro Mogiana, ambas vencidas
através de uma brutal repressão. Em
Porto Alegre, o destaque é a
realização do 2º Congresso Operário
do Rio Grande do Sul, de 21 a 25 de
março de 1920. O anarquismo ainda
prevalece amplamente, mesmo nos
grupos autodenominados “comunistas”.
Às antigas teses sobre a forma
sindicalista de organização, o
método da ação direta, o
antibelicismo, a luta pelas 8 horas,
se juntam novas teses, como a luta
contra as deportações. Em abril, no
Rio de Janeiro, realiza-se o 3º
Congresso Operário Brasileiro, do
qual participam 5 gaúchos, além de
Deoclécio Fagundes, redator de O
GRITO OPERÁRIO, de São Paulo, que
havia sido deportado para o Rio
Grande dos Sul. Participam 135
delegados, sendo nomeada uma
comissão para “coordenar” o temário
do Congresso, formada por Edgard
Leuenroth, Alberto Lauro, José Alves
Diniz, José Elias da Silva e João da
Costa Pimenta. Representando a VOZ
DO POVO, Astrogildo Pereira
participou do Congresso com direito
à voz. Esses três últimos estarão em
1922 no Congresso de fundação do
Partido Comunista do Brasil. Da
mesma forma que os Congressos
anteriores, o terceiro optou pelo
maleável “método federativo”, tão
apreciado pelo libertários. A
filiação à Internacional Comunista
foi descartada por esta não ser “uma
organização genuinamente sindical”,
decidindo-se por um “voto de
felicidades”. Ao invés de confiar
suas resoluções à COB, nomeou-se uma
Comissão executiva do Terceiro
Congresso (CETC), com mandato até o
Quarto Congresso, compreendendo um
Secretário Geral - Leuenroth - um
Tesoureiro e cinco secretários
itinerantes, entre eles José Elias
que logo assumiria a Secretaria
Geral por motivos de doença.
O ano que se seguiu ao 3º Congresso
Operário Brasileiro foi de
“desmantelamento geral da
organização operária” e de crise da
própria imprensa operária. Para isso
contribuíram a “forte reação
policial”, as leis anti-anarquistas
a retração do mercado de trabalho e
a incapacidade do anarquismo de dar
respostas as necessidades da nova
fase de lutas que se iniciava para o
movimento operário: “As greves de
1917, 1918 e 1919 mostraram que o
movimento operário estava
objetivamente maduro, mas não
possuía uma direção conseqüente,
capaz de abrir a perspectiva
política. Os anarquistas, apesar da
firmeza, da combatividade e do
devotamento com que lutavam, não
podiam desempenhar essa tarefa, em
virtude das limitações da sua
doutrina.”
Como afirma Hardman:
(...) a recusa em considerar a
organização necessária ao
proletariado para a luta política
contra o Estado; a negativa em
organizar a classe em partido
próprio, com vistas à tomada
revolucionária do poder; o apego
absoluto à chamada “resistência
anticapitalista”, que se traduzia na
superestimação do papel do sindicato
e da luta econômica; a exaltação das
formas espontâneas de luta, de ações
voluntaristas e heróicas,
individualizadas e desvinculadas das
massas; enfim, esses aspectos da
teoria e prática dos anarquistas,
revelaram o impasse e o beco sem
saída a que foi levado o movimento
operário no Brasil, neste final dos
anos 10. (...) as ações do movimento
anarquista não superaram a
espontaneidade economicista (...)
No
final de 1920, início de 1921, ainda
se registram algumas greves
operárias, como a dos estivadores de
Santos e a dos marítimos das
companhias de navegação do Rio de
Janeiro - que contou com o apoio dos
trabalhadores marítimos do Recife e
do sul do país. A sede da “União dos
Operários da Construção Civil” do
Rio de Janeiro, que preparava uma
greve geral de solidariedade aos
marítimos, foi invadida e diversos
operários presos depois de um
conflito armado. Essa greve geral,
que fracassou, expressa o refluxo
das lutas operárias:
A grande vaga de movimentos
operários e populares de 1917-1920
foi reprimida brutalmente. 1921 foi
o ano da vazante. Os trabalhadores
estavam vencidos. Os sindicatos
esfacelados. (...) ficou apenas uma
pequena vanguarda. Esta vanguarda
continuou a defender os ideais da
luta proletária. Meditou nas lições
da derrota. Compreendeu que a maior
parte da culpa cabia às idéias e aos
métodos anarquistas e
anarco-sindicalistas. Compreendeu
que eram necessários nova ideologia
e novos métodos. (...) Os movimentos
operários de 1917-1920 não foram
orientados pela ideologia
marxista-leninista. (...) No seio da
classe operária predominavam, então,
duas correntes. Uma, oportunista de
“esquerda”, com o anarquismo e o
anarco-sindicalismo. A outra,
oportunista de direita até a
traição, com o reformismo apodrecido
e policial (...) os anarquistas e
anarco-sindicalistas não poderiam
triunfar. Nem dirigir nenhuma
revolução. Faltava-lhes o
conhecimento das noções
preliminares. Quais? A teoria da
luta de classes. A necessidade do
Estado proletário, de transição. O
estudo da situação objetiva. A
análise da correlação de forças em
cada momento dado. A necessidade de
uma política proletária de classe.
Os avanços e recuos. A ofensiva e a
defensiva. A luta legal e a ilegal.
A luta no Parlamento e a luta
extra-parlamentar. A combinação
dessas formas de luta e de muitas
outras. (...) O anarquismo pregava a
revolução”. Mas não tinha nenhuma
idéia concreta da revolução. Não
compreendia suas etapas. Nem suas
forças motrizes. Nem o papel do
proletariado. Nem a aliança com os
camponeses. Reduziu, de fato, a luta
dos operários à luta econômica e
sindical. (...) O anarquismo era uma
corrente individualista
pequeno-burguesa. Não admitia
nenhum partido. Negava, de fato, a
política (...) Não tinha disciplina.
Nem organização.
Em que
pese todas essas limitações do
anarco-sindicalismo e do
sindicalismo revolucionário -
hegemônicos no Brasil até o início
dos anos vinte - uma avaliação
ponderada do seu papel leva-nos a
concordar com a opinião do estudioso
soviético Bóris Koval, que afirma:
Diferentemente do anarquismo
clássico (Bakunismo) o
anarco-sindicalismo adotou algo do
marxismo (o ensinamento sobre a luta
de classes) (...) e apoiava-se nos
sindicatos, como forma fundamental
de organizações da luta proletária e
célula do futuro “socialismo
sindicalista”. (...) Assim, no final
do século XIX, início do século XX,
surgiu (...) no movimento operário
uma nova corrente combativa - o
sindicalismo revolucionário, que na
pratica era a encarnação da luta
proletária nos limites da forma
ideológica pequeno-burguesa. Desde
os primeiros dias de seu surgimento
o sindicalismo revolucionário levou
a uma rápida animação do movimento
operário e antes de mais nada da
luta grevista, dando uma
contribuição essencial à formação
dos sindicatos.(...) A atuação dos
operários tornou-se mais consciente
e organizada, fortaleceu-se o
sentimento de solidariedade de
classe, em vários casos chegou-se a
choques armados com a polícia e
tropas. (...) Livre da influência
direta do oportunismo da II
Internacional, a classe operária do
Brasil deu sua contribuição à luta
das forças internacionalistas de
esquerda, encabeçadas pelos
bolcheviques russos, contra o
social-chauvinismo e o
capitulacionismo. (...) pode-se
concluir que antes do surgimento da
corrente marxista e da fundação do
Partido Comunista o sindicalismo
revolucionário desempenhou um papel
positivo (...) não se transformou
imediatamente em freio no caminho do
desenvolvimento do movimento
operário. Inicialmente, os
sindicalistas exerceram uma
influência até mesmo positiva,
despertando os operários a tomar
consciência do novo regime
explorador burguês, para a luta
(ainda que espontânea e limitada)
por seus direitos econômicos e
políticos. Durante anos, os
sindicalistas foram, no Brasil, a
única força revolucionária a
conclamar o proletariado à luta e a
dirigir essa luta. (...) Deste ponto
de vista, o sindicalismo
revolucionário no início do século
XX desempenhou no Brasil um papel
positivo, ativando a luta do
proletariado e desse modo
contribuindo para sua formação como
classe independente.
Mas, ou
a classe operária avançava, ou
sofreria uma derrota histórica. E
ela tratou de avançar.
O Partido Comunista do
Brasil no Rio Grande do
Sul -1922-1929 |
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