O Brasil é uma das nações mais desiguais do mundo, desigualdade que aqui tem um claro viés étnico. Os afro-brasileiros – 45% da população – totalizam 64% dos pobres e 69% dos indigentes. Só 34% de negros e pardos concluem o ensino fundamental (contra 59% de brancos), 15,5% concluem o ensino médio (37% de brancos) e 2,3% chegam às universidades (11,2% de brancos).
Evidentemente, isso não ocorreu espontaneamente nem resultou de qualquer inferioridade dos negros em relação às demais etnias. Ao contrário, foi o resultado de quatro séculos de opressão escravista, de políticas de Estado com o objetivo de oprimir e explorar os negros escravizados.
Expropriados de sua humanidade, os negros foram excluídos, através da “Lei de Terras” de 1850, de qualquer direito à propriedade. Conquistada a abolição, foram considerados “inaptos para o trabalho livre” e substituídos por imigrantes brancos europeus. Assim, excluídos da propriedade e do trabalho, discriminados e impedidos de estudar, foram lançados em uma marginalização que perdura até hoje.
Diante dessa realidade, o discurso elitista do primado do “mérito” e de “igualdade de condições” na disputa de vagas nas universidades, acusando de “racista” quem defende políticas públicas para superar de forma rápida essas imensas desigualdades, é no mínimo hipocrisia de quem se nega a abrir mão de privilégios seculares.
Como disse o Ministro Marco Aurélio Mello, do STF, “o único modo de se corrigir desigualdades é colocar o peso da lei [...] a favor daquele que é discriminado, que é tratado de forma desigual.” Por isso, defendemos, para os aprovados nos vestibulares, cotas aos oriundos de escolas públicas e aos afro-brasileiros.
É lamentável que o racismo enrustido, existente entre nós, venha a tona a partir do debate das cotas sociais e étnicas. Mas, por outro lado, é bom que isso aconteça, pois nos oportuniza enfrentá-lo e fazer avançar a consciência democrática do povo brasileiro.
Raul Carrion – deputado estadual e historiador
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