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						Charles S. Peirce | 
						
						William James | 
						John 
						Dewey | 
					
				
				
				No final do século XIX – período de rápido desenvolvimento do 
				capitalismo monopolista e de formação do sistema imperialista 
				mundial – surgiu nos Estados Unidos (país sem qualquer tradição 
				filosófica até hoje) a chamada “filosofia pragmática”, 
				apresentada por seus próprios fundadores como “um novo nome para 
				um velho modo de pensar” (William James).
				
				Seus principais formuladores foram Charles Sanders Peirce 
				(1839-1914), William James (1842-1910) e John Dewey (1859-1952). 
				Apesar da sua inconsistência e do seu caráter eclético – com 
				nuances diferenciadas em Peirce, James e Dewey –, o pragmatismo 
				rapidamente caiu nas “boas graças” da burguesia monopolista dos 
				Estados Unidos, que necessitava de uma filosofia que 
				justificasse o seu expansionismo e o seu domínio sobre o mundo, 
				apaziguasse seus explorados internos e externos e propagasse o 
				irracionalismo, desviando a atenção das massas dos grandes 
				problemas sociais para as questões prosaicas do dia a dia.
				
				
				A cavaleiro do prestígio adquirido pela “experimentação 
				científica” e pretextando o justo combate ao pensamento 
				“metafísico” com suas verdades “absolutas”, “imutáveis” e 
				“universais”, o pragmatismo – com costumam fazer as distintas 
				escolas filosóficas burguesas em tempos de “reação em toda 
				linha” – assumiu, sem meias palavras, velhas e ultrapassadas 
				filosofias idealistas ou materialistas vulgares, como o 
				“empirismo”, o “nominalismo”, o utilitarismo e o “positivismo”, 
				ao mesmo tempo que investiu com volúpia contra a “razão” e o 
				racionalismo: 
				
				“O pragmatismo representa uma atitude perfeitamente familiar em 
				filosofia, a atitude empírica, mas a representa, parece-me, 
				tanto em uma forma mais radical quanto em uma forma menos 
				contraditória (...) Afasta-se da abstração (...) Volta-se para o 
				concreto e o adequado, para os fatos, a ação e o poder. O que 
				significa o reinado do temperamento empírico e o descrédito sem 
				rebuços do temperamento racionalista. (...) O pragmatismo, (...) 
				não sendo nada essencialmente novo, se harmoniza com muitas 
				tendências filosóficas antigas. Concorda com o nominalismo 
				(...), sempre apelando para os particulares; com o utilitarismo, 
				dando ênfase aos aspectos práticos; com o positivismo, em seu 
				desdém pelas soluções verbais, pelas questões inúteis e pelas 
				abstrações metafísicas. Todas essas, vê-se, são tendências 
				antiintelectuais. Contra o racionalismo, como uma pretensão e um 
				método, o pragmatismo acha-se completamente armado e militante.” 
				(JAMES, William. O significado da verdade. In: JAMES, DEWEY, 
				VEBLEN. Os Pensadores – Vol. XL. São Paulo: Abril Cultural, 
				1974, pp. 12-13) 
				
				“A ‘Razão’, como faculdade apartada, (...) de verdades 
				universais, começa agora a impressionar-nos como remota, 
				desinteressante e talvez mesmo insignificante. A Razão (...) que 
				confere à experiência o poder de generalizar e regularizar, nos 
				impressiona como supérflua – criação desnecessária do homem 
				voltado ao formalismo tradicional e à esmerada terminologia.” 
				(DEWEY, John. A Filosofia em reconstrução. São Paulo: Companhia 
				Editora Nacional, 1958, p. 108) 
				
				É sabido que a burguesia – outrora revolucionária e racionalista 
				– transformou-se em sua fase imperialista em uma classe 
				reacionária e obscurantista, temerosa da “razão”, avessa a uma 
				análise científica dos grandes dilemas humanos e ao cotejo de 
				seu comportamento retrógrado com os valores morais 
				historicamente elaborados pela humanidade. 
				
				Para essa burguesia decrépita, a ciência precisa ficar restrita 
				ao estudo da natureza e à sua aplicação à produção capitalista, 
				devendo ser expulsa da filosofia e das ciências sociais, onde 
				devem prevalecer as concepções religiosas, as “ciências 
				ocultas”, as superstições, a magia e o misticismo. Não por 
				acaso, o pragmatismo – que tanto propala combater as idéias 
				“absolutas”, “metafísicas”, “não demonstráveis empiricamente” – 
				não tem o menor escrúpulo em defender as idéias fideístas e 
				teológicas como “úteis” e “vantajosas” para a sociedade 
				capitalista e, portanto, “verdadeiras”: 
				
				“O pragmatismo, por mais devotado que seja aos fatos, não tem 
				essa propensão materialista sob a qual o empirismo ordinário 
				opera (...) não tem preconceitos a priori contra a teologia. Se 
				as idéias teológicas provam que têm valor para a vida concreta, 
				são verdadeiras (...) Que querem dizer os crentes no Absoluto 
				quando propalam que sua crença lhes proporciona conforto? Querem 
				dizer que (...) temos o direito (...) de deixar que o mundo vá à 
				sua própria sorte, na certeza de que seus problemas se acham em 
				melhores mãos [de Deus] do que as nossas e que não constituem 
				assunto de nossa alçada. (...) Se as idéias teológicas podem 
				fazer isso, se a noção de Deus, em particular, prova que pode 
				fazer isso, como pode o pragmatismo, em sã consciência, negar a 
				existência de Deus? O pragmatismo não pode ver sentido em tratar 
				como ‘não verdadeira’ uma noção que foi tão bem sucedida 
				pragmaticamente.” (JAMES, William. Pragmatismo. In: JAMES, 
				DEWEY, VEBLEN, Idem, pp. 19-22) 
				
				E o “empirista” John Dewey – que bate no peito afirmando que não 
				têm qualquer sentido idéias ou conceitos que não surjam da 
				“experiência” e sejam por ela comprovados – não sente vergonha 
				em afirmar: 
				
				“Estas considerações podem ser aplicadas à idéia de Deus ou, 
				para evitar concepções errôneas, à idéia do divino. (...) Em uma 
				época desorientada, é premente a necessidade de tal idéia. Pode 
				ela unir e uniformizar os interesses e as energias agora 
				dispersas, assim como dirigir a ação, produzir o calor da emoção 
				e a luz da inteligência. Dar o nome de Deus a essa união, que 
				age na ação e no pensamento, é uma questão de preferência 
				individual. Mas a função dessa união ativa do ideal com o real 
				se parece com as forças que estão de fato ligadas à concepção de 
				Deus em todas as religiões de caráter espiritual; e uma idéia 
				clara dessa função se nos afigura urgentemente e necessária no 
				momento atual.” (DEWEY, John. A Common Faith. New Haven: Yale 
				University Press, 1934. In: EDMAN, Irwin. John Dewey. Rio de 
				Janeiro: Fundo de Cultura, 1960, p. 316-317)
				
				Ou seja, se as religiões nos servem de “consolo”, se nos ajudam 
				a “alienar-nos” e “desresponsabilizar-nos” dos graves problemas 
				humanos e sociais gerados pelo capitalismo – deixando para 
				“Deus” a sua solução –, então estarão “empiricamente 
				comprovadas”, por serem “úteis”, trazerem “resultados”, sendo 
				(todas!), portanto, “verdadeiras”. A isso se resume a 
				“comprovação experimental” dos pragmáticos, tão “ciosos” da 
				ciência. Ridicularizando essa absoluta incoerência dos 
				pragmáticos, Lenin diz: 
				
				“O ‘pragmatismo’ (...) é talvez o ‘último grito da moda’ da 
				novíssima filosofia americana. (...) O pragmatismo ironiza tanto 
				a metafísica do materialismo, como a metafísica do idealismo, 
				exalta a experiência e somente a experiência, considera a 
				prática como o único critério (...) e ... deduz com toda 
				felicidade, de todo o anterior, um Deus para fins práticos, 
				exclusivamente práticos, sem a menor metafísica, sem ultrapassar 
				de nenhuma maneira os limites da experiência.” (LENIN, V.I. 
				Materialismo y Empiriocriticismo. Montevideo: Ediciones Pueblos 
				Unidos, 1959, pp. 382-383) 
				
				
				A "Teoria do Conhecimento" e o "Critério da Verdade" no Marxismo
				
				
				Antes de examinarmos como a filosofia pragmática concebe o 
				“conhecimento” e a “verdade”, convém rever de forma sucinta a 
				concepção marxista acerca dessas mesmas questões, especialmente 
				porque – pretextando combater a metafísica idealista, suas 
				idéias a priori e seus conceitos universais e eternos –, o 
				pragmatismo nega a existência da realidade objetiva, 
				independente das nossas sensações, e a possibilidade de um 
				conhecimento que – através da abstração, da elaboração de 
				conceitos e teorias – ultrapasse a mera experiência sensorial e 
				empírica. 
				
				Para o materialismo dialético, o Universo tem uma existência 
				real, objetiva, que independe e é anterior ao aparecimento da 
				consciência humana, a qual, comprovadamente, só veio a surgir 
				muito recentemente. A consciência e o pensamento são produtos do 
				cérebro humano, onde a matéria alcançou o seu mais elevado nível 
				de desenvolvimento. Assim, a matéria é o “primário” (no sentido 
				de originária) e a consciência (“espírito”) é o “secundário” (no 
				sentido de surgir a partir do desenvolvimento da matéria). O 
				Universo é eterno, mas não é imutável, estando em permanente 
				movimento (mudança, transformação, deslocamento), tanto no 
				âmbito “material” como no âmbito das “idéias”. Tudo o que existe 
				se relaciona e interage. A causa essencial de todas as formas de 
				movimento dever ser buscada nas contradições internas e na luta 
				de contrários existente em cada “ser” e no “pensamento”. 
				
				
				A partir dessa concepção materialista-dialética do Universo, 
				como os marxistas explicam o processo de conhecimento humano? 
				Para o marxismo, a realidade material, ao atuar sobre os nossos 
				sentidos, gera as sensações, que dependem do cérebro, dos 
				nervos, da retina, etc., isto é, da matéria organizada de uma 
				determinada maneira. Ao combinar o conjunto de suas sensações 
				(visão, tato, audição, olfato, paladar), a consciência humana 
				constrói a sua “percepção” da realidade. Nesse estágio do 
				conhecimento – alicerçado nas sensações, ponto de partida 
				indispensável para qualquer conhecimento real –, o intelecto 
				humano permanece no âmbito do conhecimento “sensível”, 
				“empírico” (ao nível da “experiência”), onde a realidade é 
				percebida em suas manifestações e relações “externas”, 
				“aparentes”, “secundárias”, “acidentais”, captadas pelos nossos 
				sentidos, que não conseguem separar o “essencial” do 
				“fenomênico” nem descobrir as leis do seu movimento e as suas 
				“relações internas”. 
				
				Será somente pela abstração – propriedade da mente que 
				possibilita a elaboração de representações, conceitos, 
				categorias e procedimentos lógicos, tendo por base a 
				generalização e sistematização de múltiplas experiências – que o 
				intelecto humano ultrapassará o conhecimento puramente sensível, 
				fenomênico, e alcançará o conhecimento racional e teórico, capaz 
				de descobrir as leis e as conexões internas que existem na 
				realidade. Assim, para o marxismo, o conhecimento é um “reflexo 
				ativo” (ainda que aproximado) da realidade no cérebro humano. 
				Portanto, o conhecimento só será “verdadeiro” se representar 
				adequadamente o real. E o critério da verdade é a sua 
				comprovação através da prática: 
				
				“O problema de se ao pensamento humano corresponde uma verdade 
				objetiva não é um problema da teoria e sim um problema prático. 
				É na prática que o homem tem que demonstrar a verdade, isto é, a 
				realidade e a força, o caráter terreno de seu pensamento. O 
				debate sobre a realidade ou irrealidade de um pensamento isolado 
				da prática é um problema puramente escolástico.” (MARX, K. Teses 
				sobre Feuerbach. In: MARX, K. e ENGELS, F. Obras escolhidas, 
				vol. 3. Rio de Janeiro: Edit. Vitória, 1963, p. 208)
				
				
				Portanto, a resposta aos agnósticos – que negam ao pensamento 
				humano a capacidade de conhecer a “coisa em si”, visto que, 
				segundo eles, só temos acesso às “sensações” que a realidade nos 
				fornece – será dada através da prática: 
				
				“Se podemos demonstrar a exatidão de nossa maneira de conceber 
				um processo natural reproduzindo-o nós mesmos, criando-o a 
				partir de suas condições próprias; e se, além disso, o colocamos 
				a serviço de nossos próprios objetivos, então acabamos com a 
				“coisa em si”, inacessível, de Kant. As substâncias químicas 
				produzidas no mundo vegetal e animal continuaram sendo “coisas 
				em si”, inacessíveis, até que a química orgânica começou a 
				produzi-las, uma após a outra; com isso, a “coisa em si” 
				converteu-se em coisa para nós”. (ENGELS, F. Ludwig Feuerbach e 
				o fim da filosofia clássica alemã. In: MARX, K. e ENGELS, F. 
				Obras..., Idem, p. 180)
				
				
				
				O “conhecimento" e a "verdade" na visão pragamática 
				
				Examinemos, agora, como o pragmatismo responde à “questão 
				fundamental de toda filosofia (...) da relação entre o 
				pensamento e o ser (...) entre o espírito e a natureza (...) que 
				relação mantém nossos pensamentos sobre o mundo que nos rodeia 
				com esse mesmo mundo? Nosso pensamento é, de fato, capaz de 
				conhecer o mundo real? Podemos com nossas representações e 
				conceitos sobre o mundo real formar uma imagem exata da 
				realidade?” (ENGELS, F. Ludwig Feuerbach..., Idem, pp. 179-180)
				
				
				Para Charles Peirce – fundador do pragmatismo – é impossível 
				afirmar que o conhecimento é um reflexo da realidade objetiva na 
				consciência do homem, pois o único que podemos conhecer através 
				da “experimentação” – afirma, repetindo as surradas teses do 
				agnosticismo empirista – são as nossas “sensações”. Assim, o 
				pensamento deve limitar-se em buscar a superação da “dúvida” 
				(que nos imobiliza) e elaborar uma “crença estável”, uma 
				“opinião firme”, capaz de dirigir a nossa ação. Por essa razão, 
				o pragmatismo se auto-proclama a “filosofia da ação”. A questão 
				de se essa crença corresponde ou não à realidade é rechaçada 
				pelos pragmáticos como algo impossível de se saber e, portanto, 
				sem qualquer sentido. 
				
				A crença será “verdadeira” se a ação nela alicerçada obtiver 
				êxito. Em outras palavras, o significado e a veracidade de 
				qualquer idéia são determinados pela sua utilidade e benefício 
				para o indivíduo que a adota. O que importa é a convicção com 
				que cada um assume a sua crença, condição essencial para que 
				atue com eficácia e alcance o êxito: “Podemos imaginar que 
				procuramos não só uma opinião, mas uma opinião verdadeira. Mas 
				(...) tão logo obtemos a fé firme, ficamos plenamente 
				satisfeitos, seja essa fé verdadeira ou falsa.” (PEIRCE, Ch. 
				Collected papers, vol. 5, p. 232. Cambridge-Massachusetts, 
				1958-1960. In: BOLGOMOLOV, A.S. A filosofia americana no século 
				XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979, p. 26) 
				
				
				Quanto à questão se o nosso pensamento pode refletir ou não, com 
				alguma fidelidade, as concatenações reais do Universo e suas 
				leis, Peirce responde: “Procurai verificar qualquer lei da 
				natureza e descobrireis que quanto mais precisas forem as vossas 
				observações, tanto mais definidamente elas mostrarão as 
				desordenadas infrações da lei (...) Examinai com suficiente 
				profundidade as suas causas e sereis forçados a admitir que elas 
				são sempre geradas por uma determinação arbitrária ou pelo 
				acaso.” (PEIRCE, Ch. Collected Papers, vol. 6, p. 37. Idem, p. 
				26) 
				
				Aqui, Pierce antecipa a idéia – que seus discípulos 
				desenvolverão ainda mais– de que a realidade é caótica, não 
				sendo regida por nenhuma lei e que todos conceitos e teorias 
				elaboradas pelos homens não passam “construções do intelecto” 
				com o objetivo de “ordenar” os conhecimentos proporcionados pela 
				experiência humana. 
				
				William James – que popularizou o pragmatismo – reforça a visão 
				de que o único que podemos conhecer são as sensações fornecidas 
				pelos nossos sentidos, através da “experiência”, e que nossas 
				“idéias” e “teorias” nada mais são do que criações da mente 
				humana para colocar “ordem” no caos existente no Universo, cuja 
				realidade e cujas leis (se é que existem) são inacessíveis a 
				nós. A partir dessa visão “idealista-subjetiva”, James acusa 
				como “metafísica” toda e qualquer pretensão do “pensamento 
				abstrato” em elevar-se acima da mera experiência e do 
				conhecimento empírico e reduziu o “conhecimento” e a “verdade” a 
				funções puramente instrumentais e utilitárias, pois para ser 
				“verdadeiro” basta ser útil (para quem?) e obter “resultados”:
				
				
				“[a] realidade (...) é o fluxo de nossas sensações (...) Não são 
				nem verdadeiras nem falsas; simplesmente são. (...) Atrás dos 
				puros fatos fenomenais (...) não há nada. (...) Nossos 
				substantivos e adjetivos [“conceitos” e “predicados]” são todos 
				heranças humanizadas e nas teorias, pelas quais os estruturamos, 
				a ordem interna e o arranjo íntimo é totalmente ditado por 
				considerações humanas. (...) o que dele é verdadeiro parece do 
				princípio ao fim ser amplamente matéria de nossa própria 
				criação. (...) Os homens engendram verdades para ele. (...) 
				qualquer hipótese é legítima aos olhos pragmatistas, pois 
				qualquer tem o seu uso. (...) não podemos rejeitar qualquer 
				hipótese se daí decorrem conseqüências úteis à vida. (...) 
				nenhuma hipótese é mais verdadeira do que qualquer outra, no 
				sentido de ser uma cópia mais literal da realidade. São apenas 
				maneiras de falar, comparáveis somente do ponto de vista de seu 
				uso. (...) todas as nossas teorias são instrumental, são modos 
				mentais de adaptação à realidade.” (JAMES, William. Pragmatismo. 
				São Paulo: Edit Martin Claret, 2006, pp. 109-145) 
				
				“nenhuma teoria é absolutamente uma transcrição da realidade 
				(...) qualquer delas pode (...) ser útil. (...) são apenas uma 
				linguagem humana, uma taquigrafia conceitual (...) nas quais 
				escrevemos nossos informes sobre a natureza (...) O pragmatista 
				fala a respeito de verdades no plural, sobre sua utilidade e 
				caráter de satisfação, a respeito do êxito com que “trabalham” 
				(...) uma idéia é verdadeira na medida em que acreditar nela é 
				proveitoso para nossas vidas. (...) Verdadeiro é o nome do que 
				quer que prove ser bom no sentido da crença (...) o que é melhor 
				para nós é verdadeiro”. (...) é ‘útil porque é verdadeira’ ou 
				que ‘é verdadeira porque é útil’. Ambas as frases significam a 
				mesma coisa. (...) Schiller diz que o ‘verdadeiro’ é o que 
				‘funciona’. (...) Dewey diz que a verdade é o que dá satisfação. 
				(...) A verdade é feita (...) no curso dos acontecimentos.” 
				(JAMES, William. Pragmatismo. In: JAMES, DEWEY, VEBLEN, Idem, 
				pp. 14-30) 
				
				
				De maneira resumida, o pragmatismo afirma que não temos como 
				conhecer a “realidade”, pois só podemos conhecer nossas 
				“sensações”. A realidade – se é que existe – é caótica, não 
				sendo regida por nenhuma lei. As idéias, os conceitos e as 
				teorias que elaboramos, são meras “criações” humanas, que buscam 
				dar alguma coerência às nossas sensações. Portanto não existe 
				“verdade” no sentido da adequação do pensamento ao “real”. A 
				verdade se resume a qualquer “crença” útil para quem a adota, 
				que lhe traga “vantagens” e “resultados”.
				É difícil encontrar um elogio mais enfático à impotência da 
				razão e ao irracionalismo! 
				
				“Tenhamos crenças firmes, úteis e vantajosas" 
				
				Não há dúvidas que o pragmatismo – com sua negação da existência 
				da “verdade objetiva” e com sua redução da “verdade” a meras 
				“crenças estáveis” que sejam “úteis” e “tragam vantagens” – 
				prestou e continua prestando uma enorme ajuda ao imperialismo, 
				em particular estadunidense. 
				
				Certamente a “firme crença” no “destino manifesto” dos Estados 
				Unidos justificou sua tomada, pela força, de quase metade do 
				território do México, em 1848, trazendo enormes vantagens para o 
				país. Da mesma forma, a “forte convicção” (apesar das evidências 
				em contrário) de que os espanhóis eram os responsáveis pelo 
				afundamento do encouraçado “Maine”, no porto de Havana, em 1898, 
				serviu de pretexto para a declaração de guerra à Espanha e para 
				a imediata e exitosa ocupação do Havaí, Filipinas, Porto Rico e 
				Cuba, até então colônias espanholas. E a ocupação de Guantánamo 
				até os dias de hoje é justificada pela “firme convicção” de que 
				o mar das Caraíbas faz parte do “espaço vital” norte-americano e 
				que Cuba é uma “ameaça” à segurança dos Estados Unidos... Por 
				certo, também, a inabalável convicção de boa parte dos 
				estadunidenses acerca da inferioridade dos negros e da 
				necessidade da segregação racial para manter os privilégios da 
				maioria branca proporcionou bases “verdadeiras” às barbáries 
				cometidas pela Klu Klux Klan e obteve êxito durante longos anos.
				
				
				Poderíamos continuar exemplificando ad nauseam até onde pode 
				levar a pregação pragmática de que a verdade se reduz apenas à 
				sua “utilidade” e “proveito”.
				Caberia perguntar – Serve a quem? É útil para quem?
				
				Postura que leva o pragmatismo a 
				considerar as abstrações, os conceitos, as teorias como criações 
				“metafísicas” da mente, que não tem correspondência com o real. 
				A partir dessa visão “idealista subjetiva”, o pragmatismo assume 
				um “anti-racionalismo militante” e afirma que a única forma de 
				aferir a “veracidade” de uma “crença” (ao que se reduz o 
				conhecimento) são os resultados práticos obtidos com a sua 
				aplicação. Ou seja, se ela levar ao sucesso, for “útil”, trouxer 
				“proveito” e “vantagens”, será verdadeira! Só o que é eficaz é 
				verdadeiro. Portanto, se um indivíduo ficar desempregado, não 
				tiver êxito em suas atividades ou fracassar em seu 
				empreendimento, não deve buscar a causa disso na lógica 
				excludente e concorrencial do capitalismo, e sim isso em suas 
				“crenças errôneas”. Isto é, a culpa será sua... 
				
				
				Nesta segunda parte de nosso 
				estudo sobre o pragmatismo, examinaremos suas concepções morais, 
				jurídicas, sociais e políticas. 
				
				A "moral" pragmática 
				
				
				Como não podia deixar de ser, a 
				concepção pragmática de “moral” segue a mesma visão “empírica” 
				de sua concepção de conhecimento e de “verdade”. Para os 
				pragmáticos não existem normas ou valores morais – “invenção dos 
				metafísicos”, segundo eles –, e só o método experimental 
				permitirá solucionar os problemas que venham a surgir, tendo 
				como única referência a compreensão de que o “bom” ou o “certo” 
				é aquilo que é “proveitoso” para o indivíduo e lhe assegura o 
				êxito: 
				
				“No terreno da moral esse método 
				conduz inevitavelmente ao relativismo ético. O instrumentalismo, 
				por sua própria essência, rechaça todo gênero de normas morais 
				obrigatórias para todos (...); os princípios morais são para ele 
				simples instrumentos, da mesma forma que todos os conceitos em 
				geral. Desde o ponto de vista do instrumentalismo, a moralidade 
				de um ato deve ser avaliada somente segundo o êxito com que 
				resolva cada ‘situação problemática’ moral por separado, isto é, 
				em essência, de maneira totalmente subjetiva. (...) Em sua 
				aplicação às relações políticas, o princípio do instrumentalismo 
				pode ser facilmente utilizado para justificar o aventureirismo 
				mais desenfreado, a arbitrariedade e qualquer ação violenta na 
				hora de resolver os problemas políticos.” (YOVCHUK, M.T., 
				OIZERMAN, T.I. e SHCHIPANOV, I.Ia. Compendio de Historia de La 
				Filosofia, vol. 2. Montevideo: Ediciones Pueblos Unidos, 1969, 
				pp. 747-748) 
				
				John Dewey expressou sem meias 
				palavras essa concepção pragmática e utilitária da “moral”: “Os 
				fins e bens morais existem somente quando se tiver de fazer 
				alguma coisa (...) a moral não é catálogo de atos, nem um 
				conjunto de regras a serem aplicadas (...) cada situação moral é 
				situação isolada, inigualável, com o seu mérito ou bem 
				insubstituível. (...) A felicidade é encontrada unicamente no 
				êxito. (...) O crescimento, o desenvolvimento em si mesmo é o 
				único ‘fim’ moral.” (DEWEY, John. A filosofia em Reconstrução 
				São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1958, pp. 164-179).
				
				
				Analisando esse “relativismo 
				moral” do pragmatismo, o filósofo marxista mexicano Adolfo 
				Sanchez Vazques constata: 
				
				“No terreno da ética dizer que 
				algo é “bom” equivale a dizer que conduz eficazmente à obtenção 
				de um fim, que leva ao êxito. Por conseguinte, os valores, 
				princípios e normas são esvaziados de um conteúdo objetivo e o 
				valor do “bom” – considerado como aquilo que ajuda o indivíduo 
				na sua atividade prática – varia de acordo com cada situação. 
				Reduzindo o comportamento moral aos atos que levam ao êxito 
				pessoal, o pragmatismo se transforma numa variante utilitarista 
				marcada pelo egoísmo; por sua vez, rejeitando a existência de 
				valores ou normas objetivas, se apresenta como mais uma versão 
				do subjetivismo e do irracionalismo.” (VAZQUEZ, Adolfo Sanchez. 
				Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970, p. 254)
				
				
				E mesmo uma estudiosa simpática ao 
				pragmatismo – como a cientista política brasileira Thamy 
				Pogrebinschi – tem que reconhecer que, ao contrário do 
				utilitarismo de John Stuart Mill, o pragmatismo é puramente 
				“individualista”: 
				
				“Ressalte-se (...) que a idéia de 
				‘felicidade geral’ ou ‘o maior bem para o maior número’ [de 
				Stuart Mill] não são em si apropriadas pelo pragmatismo. (...) a 
				utilidade não é por ele definida em termos de felicidade e 
				tampouco de felicidade do maior número. O que é útil para o 
				pragmatismo é simplesmente aquilo que é melhor para cada pessoa. 
				A utilidade é definida, portanto, em termos instrumentais. (...) 
				são úteis na medida em que conduzem eficazmente à realização dos 
				fins dos indivíduos.” (POGREBINSCHI, Thamy. Pragmatismo - Teoria 
				Social e Política. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2005, p. 67)
				
				
				E John Shook, apologista do 
				pragmatismo, confessa: “O pragmatismo é um individualismo, pois 
				os fins são sempre fins de um determinado indivíduo. (...) Os 
				valores não existem antes do nosso ato de valoração (...) Não 
				nos perguntamos se nossas ações estão de acordo com ideais 
				morais, quando obtemos um bem social (...) Os ideais morais são 
				valorados por uma sociedade porque serviram no passado para 
				resolver um conflito; eles podem ser (...) substituídos por 
				outros ideais, caso venham a falhar na resolução de conflitos 
				futuros.” (SHOOK, John. Os pioneiros do pragmatismo americano. 
				Rio de Janeiro: DP&A editora, 2002, pp. 149; 162-167) 
				
				
				Assim, a “moral pragmática” reduz 
				todos os valores morais – amizade, solidariedade, lealdade, 
				sinceridade, altruísmo, compaixão, espírito de justiça, coragem, 
				entre outros – à mera “utilidade” para o indivíduo, examinada em 
				cada caso concreto. 
				
				O marxismo rejeita esse 
				“amoralismo” pragmático. Os valores morais não são “eternos”, 
				mas “históricos” e em uma sociedade de classes, assumem um 
				pronunciado caráter de classe. Isso não significa, porém, que 
				não existam valores universais, sedimentados ao longo do 
				processo de evolução da humanidade: 
				
				“a aristocracia feudal, a 
				burguesia e o proletariado possuem cada uma a sua moral 
				particular (...) Essas três teorias morais representam (...) 
				etapas distintas de um mesmo processo histórico e por isso têm 
				um fundo histórico comum, o que faz com que forçosamente elas 
				contenham toda uma série de elementos comuns. E não é só. Em 
				fases idênticas ou aproximadamente equivalentes de 
				desenvolvimento econômico, as teorias morais devem 
				necessariamente coincidir, numa extensão maior ou menor. (...) 
				também o mundo moral tem os seus princípios permanentes, que se 
				colocam acima da história e das diferenças existentes entre os 
				povos. (...) Que essa evolução se processa sempre, em largos 
				traços, da mesma forma no campo da moral como nos demais ramos 
				do conhecimento humano e sempre em um sentido de progresso, é o 
				que nos parece indubitável.” (ENGELS, F. Anti-Düring. Rio de 
				Janeiro: Paz e Terra, 1976, pp.78-79) 
				
				Sem dúvida, o “amoralismo 
				pragmático” serve como uma “benção” para a grande burguesia 
				monopolista, que não tem quaisquer escrúpulos nem se detém 
				diante do uso de qualquer expediente para acumular o capital e 
				dominar povos: 
				
				“Na verdade, se o valor principal 
				que a moral sustenta é o dinheiro e a riqueza, se a sua obtenção 
				é considerada como resultado do pragmatismo da pessoa, como será 
				possível pensar na moralidade dos meios para atingir este 
				objetivo? (...) A moral burguesa é pela sua própria natureza 
				hipócrita e dúplice. ‘O dinheiro não cheira’, esta é a divisa 
				mais característica que põe a nu toda a sua falsidade interna.” 
				(TITARÉNKO, A. I. Particularidades principais do desenvolvimento 
				histórico da moral. In; DIVERSOS. Fundamentos da Ética 
				Marxista-Leninista. Moscou: Ed. Progresso, 1982, p. 73) 
				
				
				“Para atingir um objetivo, 
				desrespeita-se o caráter moral dos meios. Deste enfoque surge o 
				princípio da conduta moral ótima que indica o critério de 
				eficácia dos meios em detrimento do critério da sua moralidade. 
				A mentira e a traição, o veneno e a espada – tudo é permissível 
				e, mesmo, desejável quando se trata do caminho mais breve para o 
				objetivo desejado.” (BAKCHTANÓVSKI, V. I. Problemas da opção 
				moral. In: DIVERSOS. Idem, p. 138) 
				
				“As vantagens justificam os meios"
				
				
				Todos conhecem a cantilena dos 
				ideólogos burgueses de que os marxistas se orientariam pela tese 
				de que “os fins justificam os meios”, no sentido de que os 
				comunistas estariam dispostos a utilizar qualquer meio para 
				atingir os seus fins – o socialismo e o comunismo. Essa é mais 
				uma das tantas calúnias contra aqueles que lutam por um mundo 
				mais livre e mais humano, liberto de toda forma de exploração e 
				opressão – o que é incompatível com o uso do engano, a 
				falsidade, a deslealdade, a baixeza e a vilania – que tão bem 
				caracterizam o comportamento da burguesia em sua fase 
				monopolista. O que a história tem demonstrado é que é o 
				imperialismo quem – com o “suporte filosófico” do pragmatismo – 
				nunca titubeou em utilizar os meios mais ignóbeis para alcançar 
				os seus objetivos, obter “proveito” e “vantagens”, massacrar 
				povos e destruir nações.
				Ao adotar as fórmulas “tudo que é útil é verdadeiro”, “a idéia 
				verdadeira é aquela que nos traz vantagens”, “o êxito é o único 
				objetivo moral”, o pragmatismo concedeu respeitabilidade e 
				cidadania a qualquer canalhice, desde que demonstre ser capaz de 
				conduzir ao êxito. A cantilena dos escribas do imperialismo se 
				voltou contra eles próprios, recauchutada sob a fórmula “as 
				vantagens justificam os meios”! 
				
				Assim, se for preciso mentir – 
				dizendo que o Iraque era detentor de “armas de destruição em 
				massa” (mesmo sabendo que isso não tinha qualquer fundamento) –, 
				invadir e destruir o país para apropriar-se de seus riquíssimos 
				campos de petróleo, tudo isso é “moral”, é “certo”, pois obteve 
				êxito e alcançou vantagens incalculáveis para o grande capital 
				estadunidense, além de dividendos geopolíticos e militares para 
				o imperialismo norte-americano! 
				
				O pragmatismo jurídico 
				
				
				A filosofia pragmática – com a sua 
				pregação de que a “verdade” é o que é útil e não pode ser 
				entendida como uma “representação objetiva” da realidade, 
				devendo restringir-se a descrever cada experiência concreta, 
				tendo como único critério de veracidade o seu proveito para o 
				indivíduo – tornou-se a base ideológica das teorias mais 
				reacionárias entre os juristas burgueses dos Estados Unidos, 
				entre os quais os da escola “sociológica” e os chamados 
				“realistas”. 
				
				Para os “sociologistas” – em 
				perfeita consonância com o pensamento pragmático – não existem 
				“princípios jurídicos” (invenção dos metafísicos...) e as normas 
				e as leis tem um valor meramente formal, pois são incapazes de 
				responder às necessidades das “experiências” práticas com suas 
				singularidades. “O Direito é mais do que um conjunto de normas”, 
				dizem. O que importa é o processo de aplicação dessas normas a 
				cada caso concreto, atribuindo essa “experimentação aos juízes e 
				aos tribunais: 
				
				“O abandono da democracia e o 
				retorno à reação que caracteriza a época do imperialismo, 
				manifesta-se particularmente no crescimento do papel dos 
				tribunais e dos órgãos administrativos. Buscando fundamentar a 
				arbitrariedade dos juízes e de quantos aplicam o Direito, os 
				juristas reacionários norte-americanos sustentam que o essencial 
				no Direito não é o elemento normativo [as leis], mas o processo 
				da sua aplicação. (...) é precisamente a expressão do desejo da 
				burguesia de desembaraçar-se de sua própria legalidade (...) a 
				burguesia põe suas esperanças não tanto em suas leis, quanto em 
				seus juízes, que devem ‘emendar’ as leis e adaptá-las no maior 
				grau possível aos interesses dos círculos reacionários da 
				burguesia imperialista (...) a ampliação do papel do tribunal e 
				o estabelecimento da arbitrariedade dos juízes constitui uma das 
				tarefas a que se propõe a burguesia.” (POKROVSKI e outros. 
				História das Idéias Políticas. Ciudad de México: Grijalbo, 1966, 
				pp. 595-597) 
				
				Os “realistas” vão ainda mais 
				longe em sua “pragmatização” do Direito e na renúncia aberta à 
				legalidade quando afirmam que a lei nada mais é que uma opinião 
				do legislador, mas que essa opinião ainda não é um verdadeiro 
				direito, senão simplesmente uma hipótese que deve ser avaliada 
				pelos tribunais: 
				
				“O ‘realista’ Bingham (...) diz 
				que não são as leis que governam, mas os homens. O direito não 
				radica em regras, nem em princípios. Em sua aspiração de 
				fundamentar a legitimidade da sentença dos juízes, afirma que 
				estes não estão obrigados pelas leis, nem sequer pelos 
				precedentes judiciais [a jurisprudência]. (...) A lei, com essa 
				concepção, perde o valor de uma norma inamovível obrigatória 
				para o juiz. (...) a lei é só um prenúncio do que na realidade 
				faz o tribunal e nada mais. (...) John Dewey (...) afirma que a 
				norma do direito deve ser valorada por suas conseqüências, por 
				sua utilidade prática, como meio, como instrumento para alcançar 
				determinados objetivos. (...) ‘Sem a aplicação diz Dewey – a lei 
				é um pedaço de papel ou um som no ar, mas não há nada que se 
				possa denominar lei.” (POKROVSKI, idem, pp. 597-599) 
				
				
				Não é preciso pensar muito para 
				perceber as graves conseqüências que decorrem dessa “teoria 
				pragmática do direito” da época do imperialismo (que significa a 
				reação em toda linha), enquanto um instrumento para anular – na 
				prática da aplicação do Direito – os limitados avanços duramente 
				conquistados pelos trabalhadores e pelos povos de todo mundo no 
				terreno dos direitos civis, políticos e sociais. 
				
				
				Infelizmente, muitas dessas idéias 
				prevalecem inclusive em nossos tribunais, como recentemente 
				vimos acontecer com a adoção pelo STF da “teoria do domínio do 
				fato”, fazendo tabula rasa da “presunção de inocência”, 
				existente em qualquer Estado de Direito que se preze. 
				
				
				O pragmatismo social e político
				
				
				Ao expressar suas concepções de 
				“Sociedade”, “Estado”, “Democracia”, o pragmatismo assume 
				abertamente a apologia do capitalismo e da democracia liberal 
				norte-americana, ainda que para isso tenha de lançar mão de 
				afirmações teleológicas ou propor conceitos metafísicos – 
				universais, imutáveis e a-históricos –, como “natureza humana”, 
				“tendências inatas”, “propriedade privada”, “democracia”, 
				jogando no lixo quaisquer exigências de “comprovação 
				experimental” do que apregoam: 
				
				“James (...) tenta explicar o 
				comportamento do homem e sua ‘experiência’ tomando por base a 
				imutável ‘natureza do homem’ determinada, diz, pela ‘abundância 
				inata de formas interiores, ou seja, pelo conjunto de instintos 
				que condicionam o ‘interesse eletivo’ do psiquismo humano. 
				Trata-se antes de mais nada do ‘instinto de propriedade’, que 
				motiva o homem a apropriar-se, acumular, a fazer o mal a quem 
				possui coisas das quais gostaríamos de nos apoderar; o ‘instinto 
				de beligerância’, que torna fatais as guerras e morticínios; o 
				‘instinto de dissimulação’, etc. 
				
				James expôs francamente o sentido 
				dessa concepção em suas ‘Palestras com professores sobre 
				psicologia’. ‘O instinto da propriedade é inerente à nossa 
				natureza – diz ele – e se arraigou tão a fundo nela que, do 
				ponto de vista psicológico, parece que tempos que suspeitar 
				antecipadamente de todas as formas extremadas das utopias 
				comunistas (...) Ao que parece, para a prosperidade espiritual 
				do homem é absolutamente necessário que ele seja dono, com 
				direito de propriedade exclusiva, não só da roupa que veste mas 
				de algo mais que ele possa, em caso de necessidade, defender de 
				todo mundo.” (BOGOMOLOV, A. S. A Filosofia Americana no Século 
				XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979, pp. 48-49)
				
				
				Seguindo a mesma toada, Dewey 
				afirma que as guerras e as mazelas sociais decorrem dos 
				“instintos humanos”: 
				
				“A semelhança da escravidão grega 
				ou da servidão feudal, a guerra e o regime econômico vigente são 
				formas sociais (patterns) entrelaçadas no material da atividade 
				instintiva. A natureza inata do homem fornece a matéria prima, 
				mas o costume fornece o mecanismo e os fins. A guerra seria 
				inconcebível sem a ira, a disposição de luta, a concorrência, a 
				vontade de exibir-se e outras tendências hostis. A atividade se 
				assenta nelas e existirá em quaisquer condições de vida. 
				Imaginar que elas serão erradicadas é o mesmo que supor que a 
				sociedade pode viver sem alimentação ou sem a união do homem com 
				a mulher. (...) semelhantes considerações dificilmente 
				demonstram que a guerra deve ser erradicada em algum futuro 
				distante” (DEWEY, John. Human Nature and Freedom. In: 
				BOGOMOLOV..., idem, pp. 82-83) 
				
				Dewey, também, apresenta de forma 
				apologética a “democracia liberal” norte-americana – 
				“plutocracia” escancarada que concede ao povo unicamente o 
				direito de escolher a cada quatro anos um republicano ou um 
				democrata para governá-lo, em nome dos interesses da burguesia 
				monopolista: 
				
				“a democracia tem um significado 
				moral e ideal (...) atingir a liberdade constitui o objetivo da 
				história política (...) o governo autônomo é um direito inerente 
				aos homens livres (...) podemos mesmo identificar (...) o fato 
				de toda a história do passado haver sido um movimento para a 
				conquista da liberdade. (...) A democracia é uma forma de vida 
				norteada pela fé realizadora nas possibilidades da natureza 
				humana (...) independente de raça, cor [que o digam os negros 
				norte-americanos], sexo, nascimento, família e riqueza material 
				ou cultural. (...) é a fé na capacidade de todas as pessoas para 
				dirigirem sua própria vida, livre de coerção e imposição 
				alheias”. (DEWEY, John. The Philosopher of the Common Man. In: 
				EDMAN, Irwin. John Dewey. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 
				1960, pp. 330-331) “Thomas Jefferson (...) foi o primeiro homem 
				moderno a colocar em termos humanos os princípios da democracia 
				(...) ‘as definições e os axiomas de um governo livre’, como 
				Lincoln os classificou”. (DEWEY, John. Freedom and Culture. In: 
				EDMAN, Irwin, idem, p. 294) 
				
				Mas, o próprio Dewey, em 1939 – 
				endossando as opiniões colonialistas de Thomas Jefferson –, 
				deixará evidentes suas reais concepções – imperialistas e 
				anti-democráticas: 
				
				“Os fundadores da democracia 
				política americana não eram tão ingenuamente dedicados à teoria 
				pura que desconhecessem a necessidade de condições culturais 
				para o bom êxito da tarefa das formas democráticas. (...) 
				Poderíamos encher páginas e mais páginas com palavras de Thomas 
				Jefferson insistindo (...) seus receios quanto ao bom êxito das 
				instituições republicanas nos países sul-americanos que se 
				haviam libertado do jugo espanhol. (...) Em certa ocasião chegou 
				até a sugerir que a melhor coisa que poderia acontecer às nações 
				sul-americanas seria continuarem sob o domínio nominal da 
				Espanha, com a garantia da França, Rússia [czarista], Holanda e 
				Estados Unidos, até que a experiência do governo autônomo as 
				preparasse para a independência completa.” (DEWEY, John. Freedom 
				..., idem, pp. 285-287) 
				
				Certamente, foi tão “nobre 
				preocupação” que fez os norte-americanos ignorarem o “direito 
				inerente aos homens livres” de um “governo autônomo” e imporem 
				aos cubanos, em 1901, pela força das armas, a “Emenda Platt”, 
				estabelecendo um protetorado estadunidense sobre Cuba e mantendo 
				ali, até hoje, contra a vontade do seu povo, a base naval de 
				Guantánamo. A mesma “nobre preocupação” tem sido, certamente, a 
				causa de dezenas de invasões, pelos Estados Unidos, de nações 
				soberanas em todo o mundo, em nome da “sacrossanta democracia 
				liberal”... 
				
				Nesse mesmo escrito, Dewey – 
				referindo-se à obsessão norte-americana por amealhar dinheiro – 
				o afirma que “se nossa cultura americana é grandemente 
				pecuniária, não é porque a estrutura primitiva ou inata da 
				natureza humana tenda, por si mesma, a obter lucro pecuniário. É 
				antes porque a cultura complexa estimula, promove e consolida as 
				tendências, inatas”. (DEWEY, John, idem, pp.265-266). Mais uma 
				vez, Dewey recorre em suas explicações às metafísicas 
				“tendências inatas”... 
				
				O marxismo de há muito pôs fim a 
				especulações metafísicas acerca de “tendências inatas” e 
				“natureza humana imutável”, mostrando que a essência do homem e 
				a sua “natureza” são constituídas pelo conjunto das relações 
				sociais em que ele atua: “a essência humana não é algo abstrato, 
				interior a cada indivíduo isolado. É, em sua realidade, o 
				conjunto das relações sociais.” (MARX, Karl. Teses sobre 
				Feuerbach. MARX, K. e ENGELS, F. Obras Escolhidas, vol. 3. Rio 
				de Janeiro: Vitória, 1963, p. 209). Ou seja, não são os 
				“instintos” ou supostas “tendências inatas” do homem a causa da 
				existência da exploração, da opressão, das agressões e das 
				guerras, como apregoa o pragmatismo, e sim as relações sociais 
				existentes, plenamente mutáveis! 
				
				Também em relação à violência do 
				Estado contra os oprimidos, Dewey deixa perceber seu 
				autoritarismo, reduzindo o problema à “eficiência” da repressão: 
				“É o caráter sacrossanto, assim atribuído ao uso da força pelo 
				Estado, que torna pungente a acusação de Tolstoi de que o Estado 
				é o arquiinimigo, a pessoa que recorre à violência em grande 
				escala. Não vejo outra saída exceto dizer que tudo depende da 
				adaptação eficiente dos meios aos fins. A séria acusação ao 
				Estado não é a de que ele usa a força – nada se consegue sem 
				usar força – e sim que não a usa de modo sábio ou eficiente.” 
				(DEWEY John. Force and coercion. SHOOK, John. Os pioneiros..., 
				idem, pp. 187-188) 
				
				Mas, deixemos de lado a conversão 
				“metafísica” dos pragmáticos – que nada esclarecem acerca dessa 
				tal “natureza humana imutável” e enaltecem a “sacrossanta 
				propriedade privada” (da qual a imensa maioria da humanidade 
				está excluída), o “indivíduo abstrato” (que “levita” alheio às 
				classes) e a “democracia liberal” (que nos EUA se reduz em 
				escolher, a cada quatro anos, qual o segmento do grande capital 
				que irá dirigir o Estado) – e vejamos o que Richard Rorty, o 
				“guru” do pragmatismo contemporâneo (que se auto-proclama “de 
				esquerda”) nos tem a dizer: 
				
				“Gostaria que tivéssemos alcançado 
				uma época em que pudéssemos finalmente nos livrar da convicção 
				(...) de que deve haver maneiras teóricas amplas de achar como 
				por fim à injustiça, como oposto a maneiras experimentais e 
				humildes. (...) penso que há de chegar a época de abandonar os 
				termos ‘capitalismo’ e ‘socialismo’ do vocabulário político da 
				esquerda. Seria uma boa idéia parar de falar sobre ‘a luta 
				anticapitalista’ e substituí-la por alguma coisa banal e não 
				teórica – algo como ‘a luta contra a miséria humana evitável’. 
				(...) Sugiro que comecemos a falar de cobiça e egoísmo, em vez 
				de ideologia burguesa; de ondas de fome e desemprego, em vez de 
				mercadorização do trabalho; de diferenças de gastos por aluno em 
				escolas e acesso diferencial à saúde, em vez da divisão da 
				sociedade em classes. (...) Uma vez que ‘capitalismo’ não pode 
				mais funcionar como o nome da fonte da miséria humana, ou 
				‘classe trabalhadora’ como o nome de um poder redentor, 
				precisamos encontrar novos nomes para essas coisas (...) Não 
				teremos outro nome para um poder redentor exceto ‘sorte’. (...) 
				Fukuyama sugeriu, e eu concordo, que não há mais projeto 
				romântico para a esquerda além do de tentar criar Welfare States 
				democrático-burgueses e equalizar as oportunidades de vida entre 
				os cidadãos desses Estados por meio da redistribuição de 
				excedente através de economias de mercado. (...) aquilo que os 
				marxistas chamava de ‘reformismo liberal burguês’ é o único 
				caminho que resta à política de esquerda.” (RORTY, Richard. 
				Pragmatismo e Política. São Paulo: Martins, 2005, pp. 25; 54-55, 
				63-64) 
				
				Discurso que procura induzir à 
				completa capitulação frente ao capitalismo putrefato, ao 
				abandono de qualquer teoria de transformação social e à adesão 
				ao mais rasteiro “reformismo burguês”, na esperança de que 
				algumas migalhas da mesa dos poderosos caiam para os “famélicos 
				do mundo”! 
				
				Não satisfeito com sua apologia do 
				capitalismo – “eterno e insuperável” –, Rorty esforça-se para 
				convencer- nos das “excelências” da democracia e da sociedade 
				estadunidenses: “vejo a América (...) abrindo uma possibilidade 
				de panoramas democráticos ilimitáveis. Penso que nosso país 
				(...) é um bom exemplo da melhor espécie de sociedade já 
				inventada” (RORTY, idem, p. 31) Que o digam os pobres e os 
				negros e norte-americanos, assim como todos os povos oprimidos 
				pelo poder econômico e pela máquina de guerra dos Estados 
				Unidos... 
				
				Para concluirmos nossa análise, é 
				preciso examinar a concepção pragmática de “Estado”, 
				desenvolvida essencialmente por Dewey, que se opõe tanto à 
				teoria “contratualista” – que considera que o Estado surge de um 
				“contrato” entre indivíduos que abrem mão de sua liberdade 
				absoluta para depositá-la nas mãos de um “ente”, situado acima 
				da sociedade, com a tarefa de mediar seus interesses comuns –, 
				quanto à concepção marxista, que afirma: 
				
				“O Estado (...) é antes um produto 
				da sociedade quando esta chega a um determinado grau de 
				desenvolvimento; é a confissão de que essa sociedade se enredou 
				numa irremediável contradição com ela própria e está dividida em 
				antagonismos irreconciliáveis que não consegue conjurar. Mas 
				para que esses antagonismos, essas classes com interesses 
				econômicos colidentes não se devorem e não consumam a sociedade 
				numa luta estéril, faz-se necessário um poder colocado 
				aparentemente por cima da sociedade, chamado a amortecer o 
				choque e a mantê-lo dentro dos limites da ‘ordem’. Este poder 
				(...) é o Estado (...) da classe economicamente dominante, 
				classe que por intermédio dele se converte em classe 
				politicamente dominante e adquire novos meios para a repressão e 
				exploração da classe oprimida.” (ENGELS, F. A origem da família, 
				da propriedade privada e do Estado. In: MARX, K. e ENGELS, F. 
				Obras Escolhidas, vol 3..., idem, p. 135-137) 
				
				Ao contrário, para Dewey, a 
				democracia é “um modo de vida” que se expressa em distintas 
				“comunidades locais” – família, vizinhança, escola, trabalho, 
				clube, igreja, associação, etc. A partir daí, “a democracia vai 
				vir por si própria, pois democracia é o nome para uma vida de 
				comunhão”. (DEWEY, John. The Public and its Problems. In: 
				POGREBINSCHI, Thamy, idem, p. 144) “De acordo com Dewey, (...) a 
				Grande Comunidade deve ser uma enorme articulação de pequenas 
				comunidades locais. (...) à democracia enquanto um sistema de 
				governo, Dewey chama de democracia política. (...) O que há de 
				essencial neste modo como Dewey encara a democracia (...) é que 
				a democracia deixa de ser vinculada unicamente à política. (...) 
				Os cidadãos deweyanos não precisam de um governo que não seja o 
				deles próprios, a ser exercido de forma direta e constante – 
				seja em casa, na escola, no trabalho, nas inúmeras associações 
				com seus múltiplos fins: a democracia se faz a si mesma em toda 
				parte.” (POGREBINSCGHI, Thamy..., idem, pp. 144-145; 151; 
				156-158) 
				
				Essa abordagem – sedutora por seu 
				apelo à “participação direta” dos indivíduos nos assuntos do seu 
				dia a dia, de forma palpável –, que propala ser isso a 
				“verdadeira democracia”, longe de ser uma abordagem inofensiva, 
				busca desinteressar as pessoas da “política” e da luta pelo 
				Poder do Estado, visto com algo distante e malévolo, 
				contribuindo para manter o “status quo”. “Contentemo-nos com a 
				participação democrática em nossas comunidades locais e deixemos 
				a ‘grande política’, a luta pela hegemonia no Estado, nas mãos 
				dos políticos profissionais” – essa poderia ser a “divisa 
				sagrada” do pragmatismo político!
				
				São “verdadeiras” na medida em que 
				são eficazes e proporcionam vantagem ao indivíduo. Na segunda 
				parte do nosso ensaio, estudamos o seu relativismo moral – o 
				correto, o bom, o moral, é aquilo que traz proveito para o 
				indivíduo. Em seguida, estudamos o pragmatismo jurídico, que 
				nega a existência de princípios e normas jurídicas – 
				historicamente construídas – e delega a juízes e tribunais de 
				classe a decisão sobre o “justo”, segundo sua “utilidade para a 
				sociedade” (isto é, a sua utilidade para a classe dominante). 
				Por fim, analisamos o pragmatismo social e político, mera 
				apologia da democracia liberal norte-americana e do capitalismo 
				imperialista. Nessa terceira e última parte do nosso estudo do 
				Pragmatismo, abordaremos as suas manifestações mais diretas na 
				luta de classes. 
				
				A subestimação da teoria e o 
				"praticismo rasteiro" 
				
				Na medida em que o Pragmatismo 
				nega qualquer correspondência das idéias e das teorias com a 
				realidade objetiva e faz da experiência a única forma de 
				conhecimento, ignorando a capacidade do intelecto humano – a 
				partir da generalização, da abstração e do raciocínio – de 
				chegar à essência das coisas e às leis que regem os processos –, 
				é óbvio que ele desvaloriza completamente a “teoria” e faz da 
				“prática” um fetiche. 
				
				Mesmo compreendendo que a 
				“prática” é o ponto de partida de todo o conhecimento e o único 
				“critério de verdade” (comprovação) desse conhecimento –, o 
				marxismo não cai no “empirismo”. Em seu ensaio filosófico Sobre 
				a Prática, Mao Tse Tung expõe isso de forma pedagógica: 
				
				
				“No processo da prática, o homem 
				não vê ao início mais que as aparências, os aspectos isolados e 
				as conexões externas das coisas. (…) Esta etapa do conhecimento 
				denomina-se etapa sensorial e é a etapa das sensações e 
				impressões. Nessa etapa o homem não chega ainda a formar 
				conceitos (...) nem a tirar conclusões lógicas. À medida que 
				continua a prática social, as coisas que no curso da prática 
				suscitam no homem sensações e impressões, se apresentam uma e 
				outras vezes. Então, se produz no seu cérebro uma mudança 
				repentina (um salto) no processo do conhecimento e surgem os 
				conceitos. Os conceitos já não constituem reflexos das 
				aparências das coisas, de seus aspectos isolados e de suas 
				conexões externas, senão que captam as coisas na sua essência, 
				em seu conjunto e em suas conexões internas. (…) Esta etapa, dos 
				conceitos, juízos e raciocínios, é (...) a etapa do conhecimento 
				racional. A sensação só resolve o problema das aparências; 
				unicamente a teoria pode resolver o problema da essência. (…) 
				Pensar que o conhecimento pode ficar na etapa inferior, 
				sensorial (...) significa cair no empirismo (...) Os práticos 
				vulgares (...) respeitam a experiência, mas desprezam a teoria e 
				(...) carecem (...) de uma perspectiva de longo alcance, 
				contentando-se com seus êxitos parciais e com fragmentos da 
				verdade.” (MAO TSE TUNG. Cinco tesis filosóficas. Beijing: 
				Ediciones en lenguas extranjeras, 1985, pp. 4-14) 
				
				
				Infelizmente, ao introjetar essas 
				concepções pragmáticas, muitos lutadores sociais desprezam a 
				“teoria” – vista como algo “abstrato” e supérfluo, para o que 
				não dispõem de tempo – e caem no mais rasteiro “praticismo”, 
				carentes de uma visão estratégica da luta. Incapazes de enxergar 
				além dos aspectos fenomênicos, aparentes, secundários e fugazes 
				da realidade, não alcançam penetrar na essência dos processos 
				históricos nem captar as leis que os regem. Sua ação limita-se 
				às demandas imediatas e pontuais. Seu ativismo “praticista” 
				leva-os a uma ação fragmentada, estritamente sindical, juvenil, 
				feminista, racial, comunitária, ecológica ou parlamentar, 
				desligada de um projeto estratégico. 
				
				Não por acaso, Richard Rorty – 
				“guru” do Pragmatismo atual – investe com tanto ódio contra a 
				“Teoria”: 
				
				“Essa preferência por específicos 
				compromissos concretos em prejuízo de amplas sínteses teóricas 
				concordaria com a perspectiva pragmática de Dewey de que a 
				teoria tem de ser encorajada somente quando é passível de 
				facilitar a prática. (...) Teremos de conseguir passar por cima 
				da esperança por algo que venha a ser o sucessor da teoria 
				marxista, uma teoria geral da opressão que fornecerá um divisor 
				de águas que nos levará a derrubar simultaneamente a injustiça 
				econômica, racial e de gênero. Teremos de abandonar a idéia de 
				‘ideologia’(...) o fim do leninismo nos livrará, com sorte, da 
				expectativa de qualquer coisa como socialismo científico, 
				qualquer fonte similar de prognóstico teoricamente fundamentado. 
				(...) teremos de arrancar de nosso vocabulário termos como 
				‘capitalismo’, ‘cultura burguesa’ (e até ‘socialismo’) (...) Não 
				podemos mais usar o termo ‘capitalismo’ para indicar (...) a 
				‘fonte de toda injustiça contemporânea’ (...) como a Grande 
				Coisa Má que explica a maior parte da miséria humana 
				contemporânea. (...) o Welfare State capitalista é o melhor que 
				podemos esperar.” (RORTY, Richard. Pragmatismo e política. São 
				Paulo: Martins, 2005, pp. 99; 70; 66-67; 61-62; 48) 
				
				
				Evidentemente, a justa crítica à 
				“subestimação da teoria” e ao “praticismo” não deve nos levar ao 
				erro oposto do “teoricismo” e do “doutrinarismo”, desligados da 
				vida e da luta, ou ao desprezo da “prática”, fonte de todo 
				conhecimento (direto ou indireto) e critério de verdade. Pois, 
				parafraseando Marx, não basta interpretar o mundo, é preciso 
				transformá-lo. 
				
				“Imediatismo e possibilismo"- 
				Renúncia ao futuro 
				
				O “imediatismo” manifesta-se na 
				ação que busca obter vantagens imediatas, sem levar em conta as 
				conseqüências futuras. O “pragmático” procura tirar proveito de 
				cada oportunidade momentânea, sem preocupar-se com um projeto de 
				longo prazo. Preocupa-se em apresentar resultados a curto-prazo 
				– que atendam as demandas do “hoje”, da próxima eleição, da 
				próxima campanha salarial ou luta reivindicativa – mesmo que à 
				custa do futuro. Com horizontes limitados – por não priorizar um 
				projeto estratégico – tende ao “seguidismo” e à linha do “menor 
				esforço”. 
				
				Os “imediatistas” subordinam sua 
				ação à chamada “opinião pública” e ao “senso comum” – que nada 
				mais são do que a ideologia da classe dominante – e navegam ao 
				“sabor dos ventos”. Fogem – como o “diabo da cruz” – das “bolas 
				divididas”, das polêmicas difíceis, das batalhas “encardidas”. 
				Evitam “nadar contra a corrente”. Seu critério de “verdade”, da 
				“justeza do atuar”, são o êxito e o proveito imediatos. 
				
				
				Ao contrário “os comunistas 
				combatem pelos interesses imediatos da classe operária, mas ao 
				mesmo tempo defendem e representam, no movimento atual, o futuro 
				do movimento.” (MARX, K e ENGELS, F. Obras Escolhidas, Vol. 1. 
				São Paulo: Editora Alfa-Ômega, s/data, p. 46). Pois, o “nosso 
				esforço atual visa ao grande objetivo do futuro e se perdermos 
				de vista este grande objetivo não mais seremos comunistas.” (MAO 
				TSE TUNG. Obras Escolhidas, Vol. 1. Rio de Janeiro: Editorial 
				Vitória, 1961, p. 268) 
				
				Berstein – pai do “socialismo 
				reformista” – fundamenta sem meias palavras o abandono do 
				objetivo final socialista, em troca de “conquistas palpáveis e 
				imediatas”: 
				
				“(...) escrevi a sentença que diz 
				que o movimento significa tudo para mim e que aquilo que 
				usualmente se chama ‘objetivo final do socialismo’ nada 
				representa; e é nesse mesmo sentido que hoje a escrevo de novo. 
				(...) Nunca tive um excessivo interesse no futuro, para além de 
				princípios gerais (...). Os meus pensamentos e esforços estão 
				preocupados com os deveres do presente e do futuro próximo e só 
				me ocupo com as perspectivas mais longínquas na medida em que me 
				possam fornecer uma linha de conduta para a ação adequada agora. 
				(...) Para mim o que geralmente se chama fins últimos do 
				socialismo é nada, mas o movimento é tudo (...) um fim último é 
				aqui considerado como sendo dispensável para os objetivos 
				práticos (...) demonstrei muito pouco interesse pelos fins 
				últimos”. (BERSTEIN, Eduard. Socialismo Evolucionário. Rio de 
				Janeiro: ZAHAR Editores, 1964, pp. 13; 158) 
				
				O “possibilismo” – conceito 
				surgido no seio do movimento socialista francês do século XIX, 
				defendido por Benoît Malon, Paul Brousse e outros – é uma 
				variante ainda mais pérfida do “imediatismo”, que propõe que a 
				luta deve dar-se apenas no terreno do “possível”, entendido como 
				aquilo que está ao nosso alcance, em cada momento. No mesmo 
				diapasão, refuga qualquer combate em que não haja certeza de 
				vitória. Isso significa nunca desafiar o status quo vigente e 
				abdicar de qualquer transformação revolucionária. 
				
				
				O “possibilismo” é o oposto da 
				“audácia revolucionária” – que não se confunde com o 
				“aventureirismo”, nem com o desprezo pelo exame da correlação de 
				forças –, sem a qual nenhuma transformação revolucionária é 
				possível. Como afirmou Marx, “a história universal seria na 
				verdade muito fácil de fazer-se se a luta fosse empreendida 
				apenas em condições nas quais as possibilidades fossem 
				infalivelmente favoráveis”. (MARX, Karl. O 18 Brumário e Cartas 
				a Kugelman. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977, p. 293). 
				
				
				Sem dúvida, nenhuma revolução 
				socialista – na Rússia, China, Vietnam, Coreia ou Cuba, entre 
				outras – teria ocorrido sem uma enorme “audácia revolucionária”, 
				devido às dificílimas circunstâncias em que se deram. Da mesma 
				forma, as epopéias da Coluna Prestes e da Guerrilha do Araguaia 
				nunca teriam sido empreendidas. 
				
				O “possibilismo”, além de ser o 
				mais estreito reformismo, significa a renúncia à revolução.
				
				
				“Taticismo- o descolamento da 
				estratégia 
				
				Todos nós sabemos da importância 
				da “tática” e da grande amplitude que nela se necessita para 
				fazer avançar a luta revolucionária nas condições mais adversas.
				
				
				Porém, para os marxistas, a tática 
				é parte da estratégia, à qual se subordina e à qual deve servir. 
				A tática não trata da luta na sua totalidade, de seus objetivos 
				últimos em cada etapa do processo revolucionário, o que é a 
				tarefa da “estratégia”. Sua atenção está voltada para os 
				diferentes episódios e embates parciais que têm lugar no 
				processo global de luta. Usando uma terminologia militar, se a 
				estratégia tem por objetivo vencer a guerra, à tática cabe 
				determinar os caminhos, os meios, as formas e os métodos da luta 
				em cada combate concreto. Por isso, as ações e os resultados 
				táticos precisam ser avaliados não em si mesmos, não do ponto de 
				vista dos seus efeitos imediatos, e sim em relação aos objetivos 
				e às possibilidades estratégicas. 
				
				Como nos ensina Renato Rabelo:
				
				
				“Do ponto de vista comunista 
				(...), a política é justa quando a tática não se desliga da 
				estratégia, quando a tática está em harmonia com o objetivo 
				maior, estratégico. O sentido estratégico, a razão de ser do 
				Partido Comunista, é superar os marcos da sociedade capitalista. 
				(...) nossa tática é o meio de alcançar esse objetivo. (...) a 
				tática se subordina à estratégia.” (RABELO, Renato. Idéias e 
				Rumos. São Paulo: Editora Anita, 2009, p. 263) 
				
				
				Em muitas situações, as vitórias 
				táticas contribuem para a realização das tarefas e dos objetivos 
				estratégicos. Em outras circunstâncias os êxitos táticos – por 
				mais brilhantes que sejam –, na medida em que não correspondem 
				às possibilidades estratégicas, comprometem o conjunto da luta. 
				Por fim, em certas situações é necessário abrir mão do êxito 
				tático e aceitar conscientemente os reveses e as derrotas 
				táticas, com o objetivo de obter vitórias estratégicas (e 
				inclusive táticas) no futuro. Um exemplo clássico é a firme 
				postura bolchevique contra a participação na 1ª Guerra Mundial – 
				em um momento em que o sentimento “patriótico” russo estava 
				exacerbado –, o que causou um momentâneo isolamento dos 
				comunistas (insucesso tático), logo revertido pela adesão das 
				amplas massas à luta bolchevique para terminar com a guerra e 
				realizar a Revolução de Outubro (êxito estratégico). Da mesma 
				forma, a assinatura da Paz de Brest Litovsk pela Rússia 
				Soviética – cedendo territórios à Alemanha e pagando-lhe pesadas 
				indenizações (derrota tática) – foi essencial para afiançar o 
				poder proletário, consolidar a revolução e recuperar 
				posteriormente esses territórios (vitória estratégica). 
				
				
				Lenin, em seu brilhante estudo da 
				Comuna de Paris, afirma: 
				
				“Marx sabia apreciar, também, que 
				na história há momentos em que a luta desesperada das massas, 
				inclusive em defesa de uma causa condenada ao fracasso, é 
				indispensável com o objetivo de que essas massas sigam 
				aprendendo e preparando-se para a luta seguinte.(...) ‘Os 
				canalhas burgueses de Versalhes – escreve Marx – puseram os 
				parisienses diante de uma alternativa: aceitar o desafio ou 
				entregar-se sem luta. A desmoralização da classe operária, nesse 
				último caso, teria sido uma desgraça muito maior que o 
				perecimento de qualquer número de líderes’.” (LENIN. La Comuna 
				de Paris. Moscou: Editorial Progreso, 1982, pp. 20-21)
				Assim, a tática não deve subordinar-se aos interesses parciais 
				ou momentâneos, nem pode basear-se unicamente em uma análise dos 
				efeitos políticos imediatos. Precisa ser elaborada tendo em 
				vista as tarefas e as possibilidades da estratégia, visando o 
				futuro do movimento. 
				
				O “taticismo” é exatamente a 
				autonomização da tática e o seu “descolamento” da estratégia, à 
				qual deveria servir. Em conseqüência, rebaixa a luta ao nível 
				dos interesses parciais, momentâneos ou corporativos, que passam 
				a falar mais alto que o objetivo estratégico da transformação 
				socialista.
				Os “pragmáticos” – para quem o único critério de “verdade” é o 
				êxito em cada ação concreta –, são incapazes de “renúncias 
				táticas” para assegurar vitórias estratégicas no futuro. Da 
				mesma forma, nunca nadam “contra a corrente”, pois isso pode 
				significar derrotas táticas provisórias, Já “os marxistas sabem 
				sofrer os ‘fracassos’, aparentes e passageiros, e proclamar – 
				para o maior bem da prática – a verdade científica. (...) O 
				pragmatismo, ao contrário, está sempre do lado para onde os 
				ventos sopram; não busca, assim, senão o êxito imediato.” 
				(POLITZER, Georges. Princípios Fundamentais de Filosofia. São 
				Paulo: HEMUS, s/data, p. 161). 
				
				E Mao Tse Tung nos afirma: 
				
				
				“Nas lutas sociais, as forças que 
				representam a classe avançada às vezes sofrem revezes; mas isso 
				não se deve a que suas idéias sejam incorretas, senão a que, na 
				correlação de forças em luta as forças avançadas não são 
				momentaneamente tão poderosas como as reacionárias. Portanto, 
				fracassam temporariamente, mas hão de triunfar, mais cedo ou 
				mais tarde.” (MAO TSE TUNG. Textos escogidos. Ciudad de México: 
				Partido del Trabajo, 2015, p. 529) 
				
				O pragmatismo político eleitoral
				
				
				John Dewey – em um texto de 1939 – 
				deixa claro qual é para o “pragmatismo” a grande questão em 
				jogo: “a idéia de que a moralidade deve ser (...) o supremo 
				regulador dos deveres sociais, já não é tão amplamente 
				alimentada como dantes. (...) no momento o candidato favorito, 
				ideológico e psicológico, ao controle da atividade humana é o 
				amor ao poder.” (DEWEY, John. Aplicações da Liberdade Humana. 
				In: EDMAN, Irwin. John Dewey. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 
				1960, pp. 262-264). 
				
				Ou seja, a questão principal é a 
				busca do Poder político em cada Estado e a conquista do Poder 
				Mundial. Dentro da visão pragmática, a política, a luta pelo 
				poder, são “justas”, “corretas”, “verdadeiras”, se forem capazes 
				de levar à vitória, de alcançar o êxito. Esse objetivo deverá 
				ser atingido a qualquer custo! 
				
				Na medida em que, nas ditas 
				“democracias ocidentais”, a disputa pelo Poder se dá – em 
				condições normais – através de processos eleitorais, a conquista 
				do voto do eleitor será meta. Para alcançá-la, os diferentes 
				partidos – com honrosas exceções – se curvarão ao “senso comum”, 
				à chamada “opinião pública”, que nada mais é do que a ideologia 
				dominante: “Os pensamentos da classe dominante são também, em 
				todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou seja, a classe 
				que tem o poder material dominante numa dada sociedade é também 
				a potência dominante espiritual.”
				(MARX e ENGELS. A Ideologia Alemã – Vol. 1. Lisboa – Ed. 
				Presença; Brasil - Martins Fontes: pp. 55-56). E João Amazonas 
				complementa: “A burguesia não apenas detém o predomínio de sua 
				ideologia, como domina os instrumentos de divulgação e defesa 
				dessa ideologia.” (AMAZONAS, João. Os Desafios do Socialismo no 
				Século XXI. São Paulo: Editora Anita, 1999, p. 68). 
				
				
				Assim, a chamada “opinião pública 
				é, na verdade, construída e reforçada cotidianamente pelos meios 
				de comunicação, dominados, quase que integralmente, pelo capital 
				monopolista. 
				
				E o “pragmatismo eleitoral” se 
				expressará, então, através de uma política orientada 
				fundamentalmente pelas pesquisas de opinião – quantitativas e 
				qualitativas – e pelos marketeiros, que se especializam em 
				“adestrar” os candidatos para que digam aquilo que o eleitor 
				“quer ouvir” ou se predispõe a acreditar. 
				
				Para os “pragmáticos”, as eleições 
				nunca serão um espaço privilegiado para um grande confronto de 
				idéias, onde as distintas classes ou camadas sociais apresentam 
				suas propostas e disputam a preferência do eleitorado. Aqui, a 
				performance (desempenho, principalmente visual) do candidato é 
				mais importante que o conteúdo de suas idéias e propostas.
				
				
				Referindo-se a isso, o sociólogo 
				argentino Atílio Boron, em instigante texto, afirma:
				“Uma descoberta decisiva (...) se produziu a partir do primeiro 
				debate televisado, em 1960, entre John F. Kennedy e Richard 
				Nixon. Este era o candidato oficialista, que até esse momento 
				liderava as preferências. Porém, na eleição foi derrotado por 
				uma estreita margem (aproximadamente 1%). 
				
				O que foi que descobriram os 
				investigadores? Que quem escutou o debate pela radio afirmava 
				que o vencedor havia sido Nixon, mas quem assistiu o debate pela 
				TV, inclinou-se majoritariamente por JFK. A radio transmitia uma 
				mensagem, a voz; a TV, a voz e a imagem, e esta resultou ser 
				decisiva, porque Nixon saiu-se mal na televisão, aparecendo 
				descuidado, com uma barba incipiente e suando, o que contrastava 
				desfavoravelmente com o bom aspecto e juventude do seu 
				adversário. 
				
				Refletindo sobre a ‘sociedade 
				tele-dirigida, o politólogo italiano Giovanni Sartori escreveu 
				(...): ‘Na televisão o fato de ver prevalece sobre o fato de 
				falar. Em conseqüência, o telespectador é mais um animal vidente 
				que um animal simbólico. Para ele as coisas representadas em 
				imagens contam e pesam mais que as coisas ditas em palavras. E 
				isso é uma mudança radical de direção, porque enquanto a 
				capacidade simbólica distancia o homo sapiens do animal, o fato 
				de ver o aproxima de suas capacidades ancestrais, ao gênero a 
				que pertence à espécie do homo sapiens.’ Em outras palavras, a 
				televisão nos faz retroceder na escala animal (...) produzindo 
				um progressivo menosprezo de nossas faculdades de simbolização 
				em favor das mais elementares de visualização.” (BORON, Atilio. 
				Los medios y la batalla por la democracia en América Latina.
				CIESPAL, Quito, 2015) 
				
				Assim, são desenvolvidas campanhas 
				eleitorais cada vez mais parecidas e “pasteurizadas”, onde os 
				temas tratados são aqueles impostos pelas pesquisas de opinião e 
				de antemão conhecidos – como saúde, educação, segurança, 
				corrupção –, onde os candidatos só diferem pela maior ou menor 
				engenhosidade com que prometem resolver os problemas. 
				
				
				As questões estruturais e de fundo 
				deixam de comparecer, submergidas nas aparências e nas 
				conveniências. Os temas polêmicos e capazes de confrontar a 
				ideologia dominante são deixados de lado e exorcisados, pois 
				podem prejudicar a eleição. É dada preferência a candidaturas 
				“redondas”, “sem arestas”, que abordem temas consensuais, 
				distinguindo-se unicamente por alguma “proposta de efeito”. A 
				forma prevalece sobre o conteúdo. O único que interessa é a 
				conquista do maior número de postos eletivos, não importando se 
				para isso as campanhas reforçam a ideologia burguesa dominante.
				
				
				As inevitáveis e necessárias 
				alianças eleitorais tornam ainda mais difícil evitar o 
				“taticismo eleitoral”, e a perda de referências estratégicas e 
				revolucionárias nos processos eleitorais.
				Mesmo setores de esquerda se “rendem” à lógica “pragmática”. 
				Passam-se os anos e – apesar de importantes avanços eleitorais 
				do campo popular e democrático – constata-se “com espanto” o 
				fortalecimento da ideologia e da hegemonia burguesa na 
				sociedade. Fica evidente que o “pragmatismo político” não 
				proporciona uma efetiva acumulação revolucionária de forças, 
				contribuindo, ao contrário, para reforçar a hegemonia burguesa e 
				afiançar a atual sociedade de classes. 
				
				Significa essa crítica ao 
				“pragmatismo eleitoral” que negamos a necessidade de pesquisas 
				de opinião, que nos informem acerca do estado de ânimo e das 
				opiniões predominantes nas massas? Ou de nos apoiarmos em 
				especialistas em política eleitoral, que dominem as modernas 
				técnicas de comunicação e a psicologia das massas? Evidentemente 
				que não. 
				
				Mas significa que o comando deve 
				ser da “política” e não da “técnica”. Que o “conteúdo” tem de 
				prevalecer sobre a “forma”. Que as propostas imediatas precisam 
				estar articuladas com nossas bandeiras estratégicas. Que não 
				podemos criar ilusões nas massas de que os seus problemas de 
				fundo podem ser resolvidos sem profundas mudanças sociais. Que o 
				socialismo é o nosso grande objetivo e como tal tem de ser 
				propagandeado. Pois, “nunca, em nenhum momento, esse Partido se 
				descuida de despertar nos operários uma consciência clara e 
				nítida do violento antagonismo que existe entre a burguesia e o 
				proletariado (...) Os comunistas não rebaixam a dissimular suas 
				opiniões e seus fins.” (MARX, K e ENGELS, F. Obras Escolhidas, 
				Vol. 1. São Paulo: Editora Alfa-Ômega, s/data, p. 46-47) 
				
				
				Conclusão 
				
				Não devemos subestimar a 
				perniciosidade da filosofia pragmática, apesar de seu pequeno 
				valor no “mercado de idéias” da Academia. Ela é a filosofia do 
				“senso comum”, do homem que quer “ter vantagem em tudo”. 
				Infiltra-se, insidiosa, em todos os poros da sociedade burguesa. 
				Sequer os comunistas estamos imunes a ela. 
				
				Com propriedade, os diversos 
				Congressos partidários têm alertado para os desvios 
				“pragmáticos”, que se acentuam em tempos de defensiva 
				estratégica: 
				
				“Nas condições de relativa 
				defensiva do movimento operário e de intensa institucionalização 
				da atividade política, crescem as tendências ao pragmatismo, que 
				pode levar ao oportunismo, tanto pela direita quanto pela 
				esquerda. Distanciando-se do debate teórico sobre os objetivos 
				estratégicos (...) o militante começa a construir um projeto 
				próprio, fruto de anseios pessoais, abandonando o projeto 
				coletivo, às vezes aderindo a outros que lhe dão mais vantagens. 
				(...) A rendição ao pragmatismo é o caminho para a liquidação da 
				unidade do Partido e o rebaixamento do seu objetivo estratégico” 
				(PCdoB. Documentos e Resoluções - 11º Congresso. São Paulo: 
				Editora Anita, 2006, pp. 101; 29) 
				
				Tema que também foi tratado por 
				nosso 12º Congresso, que chamou a atenção para os riscos do 
				“pragmatismo, produto da luta política no nível atual, que leva 
				a perder de vista objetivos fundamentais em prol do imediato, à 
				pressão pela autonomização de grupos de interesse no interior do 
				Partido, à perda de referenciais estratégicos na atuação no seio 
				das instituições vigentes, à burocratização.” (PCdoB. Documentos 
				e Resoluções - 12º Congresso. São Paulo: Editora Anita, 2010, p. 
				131) 
				
				Evidentemente, não temos a 
				pretensão de haver esgotado o tema do “pragmatismo” nesse 
				artigo. Esperamos, porém, ter despertado uma maior preocupação 
				em relação a ele e em relação à necessidade da valorização do 
				estudo teórico em todos os campos do conhecimento.