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   Porto Alegre, sexta-feira, 22 de novembro de 2024

   

Há motivos para lamúrias por não termos vencido no 1º turno?

Raul K. M. Carrion | 09.10.2022


Claro que seria melhor que tivéssemos liquidado as eleições presidenciais já no 1º turno.

     Mas é indiscutível que Lula e as forças de esquerda alcançaram uma grande vitória em 2 de outubro – obtendo quase 6,2 milhões de votos a mais que Bolsonaro –, faltando menos de 1,6% dos votos para decidir as eleições ainda no 1º turno. Lula venceu em 14 estados, contra 13 vencidos por Bolsonaro. Esses resultados comprovam que o objetivo de liquidar as eleições presidenciais em 2 de outubro era algo possível e desejável.

     E não podemos esquecer que esse resultados foram alcançados após anos de ataques dos principais meios de comunicação contra Lula, de perseguição do Judiciário e de sua prisão para impedi-lo de concorrer em 2018.

     Quem imaginaria – após a esmagadora vitória de Bolsonaro nas eleições passadas – na possibilidade de uma recuperação tão rápida de Lula e das forças de esquerda no Brasil?

     E agora, pela primeira vez, um presidente que busca a reeleição obteve no 1º turno menos votos que o seu oponente.

     Mas, é inegável que, ao ter 43,2% dos votos, Bolsonaro e a ultradireita mostraram força, algo que não pode ser ignorado e que tampouco desaparecerá da noite para o dia.

     Diversas razões podem ser apontadas para explicar porque Lula não consumou a sua vitória no 1º turno e Bolsonaro e a ultradireita demonstraram tanta força, apesar do descalabro do seu governo.

     Destacamos:

1) O avanço das correntes políticas de extrema direita em todo o planeta, diante da crise mundial do capitalismo.

2) Algumas melhoras da economia do país, nos últimos meses, levando à diminuição da inflação e do desemprego.

3) O uso descarado da máquina do Estado e do Governo a favor de Bolsonaro e seus aliados, inclusive aprovando um “pacote de bondades” de caráter abertamente eleitoreiro.

4) O "orçamento secreto" de 36 bilhões de reais, administrado pelos bolsonaristas, adubando as campanhas de seus aliados.

5) A utilização de temas “religiosos” e de “costumes” – com o uso de todo tipo de fakenews – para conquistar o voto conservador de grande parte da população, inclusive entre os mais pobres.

6) A “pregação” das igrejas evangélicas pentecostais pedindo, na sua maioria, o voto para Bolsonaro e seus aliados.

7) O apoio majoritário do agronegócio a Bolsonaro e a chantagem econômica aos trabalhadores por parte de expressivas parcelas do empresariado.

8) O apoio e as ameaças do chamado "partido militar" e "policial-militar", que tem capilaridade em todo o país.

9) A migração de última hora de votos da 3ª via (Simone Tebet e Ciro Gomes) para Bolsonaro, buscando o “voto útil” contra Lula.

10) A miopia de parte da esquerda e da centro-esquerda, que não entendeu a necessidade da unidade já no 1º turno.

 

LULA É O FAVORITO, MAS A DISPUTA SERÁ ACIRRADA

 

     O resultado alcançado por Lula no 1º turno – 48,4% dos votos – o coloca como o favorito, bastando-lhe conquistar mais 1,6% dos votos. Já Bolsonaro necessita conseguir mais 6,8%.

     Além da grande fidelidade dos votos obtidos, Lula tem condições de conquistar para si a maioria dos 4,9 milhões de votos (4,2%) de Simone Tebet, candidata do PMDB. Ela, além de declarar o seu apoio a Lula, colocou-se à disposição para percorrer o Brasil em campanha com ele. O PMDB liberou seus filiados para apoiarem quem quiserem. Como boa parte do PMDB já apoiou Lula no 1° turno, agora a maioria deve ficar com Lula

     Da mesma forma, grande parte dos 3,6 milhões de votos (3,0%) de Ciro Gomes, do PDT – partido que já declarou o seu apoio a Lula – devem ir para Lula. O próprio Ciro Gomes – ainda que relutante – afirmou que seguirá a orientação do PDT.

     Igualmente devem ir para Lula os 125 mil votos (0,1%) de outros três partidos de esquerda (UP, PCB, PSTU).

     Assim, além de 6,2 milhões de votos de vantagem, Lula tem 8,6 milhões de votos de candidatos que o apoiam, onde deve crescer. Mesmo os 600 mil votos (0,51%) de Soraya Thronicke, do “União Brasil”, podem deslocar-se em parte para Lula.

     É importante para Lula o apoio de lideranças históricas do PSDB, como Fernando Henrique Cardoso – duas vezes Presidente da República –, o Senador José Serra – ex-candidato à Presidência da República – e de quatro ex-presidentes do PSDB – José Aníbal, Tasso Jereissati, Teotônio Vilela Filho e Pimenta da Veiga –, que carreiam votos do centro e da direita democrática.

     O apoio de economistas como Armínio Fraga, Edmar Bacha, Pedro Malan e Persio Arida – que formularam o Plano Real, dirigiram o Ministério da Economia ou o Banco Central – também são um importante respaldo para Lula.

     E ainda temos o apoio a Lula do “Cidadania”, liderado por Roberto Freire.

     Assim – afora os 10 partidos que já o apoiaram no 1º turno –, Lula obteve o apoio de mais três: PDT, Cidadania e PCB.

     A liberação de voto por parte do PSD também favorece Lula, visto que importantes lideranças, como os senadores reeleitos Osmar Azis, do Amazonas, e Otto Alencar, da Bahia, já declararam apoio a Lula e – junto com o Senador Alexandre Silveira, de Minas Gerais, e o prefeito Eduardo Paes, do Rio de Janeiro – montaram um grupo de parlamentares do PSD para apoiar Lula.

     Diversamente, Bolsonaro dispõe de menos espaço para ampliar sua votação e expandir seus apoios. Obteve o apoio do candidato do Novo, que fez 560 mil votos (0,47%), mas o partido se declarou neutro. Além disso, tem o apoio do falso “padre” do PTB, que obteve míseros 81 mil votos (0,07%). Ao todo, a sua área de crescimento natural é de 640 mil votos (0,54%).

     Além dos três partidos que o apoiaram no 1º turno – PL, PP e Republicanos – Bolsonaro só conseguiu agregar no 2º turno o pequeno PSC...

     Os demais apoios que Bolsonaro obteve nos últimos dias têm sido “mais do mesmo”, isto é, políticos que já o estavam apoiando no 1º turno. É o caso dos governadores reeleitos Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, Ratinho Jr, do Paraná, e Zema, de Minas Gerais.

     A novidade é o apoio do governador de São Paulo, Rodrigo Correa (ex-DEM) – candidato derrotado do PSDB. Mas, o seu apoio foi imediatamente desautorizado pelo presidente estadual do PSDB e causou à renúncia de vários secretários do seu governo, obrigando-o a afirmar que era um apoio de caráter puramente pessoal.

     De toda forma, devido à força eleitoral desses quatro estados e pelo poder de suas máquinas, esses apoios não podem ser desprezados. Em contrapartida, o Dr. Pessoa, Prefeito eleito em Teresina, apoiou Bolsonaro no 1º turno, mas agora apoiará Lula.

     Para termos uma noção da vantagem relativa de Lula, imaginemos por um momento que todos os eleitores dos demais candidatos à presidência decidam anular o seu voto no 2º turno. Nesse caso – mantidas as respectivas votações do 1º turno –, Lula venceria com 52,85% dos votos válidos, contra 47,14% de Bolsonaro, ou seja, com uma diferença de 5,7%.

     Isso significa que a vitória de Lula está garantida?

     De forma alguma, pois o 2º turno – ainda que não seja uma “nova eleição” ou um “jogo zerado” – são mais 28 dias de campanha, durante os quais “muita água pode rolar debaixo da ponte” e fatos novos podem surgir...

     Por isso, com certeza, o 2º turno será difícil e precisaremos trabalhar com muito afinco para conquistar a vitória.

 

ACERTAR NA POLÍTICA PARA VENCER

 

     Nessas três semanas que nos restam, é necessário não errar e consolidar nossos acertos.

     O primeiro deles é a AMPLITUDE, que nos permitiu chegar até aqui e que precisa ser cada vez maior. Como o PCdoB apontou, já em 2018, logo após a vitória de Bolsonaro, é preciso unir todas as forças possíveis, independente de divergências menores, para derrotar o projeto neofascista, entreguista e antipovo de Bolsonaro. O 2º turno é o momento adequado para isso.

     A segunda questão é debater com o povo – além do enfrentamento de suas necessidades emergenciais IMEDIATAS – um projeto de nação, soberano, democrático e DE inclusÃo SOCIAL, capaz de retomar o desenvolvimento do Brasil e garantir benefícios a longo prazo para todos os brasileiros.

     Portanto, é preciso evitar a armadilha da ultradireita, que tenta colocar no centro da discussão as questões religiosas e a pauta dos costumes, problemas de foro íntimo de cada um.

     Sem tornar isso o central da campanha, é preciso fazer a CRÍTICA FUNDAMENTADA DOS CRIMES DE BOLSONARO, contra a vida, contra a nação, contra as liberdades democráticas e contra os direitos do nosso povo.

     Por fim, é essencial LEVAR A campanha às ruas, mobilizando o povo em torno da vitória de Lula!

 

AVANÇOS DA ULTRADIREITA NOS PARLAMENTOS E GOVERNOS

 

     Nesse contexto, é preocupante o avanço da ultradireita e de seus aliados nas eleições para o Senado (que renovou 1/3 dos senadores), a Câmara dos Deputados e os parlamentos estaduais. Eles também conquistaram importantes governos estaduais – como o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina, Paraná, Goiás, Acre, Roraima, e ainda podem conquistar outros no 2º turno como São Paulo e Rio Grande do Sul.

     No Senado (81 senadores), os setores de esquerda e progressistas conquistaram 8 cadeiras e a extrema direita, pelo menos, 13 cadeiras. A direita e centro, cerca de 6 lugares. Na composição total, a esquerda terá pouco mais de 15%, a extrema direita 30% e a direita e o centro mais da metade.

     Na Câmara dos Deputados (513 deputados), a esquerda chegou perto de 25%, a extrema direita a quase 50% e a direita e o centro outros 25%. Na Câmara, a maior representação (99 deputados) será do PL, partido de Bolsonaro, e a segunda maior (80 deputados) será da Federação Brasil Esperança (PT, PCdoB, PV).

 

AMPLITUDE PARA VENCER E PARA GOVERNAR

 

     Sem dúvidas, esses avanços da ultradireita criarão dificuldades para um terceiro governo Lula, exigindo uma ampla coalisão de forças com o centro e com a direita democrática. Portanto, é preciso compreender que será um governo de transição, com a tarefa central de garantir a democracia, reconstruir a nação e melhorar as condições de vida da população.

     Engana-se quem pensa que ele terá condições de ser um governo de grandes avanços.

     Uma vez pavimentado o caminho e derrotada a extrema direita – o que não acontecerá em 30 de outubro –, então, sim, criaremos condições para avanços mais sólidos e profundos!